O custo e o fracasso da aventura golpista
por Aldo Fornazieri
Economistas sérios, que entendem de política, se é que existem, deveriam fazer o cálculo do custo da aventura golpista que derrubou a presidente Dilma. Antes de tudo, é verdade que existia uma crise econômica em curso desde antes de 2015 e que, em boa dose, os erros do governo, somados a problemas estruturais do país, a agravaram. Mas é inegável que a crise política, estimulada artificialmente pelo inconformismo da derrota por parte do PSDB e do resto da oposição, que se aliaram ao chantagista Eduardo Cunha, potencializaram a crise ao extremo, criando uma situação de ingovernabilidade, de retração ainda maior da economia e de cisão política da sociedade.
Ao dar aval ao impeachment, ao questionar a vitória de Dilma e ao se aliar à irresponsabilidade golpista de Cunha, o PSDB foi o principal avalista do golpe. Com esse aval, abriram-se as portas para as traições de Temer, do PMDB e do condomínio de partidos mercenários que estavam no poder. O quadro de ingovernabilidade foi se deteriorando pelos sucessivos erros do governo e pela paralisia e desmoralização do PT.
Não tivesse o PSDB dado aval ao golpe, as duas crises gêmeas – política e econômica – não teriam se agravado. Com as próprias políticas de Joaquim Levy, a economia poderia estar dando sinais de recuperação no início de 2016 se não tivesse sido golpeada pelo processo de construção do golpe. Assim, a aventura golpista custou bilhões de reais à economia, bilhões ao orçamento público e milhões de empregos. As elites econômicas e a grande mídia, que nunca se importaram de forma sincera e programática com o destino desditoso dos brasileiros, aderiram a essa aventura que continua custando caro ao povo brasileiro.
O fracasso do golpe
Vitorioso no Congresso e no Judiciário, o golpe, paradoxalmente, fracassou moralmente e também na opinião pública. Fracassou moralmente porque ele foi produto de uma farsa comandada por políticos cínicos e corruptos. A farsa, convalidada pelo Judiciário e pelo Ministério Público, consistiu em inculpar exclusivamente o PT pela corrupção, na crença de que a opinião pública é manipulável até o fim. Os sintomas do fracasso dessa farsa já se evidenciavam nas grandes manifestações, que eram contra o governo Dilma sim, mas eram também contra a corrupção em geral, incluindo o PMDB e o PSDB. Não por acaso, manifestantes expulsaram Aécio Neves e outros oposicionistas da Avenida Paulista, dizendo que eles também eram corruptos. Nem os partidos de oposição, nem o PMDB foram capazes de convocar qualquer ato pelo impeachment. Esconderam-se, vergonhosamente, por detrás de movimentos que eram epifenômenos de uma indignação justificável e de uma manipulação grotesca. O resultado do golpe político-jurídico foi um governo sem legitimidade das ruas em nome das quais o comitê de corruptos, que comandou o processo de derrubada da presidente, se justificou em seus votos eivados de traição e de engodo, proferidos na Câmara dos Deputados e no Senado.
Não há nenhuma dignidade na traição: ela é abjeta e uma atitude típica dos covardes. Traidores não podem ser reputados como salvadores da pátria, como heróis, ainda mais se sabendo que os que traíram o fizeram sem nenhuma nobreza de intenções, mas para tentar salvar o pescoço da guilhotina da Lava Jato ou para abocanhar nacos maiores de poder. Como diria o nosso mestre maior, a traição “pode levar a conquista do poder, mas não à glória”. Com a consumação do golpe, a própria fúria moralizante dos procuradores e do juiz Moro se afogou no lodo da indisfarçável indignação seletiva e unilateral e que, por isso mesmo, era uma fúria hipócrita e mal cheirosa.
Sem legitimidade, sem respaldo do povo, constituído por um grupo de corruptos, incapaz de sustentar o requisito da idoneidade e da moralidade, o governo Temer nasceu sitiado pela exigência da renúncia que cresce a cada dia que passa. Com o passar dos dias, a sua única saída é produzir a truculência da repressão, comandada pelo Ministério da Justiça. Mas até aqui já encontra resistência: em primeiro lugar, da sociedade democrática que não aceita a volta da violência política. Em segundo lugar, os governos estaduais e as polícias não estão dispostas a pagar o preço da ilegitimidade do governo Temer.
