A pedagogia da ocupação ensinada pelos alunos paulistas

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Por Paula Linhares Angerami

As ocupações realizadas pelos estudantes secundaristas da rede estadual de ensino de São Paulo contra a reorganização escolar propõem uma nova pedagogia. A Pedagogia da Ocupação. Pedagogia esta que, explicita a grande distância entre a vida dos estudantes e os conteúdos curriculares do ensino médio. 

Também nos ensina que, conforme o nível de ensino avança, perde-se a ludicidade, o prazer de ensinar, de aprender e de investigar problemas advindos dos alunos, a arte vira uma disciplina isolada, não faz parte do cotidiano.

Na educação infantil o lúdico, a aprendizagem se dá por meio das brincadeiras e das interações. Ë um ambiente prazeroso, divertido, também ligado com a vida, são trabalhadas as múltiplas linguagens da criança. Existe espaço para a arte, para o riso, para que as experiências educacionais sejam significativas.

Quando a criança chega no ensino fundamental I, nível no qual ela deverá ser alfabetizada, ainda procura-se trabalhar com a ludicidade, mas a brincadeira não é mais o foco. Seu corpo precisa ser controlado,  ela não pode mais exercer sua liberdade corporal, tem que estar grande parte do tempo sentada, contida. Por mais que algumas escolas priorizem a interdisciplinaridade ou possuam propostas pedagógicas inovadoras, ainda assim, o tempo para as linguagens da criança é limitado, existem tempos específicos e rígidos para os trabalhos artísticos e corporais.

Conforme a criança chega no ensino fundamental II, este tempo da liberdade é ainda mais limitado, o ensino vai fragmentando-se, não existe mais um professor que ensina as inúmeras disciplinas e consequentemente tem flexibilidade quanto ao tempo dedicado a casa disciplina. Este tempo agora é controlado, a cada 50 minutos troca-se de aula, de disciplina, de professor. E mesmo durante estas trocas, os alunos permanecem sentados, a carteira é o principal objeto de interação do educando. O tempo do corpo ser livre é limitado às aulas de artes, educação física e o intervalo. O espaço para investigar problemas de interesse dos alunos quando existe, é bem limitado.

No ensino médio esta fragmentação se intensifica e os conteúdos curriculares se especializam ainda mais. Além disso, o vínculo com a vida dos educandos fica mais distante, a vida e a escola são mundos distantes, incompatíveis. Nesta modalidade de ensino, a primazia é preparar para o vestibular, para o ENEM. É aceitável que os conteúdos sejam desinteressantes, pois o objetivo a que eles se destinam é muito bem definido. A meta é o futuro. É o amanhã. É uma preparação para o amanhã e para a vida. O tempo de se pensar e de discutir também é limitado.

Porém, a pedagogia da ocupação modificou este panorama. O ensino tornou-se a própria vida dos estudantes, eles juntos trabalharam em favor de um objetivo comum: lutar contra a reorganização escolar. Eles se organizaram, tornaram a escola a própria democracia, ali se organizaram para manter a limpeza da escola, planejaram a alimentação dos ali ocupados, decidiram em assembleia o que pode e o que não pode. Os alunos tornaram-se cidadãos, a politica fez-se viva. Também decidiram que a arte faz parte do cotidiano escolar.  O ensino tornou-se lúdico. O pensamento, as investigações e as discussões tornaram-se presentes.

A Pedagogia da Ocupação nos remete as ideias  do pensador John Dewey  sobre educação. Tal pensador nos diz que a escola prepara para a democracia e para a vida, ao mesmo tempo em que a escola é a própria vida e lá ocorre a democracia. Na escola, os alunos lutam em prol de um objetivo comum: a aprendizagem. Apesar de suas diferenças tem este objetivo comum, e em prol deste objetivo exercem sua cidadania e assim, vivem a democracia. A escola também deve focar no interesse dos alunos, a aprendizagem deve iniciar de um problema que surja dos estudantes. É por meio das experiências que a aprendizagem ocorre, que o pensamento se dá. A arte faz parte do cotidiano, e consequentemente, da aprendizagem.

A Pedagogia da Ocupação portanto ensina a democracia, sendo a própria democracia. Ensina com como não burocratizar a aprendizagem, como não fragmentar o ensino  e torna-lo desinteressante, resgatando assim o prazer de conhecer, e fazendo com que as aulas se tornem experiências artísticas e significativas que de fato modificam o sujeito.

Paula Linhares é pedagoga

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

4 Comentários

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  1. legal, mas prefiro o termo

    legal, mas prefiro o termo psiciologia da participação.

    os direitistas fizeram do termo ocupação um termo pejorativo….

  2. legal?!

    Acho bonito a proposta. No entanto se os alunos do EM não entenderem que o conteúdo é importante, manterá assim o diferença de classe e a sua proletarização. Sua conscientização deveria ser feita através do conteúdo, pois em todos os níveis é assim que serão avaliados. A não ser se tiverem que mover coisas, talvez assim o contéudo não seja necessário.

  3. porém… é preciso que façam

    porém… é preciso que façam com muito cuidado, pois se isso chegar aos ouvidos de estudantes de grandes democracias como a cubana, norte coreana , venezulana, etc e foram fazer o mesmo, o governo será obrigado massacrar a todos e ninguém terá pena de nada. Chico fará, se for o caso, uma música elogiando os castristas e até pedindo que matem mais

  4. A Verdadeira Revolução

    O desafio de guerrilha foi encarado. Quando nada mais parecia possível, a revolta! A parte dura, a polícia burra, a burocracia do estado, todos estes covardes mostraram seus limites.

    Mas agora o desafio é outro. Mais profundo. Toda minha vida acompanhei greves de professores. Sempre por melhores salários. Nunca a pedagogia foi questionada. O ensino propriamente dito. A verdadeira razão de ser da escola. Que sem dúvidas é muito mais profunda do que transferência de conteúdo, focada no adestramento de pessoas, para que estas sirvam ao status quo e jamais o questionem. A grande questão é que este modelo faliu. Só serve para uma minoria e a imensa maioria não sabe pensar um mundo melhor.

    O elo frágil está na própria formação dos professores. Estes mesmos deveriam estar alinhados com os bravos estudantes que estão sedentos por mudanças, pois o estado atual das coisas é insuportável. Mas onde estão os orientadores? Aqueles que pretensamente deveriam ensinar? A pergunta que não quer calar diante da transparência escancarada pela coragem: “o que é mesmo que está sendo ensinado? e está a serviço de quem? essa educação está a serviço da libertação?”

    Talvez este seja o maior gancho que poderia esperar a Presidenta Dilma, uma vez que o slogan do segundo mandato é “pátria educadora”. O país é rico, mas não funciona. Possui boas universidades, mas a economia está baseada em exportação de commodities, ou seja, alimentos envenenados produzido por uma minoria em grandes latifúndios e extração de minérios que são vendidos sem valor agregado – ambas as modalidades que só deixam como legado a destruição do nosso bem maior – o Meio Ambiente.

    A educação é nossa única possibilidade de tomarmos consciência de que os ricos somos nós e de assumirmos a responsabilidade pelo nosso futuro. Precisamos urgentemente educar nossos professores, para que, unidos aos nossos bravos jovens, possamos corrigir o rumo da nossa história.

     

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