Para corrigir os rumos da política industrial

De 2004 para cá o país redescobriu a importância de se ter uma atuação proativa do Estado, na formulação de uma política industrial. Até então, a única medida efetiva havia sido a criação dos fundos setoriais, ainda no governo Fernando Henrique Cardoso, que dotou respectivos setores de recursos para investimentos em inovação.

No governo Lula seguiram-se alguns planos iniciais de política industrial, lançados com algum estardalhaço, bons na formulação, precários na implementação – como costuma ocorrer com as políticas públicas brasileiras (com exceção das políticas sociais).

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Lançado em 2011, o Plano Brasil Maior (PBM) visou corrigir inconsistências dos planos anteriores. Houve um estudo detalhado dos setores a serem beneficiados, a maior parte dos esforços concentrada na correção de vulnerabilidades existentes, uma parcela menor destinada a setores portadores de futuro.

Ao mesmo tempo, foi criada uma agência – a ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial) – destinada a concentrar os estudos e as reuniões setoriais.

Conseguiu-se criar a metodologia para um fórum permanente de discussões setoriais, ajudando (em tese) na melhoria dos diagnósticos setoriais.

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No entanto, o novo desenho padece de uma vulnerabilidade muito bem diagnosticada por Mario G. Schapiro no estudo “Ativismo Estatal e Industrialismo Defensivo: Instrumentos e Capacidades na Política Industrial Brasileira”.

Para ganhar flexibilidade, a ABDI foi criada como uma organização do sistema S. Ganhou flexibilidade para atuar como coordenadora mas não ganhou o papel institucional de formuladora de políticas. O próprio Poder Executivo vetou parágrafo da lei que definia que a ABDI poderia, entre outros, “coordenar e promover a execução das políticas de desenvolvimento industrial”.

Na análise de Schapiro, o Ministério que mais participa das decisões do PBM é o da Fazenda – que não sabe e não foi criado para definir políticas setoriais.

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Sem uma entidade central, as políticas industriais tornam-se dispersas. Os funcionários de cada órgão participante ouvem as recomendações gerais. Mas, na hora das decisões, seguem a lógica própria de cada organização.

Esse problema já havia sido detectada por Glauxo Arbix, presidente da Finep (Financiadora de Estudos e Pesquisas), antes mesmo do lançamento do PBM. Por exemplo, no caso de startups (empresas iniciantes) a lógica é a de se investir em várias empresas, sabendo que apenas algumas irão vingar.

Mas a lógica dos agentes financiadores – especialmente do BNDES e da Finep – é o da minimização de riscos. Se investirem em dez empresas e nove forem bem sucedidas, no dia seguinte estarão às voltas com o TCU (Tribunal de Contas da União) e com o Ministério Púbico cobrando explicações sobre a empresa que não vingou.

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Em recente estudo sobre a política industrial na África do Sul, o economista Dani Rodrik apontou essa dispersão como o principal fator da não efetividade das políticas. Como não há um responsável pelo sucesso e pelo fracasso, as responsabilidades ficam diluídas.

Como a ABDI não decide, as reuniões setoriais tornam-se esparsas e os setores mais influentes preferem conversar diretamente com os Ministros mais influentes.

Luis Nassif

Luis Nassif

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  • rumos na política industrial brasileira

    Caro Luis Nassif.

    O Governo Dilma não precisa só corrigir a política industrial, embora a desindustrialização do Brasil seja muito evidente. Precisa também corrigir a política energética, a política de investimento em mobilidade urbana, a política de combate à violência, a política de infraestrutura de transporte (portos, ferrovias, rodovias, aeroportos), a política comercial voltada para o falido Mercosul, ou seja, os rumos de forma geral. É evidente que a correção necessária é na forma de administrar o Brasil. São 39 ministérios, ocupados por políticos premiados, cuja cadeira foi barganhada por minutos no horário de propaganda eleitoral. Desta forma não há administração de funcione.

  • Industrialização sem parceria ?

    A análise peca, quando não especifica que não basta o governo federal, via Ministérios responsáveis pelo desenvolvimento dos setores industriais, terem planos para alavancar este setor, se não tiver a contrapartida do setor privado. O Estado há tempos deixou de ser o condutor único do desenvolvimento do país, sendo ainda o indutor desta iniciativa, e o financiador, através do BNDES, das propostas acôrdadas entre as partes, e de ser o agente da fiscalização e da implantação do que foi acertado, na elaboração da dita política industrial.

