Lava-jato: Museu de Grandes Novidades II, por Antonio Dornas

No primeiro post fez-se referência aos limites da Operação Lava-jato e concluiu-se que, apesar do aparente poderio, seu protagonismo no cenário político seria breve, não resultando, ao final, qualquer mudança efetiva da prática política no país. Propõe-se contextualizar aqui o estágio em que ela se encontra e os possíveis avanços e retrocessos a partir deste ponto.

Para facilitar a explanação apresentamos o gráfico abaixo. 

No esquema a linha vermelha indica aquilo que chamamos de ações e que pretende retratar a quantidade de atividades ou iniciativas que se desenvolvem a partir da operação. Ela vem num crescente contínuo até atingir um ápice a partir do qual começa a cair da mesma forma que iniciou.

A linha cinza indica o prestígio da operação, é consequência do número de atividades, ou aquilo que denominamos ações. Isto porque quanto mais ações acontecem, maior quantidade de material é produzida para exposição na mídia e o prestígio depende desta exposição. Inicia num processo de crescimento exponencial para chegar ao ápice um tempo depois do início do declínio do número de operações. A partir de então cai para terminar a zero.

A linha azul indica a reação às ações, isto é, ações que se contrapõe às que acontecem por ocasião das operações e que confrontam as mesmas denunciando suas contradições. Também cresce como consequência de ações, mas isto de uma forma linear e nunca atinge o nível de prestígio da operação, em função das limitações impostas pela mídia à divulgação das ideias que fundamentam esta reação.

Evidentemente, não se pretende dizer que tudo acontece exatamente desse modo. Na operação existem altos e baixos que se sucedem, interferências diversas, em particular do processo político. Por outro lado, a simplicidade do modelo facilita a comunicação e a percepção do contexto como um todo, proporcionando uma visualização rápida, essencial para uma apresentação breve.

Assim entendido, passemos à análise do estágio em que as operações se encontram. Afirmamos que o processo se encontra naquele ponto entre os dois ápices da linha vermelha (ações) e cinza (prestígio), tendo como referência para o ponto de inflexão das ações a aprovação do processo de impeachment da presidente Dilma Roussef.

Isto porque, como fica claro pelas gravações de Sérgio Machado, neste momento concretiza-se o pacto que restringe o foco das operações aos esquemas que envolvem apenas o PT o que, além de levar a uma limitação de foco, torna mais evidente as contradições acarretando um natural crescimento da reação.

Já com relação ao ponto de inflexão da linha cinza (prestígio) apesar de ainda ser difícil referenciar quando e como acontecerá, identificamos algumas circunstâncias que nos levam a afirmar que ele está próximo.

Primeiramente o fato do juiz Sérgio Moro ter recuado recentemente com relação à prisão de Guido Mantega, rendendo-se à opinião pública. Trata-se de um recuo tático, que, não ocorrendo, implicaria em maior prejuízo para a operação. Mas, considerando a onipotência de sua atuação até então, não deixa de ser expressão de uma mudança. Uma das principais razões para o prestígio do juiz é justamente o rigor na aplicação de suas decisões, o que se fixa no imaginário das pessoas como manifestação de sua infalibilidade.

Posso identificar sinais de mudança também em uma circunstância cotidiana e particular.

 Recentemente eu estava numa lanchonete e um senhor de terno ironizou a atitude de Lula diante da aceitação de denúncia contra ele. Outro homem nordestino que atendia reagiu defendendo o ex-presidente. Eu o apoiei e o homem de terno, ao final, disse que queria que “o prédio da PETROBRÁS explodisse” (estávamos em frente ao prédio da companhia no centro do Rio de Janeiro) denunciando a falta de argumento para continuar seu discurso.

O mais revelador neste relato é a manifestação do nordestino.

Como todos sabemos, Lula é o candidato mais forte para as eleições de 2018, mas este apoio pouco se traduz em manifestações públicas de apoio diante dos abusos da operação lava-jato. Intimidados, seus apoiadores, principalmente entre a população humilde, são incapazes de se contrapor ao senso comum imposto pelos meios de comunicação. Esta exceção, apesar de pontual, ficou marcada para mim como novidade a ser considerada.

Por fim, aquilo que pra mim é mais emblemático. A famosa apresentação em POWER POINT.

A autossuficiência do promotor naquela ocasião me fez lembrar as bravatas do então presidente Fernando Collor quando começaram os movimentos que culminaram no seu impeachment. Lembro perfeitamente de uma destas ocasiões, quando assinava um ato para financiar a compra de carros para taxistas, ele sugeriu que seus apoiadores fossem às ruas com roupas nas cores da bandeira brasileira. Na circunstância, hoje sabemos, ele perdeu a noção do risco, optou pelo caminho do enfrentamento, e este foi o início do fim de sua gestão porque o efeito foi o inverso do esperado.

