As críticas de Nélida Piñon a Ruffato e Paulo Coelho

Sugerido por IV AVATAR

Da Folha

Nélida Piñon faz críticas veladas a Luiz Ruffato e a Paulo Coelho
 
CASSIANO ELEK MACHADO
 
“Tenho dois princípios. Não falo mal do meu país fora das fronteiras brasileiras. E não critico meus colegas.” Foi desta forma que a escritora Nélida Piñon sintetizou, na manhã desta quarta (9), sua opinião sobre o discurso de Luiz Ruffato, feito na abertura da Feira de Livro de Frankfurt.
 
Piñon participou, no pavilhão brasileiro do evento alemão, de debate com o escritor Carlos Heitor Cony, colunista da Folha.
 
O autor de “Quase Memória” evocou o maior autor da língua inglesa para tratar de outro ponto polêmico, as críticas que foram feitas à escolha dos autores da delegação brasileira. “Nos tempos de Shakespeare ninguém dava bola para ele”, comentou Cony.
 
A colega de mesa, por sua vez, elogiou o time nacional. “A delegação brasileira está muito bem representada. Houve um propósito de escolher autores de vários grupos estéticos e gerações”, disse, e, sem citar nomes, criticou Paulo Coelho. “Há quem queira ser um árbitro estético. Não há árbitros estéticos.”

 
Ex-presidente da Academia Brasileira de Letras, Piñon homenageou um dos fundadores da casa, Machado de Assis, “um dos grandes nomes da literatura do século 19, que até recentemente ainda era muito pouco conhecido fora do país”.
 
A atual presidente da ABL, Ana Maria Machado, que também discursou ontem na abertura oficial do evento, aplaudiu. Além dela, outros autores brasileiros, como a historiadora Mary del Priore e o crítico João Cezar de Castro Rocha, escutaram o debate, batizado “As Convergências da Memória”.
 
“Toda a vida de uma figura de quem não se diz o nome por aqui, que é Hitler, foi produto de sua memória”, disse Cony, que citou ainda Santo Agostinho: “Memória é a caverna da alma”.
 
“Os homens são basicamente memória”, complementou, antes de falar sobre alguns dos seus heróis da memória literária: Marcel Proust, James Joyce, Machado de Assis.
 
Nélida Piñon terminou a fala protestando contra o formato do evento.”Não se deveria fazer leituras dos textos”, disse, em referência ao fato de metade do painel com Cony, de duração total de uma hora, ter sido usado para que trechos de suas obras fossem apresentadas em traduções para o alemão. “Não faz sentido trazer figuras como Cony e a minha modesta pessoa para falarmos só uma linha ou outra”.
Redação

20 Comentários

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  1. “Tenho dois princípios. Não

    “Tenho dois princípios. Não falo mal do meu país fora das fronteiras brasileiras. E não critico meus colegas”:

    Eu critico entao:  Ruffato eh um escritor de merda, com estrutura de exposicao de observacoes direta dos anos 70, altamente unilateral,  e incapaz de descobrir um contexto proprio pra um “discurso” que qualquer mineiro poderia ter escrito.

    Quanto a Paulo Coelho, ainda estou tentando descobrir o que o incoherente post dele de antes de ontem signifivaca, pois nem isso eu descobri ainda.

    Diagnosepra ambos:  cara de pau cronica…

  2. Parece que, após seu

    Parece que, após seu discurso, Luiz Rufallo vai se transformar em mais um “herói” da direitona. Quem sabe capa da Veja e/ou Época do próximo fim de semana.

  3. Feira de Egos de Frankfurt

    Também tenho um princípio, semelhante ao da escritora.

    Jamais falo mal do PT, de Lula e de Dilma em público ou na frente de estranhos. 

    Mas não perco a chance de esculachar o psdb nem na feira livre.

    Pessoas simples e humildes como eu encontram a felicidade nas coisas e atitudes mais simples.

    Evoé!

