Sustentabilidade

A importância da Taxonomia Sustentável Brasileira para alavancar o investimento em transição climática

Blog: Democracia e Economia  – Desenvolvimento, Finanças e Política

A importância da Taxonomia Sustentável Brasileira para alavancar o investimento em transição climática

por Carmem Feijó

O governo federal lançou na COP 28, em Dubai, no início de dezembro, o Plano de Ação para a elaboração da Taxonomia Sustentável Brasileira. A taxonomia é uma classificação de atividades, produtos e processos construída sob a ótica de critérios socioambientais e, no mundo das finanças globais, é uma ferramenta indispensável para orientar a alocação de recursos no processo de transição para uma economia de baixo carbono. Nesse sentido, representa uma iniciativa de suma importância para o avanço da agenda das finanças sustentáveis no Brasil.

O processo de transição climática, do ponto de vista econômico, é uma mudança na estrutura produtiva, onde o objetivo maior é a busca da eficiência no uso dos recursos naturais, tanto no que se refere à redução das emissões de gases de efeito estufa, como para a preservação da biodiversidade. Dois grandes desafios devem ser enfrentados: um é a rapidez com que a transição deve ocorrer frente as metas de descarbonização estabelecidas para serem atingidas para a redução do ritmo de aquecimento global. A urgência colocada pelo ritmo de aquecimento global, por outro lado, traz o risco de uma desestabilização financeira, pois grande parte do estoque de riqueza mundial está denominado em ativos que contribuem para o aquecimento global, como a exploração de combustíveis fósseis. Portanto, a mudança estrutural no contexto da transição climática exige um amplo esforço de coordenação de ações públicas e privadas, e a taxonomia sustentável é um instrumento de identificação do impacto dos processos econômicos no meio ambiente.

No debate brasileiro, a taxonomia para as finanças sustentáveis está sendo delineada como um sistema de categorização estruturado que afeta positiva ou negativamente as metas climáticas, de preservação do clima, da biodiversidade e de garantias sociais predefinidas. Este sistema de classificação irá oferecer critérios para a construção de indicadores para a avaliação da sustentabilidade de uma atividade, e também promover a interoperabilidade com outras taxonomias, fornecendo uma terminologia unificada para as partes interessadas – empresas, instituições financeiras, investidores, consumidores, reguladores e governos.

O escopo da taxonomia para finanças sustentáveis é orientar a tomada de decisões econômicas com impacto tanto positivo como negativo sobre o meio ambiente. Ou seja, a taxonomia para finanças sustentáveis possibilita uma compreensão clara das informações relacionadas às atividades, serviços e projetos econômicos e financeiros sustentáveis. Uma vez implementada, irá disseminar um conhecimento comum sobre o impacto socioambiental da ação humana, e desta forma auxiliar na avaliação contínua do impacto das decisões econômicas sobre o meio ambiente e, consequentemente, na mensuração dos avanços na preservação ambiental. A taxonomia ao possibilitar a construção de métricas de amplo uso, contribui também para um monitoramento mais eficaz sobre a degradação do meio ambiente.

Do ponto de vista da condução de políticas públicas, a taxonomia para finanças sustentáveis se insere em planos de Estado, e representa uma iniciativa potente de alinhar a governança a metas ambientais, e sociais definidas pelo governo e conformado pelos acordos internacionais. Desta forma, ao ser incorporado em normas e regulamentos que orientam a alocação de recursos, ela fomenta iniciativas destinadas a mitigar os efeitos adversos das mudanças climáticas e a promover práticas empresariais social e ambientalmente responsáveis.

Espera-se, assim, que a taxonomia exerça influência significativa sobre os fluxos de investimento. Ao guiar linhas de crédito e permitir moldar políticas de financiamento, essa ferramenta torna-se um farol, permitindo uma orientação ordenada dos recursos financeiros para iniciativas alinhadas com a transição verde sustentável, evitando desestabilização financeira.

Mais ainda, a relevância da taxonomia se destaca na regulação financeira. Ao oferecer critérios e indicadores específicos, ela não apenas avalia o impacto das atividades, mas também pode direcionar políticas regulatórias dos reguladores financeiros. Em particular, a taxonomia pode colocar em evidência a prática de greenwashing, deletéria ao meio ambiente.

Por todos os atributos elencados, a implementação de uma taxonomia para as finanças sustentáveis no Brasil representa um divisor de águas no mercado financeiro, introduzindo uma abordagem sistemática e padronizada para avaliar o alinhamento de projetos, produtos e setores com os princípios da sustentabilidade e permitindo estruturar ao longo do tempo o processo de mudança estrutural ordenado no contexto da transição climática.

Vale lembrar que atualmente, a noção de sustentabilidade é subjetiva, pois predomina a métrica das classificações tipo ESG (Ambiental, Social e Governança, na sigla em inglês), ou seja, o compromisso da empresa privada, na construção de seu capital reputacional, de manter uma política de governança transparente, ser sustentável e presar pela equidade social. A taxonomia em debate no governo, por sua vez, oferece uma classificação única e com  critérios abrangentes sobre o entendimento de sustentabilidade ambiental e transição ambiental justa. Vai muito além da classificação proposta pelo mercado que visa basicamente a mitigação de emissões de gases de efeito estufa e poluição.

Em suma, a definição dos critérios de sustentabilidade proporciona clareza e objetividade, eliminando ambiguidades que alimentam investimentos em greenwashing. Ao adotar a taxonomia para as finanças sustentáveis, a interconexão dos objetivos dessa taxonomia impõe um padrão de classificação mais elevado do que as classificações ESG, garantindo que as atividades sustentáveis contribuam positivamente para vários aspectos ambientais, sociais e econômicos.

No entanto, o que irá dar funcionalidade à taxonomia sustentável em debate atualmente para alavancar o investimento na direção desejada para a transição climática é ser inserida no Plano de Transformação Ecológica, permitindo que o resultado da ação coordenada das políticas públicas seja consistentemente avaliado ao longo do tempo. Por isso, espera-se que a abordagem disciplinada da taxonomia para finanças sustentáveis impulsione a confiança dos investidores e proporcione uma estrutura clara para avaliação de riscos e oportunidades. No novo paradigma das finanças sustentáveis, onde investir e como financiar o investimento não pode ser uma questão de interpretação subjetiva, mas sim de um conjunto de critérios mensuráveis e mensurados, que orientem a transição ordenada para uma economia de baixo carbono e com estabilidade financeira.

Carmem Feijó – professora titular do departamento de economia da Universidade Federal Fluminense e coordenadora do Grupo de Pesquisa em Financeirização e Desenvolvimento (Finde)

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