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Os perigos que o PT enfrenta, por Inês Nassif

Os perigos que o PT enfrenta

Por Maria Inês Nassif
Para o Blog Luis Nassif Online

Oito anos de Luiz Inácio Lula da Silva e a vitória de Dilma Rousseff na disputa pela sua reeleição não são apenas um problema da oposição. O PT também tem que fazer ajustes para se adequar a uma realidade que não é exatamente a da formação do partido. Embora suas instâncias internas garantam a representação dos grupos que interagem lá dentro, e acabem conferindo uma certa organicidade à legenda, o fato é que as eleições de 2006 e de 2010 criaram um descompasso entre esses quadros de origem e as massas que se incorporaram, via voto, ao partido de Lula.

Na sua origem, em 1980, os militantes operários ou provenientes de setores sociais excluídos da sociedade de consumo que aderiram ao partido vinham de movimentos organizados – do novo sindicalismo, do qual Lula foi expressão máxima, dos movimentos de base da igreja progressista ou dos movimentos de base organizados pelos partidos de esquerda que ficaram na ilegalidade no período da ditadura. Conviveram com eles, e tiveram uma expressão forte, militantes de organizações de esquerda que combatiam a ditadura e tinham em mente a organização de uma grande frente de esquerda não apenas como uma estratégia de superação do período autoritário, mas de luta política na democracia – uma opção que partia da autocrítica desses grupos, de que a pulverização da esquerda no período da ditadura os levou não apenas à derrota, mas à quase dizimação de seus militantes. Até 2002, a grande força eleitoral do partido se situava nas classes médias intelectualizadas e nos setores de esquerda organizados.

Ao longo de muitas eleições e de vitórias que foram colhidas em eleições para executivos municipais e estaduais, e depois de um crescimento constante em sua representação parlamentar federal, o PT foi se amoldando às exigências da democracia. A “institucionalização” do partido consolidou internamente uma burocracia ainda dividida em grupos, mas já totalmente adepta do pragmatismo. Grandes alianças parlamentares – e a péssima experiência de 2006, quando o chamado “mensalão” fez com que sua bancada parlamentar retraísse pela primeira vez desde a sua primeira disputa eleitoral – acabaram reforçando o pragmatismo. Hoje, ser cada vez mais forte passou a ser não simplesmente uma exigência para conquista ou manutenção do poder, já que a oposição se liquefaz após uma terceira derrota presidencial, mas uma luta pela hegemonia dentro do bloco governista.

O PT, especialmente no governo Dilma, trava uma luta permanente com o PMDB por espaços no poder. Isso consolida o espírito de corpo e restitui força a uma burocracia interna que tem know-how na luta institucional. Também confere prioridade à disputa institucional. A dinâmica interna do partido, que foi capaz, no passado, de fazer a síntese de grupos que disputavam espaço lá dentro e manter em torno de si, em maior ou menor proporção, uma militância, pode estar comprometida no momento em que precisa menos de conciliar posições ideológicas de suas facções, e mais de instrumentos para incorporar um eleitor não organizado, sem experiência de militância política mas com um poder crescente de definir os rumos da política pelo voto.

A curto prazo, e salvo algum episódio que cause grande comoção, o PT não deve perder os votos da classe média ascendente, fidelizada por políticas sociais que permitiram a ascensão social numa sociedade em que historicamente as chances individuais de superação da pobreza eram muito pequenas. Sem incorporar esses setores de fato ao partido, todavia, vai consolidar uma relação tradicional com esse eleitorado, em que a representação apenas se dá na hora do voto. Pode ser a última etapa de “institucionalização” da legenda que nasceu como uma frente de esquerda sem que tenha conseguido atrair grandes massas de eleitores das classes trabalhadoras e que agora, com a simpatia desses setores, perde a capacidade organizativa e de incorporação dessas massas.  

E-mail: minassif@gmail.com 

Luis Nassif

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