    Lutamos tanto, pela independencia empresarial, e ao conseguirmos tal independencia, ainda dependemos do "velho e bom Estado" para gerar, adubar, garantir financiamentos a juros subsidiados, e garantia aos investimentos privados, porem para ter este suporte todo, não precisaríamos aceitar ser uma economia de mercado, aonde os atores têm que ter responsabilidades e correrem os riscos inerentes a todo e qualquer negócio e/ou investimento, ou então, voltemos à época em que o Estado, era o "dono" de tudo, estatista e lento, na condução do desenvolvimento nacional.

    Foi para isto, que brigamos tanto, para que os setores não essenciais, saisse das mãos improdutivas do Estado, e tivesse o empresariado como parceiro. Parceiros só dos lucros ? 

  • O Brasil tem que atacar

    O Brasil tem que atacar várias frentes, do contrário o cenário não será nada positivo:

    - reduzir taxa de juros, porque a indústria prega que seu lucro deve estar acima do que ganha o mercado financeiro senão seria mais interessante fechar as portas e investir nesse setor;

    - reduzir em muito a burocracia tributária (obrigações acessórias) e o número de tributos (rever as competências tributárias dos entes federativos), que faz com que tenhamos um sistema tributário esquizofrênico, caótico, custoso, pouco transparente, que culmina em inúmeros recursos administrativos e judiciais (obs: ninguém falou aqui em carga tributária, que fique claro aos apressadinhos);

    - acabar com a formação de cartéis - o que lemos nas manchetes não reflete um quarto do que acontece Brasil afora (e nem estou falando de metrô);

    - acabar com a ideia de que o empresário tem que recurar o investimento em um ou dois anos;

     

    Além de tudo, continuar investindo em educação, inclusive voltada à tecnologia. O que um saldo superavitário, da balança comercial de 2013,  no valor de US$ 2.557.744.368 demonstra?

    Não muito, mas se começarmos a detalhar os números veremos que só ficou positivo porque houve exportações no valor de US$ 7.299.102.939 referente a "embarcações e estruturas flutuantes".

    Além disso, veremos, por exemplo, que 50% por saldos superavitários quando analisados NCM por NCM se concentram em apenas 9 NCM, a saber, produtos primários:

