O Neo-Escravagismo como visão de mundo.

O Neo-Escravagismo como visão de mundo.

Situar os partidos no Brasil é extremamente constrangedor para qualquer cientista social, quando se deparam com partidos de direita e de extrema direita o máximo na classificação em termos de atraso é citá-los como partidos nazifascistas.

Entretanto numa análise histórica correta do fascismo italiano, que teoricamente deu o rumo para o nacional socialismo (nazismo) alemão, fica muito difícil encaixar as propostas entreguistas da direita brasileira com o nacionalismo de direita dos partidos nazifascistas.

Se olharmos os grandes feitos do fascismo italiano vemos a famosa “Carta del Lavoro” de 21 de abril de 1927 de Mussolini, em que dentro da ideologia fascista de aceitar a existência da luta de classes tenta colocar o Estado como um tipo de poder moderador entre o capital e trabalho.

A “Carta del Lavoro” estabelece direitos de máxima jornada de trabalho, férias remuneradas, aposentadoria, assistência social pública e outros direitos dos trabalhadores que eram tidos na época como conquistas socialistas. A própria legislação trabalhista brasileira copiou em muito não só os direitos dos trabalhadores da legislação italiana como também a organização sindical obrigatória e atrelada ao Estado.

Estes direitos, concedidos pelo governo fascista de Mussolini, e incorporados a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) pelo governo Vargas durante o Estado Novo, se junta durante este mesmo período da história brasileira a criação de diversas estruturas modernizadoras do Estado Brasileiro como a Petrobrás, a Companhia Siderúrgica Nacional, a Companhia Vale do Rio Doce, a Fábrica Nacional de Motores e outras estruturas modernizadoras já no segundo governo Getúlio (BNDES e outros).

As reformas de Getúlio ficaram restritas a população urbana, que era uma percentagem minoritária durante os seus governos e exclui de forma enigmática, porém compreensível dentro do contexto aqui descrito, os empregados domésticos. Lembre-se que na década de 40 a população urbana não representava mais do que 30% da população do país, só ultrapassando a população rural aproximadamente 35 anos após. A universalização dos direitos trabalhistas só chega a com a constituição de 1988 e isto mesmo de forma parcial, só tornando equivalente a classe operária em geral em 2013!

Como se vê a sociedade brasileira é uma sociedade a duas velocidades, uma para a região industrializada e outra para o resto do país.

Uma coisa é a legislação e outra é a mentalidade das pessoas, a progressão dos direitos trabalhistas e ideias modernizadoras da sociedade brasileira, incorporando-a no capitalismo internacional é algo extremamente recente, porém ao mesmo tempo a mentalidade das classes dominantes brasileiras resiste a uma modernização até a década de oitenta e quando chega a este momento esta tendência modernizante é atropelada pelo neoliberalismo, que no Brasil é impropriamente denominado assim, pois ficaria mais certo dizer que o que há é uma mentalidade liberal clássica, que para ser entendida tem-se que retroceder mais ainda na história.

A amálgama que produz a entrada de conceitos neoliberais com a mentalidade escravocrata, esta sim que pode ser denominada neo-escravocrata, ressurge no imaginário da burguesia brasileira conceitos comuns aos economistas e demógrafos ingleses do século XVIII e XIX, e é lá que acha a classificação política da direita brasileira.

Ao se ler o livro primeiro de Thomas Malthus dedicado a questionar as chamadas English Poor Law legislation, introduzida na Inglaterra na idade média tardia em 1536 pela dinastia Tudor, este pastor protestante preconizava princípios Darwinistas de controle da população através da eliminação dos menos aptos pela miséria e pela fome, desejando que a Inglaterra retrocedesse somente trezentos anos nas relações sociais intercalasses.

O discurso da burguesia brasileira contra a bolsa família é extremamente semelhante ao discurso de Malthus, ou seja, enquanto Malthus propunha uma resposta pré-capitalista aos problemas sociais a burguesia brasileira propõe uma resposta escravagista a população brasileira.

Esta anacrônica e extemporânea opinião regride a conceitos anteriores ao positivismo que permeou no Brasil no fim do Império e início da república. Há na realidade uma ruptura entre o passado positivista da população “culta” do fim do século XIX e início do século XX, simplesmente pela ruptura da discussão política que causou o período de 64 no país. Talvez a herança mais maldita do golpe de 64 é ter tirado da discussão a política que era intensa nas décadas 50 e 60.

Pode-se dizer com certeza que a direita brasileira, não só na teoria, mas na prática, quando esta é possível (vide situação do Maranhão durante a dinastia Sir Ney), que ela nem atinge os conceitos fascistas em termos de evolução social. Há um amalgama perfeito entre o atavismo da mentalidade escravocrata e o neoliberalismo. Este amalgama é mais perverso do que meros conceitos liberais, pois não é de se estranhar que a burguesia brasileira só toma uma parte dos conceitos liberais, aqueles que querem o Estado Mínimo, mas ao mesmo tempo querem os “direitos” de assistência do Estado à minoria, algo como na sociedade feudal.

A imagem que é mostrada aqui talvez demonstre várias coisas, que a direita não é fascista, ela é pré-fascista, que os conceitos de republicanismo introduzido pelo pensamento positivista ainda não foi incorporado à mentalidade brasileira, que além de não aceitar mais o assistencialismo católico dão origem a teologias da prosperidade e outra variações da mesma.

Grosso modo, é possível dizer que parte da sociedade brasileira está em mais de um século atrasada em relação ao resto do mundo em conceito de sociedade, e que esta visão pode ser claramente denominada Neo-Escravagista.

Redação

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