Uma análise de tendências e de valores, por Ion de Andrade

Por Ion de Andrade

Uma análise de tendências e de valores

A maioria silenciosa acordou e talvez não haja segundo turno

O G1 publicou quadro proporcional dos votos por região, detalhando a pesquisa do Datafolha. Quem tiver curiosidade pode acessar o seguinte endereço eletrônico: http://g1.globo.com/politica/eleicoes/2014/blog/eleicao-em-numeros/1.html .

Produzi para elaborar esta análise uma tabela com a projeção populacional, como disponível no Datasus para 2014 segundo dados do TCU e corrigi esta população convertendo-a em eleitores conforme quantitativo de eleitores disponibilizado pelo TSE. O Cálculo é aproximado, (razão porque não vai publicada) pois multipliquei para a distribuição, a população total por fator 0,704 (que é a exata proporção entre a população total e a de eleitores), isto produz entretanto um pequeno desencontro entre os totais populacionais e o de eleitores (mas não altera as proporções). Obtidos estes dados, distribui entre as regiões conforme o peso populacional percentual de cada uma.

Por esta projeção, cujos dados percentuais foram obtidos do G1, e excluídos os indecisos, Dilma tem 44,7% dos votos e Marina 30,7%, não me dei o trabalho de calcular os votos de Aécio, por não ser objeto da ideia que trabalho aqui. Isto confirma a análise do DAtafolha que diz que Dilma precisa de 5 pontos para evitar o segundo turno.

A questão central em jogo é a de que falta pouco para a vitória de Dilma no primeiro turno.

Na semana Dilma ganhou votos expressivamente a) No Nordeste, que representa 27,7% da pop

ulação b) No sudeste que representa 41,9% da população, c) Entre a população que se declara católica, 65% da população, onde cresceu 16% e d) Entre a população que se declara de religião de matriz africana, onde a sua candidatura explodiu.

Marina perdeu votos em todos os agrupamentos, exceto na região Centro-Oeste onde está estável. As maiores perdas de Marina se encontram nas regiões onde Dilma cresce e entre as pessoas que a) Se declaram evangélicas não pentecostais (o protestantismo clássico); b)Se declaram sem religião e c) Entre as pessoas que se declaram Kardecistas. Os dados podem ser consultados no G1.

De concreto há: a) Dilma precisa acrescentar algo como 5% ao seu eleitorado para vencer no primeiro turno, b) Os números parecem apontar para uma reta final onde este percentual será alcançado se a tendência da semana passada for mantida e c) a julgar pelo Vox Populi, os dados podem ser melhores do que os que o Datafolha mostra… o que reduziria o percentual a índice inferior a 5 pontos.

Três elementos em jogo apontam para esta possibilidade: a) a queda de Marina nos segmentos do protestantismo clássico foram explosivas, (oito pontos, de 44 para 36, em duas semanas) b) o crescimento de Dilma no Nordeste (6 pontos em 49) e c) entre católicos (5 pontos em 40) e entre brasileiros de religiões africanas (17 pontos em 32) parece, graficamente, mostrar-se como os primeiros degraus de crescimento exponencial.

Ao ameaçar a integridade do Estado laico submetendo-o a um direito de matriz religiosa neopentecostal e ao relativizar os programas sociais e os direitos trabalhistas, Marina despertou uma lógica “maioria/minoria” inédita nas eleições do Brasil: nem os evangélicos tradicionais, nem os católicos, nem os kardecistas, nem os brasileiros de religiões de matriz africana querem relativizar o Estado laico e nem os programas sociais que criaram o Brasil contemporâneo, o que pode ser enxergado no Nordeste, mas também no Sudeste onde Dilma cresce.

Independentemente de haver segundo turno, estas tendências são de difícil inversão pois tocam a questões identitárias profundas e não mais a questões direitaxesquerda.

Na Itália, o velho PCI nunca conseguiu chegar ao governo, exceto em prefeituras. Isto se deu, em parte, devido às tais questões identitárias profundas.

O vínculo da candidata Marina ao movimento neopentecostal parece ter consolidado uma frente que se tece para além dos valores da política, cujo cerco se estabelece numa espécie de silêncio resignado e não é desfeito pelo discurso dos políticos mas evoca tradições a respeitar. Não se trata somente de uma opção em favor de Dilma, mas uma opção contra o risco do Brasil converter-se num país de privilégios e submissão a um segmento que, embora legítimo, não representa a maioria.

