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Uma história sucinta da guerra dos computadores

A HP não adotou o Itanium de mão beijada não. Se algo, ela entregou 80% do projeto do EPIC para a Intel para que esta fabricasse o tal monstro de processador de 64 bits. Lembrando que isso é da época em que o MIPS era o processador 64 bits dominante nos clusters da SGI e o Alpha era o novato rebelde que tendia a ultrapassar a todos em desempenho.

Aí aconteceu a sucessão de asneiras: a Compaq comprou a Digital, a HP comprou a Compaq, a SGI amarelou e emancipou a divisão do MIPS para adotar o novo processador da Intel+HP, a IBM deixou na mão da Motorola a produção de PowerPC enquanto concentrava-se em entupir de cache o Power “grande” (e aí tenho que deixar algum crédito com a Motorola, que deixou a Apple colocar a mão no desenvolvimento do AltiVec, de onde veio então o G4), e uma empresa britânica então meio obscura ganhou uma injeção de grana da Apple pra desenvolver o que hoje é o processador mais disseminado do mundo, o ARM.

Resultado: o time da Digital migrou pra AMD e teve responsabilidade direta na produção da linha K6, K7 (Athlon) e K8 (Opteron), com isso projetando a AMD no mercado de servidores, ao criar a arquitetura x86_64 e fazer a Intel passar litros de vergonha; as duas melhores arquiteturas de processador do mundo foram pra lata (Alpha definitivamente, mas MIPS foi ressuscitada pelos… Chineses!!), a IBM retomou o desenvolvimento do PowerPC tardiamente e perdeu a clientela da Apple (ironicamente, ganhando no lugar a da Microsoft, ao dar um tombo na Sony).

(E, numa jogada de 1997 que só frutificou 5 anos depois, a Apple forçou a Microsoft a continuar desenvolvendo o Offce para Mac e ainda pagar 150 milhões de dólares em ações sem direito a voto e com retenção mínima de 3 anos, por estar na beira de perder um processo por espionagem industrial e roubo da tecnologia QuickTime para criar o Video for Windows, aquele que deu origem ao .avi; isso quase ninguém sabe que se desenrolou dessa forma! Com isso, muito ironicamente montada nas costas da Microsoft, ganhou sobreviva no Mac OS 8 e 9 enquanto desenvolvia o X.)

Mais recentemente, a Intel foi praticamente obrigada a beijar a mão da AMD, abrindo mão de processos contra ela para licenciar o x86_64, que a AMD tentou passar a chamar de AMD64 e a Intel rebatizou de EMT64 e depois cinicamente de Intel 64; a AMD tomou o ferro mais previsível da história quando a Intel largou a HP para afundar sozinha com o Itanium enquanto vendia o Xeon para todo mundo; e agora a AMD respira por ajuda de aparelhos, e isso porque a Intel precisava dela para não ser arrebentada por abuso de monopólio.

Paralelo aos eventos dos parágrafos 2 e 3, a NVIDIA comprou a 3Dfx e passou 3 anos estudando a tecnologia deles. Culminou em incorporar aos poucos a tecnologia adquirida nos produtos de consumidor enquanto desenvolvia a arquitetura de pipeline gráfico programável; uma coisa levou à outra e os processadores gráficos viraram a esperança do alto desempenho computacional paralelo com o CUDA. Nisso a AMD acordou e comprou a ATI antes que a Intel o fizesse. Agora, aos poucos, a AMD sai do coma ao incorporar a tecnologia de GPU direto nos CPUs, enquanto a Intel se safa literalmente colando uma GPU ao lado de uma CPU no mesmo chip.

Novamente paralelo a isso tudo, a Apple viu que suas boas relações com a ARM podia levar à segunda revolução da computação pessoal, e começou a desenvolver quietinha sua tecnologia móvel, depois de afastar todas as suspeitas ao cancelar o Newton. A grande sacada foi que a corrida pelo desempenho puro estava perdida (a Intel ganhou, e não tem como ser desbancada pelo menos dentro dos próximos 4, 5 anos), mas a da produtividade mal tinha começado. Investiu tudo para ganhar flexibilidade no software. Jogou fora as interfaces de programação antigas (Carbon), forçou os desenvolvedores a adotarem as novas (Foundation e Cocoa), e apareceu com o iPad. Em 4 anos, ficou maior que Intel, IBM, Microsoft e… Nesse mês, por dias vezes, Exxon.

E admito sim: isso foi lindo. Todo mudo quebrando cabeça com processador e software medíocre, enquanto a Apple pegou o processador mais barato e simples que podia, esperou aparecer o ponto aceitável na curva consumo/desempenho, e botou todo mundo no bolso.

Luis Nassif

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