O Xadrez das vivandeiras dos quartéis

Cenários não são previsões taxativas. Consistem na análise de um conjunto de variáveis que apontam uma tendência – que poderá se confirmar ou ser modificada por novas variáveis.

Os fatos apontam para uma tendência cada vez maior de intervenção dos militares na vida nacional e, ao mesmo tempo, um desprestígio cada vez maior do poder civil.

Sinais recentes:

·      A entrega do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) a um militar da ativa, que passa a frequentar o coração do governo.

·      A tentativa do Ministro da Justiça de criar a figura do inimigo interno nas manifestações e em factoides sobre o Islã e colocar as FFAAs na repressão interna.

·      O convite da presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) Carmen Lúcia, para que as Forças Armadas ampliem sua participação na segurança nacional.

·      A criação e utilização da Força Nacional de Segurança para outros propósitos.

Vamos juntar algumas peças do momento, para avaliar até onde poderá ir esse flerte com as Forças Amadas.

Peça 1 – o chamamento aos militares

Saliente-se que, até agora, o comportamento das Forças Armadas tem sido irrepreensível, profissional, sem interferências no jogo político.

No governo Lula e em parte do governo Dilma Rousseff, houve ênfase na indústria da defesa, com as Forças Armadas envolvidas em temas nacionais de peso: defesa da Amazônia, da Amazônia azul, guerras telemáticas, setor aeroespacial, eletronuclear.

Por outro lado, blindou-se os militares na Comissão Nacional da Verdade, mas se reservou o Ministério da Defesa para os civis. Esse modelo foi mantido por dois superministros da pasta, Nelson Jobim e Celso Amorim.

O modelo começou a degringolar quando, ainda no governo Dilma, se entregou a Defesa ao deputado Aldo Rebelo, do PCdoB.

Na discussão do Código Florestal Brasileiro, Rebelo já dera sinais de seu estilo político, demasiadamente contemporizador, de aproximação excessivamente estreita com setores avessos ao partido e às convicções que aparentava defender. Pode ser virtude política, se bem utilizado e não se avançar além dos limites das convicções políticas que se defende. E Aldo usou bem esses dons na organização da base de apoio ao governo.

No caso do Código Florestal, no entanto, demonstrou uma preocupante simbiose política com os ruralistas. E, na Defesa, escancarou de forma temerária o Ministério aos militares. A ponto de, no curto período em que assumiu a Casa Civil, o ex-governador da Bahia Jacques Wagner ter se dado conta dos riscos implícitos nessa ação e convencido a presidente Dilma a assinar um decreto devolvendo funções de Defesa aos civis.

Assim que assumiu, um dos primeiros atos de Michel Temer foi revogar esse decreto.

Peça 2 – a dispersão de poder dos golpistas

O golpe parlamentar aplicado no país contou com a participação de inúmeros atores, mas nenhum se impondo politicamente. A saber:

·      O grupo de Eduardo Cunha, que logrou colocar Michel Temer na presidência.

·      O PMDB liderado por Renan Calheiros e José Sarney.

·      O PSDB, especialmente o de Aécio Neves.

·      O Pode Judiciário comandado por Gilmar Mendes.

·      Os grupos de mídia.

·      A Procuradoria Geral da República.

·      A Lava Jato, colocada como um poder a parte da PGR.

·      Grupos da Polícia Federal

Consumado o golpe, há um jogo de espera, uma aliança mal costurada, cheia de desconfianças, com cada lado tentando se fortalecer para preservar o poder ou para derrubar os ex-aliados do poder em que se encontram.

Além disso, o jogo de cena da Lava Jato está se esgotando com a caça aos petistas e ao ex-presidente Lula.

Em breve se entrará em novo capítulo político, no qual os antigos aliados se digladiarão pensando em 2018. É nesse quadro surgem as chamadas vivandeiras, buscando aproximação com o poder militar.

Peça 3 – a situação dos atores políticos

Vamos a uma análise da situação de cada um desses braços do golpe.

