Da BBC Brasil
Nos EUA, Dilma defende ‘agenda do século 21’, mas velhos temas ainda incomodam
Pablo Uchôa
A presidente Dilma Rousseff encerrou nesta segunda-feira à noite a primeira perna de sua visita de dois dias aos EUA, reunindo-se com empresários e com o presidente americano, Barack Obama, na capital, Washington.
A presidente dedicou praticamente toda sua programação pública a defender uma “agenda do século 21” entre Brasil e Estados Unidos. Mas não conseguiu evitar que os temas da velha política internacional continuassem presentes, como lembretes dos obstáculos para a relação bilateral.
No encontro de Dilma e Obama, tão importantes quanto os assuntos que foram discutidos são os que não foram sequer mencionados: o programa nuclear do Irã, a posição de Cuba na política continental e a vaga permanente do Brasil no Conselho de Segurança da ONU.
Foi a própria Dilma quem disse a jornalistas, em uma entrevista no meio da tarde, que nenhum dos três temas – fontes de desconforto no passado – havia sido discutido na reunião de trabalho ou no almoço entre os dois líderes.
A agenda positiva de Dilma nos EUA se centrou na cooperação em áreas em que Brasil e Estados Unidos têm maior potencial de integração: aeroespacial, energia e biocombustível, defesa, atuação em segurança alimentar em terceiros países, entre outras.
Além dessas, a grande aposta desta visita são as possibilidades de parcerias nas áreas de educação, ciência e tecnologia – foco da continuação da viagem de Dilma nesta terça-feira em Boston.
Ela vai visitar as universidades de Harvard e a sede do Massachussets Institute of Technology, instituições que receberão bolsistas do programa Ciência Sem Fronteiras.
A iniciativa brasileira é complementada pelo programa 100.000 Strong (algo como, “Fortes como 100 mil”), que tem a ambição de levar 100 mil estudantes americanos a estudar na América Latina e Caribe dentro dos próximos dez anos, e receber nos EUA igual quantidade de bolsistas da região.
No plano empresarial, as iniciativas bilaterais têm por objetivo fortalecer a cooperação entre empresas, para que as brasileiras possam avançar em termos de inovação, absorvendo o ímpeto da “grande criatividade e grande competitividade” da economia americana, nas palavras da presidente.
Em sua conversa com os jornalistas, Dilma disse que tem com o presidente Barack Obama “uma relação de alta qualidade, muito sensível”. Obama, que qualificou o antecessor de Dilma, Luiz Inácio Lula da Silva, de “o cara”, já se encontrou três vezes com a colega brasileira como presidentes.
Ele foi ao Brasil em março do ano passado, quando Dilma tinha pouco tempo de governo – o que analistas consideraram um gesto importante.
“Foi a primeira vez que um diálogo entre os EUA e um país latino-americano começou com um presidente americano fazendo a primeira visita”, resumiu o o diretor do Brazil Institute, do Woodrow Wilson Center, Paulo Sotero, em conversa com a BBC Brasil.
Na declaração à imprensa após a reunião na Casa Branca, Dilma lembrou daquela visita, quando teve a “oportunidade” de conhecer Michelle Obama e o resto da família.
Descompasso
Ternura à parte, como a própria Dilma lembrou, “temos muitos pontos de convergência, e muitos em que não convergimos em nossas posições”.
“Representamos nações diferentes e não podemos acreditar que todo mundo é Joãozinho-do-passo certo, aquele que só anda no passo certo. Nós não somos Joãozinho-do-passo certo”, disse Dilma, “nem errado”.
Entre os temas em que os dois não acertaram o passo está Cuba. Respondendo a uma pergunta sobre se houve um pedido formal para a inclusão de Cuba na próxima Cúpula das Américas – a ilha está fora do evento no fim desta semana na Colômbia –, Dilma respondeu que o governo brasileiro havia, sim, levantado a questão.
“Houve uma constatação de que todos os países têm relação formal com Cuba, e que portanto esta era a última cúpula em que Cuba não participaria”, afirmou Dilma.
Quando os jornalistas perguntaram o que Obama havia dito, Dilma respondeu: “Nada. Ele não respondeu nada, isso não é uma pergunta.”
Se o tema de Cuba caiu no silêncio do interlocutor americano, a da vaga permanente para o Brasil no Conselho de Segurança da ONU nem sequer foi mencionada, disse Dilma, assim como o programa nuclear iraniano.
Mais cedo, em uma alusão ao papel brasileiro na estabilidade mundial, a secretária de Estado americano, Hillary Clinton, disse apenas que o Brasil “é um ator responsável”.
Desde o início do governo Dilma, o Brasil passou a ter uma atuação de oposição menos frontal a propostas americanas de sanções nos fóruns internacionais e organizações multilaterais.
Em fevereiro deste ano, o país inclusive votou contra a repressão violenta a opositores por parte do regime sírio. A resolução aprovada por outros 136 países pede a renúncia de Bashar al-Assad.
Mas o apoio brasileiro para aí. Relatando a jornalistas que discutiu com Obama questões a respeito “do Oriente Médio e Norte da África”, Dilma disse que “não temos posições coincidentes a esse respeito”.
“O Brasil sempre prefere esforços diplomáticos determinados, no sentido de que a gente deve evitar sempre o conflito”, resumiu a presidente.
Relação especial
Tudo isto mostra que existem duas vias de relação entre o Brasil e os EUA: a agenda positiva abunda em prospectos de integração; a de discordância, não dá sinais de que possa mudar.
Analistas em Washington especulam se estes desentendimentos são a razão por que o governo americano não dedicou à presidente Dilma uma recepção de Estado, o que elevaria de vez a relação entre os dois países a “especial” – palavra que tem sido usada nas últimas semanas para descrevê-la.
Os EUA deram esse tratamento à Índia e à China, por exemplo, países com os quais dificilmente se pode falar em concordância de agendas. Analistas também apontaram que o premiê britânico David Cameron recebeu, semanas atrás, esse status – apesar de o Brasil ter recentemente ultrapassado a Grã-Bretanha como 6ª maior economia do mundo.
Há poucos indícios de que Dilma, pragmática e centrada nos resultados do seu trabalho, dê importância a questões deste tipo. Na declaração à imprensa, enquanto Obama fez um curto discurso diplomático, Dilma criticou o que chama de “protecionismo cambial” – as medidas de expansão monetária tomadas pelos países ricos que desvalorizam suas moedas, tornando suas exportações mais competitivas.
Um analista crê que, ao focar o relacionamento com os EUA nos aspectos positivos de cooperação e inovação, Dilma ajudará o país a se desenvolver. Crescendo, mais cedo ou mais tarde o país se tornará um ator indispensável no cenário internacional – tal e qual ocorreu com Índia e China.
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