Um estudo qualitativo publicado pelo Instituto de Estudos da Religião (ISER) mostra o que as mulheres evangélicas – que podem fazer a diferença na corrida presidencial de 2022 – pensam sobre Jair Bolsonaro e seu governo.
Realizada durante os meses de maio a julho de 2022, a pesquisa “Mulheres evangélicas, política e cotidiano” aponta que elas tendem a humanizar e, consequentemente, tolerar os erros de Bolsonaro no governo. Além disso, a imagem “exemplar” da primeira-dama Michelle Bolsonaro ofusca os escândalos de corrupção envolvendo a família presidencial.
A própria Michelle foi arrastada para o olho do furacão depois que a imprensa revelou que ela recebeu depósitos suspeitos que somam R$ 89 mil de Fabrício Queiroz, ex-assessor parlamentar de Flávio Bolsonaro, investigado como operador do esquema das rachadinhas. Recentemente, a mídia também descobriu que despesas pessoais de Michelle e Jair Bolsonaro, no Palácio do Planalto, vinham sendo pagas com movimentações financeiras suspeitas.
De acordo com o estudo, “Michelle Bolsonaro é vista como exemplo a ser seguido. As imagens de mãe, esposa, crente, mulher que nasceu em região periférica, de família desajustada, que engravidou e teve que enfrentar sozinha a criação da primeira filha, causou identificação em algumas das mulheres entrevistadas. Estas imagens se sobrepõem aos escândalos, como o envolvimento dela nas ‘rachadinhas’ (peculato) praticadas pela família”.
O estudo ouviu 45 mulheres evangélicas, divididas em 15 tríades (blocos de 3 entrevistadas por vez) entre 16 e 65 anos. As mulheres não se conheciam nem frequentavam as mesmas igrejas. São, em maioria, das classes C e D. Em 2018, 23 delas votaram em Bolsonaro, 7 em Fernando Haddad (PT) e 16 anularam o voto ou não foram votar.
Entre as mulheres que pretendem manter voto em Bolsonaro, “sinceridade” foi uma das principais qualidades atribuídas ao atual presidente. “Essas mulheres o percebem como um homem que não esconde quem ele é, o que lhe torna imperfeito e justifica seus erros, já que ele ‘não pensa antes de falar’, ‘fala muita besteira’, ‘bota a cara’ e ‘não tem medo de inimigos.”
Essas mesmas características, no entanto, também justificam a rejeição de Bolsonaro por mulheres evangélicas que não votaram nele em 2018. Para elas, Bolsonaro “despreza outras pessoas na forma como fala e age”, sempre “muito longe do Evangelho”, dando frequentemente “um mau testemunho que ajuda a justificar a visão corrompida que a sociedade tem dos evangélicos”.
Entre as mulheres evangélicas, honestidade é um adjetivo muito usado para caracterizar um bom político. Isso justifica a resistência que elas têm a Lula e ao PT, ainda associados à corrupção e “à roubalheira”, diz o texto de divulgação sobre o estudo.
Em geral, as mulheres evangélicas entendem que Bolsonaro foi uma decepção como gestor na pandemia. Mas, acima disso, seu maior erro foi não ter sido solidário aos familiares das vítimas fatais. “(…) o atraso na vacinação é um problema menor do que a postura de descaso e de respeito do presidente em relação às vítimas.”
Já sobre a economia, há a compreensão de que “a situação econômica e social piorou, em especial os preços no mercado. Há também uma percepção sobre o aumento da violência e de um clima de desunião nas igrejas e nas famílias.”
Quando questionadas sobre pautas exploradas pelo bolsonarismo – como o feminismo, casamento entre homoafetivos, aborto, etc – as mulheres evangélicas colocam em xeque o imaginário de uma “família tradicional brasileira”, mas ainda são resistentes à pauta do aborto.
As igrejas, para elas, são “uma rede de apoio que oferece garantias para o presente e para o futuro de famílias” e chegam em locais onde o Estado está ausente com seu trabalho social. Para muitas dela, o papel do Estado deveria ser de ajudar as igrejas nessas ações sociais. Já a política partidária é vista como “negativa” pelas entrevistadas.
“Primeiro, porque a igreja é vista como um lugar de acolhimento e união. Por isso, a mobilização exacerbada de falas políticas no púlpito se afasta da finalidade última daquele espaço e divide a comunidade de fiéis, ‘gerando divisão na igreja. Segundo, porque muitas delas compreendem a política como algo intrinsecamente ruim, capaz de ‘corromper as pessoas cristãs’. Nesta direção, as mulheres ouvidas afirmaram que seu voto é uma escolha individual, resultado de reflexão. Elas assumem que escutam as sugestões de pastores e familiares, mas declaram que decidem seu voto mediante pesquisa, estudo e orientação divina.”
A maioria das mulheres evangélicas ouvidas declarou se informar sobre política pelas mídias sociais, em especial os grupos de família do WhatsApp, além de Facebook, Youtube e Instagram. A propaganda eleitoral não foi citada como meio de informação e apenas mulheres mais velhas declararam assistir a debates eleitorais.
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