Falando de Sistema Tributário, por Gunter Zibell

Por Gunter Zibell

Antes de tudo, não vamos esquecer das atribuições de cada poder ou ente. Ao Poder Executivo, através da Receita Federal, cabe combater a sonegação e, através do Ministério, usar bem os impostos. Ao Poder Legislativo cabe propor e aprovar alterações do sistema tributário. Aos partidos cabe oferecer propostas com as quais buscarão aumentar suas bancadas. À Academia e à Mídia cabe realizar estudos independentes e fazer divulgação. À Opinião Pública cabe escolher que discursos lhe soam críveis.

Cada pessoa dispõe de um conjunto particular de informações e crenças. As minhas não são imutáveis, mas por ora são as seguintes:

1) Eu não acredito que os níveis de sonegação fiscal no Brasil sejam elevados. Mas há setores da Economia que são estruturalmente subtributados. Isso é resultado de decisões racionais em função da facilidade de monitorar cada setor ou origem de renda.

2) O Brasil historicamente é um país com viés arrecadador. Não há diferenças nisso entre Regime Militar e os vários governos civis que o sucederam. O maior aumento anual de carga tributária, inclusive, foi obtido na gestão FHC de 1993-2002, passou-se de 25% para 33% nos três níveis.

3) A carga tributária/PIB no Brasil, atualmente 36%, é muito maior que a de outros países de renda média (de US$ 8 a US$ 20 mil anuais em PPP) e há questionamentos da sociedade em relação à efetividade do retorno obtido na gestão desses recursos. Costuma-se usar o México como referência, pois a carga tributária nesse país é entre 20 e 25%, a renda média é maior e a maioria dos indicadores sócio-econômicos se apresenta melhor. Outras referências são EUA e Argentina, ambos em torno de 30%. Então, no mínimo, análises e estudos são necessários, pois questionamentos da sociedade devem ser respondidos.

4) Eu não tenho expectativas com maiores tributações aos mais ricos. Por um lado grandes rendas e patrimônios soem ser constituídos na forma de Pessoas Jurídicas, por outro lado existem inúmeras formas de escapar legalmente de aumentos de tributação (como constituir empresa no Exterior.) Eu não acredito que se possa elevar substancialmente a arrecadação com IRPF, Imposto sobre Grandes Fortunas ou ITCMD. De qualquer modo, se hoje temos um Congresso em 85% Centro-Direita (em geral contrários a maior progressividade tributária), nada impede que políticos estimulem esse debate com vistas a no futuro aproximar essa questão da vivida em países desenvolvidos.

5) No Brasil se costuma falar que a Classe Média estaria subtributada em relação aos mais pobres, que a progressividade não é o suficiente ou adequada. Eu discordo disso porque percebo que os 25% mais ricos no Brasil (que são a CM em uma acepção) costumam pagar por serviços privados de saúde e educação (o que não ocorreria na Europa) e também elevadas alíquotas de IPI+ICMS em bens de consumo e energia (o que não ocorre do mesmo modo nos EUA.) É uma situação perversa por ser classista, mas o fato é que setores expressivos da população não confiam no Estado como provedor de serviços essenciais. E o Estado, a invés de buscar obter essa credibilidade, dá-se por satisfeito em não tributar mais a renda da CM, sendo que, no entanto, tem consciência da dificuldade de lhe fornecer serviços. Algo como “fingimos que pagamos impostos, fingimos que retornamos à sociedade”.

6) A Sociedade Brasileira “coxinhizou” com o tempo, com valores mais social-liberais em alguns temas perpassando de cima a baixo os vários estratos sociais. Por isso acredito que se forma grande resistência a novos impostos (a propaganda de Skaf/PMDB/FIESP não é à toa) e também que se exigirá cada vez mais da Classe Política que justifique os impostos e os usos dados a eles. Uma pressão cada vez maior por Reforma Administrativa será sentida, concomitante a uma Reforma Tributária que busque simplificação e melhor equalização na tributação entre os vários setores de atividade econômica.

Redação

Redação

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  • Livre crença

    Eu não acredito que os níveis de sonegação fiscal no Brasil sejam elevados.

    Então explica a Zelotes, que é só a ponta do iceberg.

    Um dos grandes problemas do Brasil é que sonegação é vista com uma condescendência que daria náuseas em outras partes do mundo civilizado.

  • O sistema tributário e judiciário são truncados para...

    ... simplesmente favorecer quem tem o poder da informação e o poder propriamente dito.

    Por isto a carga tributária é alta para a classe média e baixa.

    Enquanto o governo não estimular a "caça ao tributo" vai continuar assim.

    1ª coisa é mudar o sistema de remuneração para os agentes de fiscalização. Salário base mais participação sobre a elaboração e pagamento de multas ou imposto arrecadado.