Grupo de Eduardo Cunha

A tentativa de criar um personagem para Michel Temer esbarra, sempre, no perfil medíocre do presidente. Não tem carisma, ideias, informação, nem reputação ilibada. E, no seu entorno, abriga a truculência de um Geddel Vieira Lima e de um Eliseu Padilha e o estilo escorregadio-gosmento de Moreira Franco.

Se a PEC 241 não for aprovada, morre no início do ano. Aprovada, inviabilizará qualquer campanha situacionista em 2018, tal o arrocho fiscal que implantará.

A criação da figura do inimigo externo é a saída mais óbvia para o governo Temer, especialmente se a PEC 241 for derrotada. Não terá nenhum prurido em invocar o poder militar, em caso de enfraquecimento maior de sua base.

A mídia

A Globo é poder dominante. Estadão e Folha não conduzem: são conduzidos. Por conta de seus problemas financeiros, estão de joelhos ante o governo Temer e a própria Lava Jato.

A Folha se amedrontou no episódio Savonalora, ao responder a Sérgio Moro, que sugeriu explicitamente o que o jornal deveria ou não publicar. A resposta foi tíbia: “A opinião do jornal está na página 2, em artigos não assinados”.

Foi necessária a Veja, da moribunda Editora Abril, fazer valer o poder da mídia, enquadrando Sérgio Moro e seu imprimatur  e alertando para os riscos do excesso de poder e de abusos de Moro e de diversos procuradores, como os que tentaram proibir manifestações políticas em Universidades ou o “Fora Temer” no Colégio Pedro 2o. O que a despertou foi a tentativa de quebra judicial do sigilo telefônico de um repórter de outra publicação.

Aliás, por incrível que pareça, os únicos assomos de jornalismo ultimamente são de Veja, com as denúncias contra a camarilha dos 6 (Temer, Cunha, Geddel, Padilha, Moreira Franco e Jucá). Finalmente, colocou um jornalista como diretor de redação, mas não a tempo de salvá-la. É possível que haja a mão de José Serra por trás desses ataques.

A Procuradoria Geral da República

Assim que começou a Lava Jato, Dilma incumbiu seu Ministro da Justiça José Eduardo Cardoso, de procurar o PGR Rodrigo Janot para viabilizar um acordo de leniência que salvasse as empresas envolvidas com a Lava Jato e não machucasse tanto a economia.

O texto do acordo chegou a ser esboçado. Os procuradores da Lava Jato peitaram a decisão: se o acordo fosse assinado, denunciaram Janot e pediriam demissão. Janot perdeu a batalha contra os de baixo.

Procurou, então, recuperar a autoridade tentando assumir a liderança dos rebelados, em gesto muito comum em comandantes frágeis. Tornou-se ele próprio um conspirador, como ficou evidente no episódio do vazamento dos grampos de Lula e Dilma.

Quando o golpe se consumou, sem noção de timing pediu a prisão de três senadores baseando-se exclusivamente em um grampo ilegal e inconclusivo do ex-senador Sérgio Machado. Era tão desproporcional o pedido que se imaginou que teria outros trunfos na manga. Não tinha. O pedido foi liminarmente rejeitado pelo Ministro Teori Zavascki, Janot ficou sem espaço e perdeu a batalha contra os de cima.

Hoje em dia, está paralisado, não consegue conter os abusos individuais de procuradores e perdeu o apoio quase unânime com que a categoria o sufragou nas últimas eleições. Foi um dos coordenadores do golpe, mas não conseguiu manter o comando.

Tudo isso induz a acreditar que empurrará com a barriga o cargo até o final do seu mandato. Pelo desenrolar do jogo, no entanto, uma eventual reação de seus aliados do PSDB contra a camarilha dos 6 poderá ensejar nova tentativa de protagonismo de Janot, acelerando as denúncias contra o grupo de Temer.

O Judiciário

As intervenções militares exigem algum grau de legitimação jurídica. Até o golpe de 64 necessitou dos tais Atos Institucionais.

