O dorso da ruína absorta
parece assomar do abismo.
Dançam lumes coloridos,
sonhos de glórias e mitos,
no cenho polido a suor.
Vozes amenas e miúdas
brincam no frio do crepúsculo
que vela as almas amuadas.
A bruma suave me afaga
a lava dos olhos túmidos.
Pios, latidos, coros múrmuros,
rumores das copas nuas,
soltos pelo anil sem nuvens,
fundem ternura e matéria
no agora da praça velha.
Vultos avançam às ruas,
passam fugazes, dispersam
vazios. Respira, suspenso,
baile teso de procuras,
um susto afoito que esquece.
Basta que a relva solene
colha os amores cansados
com sua leveza de pólen:
sou a pedra desses arcos,
dourando à dor do poente.
Poema de “Estuário” (Editora Patuá, 2018).
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