  4. Discurso do Ruffato

    O link do discurso do Ruffato. Não me parece que a direita vá incensá-lo, tanto assim que o Ziraldo, ora ícone da direita berrou contra ele, em protesto, uma frase que faz lembrar o “Brasil, ame-o ou deixe-o!” dos anos de chumbo da ditadura: “Que se mude do Brasil, então!”

    http://www.diariodocentrodomundo.com.br/machistas-hipocritas-violentos-o-discurso-sobre-o-brasil-do-escritor-luiz-rufatto-o-elemento-surpresa-da-feira-de-frankfurt/

    1. É um discurso velho. Velho no

      É um discurso velho. Velho no sentido ruim da palavra.

      Talvez há vinte anos esse discurso do desencanto com o Brasil fizesse algum sentido. Hoje é só isso, um discurso deslocado no tempo, porém, alinhado com o nosso velho e conhecido complexo de vira-latas. Achei até que ele iria reinvindicar alguma coisa “padrão-FIFA”.

      Suas queixas, na forma de denúncia, como bem convêm ao “intelectual engajado” e com “consciência social” poderiam ser aplicadas a qualquer país do mundo. Onde não há mazelas? Onde não há machismo, violência e hipocrisia? Em que lugar das Américas indios não foram massacrados e negros escravizados? Em que lugar das Américas ou do mundo esses grupos sociais estão em situação melhor?

      Não somos uma singularidade. Somos tão únicos como únicos são os cubanos e os estadosunidenses, tão parecidos conosco.

      É outro país que queremos construir. Um país que sabe que tem problemas e está aplicando seus melhores esforços em resolvê-los. O país que queremos é um país que acredita em si mesmo, não se lamenta da doença de nascença porque fala português. 

      Agora, aquele papo de filho de lavadeira que venceu na vida pela literatura e agora busca com essa mesma literatura construir um mundo melhor, convenhamos, é papo de Faustão.

  5. Era o Brasil de sempre se

    Era o Brasil de sempre se apresentando ao mundo : reuniu-se uma bando de desocupados que fingem fazer literatura de quinta e custearam-lhes as despesas com o erário público. Em outras palavras : ali estava o melhor da literatura brasileira sendo representado – uma cena de Macunaíma .

    No Brasil , se não é tragédia , é farsa ! Há 30 anos que não se faz literatura neste pais .

  6. Quanta bobagem, até parece

    Quanta bobagem, até parece que o discurso de Ruffato cabe na boca da direita, muito pelo contrario o seu conteúdo é caracteristicamente de esquerda, na melhor tradição de um MIlton Santos ou ainda, de um Eugenio Raul Zaffaroni, ao situar a localização periferica, ou marginal, do nosso país, bem como o nosso processo de modernização conservadora, atrelado às nossas contradições séculares, é preciso conxtualizar isso.

    Não adianta simplesmente ir pra gringolândia e bancar o ufanista, a representação de um país se faz em toda a sua dimensão existencial.

    O problema é que muita gente queria que a participação brasileira funciona-se mais como um missão comercial do que artística e ai são outros quinhentos.

    Só não posso dizer que me sinto representado com o discurso de Luiz Ruffato, por nessa “delegação” havia apenas um escritor negro, o Paulo Lins, será possível que os negros do país não saibam escrever e não tenham nenhuma obra publicada! E não venham com essa sacanagem de critério técnico, para esconder a falta de visão dos senhores e inclusive da lourissíma senhora Suplicy.

  7. Segui o link e li o discurso…

    Pois…

    Segui o link e li o discurso… Afinal, para opinar e criticar é preciso conhecer o objeto. Posso dizer que o discurso é equilibrado, honesto, bem redigido apesar de ser, para nós, brasileiros, áspero…

    Mas, está na hora de não nos importarmos mais com as nossas pequenezas, e encaramos a realidade dos nossos defeitos. Por isso nada demais eu vi no discurso do Sr. Rufatto….