Se eu estver certo Marina terá tido um papel extraordinário na história da República: mostrar o Brasil que não queremos.

A ver.

Ion de Andrade

Médico epidemiologista e professor universitário

Ion de Andrade

Médico epidemiologista e professor universitário

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  • As possibilidades da Marina

    As possibilidades da Marina começaram a diminuir, qdo sua imagem de condutora, de executiva, de chefe de estado começou a esmaecer diante de uma Marina que se mostrava frágil, incompleta ou indecisa, o seu vice como papagaio de pirata materializou esta impressão e a Dilma inverteu a tendencia de queda se apresentando mais firme e determinada, o sujeito comum detém uma sabedoria sutil que pesquisa alguma consegue captar, consegue discernir profundas questões complexas naquilo que mais se aproxima da intuição, do que uma lógica racional.

     

     

  • Marina se desconstruiu por

    Marina se desconstruiu por ela mesma, vem fazendo isso desde 2010, e com ela levou a reboque, pra minha tristeza, a Luíza Erundina; ou elas achavam que se aliando a pessoas da estirpe de Heráclito Forte, os Borhausens, FHC, Lara Resende, Roberto Freire, Agripino Maia enquanto vociferavam um discursinho chinfrim de “nova política” e “economia sustentável” o brasileiro médio não ia despertar do transe que a mídia induziu com a morte de Eduardo Campos?

    Desconfio que pra ela vão sobrar somente os cabrestais dos malafaias e felicianos da vida e os “sonháticos” radicais verdes e GLS que acreditam que Belo Monte é o maior crime ambiental dos Trópicos e que a homofobia é uma política de estado implantada pelo PT a partir de 2003.

  • Muito tempo pela frente

    Vai haver segundo turno.

    A onda Dilma neste finalizinho de campanha e' um alivio, sem duvida, mas acreditar que a tendencia das ultimas semanas vai continuar e' "wishful thinking". O que vai acontecer esta semana e' que com a divulgacao de pesquisas todos os dias e com o desespero da midia, havera uma estabilizacao ou ate um pequeno refluxo.

    Quem acha que os 5% que faltam sao pouco, tem que lembrar que Dilma nunca foi alem do 44% que tem hoje. Mesmo que com a nova conjuntura consiga passar um pouco, e' evidente que a oposicao e a midia vao intensificar os ataques. E eles nao precisam ganhar nada, basta nao perder que eles garantem pelo menos uma nova disputa para o segundo turno.

    Acreditar em liquidar a fatura ja pode ser motivador no curto prazo, mas a frustracao depois disso e' muito perigosa. Se Dilma tiver 49.99% dos votos validos, vai parecer uma derrota. Por isso, ta na hora de parar com essa fantasia e comecar a se preparar pela longa batalha que vem pela frente!

    • Concordo

      A vitória no primeiro turno não é impossível, mas é difícil e não é o objetivo da campanha.

      A campanha é para vencer nos dois turnos. E a vantagem de Dilma neste primeiro turno é uma excelente notícia. A vitória no segundo turno é muito possível e só depende da militância manter o pique e a campanha da Dilma continuar correta e profissional como está.

      O que não pode é perder a perspectiva da eleição em dois turnos e que tudo só acaba quando forem fechadas as urnas no dia 26 de outubro. Até lá é mobilização e pique... rumo à vitória.

  • Primeiro turno e mudança de voto

    Pois é, 

    Eu estava fortemente inclinado a votar na Luciana Genro, mas essa possibilidade de não haver um segundo turno mexeu comigo. Publiquei o seguinte texto no Facebook sobre isso.