Esse governo nasceu incapaz realizar a missão que se atribuiu e que lhe foi atribuída pela elite liderada pela Fiesp: promover reformas antipopulares. Nesse sentido, o governo já acabou. É um governo que nasceu no ocaso. Temer é um personagem das sombras e não será capaz de reorientar o governo. Carece dos atributos principais da boa liderança política. Despossuído da “precisão do golpe de vista e da vivacidade do espírito” dos líderes ousados e intuitivos, cultiva a conversa de pé de ouvido, típica dos conspiradores. Sem a virtude moral da prudência, esmera-se em exibir sua esposa, Marcela, como um troféu dos incapazes.
Temer será lenta e paulatinamente abandonado pelos que o secundaram na traição e no golpe. Se sobreviver, restar-lhe-á a solidão dos palácios, rodeado de servidores para satisfazer as benesses e os privilégios do comadrio que se refestela com o dinheiro do povo e sente prazer na frivolidade. A conta é simples: Temer não carrega perspectiva de poder futuro e, em sendo o conglomerado que o rodeia movido a interesses eleitorais e verbas públicas, destituído de qualquer moral de fidelidade, no início de 2017 ver-se-á um rearranjo das forças políticas que começarão a gravitar em torno das alternativas viáveis orientadas para 2018.
Por que “Diretas Já”
Diretas Já, em primeiro lugar, porque o que foi tirado do povo – a soberania – precisa ser restituído ao povo. Esse governo é inaceitável porque não é legítimo. Uma crise dessas não terá solução sem um governo legítimo e forte e sem um Congresso movido pela honestidade de propósitos. Quanto mais a crise se prolongar, mais o povo, os trabalhadores e os mais pobres sofrerão as agruras do desemprego e da falta de perspectivas. Desta forma, é um ditame da ética da responsabilidade pugnar pela única saída aceitável, justa e razoável para a presente situação: Diretas Já, com a antecipação das eleições gerais.
Alguns setores de esquerda resistem a esta palavra de ordem, propondo a luta pela recondução de Dilma à presidência. Nem do ponto de vista do Congresso, nem do ponto de vista do Judiciário e nem do ponto de vista da maioria da opinião pública essa é uma saída viável. Nem mesmo a maior parte das forças democráticas e progressistas entende que esse seja o caminho. Propor a volta de Dilma, independentemente das intenções, significa jogar água no moinho do governo ilegítimo de Temer. Ademais, propor a volta de Dilma ou significa acreditar que esse Congresso que a traiu agora lhe garantirá a governabilidade ou significa não se importar com a crise, com a falta de perspectivas e com o sofrimento do povo.
O fato é que o golpe provocou uma divisão insanável e irreconciliável da sociedade nos termos do resultado de um governo ilegítimo. Não será um sistema político decrépito quem promoverá a recondução do convívio democrático e a aceitação do dissenso regulado como a prática capaz de produzir decisões e soluções aceitáveis para todos. Esse governo que está aí não tem condições morais de exigir sacrifícios de ninguém. Qualquer sacrifício imposto aos trabalhadores e aos mais pobres terá que ser repudiado pelas mobilizações nas ruas.
Aldo Fornazieri – Professor da Escola de Sociologia e Política de São Paulo.
Taxação cambial, tarifas e restrição a exportações estão entre punições avaliadas pela equipe do candidato…
Força-tarefa composta por ministérios, Funai, AGU e Incra busca acelerar processo; quatro processos devem ser…
A população russa deu ao Kremlin carta branca total para exercer a punição máxima e…
Golpe inventa uma nova empresa de Elon Musk, a Immediate X1 Urex™, que pretende enriquecer…
Apesar da retirada da lista de privatização, governo Milei reforça intenção de fazer banco oficial…
Prêmio para soluções sustentáveis passa a aceitar inscrições em português; fundos de premiação chegam a…
View Comments
A FEDENTINA DA PODRIDÃO OU O GOVERNO QUE NASCEU DA USURPAÇÃO
Com o impeachment da Presidenta da República o sistema político carcomido, absolutamente viciado, onde vicejam partidos políticos oficiais e oficiosos, no qual a regra é a compra e venda de consciências e votos, onde o poder do dinheiro foi substituído pelas ideologias, tem todas as chances de se manter hígido, íntegro. De fato, o jogo jogado com o impedimento da Presidenta da República é o da manutenção do sistema político e o da salvação da classe política.