    Nada demais. A realidade é o que é, está onde está, no entanto, vê-la é uma questão de escolha.

    Qual é a sua escolha?

  8. Paulo Coelho ,com o é sabido,

    Paulo Coelho ,com o é sabido, é um mago! Quem mais conseguiria   produzir vendagens  milionárias pelo mundo afora com  aquele conteúdo, narrativa e  gramatica claudicante?

    Luiz Rufallo, e um fenômeno a parte: filho de lavadeira e pai pipoqueiro  superou os naturais  obstáculos que  se impõe na transposição  do satus social dos que emergem.

    Talvez , a ausencia de traquejo ou mesmo de  educação formal,  permitiram  críticas descabidas  num evento em que a literatura era o mote  principal  e o país  homenageado , o Brasil.

    Esse discurso, que  estamos  exaustos de ler  na grande mídia ” o  Brasil, foi, é, e será sempre uma merda”, é  o mantra que  converte ou mantém o cidadão  condicionado  àquele complexo já conhecido dos leitores  de Nelson Rodrigues.

    Felizmente  , o interesse é o país  e não uma estrela em particular.O complexo cultural  desse multifacetado subcontinente é  que intriga e instiga  cada vez mais   estrangeiros  de todas latitudes interessados em decifrá-lo,conhecê-lo e vivê-lo.

     

  9. Me pareceu um texto chulo o do Ruffato

    Artaud, mas o que move Nelida Piñon a não esculhambar com o país não tem a ver com ser governado por uma petista, até mesmo pq, salvo engano, ela votou em Zé Serra, se não me falha a memória, ela declarou voto em Zé Serra, num video que rodou no Youtube e provavelmente no programa do tucano. Ao que tudo indica, ela tem isso como princípio, de não contribuir para a destruição da imagem do país, até parece que o racismo, o machismo, a burla no guarda da esquina, são coisas que só existem no Brasil, o discurso do escritor foi quase todo em cima de tudo, de literatura brasileira que é bom, ele não falou nada, nem mesmo de Gilberto Freyre, Darcy Ribeiro e outros escritores que, não partiram para a baixaria ao apontar as nossas mazelas sociais. A literatura tem sim, seu poder de transformação, mas uma literatura que aborda a questão social de uma forma que eleve mesmo criticando, Euclides da Cunha fez isso muito bem, tantos outros o fizeram mas, repito, através do espírito que norteia da literatura. Detonar por detonar já tem gente demais prá fazer isso: O último a entrar na arena foi o Lobão.

    Mas entendo, não é todo dia que nasce um Affonso Romano de Sant´Anna que, como podemos observar neste texto, diz das nossas mazelas mas não através de  uma linguagem rasa:

    Que país é este? 
    para Raymundo Faoro

    “¿Puedo decir que nos han traicionado? No. ¿Que
    todos fueram buenos? Tampoco. Pero alli está
    una buena voluntad, sin duda y sobretodo, el ser así.”
    César Vallejo

    Fragmento 1

    Uma coisa é um país
    outra um ajuntamento. Uma coisa é um país,
    outra um regimento. Uma coisa é um país,
    outra o confinamento.

    Mas já soube datas, guerras, estátuas
    usei caderno “Avante”
    – e desfilei de tênis para o ditador.

    Vinha de um “berço esplêndido” para um
    “futuro radioso”
    e éramos maiores em tudo
    – discursando rios e pretensão. Uma coisa é um país,
    outra um fingimento. Uma coisa é um país,
    outra um monumento. Uma coisa é um país,
    outra o aviltamento.

    Deveria derribar aflitos mapas sobre a praça
    em busca de especiosa raiz? ou deveria
    parar de ler jornais
    e ler anais
    como anal
    animal
    hiena patética
    na merda nacional?
    Ou deveria, enfim, jejuar na Torre do Tombo
    comendo o que as traças descomem
    procurando
    o Quinto Império, o primeiro portulano, a viciosa
    visão do paraíso?
    que no impeliu a errar aqui?