    *****

    Algumas pessoas me questionaram por inbox a razão de eu ter mudado de candidato à presidência. Agora que eu estou mudando de novo, vou expor as razões aqui para poupar trabalho.   Se você acha que a Veja, Estadão, Folha de São Paulo, Rede Globo, etc., produzem predominantemente informações relevantes e confiáveis, talvez seja melhor parar de ler este texto por aqui. Se quer saber as razões, esses dois textos podem ser esclarecedores: http://goo.gl/aiwkzt e http://goo.gl/vG0zTB  Pois bem, em recente pesquisa do Vox Populi (http://goo.gl/HnwmOi), há indícios de que a Dilma pode (não é algo que certamente vai acontecer, é apenas uma possibilidade) vencer as eleições em primeiro turno. Basta que uma parcela dos mais de 10% de indecisos vote nela.   O Governo que a Dilma implementou até agora  está cheio de problemas. Por exemplo (não vou fazer uma análise detalhada), existe uma série de concessões ao capital financeiro, a ruralistas, a fundamentalistas religiosos, etc., que eu acho bem problemática.   Mesmo isso deve ser devidamente ponderado. Aqui em Brasília temos um monte de concurseiros, e todos sabem que a Administração Pública é pautuada pelo Princípio da Legalidade. Ele quer dizer que qualquer administrador público, inclusive o Presidente da República, só pode fazer aquilo que a lei permite.   Pois bem, para realizar seu programa de governo, o Presidente da República deve, portanto, ter autorização legislativa. Com a massiva presença desses grupos representados no Congresso Nacional, não há como implementar mudanças no governo sem aprovar leis autorizando essas mudanças, e essa autorização vai depender de concessões para esses grupos, porque são eles que votam pela aprovação ou rejeição das proposições legislativas.   Não são apenas as leis aumentando o salário mínimo, aprovando programas como o bolsa família (que antes era bolsa esmola, mas agora todos os presidenciáveis no alto das pesquisas aprovam), o Marco Civil da Internet garantindo a neutralidade da rede, o Plano Nacional de Educação…   Para implementar o programa de governo, deve haver uma série de gastos, com construção de obras de infraestrutura, escolas, hospitais, pagamentos de professores, médicos, das diversas bolsas... Todos esses gastos devem estar previstos nas leis orçamentárias (Plano Plurianual, Lei de Diretrizes Orçamentárias e Lei Orçamentária Anual), que necessitam de aprovação periódica, e em período relativamente curto, de até um ano.   Tudo isso deve ser aprovado pelos nossos representantes no Congresso. Ora, se os interesses daqueles grupos estão amplamente representados no Congresso, fazer concessões a esses grupos não passa de condição de governabilidade. Sem concessões, sem novas leis e, sem novas leis, sem mudanças.   Então, vamos assinar os projetos legislativos de iniciativa popular para a reforma política para tentar diminuir a presença desses grupos no Congresso? Quem quiser, fale comigo que eu estou colhendo assinaturas e vou buscar em domicílio! Vale lembrar que a Lei da Ficha Limpa saiu de uma iniciativa como essas.   Retomando, a questão da governabilidade também passa pela necessidade de concessões fora do Congresso, como à mídia, mas acho que o exemplo acima basta para ilustrar o argumento.  Pois bem, não obstantes essas concessões, as conquistas no plano social foram muito maiores do que em qualquer outro governo na história do Brasil (salvo, talvez, do que o governo de Getúlio Vargas, sobre o qual os governos petistas levam vantagem por terem feito tudo isso em ambiente democrático). Vejamos algumas.  A concentração de renda vem caindo sistematicamente. Estamos hoje com o índice de Gini abaixo de 0,5 (http://goo.gl/ZFJDRN), que ainda é muito alto, mas a queda sistemática desde 2001 (verdade, dois anos antes da eleição de Lula) é algo muito positivo. Aqui tem dois gráficos que permitem avaliar um pouco essa situação em relação a governos anteriores: http://goo.gl/5IdtFP e http://goo.gl/6jtKtL  O Brasil possui um compromisso histórico com a queda da concentração de renda. Nos governos militares, a política econômica foi abertamente complacente com o aumento da concentração de renda, sob o argumento de que era preciso fazer o bolo crescer para depois dividir. Pois bem, o bolo até que ficou bastante grande, pois somos a sexta maior economia do mundo. Não obstante, muito pouco foi feito antes do governo Lula para dividir esse bolo. Veja de novo o gráfico, lembrando que a ditadura começou em 1964: http://goo.gl/5IdtFP  A fome também foi amplamente combatida pelas gestões do PT. Recentemente a ONU publicou relatório sobre o estado da fome no mundo, e ficou constatado que mais de 10% da população mundial passa fome (http://goo.gl/zXdnS3). É bem verdade que houve uma discreta