    Assim o agente público vai sair a procura do dinheiro e não ficar sentado numa cadeira de escritório. E fazerem as leis serem respeitadas. 

    Lembro que autuações já dão direito a defesa. E falar sobre excesso de multas é abominação. Fale isto para quem perdeu um ente querido no trânsito (por exemplo).

  • Há estudos que mostram que

    Há estudos que mostram que quem paga mais impostos, proporcionalmente, é a classe mais empobrecida. Também se sabe que ninguém paga impostos na distribuição de lucros das empresas. Também se sabe do alto índice de elisão fiscal, que anda por volta de 400 bi (segundo o Impostômetro). Que os brasileiros estão em quarto lugar no número de contas em paraísos fiscais.

    Também se sabe das várias trampas feitas com o dinheiro do governo federal, via SUS, Bolsa Família e que tais.

    E sabemos também que, com esse congresso, é praticamente nula a hipótese de alguma mudança para melhor.

  • Nào precisa accreditar em

    Nào precisa accreditar em nada. Basta analisar os fatos. Quanto está para esperando ações na Justiça ou no CARF.

    Também,a comparação com a carga tributária de outros países é despropositada. É preciso avaliar a o tamanho da base de contribuição. em um país com tamanhas desigualdades de renda igual ao Brasil a base de contribuiçAo é muito baixa embora o retorno desta contribuição deva ser distribuido entre todos.

    Ou diminui-se a desigualdade,permitindo que todos contribuam com a arrecadação ou aumenta-se a tributação sobre os mais ricos ou,melhor ainda,as duas coisas.

    O resto é defesa da livre iniciativa de quem não tem iniciativa.

  • "A carga tributária/PIB no

    "A carga tributária/PIB no Brasil, atualmente 36%, é muito maior que a de outros países de renda média (de US$ 8 a US$ 20 mil anuais em PPP)"

    Não basta comparar indíces isolados para justificar carga tributária. O Brasil tem uma distribuição de renda muito inferior comparado com estes paises de renda media. Isto resulta em mais aporte feito pelo estado para atender as necessidades básicas da população, enquanto nestes outros paises, um contingente maior tem possibilidade de buscar serviços privados. Além disso, a distribuição de renda mais distorcida, gera mais demanda na saúde, pois não é feita uma prevenção do próprio cidadão, como em paises de melhor distribuição de renda.

    Outra questão é que a carga tributária é muito mais pesada para os extratos de renda mais baixos de que para a classe média, por conta da característica da tributação indireta.

    "Eu discordo disso porque percebo que os 25% mais ricos no Brasil (que são a CM em uma acepção) costumam pagar por serviços privados de saúde e educação"

    Pagam por serviços privados de saúde e educação, mas através da declaração de imposto de renda, descontam valores que são bem próximos daqueles que são utilizados pelo estado para custear a saúde e educação. Ou seja, estão em situação privilegiada, porque o mesmo real que custeia um serviço publico de péssima qualidade, custeia um serviço privado de boa qualidade para a CM.

     

     

     

    • Acrescentando

      Em comparação com os países da OCDE a carga tributária total é ligeiramente maior, mas o IR é muito menor. Ou seja, penaliza quem paga imposto embutido em serviço e produto (os mais pobres) e livra a renda, o que ajuda os mais ricos...

      http://glo.bo/1MbZ8Td

  • Quanta bobagem...

    A sonegação no Brasil não é grande, é imensa! Mesmo com uma legislação que parece ter sido feita sob medida para sofrer "engenharia tributária".

    O que o sábio, ou esperto, autor parece propor é que os pobres carreguem nas costas a sociedade e sua plutocracia, porque, afinal, não tem outro jeito mesmo ..., veja bem, é mais fácil assim..., não vamos incomodar os ricos que já contribuem muito e não sonegam ... Ah, tenha a santa paciência!

    Argumento: "Não adianta aumentar impostos dos mais ricos, pois eles não vão pagar mesmo. Vão para paraísos fiscais." Sei... Então, Não adianta existirem leis penais, uma vez que os criminosos sempre podem fugir pelas fronteiras.

    Que Tributem patrimônio e apertem contra a criação de empresas fictícias, apenas para fugir de tributos e blindar patrimônio. Fusca velho paga IPVA; aviões, lanchas, yates, helicópteros não pagam! 

    Imposto territorial rural: Na prática, se paga o que se quer!

    Não há imposto sobre distribuição de lucros. Além disso, criaram a jabuticaba dos juros sobre o capital próprio.

    Fiscalização? Parece que, tendo muita grana, tudo se ajeita no Carf.

    Classe média não tem retorno dos impostos? E a segurança pública, as ruas e estradas, o saneamento, o sistema judiciário, o sistema prisional, a própria moeda e a sua garantia, e ...

