Eduardo Cunha e seu micropoder bombástico, por Luiz Flavio Gomes

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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De que maneira nós, os senhores neofeudais donos do poder (financeiro e econômico), estamos encarando Eduardo Cunha? Poucos políticos têm apetite pelo exercício do poder como ele. Não é o detentor do poder supremo neofeudal, que nos pertence. Nós somos as classes dominantes mais poderosas e chegamos aonde chegamos porque temos o poder de “comprar” (sempre que possível) os mandatos dos parlamentares (financiando suas pródigas campanhas políticas). Eduardo Cunha na estrutura geral do poder é detentor de um micropoder (como dizia o filósofo francês Michel Foucault), mas é pertinaz e bombástico.

Acusado por um dos delatores da Lava Jato (Júlio Camargo) de ter recebido 5 milhões de dólares em propinas (o dinheiro teria saído das empresas Samsung e Mitsui), redobrou seu ódio (e, assim, aumentou seu protagonismo) contra o governo petista de Dilma assim como contra o Procurador-Geral da República (Janot). Agora promete uma agenda bombástica para agosto e já fala abertamente no impeachment da presidente (presidenta) Dilma (cuja popularidade está virando um raquítico traço). Tudo isso está sob a análise do nosso clube. Nada será decidido, a não ser por nós mesmos.

Para se saber se Eduardo Cunha vai ou não incendiar o governo petista assim como o país, se vai mergulhar ou não na tese do impeachment, é preciso voltar a Foucault e perguntar o seguinte: quem são os verdadeiros donos do poder? Os agentes dos micropoderes ou os detentores do poder político, atrelado ao Estado? Ou ambos? Foucault, diferentemente de Hobbes, por exemplo, descatacteriza o Estado (no caso do Brasil aqui entramos nós, os senhores neofeudais) como fonte única do poder sobre os indivíduos (sobre as classes dominadas). Confere mais relevância aos micropoderes, que se produzem a cada instante, em todos os pontos, em todas as relações (de pais e filhos, de médico e paciente, de chefe e subordinado, professores-alunos, confessor-penitente, psicanalista e paciente etc.). São muitas as instituições que nos auxiliam na tarefa de “amansar” os indivíduos, consoante um padrão de disciplina. Isso vem desde o Iluminismo (século XVIII). Mas a pergunta mais importante é a seguinte: é o Estado (por meio de nós, os senhores neofeudais) que domina as massas ou são os micropoderes que fazem isso? Para Foucault são fundamentalmente os micropoderes que dominam. De acordo com essa teoria, portanto, Eduardo Cunha seria muito mais poderoso do que aparenta. Mas as aparências podem enganar.

Nós, os senhores neofeudais, contestamos em parte a tese de Foucault, que por sinal é muito criticada no mundo filosófico (cf. Jaime Osorio, El Estado en el centro de la mundialización), porque desconsidera o poder político que vem “do alto, de cima”, conferindo protagonismo somente para aquilo que vem de “baixo” (das relações diárias). O poder para Foucault seria ascendente (vai de baixo para cima), enquanto a teoria predominante (que nós seguimos) afirma o contrário (o poder é descendente, porque começa em cima e vem para baixo, onde muits instituições nos auxiliam nessa tarefa disciplinatória).

A questão mais relevante (para nós) na teoria de Foucault é que caberia contra o exercício dos poderes apenas resistências isoladas (dos alunos contra os professores, das mulheres contra o machismo, dos empregados contra seus empregadores etc.). Pensamos que essa tese nos é extremamente útil, porque tolhe a possibilidade de as massas se rebelarem contra as bases da nossa formação social, que se condensam hierarquizadamente no ente chamado Estado (dominado, aqui, por nós, os senhores neofeudais). Para a preservação dos nossos interesses é muito conveniente que as resistências sejam dirigidas contra os micropoderes, sem que nunca levantem os olhos (ou tirem as vendas dos olhos) visando à transformação dos macropoderes (exercidos por nós, os senhores neofeudais).

É importante para nossos padrões de prosperidade que não exista nada de tangível em termos de macrodominação para se contestar (a teoria de Foucault esvazia, atomiza, dilui e indetermina o poder do alto, de cima). Isso nos é muito conveniente. Essa, aliás, é a técnica empregada pela nossa tradicional aliada, que é a grande mídia: ela jamais apresenta os problemas com a perspectiva macrossocial. A lupa da mídia é sempre microssocial (algo tangível, concreto, determinado). A responsabilidade pelos problemas é sempre a imediata (nunca dos verdadeiros detentores do poder, que ficam invisíveis). Se uma escola não educa, o problema é da direção, do emprego do dinheiro público, do gerenciamento etc. Nunca o problema chega no topo, ou seja, nunca afeta o nosso poder neofeudalista.

