Opinião

Não nos deixam ser uma Nação, por Fernando Castilho

Não nos deixam ser uma Nação

por Fernando Castilho

Em maio de 2013 a presidenta Dilma Rousseff ostentava confortáveis 65% de aprovação de seu governo, mas já no mês seguinte despencou para cerca de 30%.

O movimento pelo passe livre havia se insurgido contra o aumento de 20 centavos nas passagens dos ônibus e do metrô de São Paulo, mas com uma velocidade inédita se transformou em protestos pelo Brasil inteiro contra a única pessoa que seria a responsável por todas as mazelas de um país que caminhava para a frente social e economicamente: Dilma, a nova anta da classe média e da grande mídia.

Hoje se sabe – embora os autores da urdidura do golpe que tirou a presidenta honesta do poder, neguem – que as hordas de pessoas vestidas de verde-amarelo que invadiram as ruas foram comandadas pela atuação do Departamento de Estado dos Estados Unidos que estava de olho no petróleo do Pré-sal que Dilma resistia em entregar ao Tio Sam. Esse modelo de atuação tem sido replicado em todo o mundo, segundo os interesses norte-americanos.

A verdade é que os governos do PT haviam alçado o Brasil à sexta posição mundial na economia, superando o Reino Unido. A projeção do gráfico de crescimento fazia supor que o país emergente seguia segura e continuamente seu projeto de se tornar uma grande nação.

O golpe pôs fim a esse projeto com muita gente ganhando dinheiro e poder, e um juiz alçado à posição de celebridade nacional ao articular com o ministério público a prisão daquele que iria recolocar o país de volta aos trilhos do crescimento.

Hoje temos no poder um tirano que prometeu no início do mandato não só acabar com o sonho de nos tornarmos uma grande nação, mas destruir o país. Esse é o único projeto que aquele que, no auge da pandemia, recebeu a alcunha de Capitão Morte.

O ousado lance de decretar uma graça ilegal constitucionalmente a um daqueles desqualificados, soldados da guerra contra a democracia, que invariavelmente o capitão abandona para trás, tem o intuito de, não só confrontar forças com o Supremo, mas sobretudo de dar o primeiro xeque contra a democracia brasileira.

Nesse xadrez em que, de repente, o país se vê envolvido, é imprescindível que o STF contra ataque, sob pena de que a porteira para a boiada do golpe já comece a se escancarar.

As pesquisas de opinião apontam há meses, com pequenas variações, um quadro em que Lula vence o inominável em todos os cenários, com possibilidade de vitória em primeiro turno, sem possibilidade de terceira via. Parece não haver nada que altere esse estado de coisas até 3 de outubro.

O capitão PRECISA de mais um mandato para que não seja preso e para que dê continuidade às maracutaias que se tornariam de domínio público assim que Lula assuma a presidência em 2023. E após mais quatro anos, precisará mudar a Constituição para um terceiro mandato ou colocar no poder um dos filhos para assegurar sua impunidade eterna.

Por isso, o capitão não esperará o dia das eleições em primeiro turno para dar um golpe.

Recentemente boa parte do exército reagiu contra a revelação de que em 1975 o STM (Superior Tribunal Militar) tinha conhecimento das torturas e assassinatos que ocorriam no Doi-Codi durante a ditadura. O inominável se aproveita desse fato para tentar aglutinar as forças que ele não conseguiu no último 7 de setembro.

Precisamos que o STF tenha a coragem de anular o decreto, mas, mais que isso, precisamos que as outras instituições, a sociedade civil responsável, os movimentos sociais e os partidos de oposição se organizem para dar suporte à decisão do Supremo.

Se a resposta ao inominável não for mais forte que o lance que acabou de fazer, desistiremos de ser uma nação para nos tornarmos a Cuba de Fulgêncio Batista.

Fernando Castilho é arquiteto, professor e escritor

O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN. Concorda ou tem ponto de vista diferente? Mande seu artigo para dicasdepauta@jornalggn.com.br.

Leia também:

A crueldade do governo Bolsonaro com os aposentados, por Fernando Castilho

De onde vem a revolta contra o PT?, por Fernando Castilho

Um exemplo de resistência ao ódio, por Fernando Castilho

Fernando Castilho

Fernando Castilho é arquiteto, professor e escritor. Autor de Depois que Descemos das Árvores, Um Humano Num Pálido Ponto Azul e Dilma, a Sangria Estancada.

Fernando Castilho

Fernando Castilho é arquiteto, professor e escritor. Autor de Depois que Descemos das Árvores, Um Humano Num Pálido Ponto Azul e Dilma, a Sangria Estancada.

View Comments

  • "Não nos deixam ser uma Nação". Desde o início. Enfrentamos a ideologização espanhola, que sobrepôs-se à portuguesa, que sobrepôs-se às demais... e n]ao geramos identidade nacional; quando o pesado braço espanhol desapareceu com a expulsão dos jesuítas, duas décadas depois - um pestanejar - e já estávamos caindo direto sob comando de uma novo poder - a Anglo-América - que até hoje nos reduz à colônia de segunda. Bastou sobrepujar o núcleo original do poder e arrancar do mandatário-mor do atual (aquele this is my man foi de lascar), nos arrebentam de novo. Seriamente ando com medo de ser confundido com Cartago.

Recent Posts

Deputadas de direita querem impedir fiscalização da Lei da Igualdade Salarial

Filiadas ao PL, União Brasil, Cidadania e ao Novo apresentaram proposta na Câmara Federal

5 horas ago

CNU: tire suas dúvidas sobre o adiamento do concurso

Fortes chuvas no sul levaram governo a adiar aplicação das provas em todo país

5 horas ago

Cozinhas solidárias distribuem marmitas aos atingidos pelas enchentes no RS; veja como colaborar

Distribuição começou nesta sexta-feira (3) e deve seguir durante o final de semana; movimentos pedem…

6 horas ago

Hamas chega ao Egito e acordo de cessar-fogo pode ser divulgado em breve, diz mídia árabe

Jornais árabes afirmaram o Hamas teria aprovado a implementação da primeira fase do acordo, que…

6 horas ago

SP: agora, até as águas correm para trás, por Rita Casaro

Empresa-símbolo da engenharia brasileira está à beira de privatização predatória e ilegal, que afetará serviços…

7 horas ago

Em apenas 24 horas, Brasil registra mais 35 mil casos prováveis de dengue

O número de mortes confirmadas pela doença nos primeiros meses deste ano chegou a 2.197

8 horas ago