Da mesma forma, uma vez consumado o impeachment, a operação lava-jato se encontrava pressionada a apresentar provas de continuidade em contraponto ao conteúdo da gravação de Sérgio Machado. O álibi encontrado foi consumar uma acusação sem provas. O promotor, na apresentação, parecia um professor diante de alunos do segundo grau, quando o tablado, a lousa, o poder da avaliação, enfim, a condição de mestre o faz imaginar ser o dono da verdade e prescindir da opinião da assistência. Ora, eu já fui professor e sei que isto podia funcionar com os alunos do século passado, mas hoje em dia?

Também a reação da opinião pública segue este paralelo. Como naquela época, a “máscara” que aos poucos vai caindo, transforma os responsáveis pela operação lava-jato, assim como aconteceu com o ex-presidente, numa caricatura. E este fato não deixará de ter consequências, apesar de toda blindagem.

Por fim, precisamos tratar daquilo que denominamos reação (linha azul). Em minha opinião ela ainda é relativamente embrionária. Mas dois fatores me levam a afirmar que tende a um crescimento cada vez mais expressivo, conforme o esquema proposto.

Primeiro pela sua relevância qualitativa. Não creio que passem ao largo da consciência dos senhores responsáveis pelo Supremo Tribunal Federal questionamentos feitos por pessoas do gabarito de um Jânio de Freitas, só pra ficar em um exemplo. Com toda a pressão que possa existir em outro sentido. Haja vista a retirada de uma parte do parecer do ministro Teori, no qual ele questionava o uso de recursos pela defesa de Lula.

Existe também uma reação muito significativa acontecendo em um dos pilares que sustentam a operação, conforme apontado no primeiro post: o sistema judiciário. Não são poucos os advogados que têm se manifestado contra os argumentos usados pela operação. Mas isto, evidentemente, acontece muito lentamente devido ao espírito de corpo que limita em grande parte as críticas aos ambientes acadêmicos.

No entanto, mais significativa do que este tipo de reação que acontece no campo democrático popular, é a que se faz no campo conservador, através de figuras como Renan Calheiros e Gilmar Mendes, em conluios de gabinetes. Por enquanto, isto raramente se traduz em manifestações públicas, pois eles agem como raposas esperando a hora de assaltar o galinheiro e dar uma verdadeira aula de política, no pior sentido, a esses “meninos de Curitiba”.

É esperar pra ver.

 

Redação

Redação

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  • O judiciário está dando um
    O judiciário está dando um péssimo exemplo. As leis são feitas para harmonizar a sociedade , mas como? Nem o judiciário quer cumprí-las. Vejo aos meus 56 anos a total falência das Instituíções.

  • Peço desculpas e todas as

    Peço desculpas e todas as vênias do mundo mas farei algumas diletantes observações:

    Nem Sérgio Moro desprezou a importância da participação de empresas particulares, firmas privadas como as firmas Globo, OESP, Abril e Folha.

     

    A função da curva cinza, PRESTÍGIO, pode ser assim determinada:

    DAM: Desejo dos Administradores daquelas firmas de Mídia de apoiar sua classe social, a dos operadores do capital

    DJP: Desejo dos Jornalistas empregados dos administradores citados por Prestígio junto aos chefes

    EPJ: Espírito de Porco dos Jornalistas empregados nas firma citadas, vaidade por conseguir derrubar governos, inconsciência, inconsequência e falta de senso de responsabilidade

    Assim:

    PRESTÍGIO = AÇÕES + (DAM x DPJ x EPJ)

     

    E talvez haja um erro na curva azul, REAÇÃO. É que creio que ela não "morre" junto às da AÇÃO e à do PRESTÍGIO e sim tende a se prolongar no tempo. A "prova" (ou o que leva a crer que seja assim) é o clamor tanto por uma volta à ditadura miliar quanto pela citação, nesse clamor, de fatos há muito superados como a Comunismo Soviético. Note-se que há muito mais clamor pela volta à ditadura do que por nova e inédita edição desse regime. E isso porque o a AÇÃO e o PRESTÍGIO (negativo) da U.R.S.S. já morreram faz tempo...

    Será?

  • O juiz intocável e

    O juiz intocável e santificado de Curitiba não inventou museu para expor as obras de arte confiscadas de seus condenados? Não parece, já, que a própria Lava-Jato está indo pro museu como escultura da hipocrisia? Quem dá mais?

     

     

     

     

     

     

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