    Subo, de joelhos, as escadas dos arquivos
    nacionais, como qualquer santo barroco
    a rebuscar
    no mofo dos papiros, no bolor
    das pias batismais, no bodum das vestes
    reais
    a ver o que se salvou com o tempo
    e ao mesmo tempo
    – nos trai

    Fragmento 2

    Há 500 anos caçamos índios e operários,
    Há 500 anos queimamos árvores e hereges,
    Há 500 anos estupramos livros e mulheres,
    Há 500 anos sugamos negras e aluguéis.

    Há 500 anos dizemos:
    que o futuro a Deus pertence,
    que Deus nasceu na Bahia,
    que São Jorge é guerreiro,
    que do amanhã ninguém sabe,
    que conosco ninguém pode,
    que quem não pode sacode.

    Há 500 anos somos pretos de alma branca,
    não somos nada violentos,
    quem espera sempre alcança
    e quem não chora não mama
    ou quem tem padrinho vivo
    não morre nunca pagão.

    Há 500 anos propalamos:
    este é o país do futuro,
    antes tarde do que nunca,
    mais vale quem Deus ajuda
    e a Europa ainda se curva.

    Há 500 anos
    somos raposas verdes
    colhendo uvas com os olhos, semeamos promessa e vento
    com tempestades na boca, sonhamos a paz na Suécia
    com suiças militares, vendemos siris na estrada
    e papagaios em Haia, senzalamos casas-grandes
    e sobradamos mocambos, bebemos cachaça e brahma
    joaquim silvério e derrama, a polícia nos dispersa
    e o futebol nos conclama, cantamos salve-rainhas
    e salve-se quem puder, pois Jesus Cristo nos mata
    num carnaval de mulatas

    Este é um país de síndicos em geral,
    Este é um país de cínicos em geral,
    Este é um país de civis e generais.

    Este é o país do descontínuo
    onde nada congemina, e somos índios perdidos
    na eletrônica oficina.

    Nada nada congemina:
    a mão leve do político
    com nossa dura rotina, o salário que nos come
    e nossa sede canina, a esperança que emparedam
    e a nossa fé em ruína, nada nada congemina:
    a placidez desses santos
    e nossa dor peregrina, e nesse mundo às avessas
    – a cor da noite é obsclara
    e a claridez vespertina.

    Fragmento 3

    Sei que há outras pátrias. Mas
    mato o touro nesta Espanha,
    planto o lodo neste Nilo,
    caço o almoço nesta Zâmbia,
    me batizo neste Ganges,
    vivo eterno em meu Nepal.

    Esta é a rua em que brinquei,
    a bola de meia que chutei,
    a cabra-cega que encontrei,
    o passa-anel que repassei,
    a carniça que pulei.

    Este é o país que pude
    que me deram
    e ao que me dei,
    e é possível que por ele, imerecido,
    – ainda morrerei.

    Fragmento 4

    Minha geração se fez de terços e rosários:
    – um terço se exilou
    – um terço se fuzilou
    – um terço desesperoue nessa missa enganosa
    – houve sangue e desamor. Por isto,
    canto-o-chão mais áspero e cato-me
    ao nível da emoção.Caí de quatro
    animal sem compaixão.

    Uma coisa é um país,
    outra uma cicatriz.

    Uma coisa é um país,
    outra é abatida cerviz.

    Uma coisa é um país,
    outra esses duros perfis.

    Deveria eu catar os que sobraram
    os que se arrependeram,
    os que sobreviveram em suas tocas
    e num seminário de erradios ratos
    suplicar:
    – expliquem-me a mim
    e ao meu país?

