Em SP, famílias têm dificuldade financeira com a suspensão da merenda escolar

do Brasil de Fato

Em SP, famílias têm dificuldade financeira com a suspensão da merenda escolar

por Caroline Oliveira, de São Paulo (SP)

Priscila Araújo, de 30 anos, tem três filhos que estudam na rede pública de ensino de São Paulo. Sem aula e sem merenda, todos eles estão em casa desde o dia 16 de março. Ela, que está desempregada e, por não poder contar mais com a merenda escolar como uma das refeições do dia para as crianças, conta que as dificuldades financeiras desde então aumentaram.

“Eu tenho três filhos, dois são especiais, eu só recebo o Benefício de Prestação Continuada (BPC) por causa de um deles, e a Bolsa Família. O governo não me deu auxílio nenhum durante essa suspensão de aula e da merenda, então eu estou passando muita dificuldade com os três”, afirma.

A situação é a mesma de Alexsandra Martins, de 33 anos, que tem dois filhos na rede pública de ensino de São Paulo. Ela conta que desde a suspensão das aulas e, consequentemente, das merendas, o orçamento dobrou dentro de casa.

“Eu fiz as compras no começo do mês e agora aqui dentro de casa já não tem quase nada. Eu vou ter que dar um jeito comprar as coisas de novo. Atualmente eu fui mandada embora do serviço e não sei como vai ficar a situação, porque causa dessa covid-19″, afirma.

No mundo todo, cerca de 386 milhões de estudantes recebem merenda escolar no mundo, de acordo com um estudo feito pelo Programa Mundial de Alimentos (PMA), da Organização das Nações Unidas (ONU), em 2019.

Para muitas dessas crianças e adolescentes, a refeição que recebem na escola é a mais importante do dia, quando não é a única. A fome é mais certeira, então, quando há férias escolares ou suspensão das aulas, como é o caso atual em todo o mundo diante da pandemia causada pelo coronavírus.

Em São Paulo, a suspensão total das escolas públicas ocorreu nesta segunda-feira (23), assim como oferecimento de merenda. Isso porque a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo decidiu pelo adiantamento do recesso escolar, período em que não há a distribuição de merenda, como informou a própria pasta ao Brasil de Fato.

O mesmo ocorre na cidade carioca. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) determinou, no dia 17 de março, o interrompimento da distribuição de almoço nas escolas da rede municipal durante a suspensão das aulas.

No primeiro dia de oferecimento de almoço, cerca de mil alunos da rede municipal se deslocaram até as instituições de ensino para almoçar. Com a decisão, no entanto, desde a última quarta-feira (18), as 350 unidades de ensino, que serviriam merenda, não abrem. A Prefeitura afirmou que a Procuradora Geral do Município irá recorrer da decisão.

O que dizem os especialistas?

Daniel Cara, coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, afirma que não se trata de ir contra a suspensão da aulas ou o oferecimento da merenda nas escolas nesse período. Para ele, as medidas são necessárias, mas devem ser tomadas de modo a se tornar o menos prejudicial.

“Sem a merenda escolar, as crianças simplesmente não conseguem aprender. Só que, além da situação do aprendizado, existe uma questão de saúde pública. Sem a merenda escolar, as crianças não têm acesso a uma alimentação nutritiva”, afirma.

Hoje, no país, a merenda escolar é feita com produtos de pequenos agricultores familiares, com menos uso de agrotóxico, mais qualidade nutricional e de segurança alimentar. “Então a alimentação escolar é responsável, inclusive, por uma melhoria no desenvolvimento, crescimento, saúde de crianças e adolescentes. Então ela é central”, afirma Daniel Cara.

O que ele defende já começa a valer no Paraná a partir desta quinta-feira (26): a distribuição de kits de alimentos perecíveis e não perecíveis. Receberão a cesta de produtos, a cada quinze dias, aqueles alunos regularmente matriculados, beneficiários do Programa Bolsa Família e em situação de vulnerabilidade social.

Os estudantes deverão comparecer às escolas, junto aos responsáveis, para retirarem o kit, e tudo deve ser feito nos moldes das orientações do Ministério da Saúde.

Nesse momento, de escolas fechadas, “o Brasil precisa ter consciência de que não vai poder seguir a orientação do governo federal que, na verdade, tem tratado de forma displicente a pandemia. Mas deveria trabalhar na perspectiva de fazer com que cada escola seja uma escola de campanha para alimentação para a população, especialmente de baixa renda. Isso tudo acordado com o sistema de saúde, para evitar a proliferação da pandemia”, defende Cara.

Sônia Kruppa, professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), vai na mesma linha: ela afirma que as escolas são os únicos equipamentos públicos existentes nas periferias.

Para ela, é importante “que as autoridades da Educação não parem o fluxo da alimentação escolar, cujo recurso é proveniente do salário educação e cujos contratos estão em vigência. Não há porque interromper os contratos de fornecimento de alimentos às escolas e a sua comunidade”, ressalta Kruppa.

Para isso, a professora defende que deve haver um redirecionamento dos kits com alimentos básicos das escolas para as casas dos estudantes, por meio de brigadas, sempre respeitando as orientações de saúde. “Para isto, as direções das escolas deveriam assumir, com retaguarda pública e como política pública, a responsabilidade política de organização de brigadas de distribuição desse alimento nas escolas”, afirma.

Como ficou o oferecimento da merenda em outros estados?

Em Minas Gerais, a distribuição de alimentos será mantida, e os agentes de serviços gerais trabalharão de maneira escalonada. Em Pernambuco, no município de Salgueiro desde o primeiro dia de suspensão das aulas, cerca de 8 mil alunos recebem um kit com alimentos básicos. Em Recife, a prefeitura também iniciou a distribuição de kit alimentação para os estudantes, objeto de críticas por parte de familiares dos estudantes em relação à quantidade e qualidade da alimentação oferecida.

O mesmo acontece em Mato Grosso, em Barra do Garças, onde a cesta distribuída deve suprir a necessidade de crianças e familiares por 20 dias. Para retirar o kit, assim como no Paraná, é necessário comprovar que o aluno é beneficiário de Bolsa Família e que frequenta a escola regularmente.

No Distrito Federal, o governador Ibaneis Rocha determinou um auxílio financeiro às famílias de R$ 3,98 por refeição. O valor será pago de acordo com a situação de cada aluno, apurada pela Secretaria de Educação do estado e se divide em três faixas: os estudantes que fazem uma refeição por dia na escola terão acesso a R$ 59,70 para os 15 dias de suspensão; aqueles que fazem duas, R$ 119,40; e os alunos que fazem três refeições por dia na instituição de ensino, R$ 179,10. O próximo pagamento deverá ser feito na próxima quarta-feira (25).

Edição: Leandro Melito

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