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A diplomacia do álcool

Coluna Econômica – 13/03/2007

Para analisar os resultados do encontro entre George W. Bush e Lula, é necessário entender um pouco a lógica diplomática e comercial norte-americana.

O grande avanço possível é o acordo para transformar o etanol em “commodity” – ou seja, em produto padronizado. Conquista-se esse status padronizando o produto. