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Transportes no Governo Lula: a herança neo-liberal

Tive a honra de coordenar a área de transportes na equipe de transição do Governo Lula, no final de 2002. Mais tarde, pude participar em grande parte das ações do Ministério dos Transportes, até junho de 2007, quando saí do governo para voltar à iniciativa privada.

A partir de agosto de 2007, constituí empresa de consultoria, consolidei o Blog Logística e Transportes e, em maio deste ano (2010), com alguns sócios, realizei o sonho de construir e operar um Portal de Logística e Transportes: o Agência T1.

Sinto-me na obrigação, como Diretor Técnico da Agência T1, de elaborar um balanço técnico e político, com informações e juízos, sobre a evolução do setor transportes, antes e durante os dois mandatos do Presidente Lula. Escrever sobre o que vivenciei e o que pude obter de informações de terceiros, bem como fazer uma avaliação crítica desse período e opinar sobre o que julgo necessário para os próximos anos.

Utilizarei o espaço Opinião para publicar os artigos referentes a esse balanço. Espero que esse registro possa ser útil para vocês. Critiquem, por favor

1. A Herança Neo-Liberal

O período 1991-2002 foi marcado por governos de ideologia neo-liberal: Fernando Collor, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso.

Esses governos propugnavam a busca do estado mínimo, com descentralização de suas operações, seja para a iniciativa privada (desestatização), seja para estados e municípios (estadualização e municipalização).

Em relação a Transportes essa ideologia gerou políticas e ações que ora deram conta das necessidades e possibilidades da década 90 – como os arrendamentos e concessões portuárias e ferroviárias –, ora geraram um grande passivo, como no caso da malha rodoviária nacional.

A política de arrendamentos e concessões para operação portuária pela iniciativa privada, nos terminais de uso público, embora bem sucedidas para a movimentação de cargas no cais e retro-áreas, não foram acompanhadas por políticas relativas ao planejamento e à gestão dos respectivos sistemas.

No sistema portuário, as Cia. Docas foram largadas à própria sorte, com restrições de ação, devidas aos passivos trabalhistas e comerciais, não resolvidas prévia ou simultaneamente aos arrendamentos e concessões.

Esses problemas, não equacionados naquela ocasião, geraram “bolas de neve” que praticamente soterraram todos os administradores que dirigiram as Cia. Docas, antes e durante os oito anos do Governo Lula.

Os arrendamentos e concessões para operação ferroviária, pela iniciativa privada, da malha federal de cargas, em que pesem avanços importantes, deixaram de lado questões fundamentais sobre investimentos em transposições urbanas, expansão das malhas, remoção de ocupantes de faixas de domínio e até melhorias de traçado para aumento da eficácia operacional.

Mas é na malha rodoviária que essa política de descentralização mais gerou problemas:

a) Com a transferência de domínios de rodovias importantes para que os governos estaduais (especialmente durante o Governo FHC) licitassem as concessões para a iniciativa privada.

Que resposta satisfatória pode ser dada à seguinte pergunta: se era para conceder à iniciativa privada, porque o governo federal não o fez diretamente? Qual o objetivo e que ganhos teve o país com a transferência de domínio das rodovias para os governos estaduais?

Esse primeiro momento de “estadualização” se deu, principalmente, para os governos do Rio Grande do Sul, Santa Catarina (em pequena escala) e Paraná.

b) Com o abandono dos investimentos em restauração e manutenção da malha rodoviária federal.

Para se ter idéia, em 2002, cerca de 30% dos contratos do DNIT estavam paralisados por falta de pagamento. Os contratos em andamento mantiveram-se em ritmo muito lento, também pela falta de regularidade nos desembolsos do órgãos. No final de 2002, a dívida com os empreiteiros alcançara a cifra de R$ 1,2 bilhão (valor não atualizado).

Penso que todos se recordam que, em 2002, a malha rodoviária federal estava completamente sucateada, com muitos buracos e sem sinalização. Somente ainda não padeciam de saturação de tráfego devido ao baixíssimo crescimento da economia naquele período.

Nesse quadro, o governo FHC resolve estadualizar quase 30% da malha rodoviária federal, através da MP-82/2002, por meio da qual seriam repassados 14,5 mil quilômetros de rodovias para alguns estados, com Minas Gerais recebendo 6,0 mil quilômetros.

Para que os governos estaduais realizassem investimentos de manutenção nessas rodovias, foi estabelecido um custo médio de R$ 130 mil/km, gerando um repasse total de R$ 1,9 bilhão da União para os Estados. Dinheiro este, com raras exceções, foi utilizado para pagamento de 13% do funcionalismo, entre outros desvios de finalidade.

Como se vê, os governos neo-liberais de Collor, Itamar e Fernando Henrique Cardoso abandonaram os investimentos em novas pavimentações, aumento de capacidade das rodovias mais saturadas, restauração e manutenção.

Esse enorme passivo foi reduzido significativamente pelo Governo Lula mas ainda é sentido, mesmo após cinco anos de maciços investimentos, sobre os quais escreveremos mais adiante.

José Augusto Valente – Diretor Técnico da Agência T1

Redação

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