    US$ 25.996.239.67826011100 - MINERIOS DE FERRO NAO AGLOMERADOS E SEUS CONCENTRADOS US$ 22.678.861.55512019000 - SOJA, MESMO TRITURADA, EXCETO PARA SEMEADURA US$ 9.155.407.14117011400 - OUTROS ACUCARES DE CANA US$ 7.734.079.97889052000 - PLATAFORMAS DE PERFURACAO/EXPLORACAO, FLUTUANTES, ETC. US$ 6.495.284.10626011200 - MINERIOS DE FERRO AGLOMERADOS E SEUS CONCENTRADOS US$ 6.109.520.07710059010 - MILHO EM GRAO, EXCETO PARA SEMEADURA US$ 6.101.102.58523040090 - BAGACOS E OUTROS RESIDUOS SOLIDOS, DA EXTRACAO DO OLEO DE SOJA US$ 4.820.831.28047032900 - PASTA QUIM.MADEIRA DE N/CONIF.A SODA/SULFATO, SEMI/BRANQ US$ 4.582.226.59009011110 - CAFE NAO TORRADO, NAO DESCAFEINADO, EM GRAO  Por outro lado, 50% dos saldos deficitários quando analisados NCM por NCM se espalham por 126 diferentes NCM, sendo muitos produtos com alta tecnologia agregada: - US$ 7.983.548.17627101921 - GASOLEO” (OLEO DIESEL) - US$ 4.458.956.33827101241 - NAFTAS PARA PETROQUIMICA - US$ 3.877.550.87427112100 - GAS NATURAL NO ESTADO GASOSO - US$ 3.363.381.90727090010 - OLEOS BRUTOS DE PETROLEO - US$ 3.315.511.91831042090 - OUTROS CLORETOS DE POTASSIO - US$ 3.218.598.85485299020 - OUTS.PARTES P/APARELHOS RECEPT.RADIODIF.TELEVISAO, ETC. - US$ 2.811.903.45327111100 - GAS NATURAL, LIQUEFEITO - US$ 2.078.173.52410019900 - OUT.TRIGOS E MISTURAS DE TRIGO C/CENTEIO, EXC.P/ SEMEAD - US$ 2.064.793.24387042190 - OUTROS VEICULOS AUTOMOVEIS C/MOTOR DIESEL, P/CARGA<=5T - US$ 2.042.005.95885177099 - OUTS.PARTS.P/APARS.D/TELEFONIA/TELEGRAFIA - US$ 1.950.943.40927011200 - HULHA BETUMINOSA, NAO AGLOMERADA - US$ 1.913.520.48227101259 - OUTRAS GASOLINAS, EXCETO PARA AVIACAO - US$ 1.645.806.09387032310 - AUTOMOVEIS C/MOTOR EXPLOSAO, 1500<CM3<=3000, ATE 6 PASSAG - US$ 1.568.758.05627101911 - QUEROSENES DE AVIACAO - US$ 1.410.660.51685423120 - MICROPROCESSADORES MONT.P/SUPERF.(SMD) - US$ 1.326.720.91787084080 - OUTRAS CAIXAS DE MARCHAS - US$ 1.299.623.75831021010 - UREIA COM TEOR DE NITROGENIO>45% EM PESO - US$ 1.253.412.67838089199 - OUTROS INSETICIDAS, APRESENTADOS DE OUTRO MODO - US$ 1.251.555.58531054000 - DIIDROGENO-ORTOFOSFATO DE AMONIO, INCL.MIST.HIDROGEN.ETC - US$ 1.183.757.35874031100 - CATODOS DE COBRE REFINADO/SEUS ELEMENTOS, EM FORMA BRUTA - US$ 1.095.393.80787032100 - AUTOMOVEIS C/MOTOR EXPLOSAO, CIL<=1000CM3 - US$ 1.049.553.33487082999 - OUTRAS PARTES E ACESS.DE CARROCARIAS P/VEIC.AUTOMOVEIS - US$ 951.803.65285423939 - OUTROS CIRCUITOS INTEGRADOS MONOLITICOS - US$ 947.657.32927111290 - OUTROS PROPANOS LIQUEFEITOS - US$ 864.627.91730021039 - OUTS.FRACOES DO SANGUE, PROD.IMUNOL.MODIF.(MEDICAMENTOS) - US$ 788.309.21488033000 - OUTRAS PARTES PARA AVIOES OU HELICOPTEROS - US$ 725.985.39185423190 - OUTROS CIRCUITOS INTEGRADOS - US$ 708.223.50630021038 - ANTICORPO HUMANO C/AFIN.ESPECIF.ANTIGENO TRANSMEMBRANAL - US$ 649.479.43085177010 - CIRCUITOS IMPR.C/COMP.ELETR./ELETR.MONTADOS - US$ 594.961.62684119100 - PARTES DE TURBORREATORES OU DE TURBOPROPULSORES 

  • FHC

    Duas contribuições deu o FHC para a indústria brasileira:

    O apagão elétrico, incluído o caixa 2 de Itaipu que financiou o PSDB.

    O projeto de Corredores de Exportação. Contratou uma consultoria extrangeira que partiu da nossa "vocação" de exportador agrícola de  produtos primários (esquecendo a industrialização dos últimos 70 anos) e fez um projeto em 15 dias que mudaria (para pior) a dinamica econômica e social brasileira, sedimentando o papel de colônia de exploração dos países industrializados. Não saiu do papel, o presidente estava ocupado sendo bajulado no exterior.

    Doctore FHC, o pusilânime.

      • Você deveria desconfiar

        Você deveria desconfiar destas premiações. A reportagem-confete da globo que você indica, pinta FHC como um nobel, citando o FHC visonário que hà 50 anos já previa a globalização. Ridículo. FHC não fez nada mais que papagaiar as teorias de dominação yanke. Dentre as "dezenas" de publicações do figurão está o livro Dependência e Desenvolvimento na América Latina, creio que seja a publicação que mais encantou os senhores congressistas norteamericanos, além é claro de ter entregue nossa soberania na bandeja quando acatou pusilanimemente o Consenso de Washington. FHC é uma triste figura como nassa elite, cujos feitos ruins superam em muito os feitos bons e que só não deve ser esquecido para que não repitamos o erro, por nada que só tem voz na mídia corporativista e só é premiado nos EUA e vassalos.