É por aí que se torna perigosa a iniciativa da Ministra Carmen Lúcia de convocar militares para discutir segurança nacional. No plano institucional, a Ministra é tão despreparada que não se sabe se sua iniciativa foi apenas uma demonstração de ignorância sobre o papel dos militares, uma tentativa canhestra de se colocar no centro dos acontecimentos, de “causar”, ou se de fato foi mordida pela mosca azul de Brasília.

De qualquer modo, com ela na presidência do STF e Gilmar Mendes na do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), há jogo, caso de pretenda incompatibilizar Temer para abrir espaço para um presidenciável do PSDB.

O PSDB e o PMDB de Renan

Mantém o casamento por conveniência com a camarilha dos 6.  É um partido sem coluna vertebral, que se sustenta apenas com a blindagem que lhe é conferida por Janot e pela Lava Jato.

Peça 4 – as probabilidades políticas

Como se percebe, fora a aliança contra o inimigo comum – o PT e Lula – não há um grupo hegemônico nem uma pauta capaz de unir os mentores do golpe. Por outro lado, mesmo com o PGR não tomando medidas mais efetivas contra o PSDB e setores aliados do PMDB, há a percepção generalizada da falta de legitimidade de todos esses grupos civis, ainda mais em uma empreitada em que a palavra de ordem foi o combate à corrupção.

O único fator a uni-los seria a perspectiva de perder as eleições de 2018.

Por tudo isso, as perspectivas atuais são as seguintes:

1.     Permanece o risco da prisão de Lula, visando promover agitações populares que justifiquem o endurecimento do regime.

2.     Continua baixa a probabilidade de recuperação da economia, ainda mais com a combinação de ajuste fiscal rigoroso e ritmo lento de queda dos juros.

3.     Há uma probabilidade não desprezível de Temer ser despojado do cargo por conta dos julgamentos do TSE e pela desmoralização contínua de seu governo.

4.     Persistirá a tendência de ampliação da presença dos militares no governo, ao mesmo tempo em que se aprofunda a desmoralização do poder civil.

5.     Mesmo assim, qualquer ampliação da intervenção militar viria como retaguarda para um governo civil.

Luis Nassif

Luis Nassif

View Comments

  • A grande tristeza da minha

    A grande tristeza da minha vidinha foi, há muito tempo, descobrir que as tais sumidades por conta de votos, de concursos et caterva eram, em verdade, tão ou mais insignificantes eou ignorantes do que eu. As provas estão aí. São negociatas para todos os lados, alguns beócios são facilmente comidos e jogados fora pelos "expertos" de sempre. Qualquer tutu no bolso dá a falsa impressão de que passaram a ser nobres, sem conseguir enxergar de que suas "nobrezas" são apenas - e tão somente - reflexos de águas turvas. Pobre país sob o comando desses estropícios sem moral, sem ética e sem vergonha na cara.

  • A notícia é que Temer estava

    A notícia é que Temer estava namorando os militares, prometendo deixá-los de fora da reforma da presidência que ele tenta acometer os servidores civis e os celetistas. Que eles são diferentes, que mudam muito de região por convocação, mas que aposentar aos 50 é muito cedo. Um sujeito metido a destemido sair namorando militares depois de dar um golpe é de se preocupar. 

  • Nassif,
    Li no facebook que as

    Nassif,

    Li no facebook que as ruas no entorno da Polícia Federal em Curitiba estão fechadas, ninguém passa. Estão dizendo que é por causa da prisão de Lula, vai ser amanhã mesmo.

  • Sem assunto!

    O Nassif faz um post sobre as vivandeiras e o sítio Jornal GGN não abre porque "está em manutenção". A coisa tá feia!

  • Intere$$es......
     
    é o que

    Intere$$es......

     

    é o que une a galerinha do mal, e um desejo imenso de enfiar o dedo na toba dos pobres desse país.......

  • Um nome me vem à cabeça no último parágrafo

    5.     Mesmo assim, qualquer ampliação da intervenção militar viria como retaguarda para um governo civil.

    Juan Maria Bordaberry (link da Wikipedia hispana)

    E aí entra a questão: quem seria o Bordaberry brasileiro?