Nesse mar de lama, nesse lodaçal que se revela ser o Congresso Nacional, onde trafegam toda sorte de espécimes horripilantes, onde em meio a toda mediocridade se salva uma meia dúzia, quem de fato acreditará em moralização das práticas?
Após a votação do impeachment da Presidenta da República, com o apoio explícito do vice-presidente da República, que não se envergonhou e não teve quaisquer pruridos da sua deslealdade, mediante um processo deflagrado por um ex- presidente da Câmara dos Deputados, ele mesmo envolvido em toda espécie de crimes, acusado de corrupção e tendo por apoiadores, em seu entorno deputados envolvidos em toda espécie de sujidades, desvios de verbas, sonegação, corrupção e até homicídios, quem acredita sinceramente que essa fauna, composta por mais de 400 deputados, que essa espécie de gente pode produzir algum bem?
Não guardamos qualquer otimismo. O que emergiu de toda essa barafunda, desse antro de mafiosos e falsos profetas, sob as bênçãos da grande mídia, de pastores evangélicos e do grande empresariado, foi um governo de um presidente ilegítimo, sob o domínio de um ardiloso enxadrista da chantagem e da extorsão .
À elite feudal
À elite feudal latino-americana é bastante o "quem tem mais o quê". Logo, o que importa é viver num casebre, desde que o outro nem o casebre tenha. Partindo desse princípio, tocar fogo no país para vender as cinzas calha muito bem.
Meros agentes coloniais.
Em tempo: E o sonho do povo, naturalmente, é virar elite.
antes fosse so a elite o
antes fosse so a elite o problema. Muito bem observado no final!
abrc, pra esq e avante
Curiosa a afirmação do
Curiosa a afirmação do articulista de que "Com as próprias políticas de Joaquim Levy, a economia poderia estar dando sinais de recuperação no início de 2016."
Ora, se o próprio PT (partido da então Presidente) era contra as políticas de Levy, como isso seria possível? Os defensores da ex-Presidente insistem em falar na suposta "pauta-bomba" que teria paralizado o Governo, mas (convenientemente?) se esquecem de mencionar que eram contra tal pauta, contribuindo para a paralisia e o impeachment.
A esquerda deveria encampar um movimento "o pré-sal é nosso"!
A esquerda deveria encampar um movimento "o pré-sal é nosso"!
Esse calculo ja foi feito
Esse calculo ja foi feito pelos sabotadores da economia da País , saquearao ativos da previdencia , ja saquearam o BNDES, as empress publicas , levarao tudo que puderem enquanto petralhas , tucanos, coxinhas e bolsonarets discutem quem é o melhor....
Só agora o professor percebeu o óbvio?
Prezados,
A falta de originalidade dos acadêmicos 'esquerdistas' é impressionante. O que Aldo Fornazieri expõe neste artigo é o óbvio lulante, que eu e muitos dos leitores que o criticam percebemos há muito tempo. Mas por vaidade e ressentimento com o PT, bem como para garantir espaço no PIG/PPV, Aldo, Wenderley e outros sempre usaram dos microfones e das colunas em jornais para espinafrarem o PT, os governos petistas, a Esquerda que chegou ao poder por meio do voto. Só agora, depois do golpe de Estado consumado é que esses intelectuais parecem ter caído na real e passaram a escrever de forma mais racional e menos ressentida, vaidosa e vingativa.
Fico surpreso com a alta dose de auto-engano ou ingenuidade que Aldo e outros 'intelectuais esquerdistas' expõem nos artigos que escrevem. Neste, Aldo defende a realização de eleições diretas, mas não explica se defende eleições gerais ou apenas para a presidência da república. Na hipótese de uma eleição apenas para presidente, pensa Aldo que o povo elegerá alguém que consiga maioria parlamentar? Mantendo a atual composição do parlamento, que grarantias teremos de que o novo presidente eleito consiga governar até o final do mandato? Ou Aldo pensa que os brasileiros elegerão presidente um corrupto fisiológico das velhas oligarquias plutocráticas, como michel temer?
