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Os direitos individuais

O estado de direito no país é um problema torto de uma situação torta. Os sistemas de segurança são falhos, a justiça é lenta. E, a exemplo da sociedade européia nos anos 20, somente a partir dos anos 90 surgiu uma opinião pública midiática no Brasil.

Parte dela não acompanhou os anos de chumbo. Não tem noção do que foi a penosa luta pela defesa dos direitos individuais. E não se dá conta de que direitos individuais são valores em si, não dos criminosos. Trata-se da defesa da sociedade como um todo contra desmandos do Estado. Ao se defender o direito individual do criminoso, ao se colocar seu direito acima da sede de vingança, está-se protegendo o direito individual do inocente, quando vier a ser vítima de um arbítrio.

É por isso que nos Estados Unidos -pátria dos direitos individuais–, antes de cada prisão, mesmo do pior dos criminosos, a pessoa é avisada sobre seus direitos, inclusive o de ficar em silêncio para não se comprometer. Depois, há punição severa, muito mais severa que aqui. Em alguns estados, pode chegar à pena de morte. Mas qualquer irregularidade durante o processo, qualquer sinal de que o direito de defesa foi desrespeitado leva à anulação do julgamento.

Esses princípios universais de direitos individuais, algo que a humanidade levou séculos para alcançar, ainda não são compreendidos por parte relevante da opinião pública midiática. E aí se cria essa enorme atoarda, na qual qualquer voz discordante é submetida a um linchamento -no meu caso, felizmente, virtual.

Imagine você, na seguinte circunstância: está passando de carro por um local ermo e, de repente, atropela uma pessoa que atravessa correndo a rua. Você não viu, não pode ser acusado de dolo, mas, na sua frente, começa a se formar uma multidão, insuflada por pessoas como algumas que se manifestaram nesse blog. Você sabe que não teve intenção de atropelar a pessoa, mas será ouvido? Não, porque você não está mais do lado da maioria, deixou de ser caçador e virou alvo.

Não adianta argumentar que as situações são diferentes, que os Cravinhos e a Suzane são réus confessos e você atropelou sem intenção. Acha que com o clima criado, com os nervos explodindo, com algumas pessoas insuflando a turba, alguém irá parar para ouvir seus argumentos?

É por isso que a civilização criou os direitos individuais, as sociedades civilizadas coíbem o linchamento, a opinião pública civilizada defende a punição como uma defesa da sociedade, não para satisfazer a sede de vingança.

O problema são esses instintos de justiçamento, não a eventualidade dos réus merecerem ou não serem condenados.

Luis Nassif

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