  • Parabéns pela paciência

    Em investigar tanta sujeira. A única coisa realmente segura, é de que nada disto é permanente. Não vivemos mais um tempo líquido, nossa época já está gasosa.

  • Militares

    É difícil acreditar que os militares estejam tão alienados para desconhecerem que a Constituição e a Pátria (que eles juram defender) estão sendo traídas por uma quadrilha de corruptos. Haverá sempre os militares mas há uma larga tradição de cumprimento a Lei e a defesa do patrimônio nacional.

    Conheço melhor o Exército e a Aeronáutica, e vejo que todos odeiam o "comunismo", mas odeiam tanto quanto os "vendilhões do Brasil". 

    E mais: acho que nós paisanos temos um antigo preconceito, que vem da ditadura de 64-85, pela qual muitos militares atuais não têm o menor compromisso. Apanham por isso, porque a gente preserva a memória dos crimes daquele período, patrocinados por civis, como a Fiesp, os bancos, a CIA. 

    Em 13 ou 14 anos de governo de Lula/Dilma, quantos generais foram promovidos, brigadeiros e almirantes? Se o PT, no poder, não criou nenhuma consciência de esquerda nas Forças Armadas, a ponto de não se revoltarem agora contra a venda do patrimônio nacional no varejo, por uma quadrilha de notórios corruptos, então não tivemos ministros da Defesa! 

    Ninguém quer os militares no poder, nem eles. Mas um brado de alerta quando a Pátria está sendo saqueada, e pela volta na Democracia constitucional, está tardando. Ou será que está sendo preparada? 

    • O governo não tem que. . .

      O governo não tem que criar consciência de esquerda ou de direita nas forças armadas, mas sim lembrá-los sempre que uma de suas principais funções é a defesa das instituições e da garantia que a vontade do povo expressa nas urnas seja sempre respeitada, independente  do governo ser alinhado às esquerdas ou à direita.

    • Eu também tenho  esta dúvida

      Eu também tenho  esta dúvida em relação aos militares, e venho estranhando esta posição omissa principalmente em relação à nossa soberania e ao pré-sal.

      Não podemos esquecer que os tempos de FHC foram péssimos para as F.A.'s, que perderam seus status de ministros, tiveram seus soldos congelados, verbas  diminuídas (recrutas eram enviados para almoçar em casa para economizar comida), planos de reaparelhamento bélico paralizado (inclusive o projeto do submarino nuclear iniciado nos anos 80 e a compra de caças negada) além dos episódios patéticos da tentativa de entrega da base de Alcântara, que eles não engoliram, e daquele "estranho acidente" da explosão naquela base.

      Nos governos do PT, todos os ítens acima tiveram andamento contrário, à exceção do status ministerial. Foram retomados os planos de carreira, o projeto do submarino nuclear, a compra dos caças (dando preferência à escolha dos militares e à transferência de tecnologia), além do óbvio projeto de nacionalização da maior parte da exploração do pré-sal pela Petrobrás, que acredito ter a concordância dos militares.

      Tudo muito estranho e incoerente (até onde posso ver)...

    • Que larga tradição no cumprimento da Lei é essa, Barbosa Filho?

      O Jofran Oliva observou o mais importante, mesmo assim valem algumas observações.

      1. O golpe de 1964 foi perpetrado em nome da Constituição e da Pátria que eles juravam defender. O ''claim'' foi ensinado na Escola das Américas: ''Segurança Nacional'' (sanha e morte do México para baixo).

      Que larga tradição no cumprimento da Lei e da defesa do patrimônio nacional é essa, Antonio Barbosa Filho?