Em termos morais, de legitimidade, o golpe já nasceu fracassado. Em tempos de internet e comunicação instantânea, apenas pela força, pela repressão truculenta, pela cassação dos direitos dos cidadãos, pela censura e perseguição política aos líderes da Esquerda e dos movimentos sociais o governo golpista pode se impor e se afirmar de forma precária. É ingênuo e pueril esperar do atual Congresso Nacional, que aplicou a fase parlamentar do golpe de Estado, assim como do Poder Judiciário (conivente e ator do golpe, ao lado a do MP e da PF) que seja aprovada uma PEC permitindo a convocação ou convocando uma eleição direta (seja apenas para a presidência da república, seja uma eleição geral).
Se Aldo, Wanderley e outros realmente estivessem defendendo o Estado de Direito e a forma mais simples de se restabelecer a Democracia, o que eles deverim fazer é instar o STF a reconhecer o óbvio: houve um golpe de Estado, não houve crime de responsabilidade cometido pela presidenta Dilma Rousseff e ela deve ser imediatamente reconduzida ao cargo. Esse é o caminho legal, legítimo, democrático. No regime presidencialista, a presidenta não pode ser destituída apenas por não contar com maioria no parlamento. Qualquer alternativa diferente dessa é um golpe de Estado.
Acho que o grande erro do
Acho que o grande erro do golpe foi achar que todo impeachment é uma "solução Itamar Franco". Não refletiram, ainda, que em 1992, o Brasil teve muita sorte. Não houve crise de legitimidade porque o presidente anterior não era uma criação da política em nível nacional, mas sim uma criação midiática. Agora há, realmente, uma crise de legitimidade. Além disso, a nova cúpula econômica não tem muito compromisso com o desenvolvimento econômico, mas, ao mesmo tempo, não tem o "compromisso forçado" que as outras equipes econômicas tinham até o início da década de 1990: combater a inflação galopante. Ou seja, fazem política contracionista em um país que necessita de políticas expansionistas, defendendo tão somente os interesses de sua classe (Tanto o ministro da fazenda quanto o presidente do BACEN são banqueiros, e preservam a aliança tácita com os rentistas, outra casta desinteressada com o desenvolvimento do país). Em suma: um golpe com custo altíssimo para a democracia e com recompensas mínimas para a maioria da população, se é que há recompensas.
Foi isso.
O golpe, com foi e vem sendo feito, foi feito para isso: destruir a economia do país. Este foi o objetivo e por isso toda esta bizarrice, esta falta de critério, este desbunde.
O maior objetivo do golpe foi o que a globo sempre quiz: provocar o desastre; a mando de quem não digo. Estas alterações da previdência e da clt, cuja pressa não se explicaria jamais, farão o resto da destruição com o confronto que pedem. Era para destruir e foi totalmente exitoso. Destruiu o país.
E o nassif, nem tá aí... Acha que a culpa foi da Dilma.
Bizarro.
Eliseu padilha comandando reformas como a da previdência e da CLT. querem ou não querem destruir o país?
Acho que já conseguiram.
O golpe é mais do que
O golpe é mais do que vencedor !!!
Narrativas morais e históricas não devolverão o mandato de Dilma. A única saída que o autor enxerga é diretas já, que só reforçam a legitimidade do golpe e serão disputadas em um ambiente amplamente desfarovél a esquerda. Diretas já só substituirão o golpista PMDB pelo avalista do golpe PSDB.
Reconhece a queda e não desanima.
Também vejo como você.
Acho que a fragmentação política é vitoriosa e fortalece as oligarquias regionais, o PMDB e os partidos fisiológicos, aconteça o que acontecer. Quem ganhar o executivo terá que cantar fino com um confuso congresso.
E os grandes vencedores são as burocracias judiciárias e policiais que saem super fortalecidas e legitimadas. Junto delas a rede globo e congêneres, que apesar de terem se chamuscado bem são vencedores e darão as cartas, talvez por muitos anos.
É bom que comecemos a juntar os cacos e construirmos uma nova análise e um novo ciclo de organização e conquista.
Avalista ou agente?
Avalista ou agente?
Avalista ou agente?
Avalista ou agente?