    Vivo no século vinte, sigo para o vinte e um
    ainda preso ao dezenove
    como um tonto guarani
    e aldeado vacum. Sei que daqui a pouco
    não haverá mais país.País:
    loucura de quantos generais a cavalo
    escalpelando índios nos murais,
    queimando caravelas e livros
    – nas fogueiras e cais,
    homens gordos melosos sorrisos comensais
    politicando subúrbios e arando votos
    e benesses nos palanques oficiais.

    Leio, releio os exegetas.
    Quanto mais leio, descreio. Insisto?
    Deve ser um mal do século
    – se não for um mal de vista. Já pensei:

    – é erro meu. Não nasci no
    tempo certo.
    Em vez de um poeta crente
    sou um profeta ateu.
    Em vez da epopéia nobre,
    os de meu tempo me legam
    como tema
    – a farsa
    e o amargo riso plebeu.

    Fragmento 5

    Mas sigo o meu trilho. Falo o que sinto
    e sinto muito o que falo
    – pois morro sempre que calo.
    Minha geração se fez de lições mal-aprendidas
    – e classes despreparadas
    Olhávamos ávidos o calendário. Éramos jovens.
    Tínhamos a “história” ao nosso lado. Muitos
    maduravam um rubro outubro
    outros iam ardendo um torpe agosto.
    Mas nem sempre ao verde abril
    se segue a flor de maio.
    Às vezes se segue o fosso
    – e o roer do magro osso.
    E o que era revolução outrora
    agora pasas à convulsão inglória.
    E enquanto ardíamos a derrota como escória
    e os vencedores nos palácios espocavam seus
    champanhas sobre a aurora
    o reprovado aluno aprendia
    com quantos paus se faz a derrisória estória.
    Convertidos em alvos e presa da real calçada
    abriu-se embandeirado
    um festival de caça aos pombos
    – enquanto raiava sangüínea e fresca a
    madrugada.Os mais afoitos e desesperados
    em vez de regressarem como eu
    sobre os covardes passos,
    e em vez de abrirem suas tendas para a fome dos
    desertos,
    seguiram no horizonte uma miragem
    e logo da luta
    passaram
    ao luto.Vi-os lubrificando suas armas
    e os vi tombados pelas ruas e grutas.
    Vi-os arrebatando louros e mulheres
    e serem sepultados às ocultas.

    Vi-os pisando o palco da tropical tragédia
    e por mais que os advertisse do inevitável final
    não pude lhes poupar o sangue e o ritual.

    Hoje
    os que sobraram vivem em escuras
    e européias alamedas, em subterrâneos
    de saudade, aspurando a um chão-de-estrelas,
    plangendo um violão com seu violado
    desejo
    a colher flores em suecos cemitérios.

    Talvez
    todo o país seja apenas um ajuntamento
    e o conseqüente aviltamento
    – e uma insolvente cicatriz.

    Mas este é o que me deram,
    e este é o que eu lamento,
    e é neste que espero
    – livrar-me do meu tormento.

    Meu problema, parece, é mesmo de princípio:
    – do prazer e da realidade
    – que eu pensava
    com o tempo resolver
    – mas só agrava com a idade.

    Há quem se ajuste
    engolindo seu fel com mel.
    Eu escrevo o desajuste
    vomitando no papel.
    Fragmento 6 
    Mas este é um povo bom
    me pedem que repita
    como um monge cenobita
    enquanto me dão porrada
    e me vigiam a escrita.

    Sim. Este é um povo bom. Mas isto também
    diziam os faraós
    enquanto amassavam o barro da carne escrava.
    Isso digo toda noite
    enquanto me assaltam a casa,
    isso digo
    aos montes em desalento
    enquanto recolho meu sermão ao vento.

    Povo. Como cicatrizar nas faces sua imagem
    perversa e una?
    Desconfio muito do povo. O povo, com razão,
    – desconfia muito de mim.

    Estivemos juntos na praça, na trapaça e na desgraça,
    mas ele não me entende
    – nem eu posso convertê-lo.
    A menos que suba estádios, antenas, montanhas
    e com três mentiras eternas
    o seduza para além da ordem moral.