      2. O anticomunismo (das FFAA, da Policia Militar, da Civil, da Federal) é irmão xifópago do acanalhamento imposto pelo capital transnacional. Dezenas de blogs publicam textos do Mauro Santayana onde se aprende o que o PT fez pela reconquista da dignidade brasileira prestigiando as FFAA, lançando e bancando o maior programa de rearmamento na história brasileira, que nem nos governos militares ousara-se investir, ao mesmo tempo, em tantos projetos estratégicos. Mesmo assim, o ''Estadão'' e a ''Folha'' publicaram durante 2015 artigos esclarecedores de um problema ainda não resolvido. 7 de março: editorial ''Vamos à Guerra!'' do general Rômulo Bini Pereira, ironizando, desqualificando Lula e ameaçando por coturnos em solo se convocarem o ''exército do Stedile''; o general fazia alusão ao discurso proferido pelo ex-presidente Lula, que usou a expressão “vamos à guerra” para conclamar a militância a defender a Petrobras (contra os interesses estrangeiros!). Absurdo, né não? E por falar em petroleo, vale repassar alguns momentos que ilustram o acanalhamento que vc, enganado, confunde com ''anticomunismo'':

      1945 - Vargas sentenciou: ''Uma economia equilibrada não comporta mais o monopólio do conforto e dos benefícios da civilização por classes privilegiadas''. Rockefeller não gostou. Vargas foi destituído. O interino Zé Linhares tomou posse com ordens de revogar imediatamente a Lei antitruste, a Lei Malaia (que criara a Comissão de Defesa Economica com poderes para expropriar qualquer organização cujos negócios lesassem o interesse nacional!!). A burguesia entreguista e lacaia (PSD e UDN) elegeu então o general Eurico Gaspar Dutra com ordens de aterrorizar o PTB e o PCB (as verdadeiras tendências do pensamento brasileiro em busca de justiça e equilibrio) e de sintonizar-se com Washington. Dutra tinha como assessores dois advogados estadunidenses ligados aos trustes do petróleo, Herbert Hoover e Arthur Curtice. A Assembleia Constituinte instalada em 1946 elaborou a nova Carta Magna com o bafo do Rockefeller no cangote. Paul Howard Schoppel, também jagunço da Standard Oil, chegara ao Brasil para modificar do que dispunha a Carta sobre a exploração do Petróleo.

      Dutra acionou o dispositivo policial militar pra manter o povo fora dos debates. Uma concentração promovida pelos comunistas, no Rio, no dia 23 de maio, terminou sob rajadas de metralhadoras. Mortos e feridos espalhados pelo Largo da Carioca, tomaram uma lição de democracia representativa. O artigo 153 da Carta foi modificado a favor da Standard Oil e Paul Howard Schoppel despediu-se, com a Comenda da Ordem do Cruzeiro do Sul no bolso. Rockefeller continuou promovendo a campanha para obter a exploração do petróleo brasileiro. Dez anos depois uma CPI da Câmara dos Deputados comprovaria que “O Estado de São Paulo”, “O Globo” e o “Correio da Manhã” foram remunerados para moverem campanhas contra a nacionalização do petróleo. Nos momentos cruciais para o país estes jornais estavam da parte da traição aos interesses nacionais, contra Getúlio, contra a Petrobrás, contra JK, contra Jango, contra Lula, contra Dilma, apoiando o golpe de 1964, Collor, FHC e a destruição do nosso patrimônio.

      1964 - No ''O Estado de São Paulo'', duas notícias na mesma edição de 18 março (dias antes do golpe): 1) “Petrobras é uma entidade famosa por sua ineficácia, por sua corrupção e pela grande infiltração de comunistas, os quais controlam o monopólio petrolífero por todos os meios” — 2) “A ideia do impeachment do presidente [Jango] vale por uma frente legítima de combate (…) o chefe da Nação não se encontra à altura do cargo, independente até da cogitação de crime de responsabilidade (…). O caso é de impeachment, julgamento político através do qual o Parlamento deverá concluir que o presidente não pode continuar na chefia do governo, em benefício da tranquilidade da família brasileira e da prosperidade do país (...)”

      Correio da Manhã - ''O general A. Levi, ex-presidente da Petrobrás, na qualidade de Chefe de Gabinete e por ordem do general O. Mourão Filho, presidente nomeado, disse ao Correio da Manhã que continuam as prisões de todos os dirigentes e empregados da estatal que parteciparam das campanhas de nacionalização do petroleo e da encampação das refinerias particulares. Serão entregues ao DOPS como comunistas.''

