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A cara aventura de jantar fora em São Paulo

A aventura de jantar fora em São Paulo

Vou propor um fora de pauta inusitado. Ou nem tanto, já que um dos assuntos do Blog do Nassif é a economia. Discutir o risco envolvido em sair hoje para um simplório jantar com a família nos restaurantes de São Paulo. E não pensem que vamos entrar no terreno das precariedades da nossa segurança pública. Já faz certo tempo que é possível ser assaltado nos restaurantes paulistanos sem o concurso da bandidagem, digamos assim, ortodoxa.

Dou exemplos: há tempos me incomoda o que eu considero um certo abuso nos preços dos restaurantes da capital paulista. E não falamos aqui de D.O.M.s, Fasanos, Rubayats e quetais, templos mui distantes das minhas modestas possibilidades gastro-econômicas. Falo dos restaurantes de bairro, a pizzaria simpática, a churrascaria honesta, a cantina divertida – locais aonde podemos convidar os amigos para um jantar despretensioso após o cinema, ou onde arriscamos reunir nossa família nos almoços dominicais.

Nos últimos anos, esse programa banal tem se convertido em aventura plena de emoções. Que pai de família não sente a adrenalina pulsando ao abrir um cardápio e encontrar uma pizza Marguerita comum beirando os R$ 50,00. Ou o nosso bom e velho conhecido “filet à cubana” na faixa dos R$ 80,00.  Ou ainda um popular frango a passarinho por surpreendentes R$ 42,00. Pois são esses os precos atualmente praticados respectivamente na Pizzaria Speranza da Rua 13 de Maio (no Bexiga) na Osteria Del Generale da Rua Pamplona, (imediações da Av. Paulista) e no Bar Frangó do Largo da Matriz (Freguesia do Ó). Quem as conhece sabe que são casas tradicionais, conhecidas pela boa comida, mas que estão longe, muito longe de poderem ser consideradas como “sofisticadas” ou “luxuosas”. Aliás, muito pelo contrário.

E não pensem que esses preços são exceções à regra. A praga se alastra a locais inusitados. Ontem, Dia dos Pais, saímos para jantar, eu a mulher e os dois filhos pequenos. Decidimos revisitar um antigo e simpático restaurantezinho italiano, onde há muito não íamos, escondido nas ruas escuras e vazias do bairro do Cambuci: a Cantina 1020. Casa simples, decoração tradicional com toalhas xadrez nas mesas, fotos e posteres do Palmeiras e da Azzura nas paredes. A velha e boa cantina de bairro paulistana, a muitos quilômetros da badalação dos Jardins e do Itaim Bibi.

Quase caí da cadeira quando abri o cardápio: um simples prato de “espaguete a bolonhesa” (a popular “macarronada” da casa da nonna) custa agora a bagatela de R$ 64,90. O Filet a Parmegianna roçava perigosamente a faixa dos R$ 90,00. É verdade que as porções são relativamente fartas (a massa serve duas pessoas), mas pagar mais de R$ 32,00 por um prato simples de macarronada (fora o couvert, as bebidas, os 10%, etc) numa cantina modesta aproxima-se perigosamente da categoria “assalto à mão desarmada”.

Chovia e garoava na rua, as crianças cansadas e com fome: fazer o que? Encaramos a parada. Dispensamos o couvert, dividimos os quatro um filet a parmegianna (acompanhava arroz e fritas) e meio prato de espaguete na manteiga (o prato custava R$ 54,90, meio saiu por R$ 28,00). Para beber, dois sucos para as crianças, uma água mineral e 1/2 jarra de um sofrível vinho tinto da casa. Total da brincadeira: R$ 174,00. R$ 43,50 por pessoa, isso incluindo na divisão duas crianças de 6 e 10 anos. Estivessemos só eu e minha mulher, a conta certamente não sairia por menos de R$ 70 per capita.

Consulto diversos guias de viagem na Internet e vejo que é possível jantar em restaurantes bons e modestos do bairro do Trastevere, em Roma (como o Mea Pataca, o La Fraschetta ou La Cantina Del Grillo) por valores entre 25 e 30 Euros (R$ 50 a R$ 60). No popular Caffè Macaronido bairro italiano de São Francisco, nos EUA (muito semelhante às nossas cantinas) os pratos principais custam entre US$ 9 e US$ 15 (R$ 15 a R$ 25). No pequeno e simpático Barbarini Alimentari, de Nova York, próximo ao Distrito Financeiro no sul de Manhattan, a porção deFettuccine alla bolognese também custa US$ 15. E entre as 16h30 e 19h, há a opção de um menu especial (entrada, prato principal e sobremesa) por US$ 19,95.

Como os restaurantes de SP seguem lotados, entendo que há duas opções: ou apenas eu estou muito pobre e ainda não me dei conta disso, ou alguma coisa está fora da ordem mundial nos preços que os consumidores aceitam pagar nos restaurantes ditos “populares” da nossa Capital.

Quem paga R$ 32,50 por um prato de macarronada? Nós, os paulistanos.

Luis Nassif

Luis Nassif

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