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COVID-19 e a incongruência entre as curvas de casos e de mortes, por Gustavo Gollo

Depois do breve surto inicial asiático ter sido contido, o número de casos de COVID-19 começou a crescer consistentemente em 25 de fevereiro, quando tinha 806 casos na média diária (curva azul), e prosseguiu crescendo até 10 de abril, quando chegou a 80.643.

Em seguida, durante quase um mês a média diária manteve-se estável, chegando a 2 de maio, com 80.225. (Entre 7 de maio com 87.583 casos e 14 de maio com 87.653 ocorre novo pequeno período de estabilidade.)

A curva retoma, então, um crescimento consistente até 7 de julho, com 196.587 casos, na média semanal.

Vemos, assim, uma curva crescente entremeada por um breve período de estabilidade entre 10 de abril e 2 de maio, ou pouco além.

Como metade das mortes ocorre 14 dias após a notificação do caso, deveríamos esperar que a curva do número de mortes descrevesse o mesmo perfil, em linhas gerais, da do número de casos, mas com um atraso de umas duas semanas, expectativa acentuada pela incapacidade de achatamento da curva de contágio em várias localidades.

Surpreendentemente, não é o que mostra o gráfico.

.              Curva mostrando o número de óbitos diários em todo o mundo

A curva marrom mostra a média semanal de óbitos no dia. Consiste em um artifício para suavizar a curva e facilitar sua análise.

Em linhas gerais, desprezando-se a região inicial, a curva cresceu de 3 de março a 18 de abril, caindo até 26 de maio e voltando a crescer, embora leve e irregularmente, até 9 de julho.

Também é plausível considerar a quantidade de mortes relativamente estável entre 14 de maio com 4771 e 9 de julho, com 4760 fatalidades.

Comparando os 2 gráficos, vemos que eles obviamente não descrevem um mesmo perfil. A curva de óbitos certamente não acompanha a do número de casos, dificultando a interpretação da relação entre os eventos.

.                         Curvas de casos e óbitos em todo o mundo


Itália

As curvas da Itália apresentam-se quase como esperado, com o pico de óbitos em 2 de abril, apenas 7 dias após pico de casos, em 26 de março.

.                            Itália: curva de casos e de óbitos

Espanha

As de Espanha apresentam similaridade entre o perfil de casos e óbitos. Difícil, no entanto, explicar a exiguidade da defasagem de apenas 2 dias entre o prosaico pico do número de casos no primeiro de abril, e o de fatalidades, no dia 3.

,                                 Espanha: curva de casos e de óbitos


EUA

O que determina a estranheza da curva mundial, no entanto, é a gigantesca e surpreendente curva estadunidense, com pouco mais de um quarto de todos os casos do planeta, hoje, já tendo tido um terço deles.

Nos EUA ocorre um pico em 10 de abril, com 32.422 casos diários, na média semanal, seguido de redução suave até 9 de julho, com 21.287 casos, para retomar novo período de aumento vertiginoso.

O pico de óbitos ocorre em seguida ao de casos, entre 17 e 21 de abril, quando se inicia longo período de declínio que prossegue até 6 de julho, pelo menos.

Nitidamente, as duas curvas não se encaixam.

.                                    EUA: curva de casos e de óbitos



Brasil

No Brasil a curva da média semanal de casos diários cresceu até 2 de julho, quando parece ter estabilizado. A curva de mortes, no entanto, já se encontra estabilizada em torno de 1.000 óbitos diários desde 5 de junho. Estranhamente, nesse período, o número de casos elevou-se de 25.382 a 38.315.

.                                  Brasil: curva de casos e curva de óbitos



Simulações

Muitas deliberações foram tomadas com base em simulações que pressupunham que o número de mortes seria proporcional ao de casos, expectativa agravada pela falta de leitos decorrente do abarrotamento hospitalar. Nossas expectativas, no entanto, têm se mostrado francamente descoladas dos fatos que parecem sugerir que nossa compreensão do pandemônio seja bem superficial.

Revelações surpreendentes

A notícia bombástica anunciada por espanhóis que teriam encontrado traços do novo coronavírus em março de 2.019, em Barcelona, ainda não gerou confirmações tão contundentes quanto ela própria. Embora um pouco menos drástico, o anúncio do vírus em Florianópolis em novembro, 97 dias antes da primeira notificação oficial, sugere um enigma surpreendente: como pode um vírus supostamente tão contagioso e letal ter circulado pela cidade por tanto tempo, sem que tivesse sido notado.

A mim surpreende que incongruências tão paradoxais não alimentem a curiosidade a ponto de nos fazer exigir explicações para fatos tão surpreendentes.

Consonante à sugestão de que aumentos na quantidade de mortes sempre sucedem a implementação de confinamentos pode-se conferir se a suspensão dessa medida teve efeito redutor na quantidade de óbitos onde isso já tem ocorrido.


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Redação

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