      Os Presidentes Lula e Dilma vivenciaram abertos desacatos por parte do alto comando militar. No Natal de 2013, os reis magos Peri, Moura Neto e Saito desafiaram a presidenta Dilma e parlamentares, ostentando desprezo durante a cerimônia que restituiu simbolicamente o cargo ao ex-mandatário João Goulart, derrubado por uma camarilha de bandidos cívico-militar-eclesiástica, em 1964. O boçal e rechonchudo general Carlos B. Goellner, durante o enterro definitivo do presidente Goulart, no dia 6 de dezembro em São Borja, declarou à imprensa: “Não há nada de que retratar-se, não há nenhum erro histórico, a história não comete erros, a história é a história”. Os três servidores públicos Peri, Moura Neto e Saito, que estavam em seus cargos desde o governo do Lula (contra quem também montaram gesto de insubordinação quando se tocou a agenda de direitos humanos), repetiram no palácio do Poder Legislativo de Brasília a mesma hostilidade de 2011, permanecendo ostentadamente de braços cruzados enquanto Dilma, dezenas de familiares de desaparecidos e uma delegação argentina encabeçada por Eduardo Luis Duhalde, aplaudiam a criação da Comissão da Verdade.'' Nota - o então ministro da Defesa, Celso Amorim, botou o rabo entre as pernas e ficou calado. Tempos depois, interpelado pela Comissão, enviou uma nota informando que os quartéis não foram usados para tortura!! Pela sua atuação como Chanceler, eu não contava com essa demonstração de cagaço.

      3. Quem disse que os militares atuais não têm compromisso com os milicanalhas do golpe?

      O rechonchudo Goellner, então com 63 anos, usava calça curta quando deram o Golpe e a ditadura terminou quando ele apagou as 35 velinhas do bolo, pese a isso, está entrincheirado na defesa dos milicanalhas. Outro exemplo, mais recente, é o tal Bini Pereira reverenciando o ditador Castelo Branco e atacando a Comissão Nacional da Verdade. Sete meses depois daquele editorial do Bini Pereira, a Folha de S. Paulo noticiou que o general Antonio Hamilton Martins Mourão, um troglodita Para o general Antonio Hamilton Martins Mourão, um troglodita mimetizado, o exército não é uma instituição pública com deveres estritos regulados por lei, é um club priveé. Mourão que comandava o Exército na região sul, clamou pelo "despertar para a luta patriótica" em nome de "bons costumes"; criticou a maioria dos políticos que "vendem grandes ilusões" e foi taxativo: "mudar é preciso" (Dilma), com a ressalva: "a vantagem da mudança seria o descarte da incompetência, má gestão e corrupção" (alguém reparou nas coincidências das notícias do Estadão, em 1964?) O general Mourão falou da maioria dos "políticos de hoje", mas o que ele teria a dizer dos políticos de ontem?

      O extraordinário Rui Moreira Lima, Major-Brigadeiro do Ar, citou o caso de Brilhante Ustra, coronel que foi reformado após o golpe e colocado como Cônsul no Uruguai onde foi reconhecido pela atriz e então deputada Bete Mendes: “O senhor é o “Doutor Tibiriçá”. O senhor me torturou!”. Bete Mendes enviou uma carta ao José Sarney solicitando que Ustra fosse removido do cargo. O general Lêonidas Pires Gonçalves, ministro do Exército, não só manteve Ustra no posto como também avisou que não demitiria nenhum outro militar acusado de tortura. “Ustra ficou num ostracismo tranqüilo”, como definiu Moreira Lima. “E os três Clubes Militares ainda ofereceram um jantar de desagravo a esse cara. Com mais de 700 talheres!”, detalhou.

      Corolário: não houve depuração ideológica entre os quadros militares unidos na reivindicação do terrorismo de Estado e contra as tentativas de reconstruir a memória.