  • Só uma correção, Nassif. A

    Só uma correção, Nassif. A ABDI foi criada em 2004, no governo Lula. No texto, dá a impressão que ela foi criada em 2011, junto com o PBM.

     

     

  • De 1940 a 1980 o Brasil teve

    De 1940 a 1980 o Brasil teve políticas indústriais que mudaram o panorama da economia nacional graças ao modelo de substituição das importações (até hoje o melhor) graças principalmente a 3 governantes (Getúlio, Juscelino e Geisel).

    A partir dos anos 80 houve medidas isoladas:

    - A lei da Informática no governo Figueiredo, importante para consolidar essa base industrial e que permitiu ao país eleições informatizadas;

    - A lei dos Genéricos, criada no governo Itamar pelo ministro da Saúde Jamil Haddad (apesar de atrelada ao período FHC) ajudou a montar uma base industrial de medicamentos no país a medida que o Sistema Universal de Saúde consolidava;

  • Em relação aos governos do PT:

    Os setores da indústria nacional que mais cresceram foram Informática e Bens de Capital, setores de ponta.

    Informática está relacionada a lógica do consumo (avanço da internet e tecnologias da informação), de bom o mercado nacional ser liderado por uma empresa nacional (Positivo Informática) de ruim o país importar muitos componentes (chips, placa-mãe, modem, etc) que poderiam ser fabricados aqui.

    Como a Indústria Naval, o setor de Bens de Capital não cresceu entre 1980-2003, quando fabricantes de máquinas crescem mais que o restante da indústria é desmentida a tese da desindustrialização.

    Há boas políticas industriais conduzidas pelos ministérios da Saúde e da Defesa

    O erro do PT está na falta de atenção a desnacionalização e ter trocado Carlos Lessa por Luciano Coutinho.

    Nunca se vendeu tanto carro, mas não fizeram nada para desenvolver no país uma indústria inteiramente nacional, estamos dependentes até de veículos chineses.

  • Não entendo porque Lula e

    Não entendo porque Lula e Dilma não nomearam o presidente da ABIMAQ (Luiz Aubert) como ministro do Desenvolvimento, um dos poucos empresários ligados ao governo que contrapoem aos reacionários do agronegócio, até inaugurar um escritório em Caracas para assessorar a industrialização bolivariana ele fez.

  • E o nome do modelo econômico é...

    ... keynesianismo de compadrio, um modelo 100% verde e amarelo, em que se "emprestam" recursos do FGTS a juros subsidiados para empresários que poderiam facilmente captar recursos aqui ou no exterior, O resultado é expor ao risco os recursos que irão compor as aposentadorias de todos os trabalhadores brasileiros em nome do (essa agora é a melhor) Projeto Brasil Maior. Maior pra quem? Só para os amigos do reizinho que estiver de plantão.

     

     

  • Lendo todos os comentários,

    Lendo todos os comentários, todos apontam que o Brasil deva fortalecer seu mercado tecnológico e industrial. Existe um problema: Será que os países exportadores de tecnologia e maquinários permitirão isto?

    Acredito que passamos deste ponto, esta discussão deveria ter sido feita na década de 60, hoje estamos a merce de poderosos grupos globalizados. Criar um empresa nacional de automóveis seria condena-la a falência e um prejuízo enorme ao estado em seu financiamento.

    Patentes protegem a maioria de tudo que está em circulação, imaginem tentar criar alguma coisa que não exista, é isto que emperra o mercado brasileiro. Qualquer coisa de tecnologia nacional ficará preso as barreiras de patentes internacionais, sujeitas as sansões internacionais de propriedade intelectual.

    Somos explorados? Sim, somos explorados! A questão é para quem iremos reclamar num universo onde cada um protege seu interesse, querem que o Brasil seja um exportador de grãos para a humanidade, assim escravizando seu povo para este intento.

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