    Quanto aos subsídios, incentivos fiscais, swaps cambiais bancados pelo tesouro, socorros aos grandes demais pra quebrar? 

    Eu poderia ficar horas argumentando, mas não tenho tempo nem paciência.

    • um item chamou a atenção:

      Classe média não tem retorno dos impostos? E a segurança pública, as ruas e estradas, o saneamento, o sistema judiciário, o sistema prisional, a própria moeda e a sua garantia, e ...

       

      --------------------

       

      eles podem alegar que recebem bem menos do que pagam em impostos, podem até falar que "pagam impostos europeus para receber serviços africanos"

  • carga tributária líquida

    Na questão da carga tributária, 36% mencionada no post, não se pode ignorar as transferências de renda. A maior parte dos tributos cobrados do setor privado volta imediatamente para ele por pagamento de rendas pelo Estado.

    Exemplos:

    FGTS arrecadado vai direto para as contas vinculadas dos trabalhadores;

    Contribuição do INSS (5% dos salários) vai para o sistema "S", inclusive para ajudar o Skaf pagar as propagandas dele (quanto será que vai receber de rebates das emissoras para sua próxima eleição?);

    Aposentadorias e pensões voltam para os beneficiários; e aqui começam as meras transferências: cobrar de um setor e repassar para outro;

    Programas de complementação de renda: Bolsa Família, Alimentação dos trabalhadores (PAT), subsídio ao transporte de trabalhadores, etc.;

    Bolsa juros, um quinto da carga vai para o pagamentos de juros: impostos de todos viranda renda financeira de alguns

     

    Muito tempo atrás li um artigo do Prof. André Franco Montoro Filho que argumentava exatamente com isto: para se fazer uma comparação justa entre países, há que se levar em conta a carga tributária líquida. Tenho a impressão que, fazendo as contas direito, o Brasil deve ter uma das menores do mundo!

    • Com o povo sendo bombardeado de mal uso do Erário

      acha mesmo que a sonegação alta vai sensibilizar?? vai é causar inveja em quem não consegue sonegar...

      • Sei lá se vai sensibilizar...

        Não sei se vai sensibilizar, mas a minha intenção não era essa: era rebater o argumento de que se sonega pouco no país ou que a sonegação é um mal menor.

        E eu não sei você, mas na minha ideia sonegação é crime, e eu pelo menos não tenho a menor inveja de criminoso...

  • IGF funcionaria sim

    Nunca concordei com esse papo de que tributar fortunas não adianta nada, porque elas simplesmente "fugiriam do país".

    Bobagem! Tribute todos os imóveis com valor de mercado superior a R$ 2 milhões em 0.1% e os sócios de todos as empresas que faturam mais de R$ 5 milhões em 0.1% do valuation - use um múltiplo do faturamento para facilitar.

    Faça o mesmo com lanchas, barcos, carros esportivos, motos caras, obras de artes, jóias, etc.

    Se o ativo encontra-se no Brasil, o dono tem que pagar. Não tem como o ativo sair voando para as Ilhas Cayman.

    Dá bilhão fácil.

    Use o dinheiro para extinguir os confusos e injustos impostos sobre valor agregado, como o IPI e o ICMS

    • O Brasil tem uma Alemanha de

      O Brasil tem uma Alemanha de terras na mão de investidores extrangeiros.

      Sem contar que imóvel não da para levar embora! 

  • E as soluções que o país precisa?

    Os Analistas-Tributários da Receita Federal do Brasil têm realizado um amplo trabalho visando tornar mais efetiva a cobrança e arrecadação do montante de R$ 258,65 bilhões em créditos tributários devidos – que estão prontos para cobrança imediata. Com a campanha Brasil Sem Crise, lançada no início deste mês, apresentam-se alternativas aos ajustes fiscal realizados até o momento e possíveis cortes orçamentários que podem comprometer programas sociais e diversos setores do serviço público.  As propostas tem como foco a cobrança desses créditos, o que pode resultar no aumento da arrecadação sem necessidade de sobrecarga tributária ou aumento de impostos.

    Acreditamos que, a partir do aproveitamento devido da mão-de-obra dos Analistas-Tributários, somado a ações voltadas para dar maior agilidade ao julgamento de créditos nas Delegacias da Receita Federal de Julgamento (DRJ) e no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), teremos, com certeza, formas concretas de viabilizar essa cobrança, além de fortalecer o combate à sonegação fiscal no País.

    Como sugestão encaminho o link do estudo “Alternativas para enfrentar a crise fiscal – Propostas dos Analistas-Tributários da Receita Federal do Brasil”,  http://sindireceita.org.br/wp-content/uploads/2015/10/Alternativas-para-enfrentar-a-crise-fiscal-revisada-final.pd

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