    Quando cruzamos pelas ruas
    não vejo nenhum carinho ou especial predileção
    nos seus olhos.
    Há antes incômoda suspeita.

    Agarro documentos,
    embrulhos, família
    a prevenir mal-entendidos sangrentos.

    Daí vejo as manchetes: – o poeta que matou o povo
    – o povo que só/çobrou ao poeta
    – (ou o poeta apesar do povo?)

    – Eles não vão te perdoar
    – me adverte o exegeta.
    Mas como um país não é a soma de rios, leis,
    nomes de ruas, questionários e geladeiras,
    e a cidade do interior não é apenas gás neon,
    quermesse e fonte luminosa,
    uma mulher também não é só capa de revista,
    bundas e peitos fingindo que é coisa nossa.

    Povo
    também são os falsários
    e não apenas os operários,

    povo
    também são os sifilíticos
    não só atletas e políticos,

    povo
    são as bichas, putas e artistas
    e não só os escoteiros
    e heróis de falsas lutas,
    são as costureiras e dondocas
    e os carcereiros
    e os que estão nos eitos e docas.

    Assim como uma religião não se faz só de missas
    na matriz,
    mas de mártires e esmolas, muito sangue e cicatriz,
    a escravidão
    para resgatar os ferros de seus ombros
    requer
    poetas negros que refaçam seus palmares e
    quilombos.

    Um país não pode ser só a soma
    de censuras redondas e quilômetros
    quadrados de aventura, e o povo
    não é nada novo
    – é um ovo
    que ora gera e degenera
    que pode ser coisa viva
    – ou ave tortadepende de quem o põe
    – ou quem o gala.

    Fragmento 7

    Percebo
    que não sou um poeta brasileiro. Sequer
    um poeta mineiro. Não há fazendas, morros,
    casas velhas, barroquismos nos meus versos.

    Embora meu pai viesse de Ouro Preto com
    bandas de música polícia militar casos de
    assombração e uma calma milenar,
    embora minha mãe fosse imigrando
    hortaliças protestantes tecendo filhos
    nas fábricas e amassando a gé e o pão,
    olhos Minas com um amor
    distante, como se eu, e não minha mulher
    – fosse um poeta etíope.

    Fácil não era apenas ao tempo das arcádias
    entre cupidos e sanfoninhas,
    fácil também era ao tempo dos partidos:
    – o poeta sabia “história”
    vivia em sua “célula”,
    o povo era seu hobby e profissão,
    o povo era seu cristo e salvação.

    O povo, no entando, é o cão
    e o patrão
    – o lobo. Ambos são povo.
    E o povo sendo ambíguo
    é o seu próprio cão e lobo.

    Uma coisa é o povo, outra a fome.
    Se chamais povo à malta de famintos,
    se chamais povo à marcha regular das armas,
    se chamais povo aos urros e silvos no esporte
    popularentão mais amo uma manada de búfalos em
    Marajó e diferença já não há
    entre as formigas que devastam minha horta
    e as hordas de gafanhoto de 1948
    – que em carnaval de fome
    o próprio povo celebrou.Povo
    não pode ser sempre o coletivo de fome.
    Povo
    não pode ser um séquito sem nome.
    Povo
    não pode ser o diminutivo de homem.
    O povo, aliás,
    deve estar cansado desse nome,
    embora seu instinto o leve à agressão
    e embora
    o aumentativo de fome
    possa ser
    revolução

    http://www.casadobruxo.com.br/poesia/a/affonso43.htm

  10. Então que levassem ghostwritten

    O Ruffato entende-se é livre para falar o que quiser. Talvez passe pela cabeça do Ziraldo não oferecer a passagem de volta ao Brasil, mas depois de ler o discurso do Ruffato, não vi nenhuma bobagem ou invenção, e por favor, sem melindres do que somos, ou pisando em terra estrangeira nosso discurso muda e vivemos em Shangri lá como parece para alguns escritores do beijamão da ABL. Se quisessem fazer propaganda do Brasil no estrangeiro que levassem vendedores e profissionais do marketing, jamais escritores de verdade.