      Artigo do Janio de Freitas publicado na Folha de SP no dia 1/4/2014: [...] ''O ensino das escolas militares precisaria passar por reformulação total. A do Exército, mais que todas. Nas escolas militares brasileiras não se ensinam apenas as matérias técnicas e acadêmicas apropriadas para os diferentes ramos da carreira militar. Muito acima desse ensino, as escolas militares ocupam-se de forjar mentalidades. Uniformes, planas, infensas à reflexão, e, por aí já está claro, ideológica e politicamente direcionadas. São produtos criados ainda para a Guerra Fria. É por isso que se vê, há tantos anos, tão igual solidariedade e defesa dos atos e militares que, para a lei e para a democracia, são criminosos, muitos de crimes hediondos e de crimes contra a humanidade. As escolas militares não preparam militares para a democracia.

      Outra condição é que se propague a noção de soberania, tão escassa nos níveis socioeconômicos que influenciam a condução do país. Em seu artigo na Folha de ontem [terça-feira, 31/3], o embaixador Rubens Ricupero contou de documentos por ele vistos, na Biblioteca Lyndon Johnson, em que os “reformistas” conduzidos por Roberto Campos, no governo Castello Branco, sujeitavam aos americanos até a revisão do currículo escolar. Se a imaginação conseguir projetar a mesma conduta para o sistema financeiro privado, por exemplo, pode-se ter uma ideia dos obstáculos que a construção do desenvolvimento brasileiro enfrenta''.

      Em respeito aos militares que foram perseguidos e padeceram por defenderem a legalidade, a nossa soberania e que muito me orgulham como brasileiro, proponho esse trecho da entrevista com o prof. João Quartim de Moraes, publicada no site Vermelho, dia 3 de agosto de 2014:

      PERGUNTA - Os militares também tiveram um papel importante – se não central – na campanha nacionalista ocorrida na década de 1950. A Campanha do Petróleo é Nosso! foi praticamente comandada por oficiais. O que levou a ala nacionalista, que chegou a ter o ministro da Guerra e a direção do Clube Militar, a gradualmente perder espaço dentro das Forças Armadas? Havia outro cenário possível?

      RESPOSTA - Entre 1946 e 1964 houve duas conjunturas em que a “ala nacionalista” ocupou posições decisivas no Exército e na política brasileira: em 1950-1952 e em 1961-1964. Em 1950, a chapa nacionalista, encabeçada pelos generais Estillac Leal e Horta Barbosa, venceu por ampla maioria as eleições para a direção do Clube Militar. Mais do que meros nacionalistas, os oficiais que a integravam eram também anti-imperialistas. Além da campanha O Petróleo é Nosso!, tiveram também papel importante, ao lado do PCB (do qual alguns faziam parte), na luta para impedir que soldados brasileiros servissem de tropa auxiliar na invasão estadunidense da Coreia, decidida pelo presidente Truman (o mesmo das duas bombas atômicas). Nelson Werneck Sodré, que a integrava e já era considerado, não sem razão, o principal teórico da esquerda militar, assumiu a direção do Departamento Cultural do Clube, cuja revista tornou-se a tribuna dos oficiais empenhados a fundo na batalha pelo desenvolvimento nacional, por uma política externa independente e por reformas sociais avançadas.

      A direita militar, exacerbada pelos ódios da “guerra fria”, logo se articulou numa “Cruzada Democrática” para aniquilar esse ''perigoso foco subversivo'', que ousava contestar a subordinação do Brasil ao “colosso do Norte” (fórmula reverencial dos deslumbrados com o poderio do dólar e do Pentágono). Com o apoio dos estadunidenses, logrou não somente derrotar a ala nacionalista do Exército, mas também acuar Getúlio ao suicídio.