A corrupção é sempre do funcionário público e do político, não nossa, não dos poderosos econômicos e financeiros (ou seja: dos senhores neofeudais). A corrupção delatada contra Eduardo Cunha seria exclusivamente do Eduardo Cunha, não de quem teria pago as propinas para ele (aliás, os nomes das empresas corruptoras são quase sempre atomizados, diluídos, intangibilizados, escondidos). É assim que nós, os senhores neofeudais, continuamos sendo os donos do poder. O impeachment é assunto que nos compete. No tempo devido decidiremos.

Luiz Flávio Gomes é jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). [ assessoria de comunicação e imprensa +55 11 991697674 [agenda de palestras e entrevistas] 

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

5 Comentários

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  1. Teses…

    Teses são respeitáveis, com certeza! Mas canalhas devem ser tratados como tal, tenham ou não poderes e sejam estes  macros ou micros, ressalvando-se porém o amplo direito a defesa o que não existe mais no Brasil. Nem na ditadura ví tamanho regime de exceção.

    Porém, se tratando deste sujeito, seu poder não é tão micro. Tanto que atacaram agora um cidadão como o ex-presidente da eletronuclear apenas para desviar os holofotes dele.

     

  2. Mas tem o poder….

    O micropoder tem…  o poder da mídia, que até já chutou até a bunda dos empresários deste país, ou ocês num sabe que todo ricaço é ladrão, que o pt contminou os empresários desde o governo fhc? Fico preocupado é com os irmãos marinho. Padrão fifa… estas coisas.

    1. Tenho a impressão de que a

      Tenho a impressão de que a imprensa pertence aos detentores do macro poder. Esse negócio de chutar os fundilhos do PT e até dos empresários é apenas circo, de que o vulgo tanto gosta, do gosto popular, leitores de Veja, telespectadores da Globo.

      Desde quando se combate corrupção prendendo apenas corruptos e corruptores “notáveis”, celebridades? E o médico que tem um  preço com recibo e outro sem? Prender Marcelo Odebrecht vai eliminar a caixinha ao examinador dos detrans do país todo? Quem é que acredita que todo milionário poderoso é obrigatoriamente celebridade? A ânsia pela fama é característica de nós, ralé. O macro não frequenta a auto-escola. E preso ou não Odebrecht, não frequentará, da mesma forma. Consta que os donos de um dos maiores bancos do Brasil, na mesma noite em que o BACEN decretou intervenção fechando esse banco, também eles fecharam… uma boate. Boca livre, Moet Chandon, com direito a confete, serpentina e realce. Depois foram todos, anfitriões e convidados, para Paris. Coisas do capitalismo…

  3. Ê vida de gado

    Povo sofrido. povo marcado, povo transformado em manada, massa da manobra dos macro poderes nacionais e internacionais, inclusive o povo que se acha letrado e nunca se dá a oportunidade de investigar o outro lado da moeda. È uma pena que o Brasil deixe escapar esta oportunidade de se deixar passar a limpo respeitando os direitos de ampla defesa dos seus concidadãos.

     

     

     

  4. Golpe

    Alguém acredita que Cunha esta fazendo todo que vem fazendo para salvar o Brasil do PT e, no fim, colocar aécio, psdb, ou temer na presidência ?
    Alguém acredita que aécio, PSDB, etc estão fazendo tudo que estão fazendo para salvar o Brasil do PT, e, no fim, colocar Cunha ou Temer na presidência ?
    —-
    Cunha pode ser tudo, menos…burro !
    É um espertalhão reforçado com uma “cara- de- pau” imensa.
    Não tem “torcida organizada” como aécio.
    Parece não ver muita vantagem em movimentar massas.
    Seu negócio não é povo.
    Parece ser de uma fidelidade canina a seus financiadores
    —-
    Aécio continua parecendo meio desesperado.
    Parece estar agindo sob pressão.
    Aposto que quem o financiou está “puto” com ele
    Sua “torcida” debandou em parte, mas, ainda pode fazer barulho.
    Acho que Cunha tem mais munição prá queimar.
    —-
    Acho que, por traz dessa “briga política” o que está realmente acontecendo, é uma disputa entre dois grupos poderosos.
        
    1 ) Um dos grupos tem como braço político a turma do PSDB e outros.
          
    2 ) No outro grupo, Cunha lidera um punhado enorme de políticos eleitos com sua ajuda.

    Em jogo, está a inimaginável situação de poder e riqueza que caberá ao grupo vitorioso nessa “briga”.
    E, obviamente, o grupo derrotado perderá muito, muito, muito.
    Privatizações, vendas de empresas, concessões, contratos, etc
    Num país como o Brasil, as possibilidades são quase infinitas.
    O grupo vencedor ainda recebe de bônus 200 milhões de trabalhadores que poderão ter o preço de seu trabalho “ajustado” de acordo com as “leis do mercado”.

    Aquela delação premiada acusando Cunha de ter recebido 5 milhões de dólares, UM DIA ANTES de Cunha aparecer na TV, é uma evidencia dessa “briga”.
    Foi uma delação encomendada para “melar” a aparição de Cunha na TV.
    Essa delação mostra como, parte da PF e judiciário estão sendo usadas nessa disputa.
    — Se segurem e apertem os cintos !
     

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