  11. Não somos apenas tragédia

    “Tem muita coisa boa sendo feita no Brasil que é invisível”, diz Paula Mastroberti

    Paula é a única quadrinista mulher que vai representar o Brasil na Feira de Frankfurt

    "Tem muita coisa boa sendo feita no Brasil que é invisível", diz Paula Mastroberti Divulgação/Editora LibretosFoto: Divulgação / Editora Libretos

    Com três conferências agendadas na Feira de Frankfurt, a quadrinista Paula Mastroberti enxergou uma oportunidade para divulgar não apenas o seu trabalho, mas a força da produção gráfica.

    Ela pretende promover Osmose: Brasil e Alemanha em Quadrinhos, uma publicação bilíngue do Instituto Goethe fruto do intercâmbio entre três quadrinistas brasileiros em cidades alemãs e três alemães no Brasil, durante um mês no passado. Paula, que pesquisa HQs e leciona na UFRGS, aproveitou a estadia em Berlim não apenas para desenhar o conto gráfico que está no livro, mas também para travar contato com as quadrinistas alemãs que produzem a Spring Magazin. Daí surgiu Inverna, uma publicação especializada em HQs feitas por mulheres. 

    >> Brasil investe R$ 18 milhões para promover autores nacionais no exterior

    – Tem muita coisa boa sendo feita no Brasil que é invisível, a produção alternativa tem que ser exportada e, na Alemanha, há um olhar muito mais aberto para isso – avalia a autora.

    Quem também enxergou na Feira uma porta aberta para a produção alternativa foi Gustavo Faraon, sócio e editor da Dublinense e da Não Editora, baseadas em Porto Alegre:

    – No ano passado, conheci muitos editores que estavam buscando coisas fora do clichê, que me procuraram porque buscavam uma editora mais urbana, periférica.

    Gustavo frequentou a Feira em 2012 pela primeira vez, de olho no interesse gerado pelo anúncio do Brasil como país homenageado de 2013. Desta vez, já pegou o avião com 30 reuniões agendadas com editoras de todo o mundo. No ano passado, Gustavo vendeu os direitos para a publicação de três livros, e as bolsas de tradução oferecidas pela Fundação Biblioteca Nacional, uma das iniciativas federais de apoio à literatura, foram fundamentais para baratear o negócio:

    – Para editoras pequenas, é superimportante estar lá, é uma oportunidade de se pensar como fazer as coisas, ver o que as outras pessoas estão fazendo, fazer com que os nossos autores ganhem o mundo, pensar parcerias.

    A EdiPUCRS, única editora gaúcha que participa como convidada do governo brasileiro, já definiu suas apostas para a Feira há meses e está levando livros de perfil mais “internacional” que, inclusive, foram divulgados previamente em várias línguas.

    – Já tenho várias reuniões marcadas com editoras universitárias, pessoal de eletrônica dos Estados Unidos e da Europa, que está oferecendo novas plataformas para a comercialização e divulgação de livros eletrônicos – compartilha o diretor da EdiPUCRS, Jeronimo Carlos Santos Braga.

     

     

  12. Rufatto esqueceu-se da nossa literatura

    Rufatto repetiu velhos clichês e nada disse da nossa literatura.

    Não estou aqui a dizer que os escritores devem ficar jogando confetes entre si ou em quem que seja mas alto lá: O evento era de sociologia ou literatura? Claro que o discurso de Rufatto é verdadeiro, isso no que diz respeito ao nosso atraso em termos de cidadania. Mas somos apenas isso? Ele não poderia ter reservado uma parte do seu discurso para falar como escritor e não apenas para dar uma aula de sociologia que, como declarou a diretora Daniela Thomas, poderá contriubir para acentuar os clichês que marcam o entendimento do público europeu sobre o Brasil?”