      Na História militar do Brasil Sodré relata as perseguições então desatadas, que só seriam suplantadas pelo expurgo promovido pelos golpistas vitoriosos de 1964 contra seus companheiros de farda, fiéis à legalidade constitucional. Interrompida em 1955, quando o general Henrique Lott desarticulou o dispositivo golpista da UDN contra a posse de Juscelino Kubitschek, a perseguição recrudesceu em 1960, com a vitória de Jânio Quadros sobre o general Lott, candidato nacionalista. Entrementes, sua notável e fecunda atuação no Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), tornara-o um dos intelectuais mais conhecidos e respeitados do país. Mas para poder prosseguir seu trabalho teórico-crítico, foi constrangido a solicitar transferência para a reserva. Nas Memórias de um soldado registrou quão difícil foi, para ele, esta decisão, “que vinha amadurecendo de há muito: quatro anos de exílio na fronteira, cinco anos embalsamado [...] numa Circunscrição de Recrutamento [...] novo exílio no extremo norte [...] instrutor de generais e no entanto sem perspectiva nenhuma na carreira”. “Certo”, prossegue, “o dever é resistir, incomodar, permanecer, mas eu vinha fazendo isso há praticamente quinze anos, sem resultado algum. Não era justo que militares democratas abandonassem o serviço ativo; mas há um limite além do qual o positivo se torna negativo”.

      O fiasco do golpe militar de 1961 contra a posse de João Goulart renovou o oxigênio intelectual nos meios militares, permitindo e até suscitando a eclosão de novos movimentos de militares de esquerda. O plural aqui é decisivo: estes movimentos foram pelo menos três, o dos oficiais nacionalistas, o dos sargentos e o dos marinheiros e fuzileiros navais. Não foi “gradualmente” que eles perderam espaço dentro das Forças Armadas, mas de um só golpe, o de 31 de março de 1964. Há uma vasta bibliografia sobre este tema tão complexo quão dramático, referida por Paulo Cunha na preciosa Introdução que escreveu para esta segunda edição do primeiro volume de A Esquerda Militar no Brasil.

      Havia outro cenário possível: a vitória do programa de reformas de base defendido pela esquerda durante o governo João Goulart.

  • Poderia ter militares

    Poderia ter militares nacionalistas que colocassem no paredão todos esses personagens envolvidos no golpe, restituissem a Presidência à Presidente Dilma, para que ela terminasse seu mandato, e que continuassem tocando todos os projetos de defesa, pois há de se reconhecer que os governos  petistas valorizaram as Forças Armadas.

    • Os seus militares não têm

      Os seus militares não têm culhões para isso. E a maioria dos que estão no comando são de extrema direita e alinhados com os conspiradores, oficiais com mais lealdade ao dinheiro do que ao país.

  • Eu quero aproveitar para

    Eu quero aproveitar para fazer uma pergunta sobre um assunto que eu não consegui chegar em uma conclusão: Na opinião de vocês visitantes do blog do Nassif, qual é o motivo real para a PEC241? O que os autores dela esperam conseguir com a mesma?

    Eu estou perguntando isso porque não consigo achar sentido na mesma, se ela for aprovada ela vai afundar a economia do país no médio e longo prazo e portanto iria jogar no lixo qualquer tentativa da direita do seu país de tentar ganhar as eleições de 2018. Então qual é o sentido em um ato que é na prática suicídio eleitoral?

    Eu tenho algumas hipóteses mas não vou citá-las para não influenciá-los, irei citar as mesmas somente depois dos seus argumentos.

    • Não acho que seja suicídio

      Não acho que seja suicídio eleitoral pq os efeitos só serão sentidos mais a frente.... talvez suicidio eleitoral para 2022, não para 2018.

      E mesmo que fosse, a PEC 241 torna as eleições presidenciais irrelevantes. Pelos próximos 10 anos o Brasil está garantido contra indesejáveis.

      A PEC 241 transforma a polític de governo do PSDb em política de estado do Brasil.

      • "A PEC 241 transforma a

        "A PEC 241 transforma a polític de governo do PSDb em política de estado do Brasil."

        Não é a primeira vez, o primeiro mandato do Lula foi inteiramente baseado em política de governo do PSDB. Palocci não mudou uma vírgula da política economica do segundo mandato do FHC, pelo contrário, seguiu a risca o tripé macroeconomico. Foi ajuste fiscal na veia e obteve superavits primários recordes, inclusive é de autoria de Palocci e Meirelles (então Pres. do BC) o projeto de vincular o crescimento das despesas à inflação. O "colchão" criado nesse período sustentou a gastança pós crise de 2008, e após anos de medidas anticíclicas e contabilidade criativa de Mantega e Agustim, estamos onde estamos.

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