Política

Mudança nas regras sobre “saidinhas” de presos “representam um retrocesso civilizatório”, afirma especialista

O Senado aprovou nesta terça-feira (20), por 62 votos a 2, um projeto de lei que coloca um fim nas saídas temporárias de presos para visita às famílias ou para convívio social em feriados e datas comemorativas, prática chamada popularmente de “saidinha”.

O texto do PL 2.253, de autoria do deputado federal Pedro Paulo (MDB-RJ) e sob a relatoria de Flávio Bolsonaro (PL-RJ) no Senado, passou recentemente na Comissão de Segurança Pública da Casa. Agora, a matéria aprovada pelos deputados em 2022 será analisada novamente pela Câmara, já que houve mudança no texto pelos senadores.

No último dia 7 de fevereiro, os senadores bolsonaristas conseguiram acelerar a tramitação na Casa com aprovação de urgência para votação, assim o texto passou no Senado sem a deliberação da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).

O principal argumento utilizados pelos apoiadores do PL é que as saídas temporárias colocam a população em risco, já que alguns presos cometem infrações durante o gozo do benefício ou fogem do encarceramento. “Ao permitir que presos ainda não reintegrados ao convívio social se beneficiem da saída temporária, o Poder Público coloca toda a população em risco”, argumentou Flávio Bolsonaro.

Contudo, segundo o advogado criminalista e especialista em Direito e Processo Penal, Vinícios Cardozo, a prática é fundamental para o processo de ressocialização desses indivíduos, conforme previsto em Lei. “As saídas temporárias representam um benefício fundamental para o processo de ressocialização de indivíduos privados de liberdade de acordo com a Lei de Execução Penal. Estas saídas são regulamentadas de forma clara e rigorosa, visando garantir a segurança e o cumprimento das normas estabelecidas“, explicou.

Os números apontam ainda que os presos que são beneficiados e fogem são minoria. Na “saidinha” de 25 de dezembro de 2023, por exemplo, 52 mil presos foram beneficiados. Desse total, 95% retornaram aos presídios para cumprir as respectivas penas.

Exigências

Hoje, somente os presos que cumprem uma série de exigências têm direito a cinco saídas anuais para visitas à família, atividades de retorno do convívio social e cursos profissionalizantes. Sendo que nos dois primeiros casos as saídas acontecem em datas comemorativas específicas, como Natal e Dia das Mães.

Para ter direito à saída temporária, o detento deve cumprir os requisitos estipulados pela lei, como estar em regime semiaberto, ter cumprido uma porcentagem específica da pena e manter boa conduta carcerária. Antes de conceder a saída, o juiz consulta os diretores do presídio para avaliar a situação do detento“, explicou Cardozo.

Durante a saída temporária, o detento deve manter o mesmo comportamento que dentro do presídio ou no trabalho externo. Não é permitido o envolvimento em atividades ilícitas, consumo de álcool, brigas ou qualquer outro comportamento que caracterize falta grave“, acrescentou.

Focar nos problemas não é a solução

Outro argumento utilizado por Flávio Bolsonaro é que as penitenciárias não têm cumprido o papel de ressocializar os presos. Cardozo reconhece a situação, mas afirma que focar nesses problemas para extinguir direitos “não contribuí”.

É importante destacar que o Brasil enfrenta sérios desafios no sistema prisional, com superlotação e falta de estrutura adequada para promover a ressocialização dos detentos. A cultura de que “bandido bom é bandido morto” e a negligência em relação às condições das prisões não contribuem para a reinserção social dos presos“, pontou.

O PL 2.253 extingue de vez as possibilidades de visitas às famílias e atividades de convívio social, mantendo somente a autorização de saída temporária para estudos e trabalho externo ao sistema prisional.

Para Cardozo, as mudança nas regras “representam um retrocesso civilizatório, implicando no aumento da superlotação e na queda dos índices de ressocializados, de modo que a Lei atinja resultado diametralmente oposto do que se propõe“.

O Palácio do Planalto já se manifestou contra a extinção completa do benefício e, se aprovado novamente pela Câmara, o texto pode ser vetado pelo presidente Lula (PT).

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Ana Gabriela Sales

Repórter do GGN há 8 anos. Graduada em Jornalismo pela Universidade de Santo Amaro. Especializada em produção de conteúdo para as redes sociais.

Ana Gabriela Sales

Repórter do GGN há 8 anos. Graduada em Jornalismo pela Universidade de Santo Amaro. Especializada em produção de conteúdo para as redes sociais.

View Comments

  • 5% de não retorno é um percentual muito alto.

    Mas a correção deveria ser na seleção dos que deveriam ter direito e não na supressão da saída.

  • O veto do Lula para esse projeto de lei é algo que a direita vai usar com MUITA satisfação durante todo o tempo até as próximas eleições. O que o cidadão comum tem mais pavor são esses pequenos delitos, que o põe em vulnerabilidade e gera ressentimento. E eu só vendo os governos de direita estarem presentes em eventos militares e a esquerda em eventos acadêmicos. Isto está totalmente ERRADO, depois reclamam do porquê os militares terem baixa adesão ao pensamento de esquerda. Toda a esquerda está ERRADA em não incluir em sua agenda política a adesão e convívio COM os militares.

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