diminuição, mas nada que chegue aos pés da redução constatado no Brasil, que reduziu sua fome em 50% de 2000 para cá, aumentando os investimentos em 128% enquanto o PIB cresceu 31% (http://goo.gl/f18wMR). Mas veja como a grande mídia tratou o assunto: http://goo.gl/aiwkzt  Dá para falar muito mais. Houve aumento substancial do salário mínimo (http://goo.gl/lV7F25); do emprego (http://goo.gl/ubjOV0), com desemprego na faixa de 5%, tido por muitos como pleno emprego; garantia de recursos para a educação provindos da exploração do pretróleo (http://goo.gl/0m3fzs); e meta no Plano Nacional de Educação de investimento de 10% do PIB nos próximos 10 anos (http://goo.gl/qmOSfL)… Não vou me alongar, para não deixar o texto muito grande.   Aí a pessoa pensa: isso é realmente muito legal, mas eu vou votar na Marina, que vai fazer muito melhor. O prestígio da Marina está realmente muito alto, o que, na minha opinião, só representa um grande perigo. Ela tem ganhado muitos votos fazendo um discurso vago, que diz que vai fazer tudo o que existe de bom no mundo, sem dizer como. Vai governar com os melhores, por exemplo, mas quantos e quem são esses melhores? Essa informação não é bastante para saber se vai conseguir as aprovações legislativas necessárias, mas, já que são melhores, e os parlamentares predominantemente são pessoas de bem, né?!  E o que dizer da flexibilidade do conceito de melhores, quando sobe no palanque com Bornhausen (http://goo.gl/Oe3Tew)?  Além disso, vai fazer o milagre de manter todos os programas sociais maneiros, que por acaso oneraram tanto o orçamento, enxugando o Estado. A cartilha neoliberal, que a paradoxalmente "socialista" segue à risca, vê no Estado a instituição mais malévola que hoje temos na sociedade. A solução que eles propõem é diminuir a presença do Estado, essa criatura intrinsecamente ineficiente, na sociedade. Pois bem, com que recursos vai tocar projetos sociais tão custosos, como o Bolsa Família (em que ela insistir que não vai mexer), pagar salários de professores e médicos, entre tantas outras coisas, se tem que cortar gastos dessa instituição nefasta?  A fórmula mágica ela esconde para si, mas deve existir, e talvez tenha sido revelada por Deus a ela, não é mesmo? Afinal, sua religião aparece até nos seus discursos políticos (http://goo.gl/GGzQhL). Ah, é, ela é fortemente evangélica, e faz discurso político citando Deus, querendo ocupar um posto no Estado, que deveria ser laico, dizem esses intrometidos da ciência e filosofia política.   Voltando à questão da diminuição do Estado, é bastante reveladora a posição de assessor de sua campanha para as questões afetas à economia. O cara falou expressamente que vai manter tudinho, mas apenas se as contas fecharem (http://goo.gl/q3AbLC). Ora, na opinião da equipe, é necessário um grande ajuste fiscal (http://goo.gl/RP4xKI)? Existe, então, muitas chances dessas contas fecharem? Aí eu fico novamente com a Dilma: tá na hora de dizer o que vai cortar (http://goo.gl/ja9Hhk).  Tomara que, nesse ponto, ela mude de opinião, como tem mudado tanto desde que encabeçou a chapa do PSB como presidenciável. Bastaram alguns twittes do pastor Malafaia para que recuasse no que constava do seu programa de governo sobre avanço nos direitos LGBT (http://goo.gl/sBbIQs). O pré-sal, que não pré-stava (http://goo.gl/zmSnty), ficou bem mais legal alguns dias depois (http://goo.gl/lI9uWP).   Acho muito arriscado confiar que ela vá mudar de opinião no sentido que mais interessa ao Brasil. Me parece muito mais garantido continuar com a Dilma, que já mostrou que está fazendo essas coisas. Isto é, jogar e apostar até podem ser bem divertidos, mas não me parece ser o cenário político o campo apropriado para isso.   Por fim, a Luciana Genro é uma linda! Deu muita visibilidade para a causa socialista e o Psol em uma cultura que ainda enxerga o tema sob forte influencia da propaganda desinformativa feita durante a época da Guerra Fria.   Não obstante, não tem muitas chances de chegar a um segundo turno. Talvez sendo bastante pragmático, acho que a melhor saída é tentar garantir a eleição da Dilma já no primeiro turno, diminuindo as chances de termos um governo da Marina, e eleger candidatos do Psol para o parlamento. Será lindo ver o governo Dilma tendo que fazer concessões ao socialismo no lugar de concessões aos banqueiros, ruralistas e fundamentalistas.   Quando esse for o caso, o Brasil estará pronto para uma governante como Luciana Genro realizar suas propostas com ampla condição de governabilidade.

  • marina desconstruiu-se.
    com

    marina desconstruiu-se.

    com suas absurdas propostas,

    todas que tocam profundamente as

    estruturas democráticas do país. .

     

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