    O Paulo Coelho tmbm fez seu marketingzinho na linha do detonar geral.

    Será que somos apenas miséria social, mazelas, estupro, assassinatos. Sim, temos todos outros problemas, mas o evento se propunha a mostrar a nossa criatividade, isso não foi citado nem de longe por Rufatto, até parece que não tivemos grandes escritores por aqui. 

    Trechos do discurso de Rufatto, em negrito:

    Uma pena que o sociólogo Rufatto não se informe através de mídias independentes, senão teria citado as políticas de inclusão social dos afro-descendentes, como por exemplo a quota racial para ingresso na universidade.

    ” Ocupamos os últimos lugares no ranking que avalia o desempenho escolar no mundo” 

    Interessante essa “verdade” que rola no facebook. Houve uma pesquisa que pesquisou a qualidade do ensino em 40 países. É verdade, o Brasil ficou em penúltimo lugar em tal pesquisa. Mas é correto, baseado nisso, se afirmar que somos o penúltimo no raking mundial? Os últimos lugares? No mundo só existem 40 países? É que foram pesquisados 40 paises, sendo que o Brasil ficou em penúltimo lugar no ranking desempenho escolar. Sim, mas dentre 40 países pesquisados e não “pior desempenho escolar no mundo’. Ele ocupou toda a sua fala com sua aula de sociologia, o que ele disse é, em sua maioria, pura verdade. Mas não poderia ter falado um pouco de nossa literatura para o mundo? 

     

     

  13. A tal Nelida Piñon tem razão,

    A tal Nelida Piñon tem razão, um dia o mundo vai reconhecer que seus colegas de ABL – Sarney e Marco Maciel – foram verdadeiros Shakespeares tupiniquins, homens avançados demais para seu tempo.

    Qualquer pessoa associada à ABL não merece o menor respeito.

  14. Pela reação agressiva de

    Pela reação agressiva de alguns (ver o post do discurso do Ruffato), acho que ha confusão sobre a postura do escritor e de seu discurso. 

    Ruffato não era convidado a  uma festa ou jantar na casa de alguém, um estrangeiro, e de repente desandou a falar “mal” do Brasil. 

    Ele tinha um discurso a fazer e o fez nos termos que achou mais importante levar à publico. Desenterrar o que tentamos a todo custo jogar para baixo do tapete.

    O discurso é velho ? Dos anos 70, disseram. Não, não data dos anos 70 apenas, data ainda do império, porque o que Ruffato fez foi retraçar toda a nossa Historia, com nossa peculiar e hipocrita formas de lidar com as diferenças.  

    O que ma parece inacreditavel é que muitos querem nega-la. Nos não somos apenas isso, mas temos muito disso.

    Ele foi realista e justo, lembrou que o Brasil tem mudado, mas que ainda é um poço de diferenças e de paradoxos.   

    Nélida Pinon faz parte de uma casta protegida, que busca na litarutura uma forma de se demarcar das massas. Tem um quê de Fernando Henrique Cardoso, sem a mesma pavonice, mas elitista, sim. 

     

     

     

  15. Achei o discurso do Ruffato

    Achei o discurso do Ruffato infantil, coisa para alguém com 16, 18 anos ler no dia da formatura para constranger a diretora frente aos pais dos alunos. Há muita coisa que se criticar no Brasil contemporâneo, mas essa necessidade de mudar a história oficial do Brasil um pouco gasta. Poderia falar da péssima qualidade dos nossos escritores desde o século XX, que mesmo com um ou outro autor bom, não produziu nenhum livro do calibre de “Conversa na Catedral” ou “Cem anos de Solidão”. Poderia falar das censuras à biografias, com apoio de quase toda nossa opinião pública. Enfim, acho que pecou por querer falar muito, mas não disse grande coisa. Faltou aprender uma lição básica para qualquer escritor nacional: menas é mais.

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