Uma roda-viva interminável, por Carlos Motta

por Carlos Motta
É uma pena que o projeto do icônico Zé Celso Martinez Corrêa de reencenar a peça “Roda Viva”, de Chico Buarque, tenha pouca possibilidade de sair do papel, apesar do sinal verde do autor.
A obra marcou a estreia de Chico como autor teatral, em plena ditadura militar, e provocou reações violentas dos fascistas daquela época: milícias atacaram a montagem em São Paulo e em Porto Alegre, e a censura a proibiu.
A peça fala da relação entre o artista e a sociedade capitalista de consumo, de como são fabricados os ídolos populares, um tema atual até hoje.
Se o texto é pouco conhecido, a música tema se tornou um clássico – é uma das melhores composições do genial Chico Buarque.
Nos bons tempos de festivais de música, ficou em terceiro lugar no terceiro certame promovido pela TV Record, em 1967.
Sua letra reflete o ambiente opressivo da época e a impotência do cidadão comum que vive numa ditadura – mais ou menos como neste Brasil Novo.
A gravação original, com Chico Buarque e o MPB-4, é primorosa, com um arranjo vocal de arrepiar.
Duas décadas depois a TV Cultura lançou um programa de entrevistas denominado “Roda Viva”, claramente inspirado na música de Chico Buarque. O programa existe até hoje, mas de tão ruim, tão engajado no golpe que destituiu a presidenta Dilma Rousseff, foi proibido pelo autor de usar a música homônima como tema.
“Roda Viva”, afinal, é um grito contra a tirania.
https://www.youtube.com/watch?v=IpAR9DlQV6o
Tem dias que a gente se sente
Como quem partiu ou morreu
A gente estancou de repente
Ou foi o mundo então que cresceu
A gente quer ter voz ativa
No nosso destino mandar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega o destino pra lá
Roda mundo, roda-gigante
Rodamoinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração
A gente vai contra a corrente
Até não poder resistir
Na volta do barco é que sente
O quanto deixou de cumprir
Faz tempo que a gente cultiva
A mais linda roseira que há
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega a roseira pra lá
Roda mundo, roda-gigante
Rodamoinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração
A roda da saia, a mulata
Não quer mais rodar, não senhor
Não posso fazer serenata
A roda de samba acabou
A gente toma a iniciativa
Viola na rua, a cantar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega a viola pra lá
Roda mundo, roda-gigante
Rodamoinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração
O samba, a viola, a roseira
Um dia a fogueira queimou
Foi tudo ilusão passageira
Que a brisa primeira levou
No peito a saudade cativa
Faz força pro tempo parar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega a saudade pra lá
Roda mundo, roda-gigante
Rodamoinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração
Roda mundo, roda-gigante
Rodamoinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração
Roda mundo, roda-gigante
Rodamoinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração
Redação

Redação

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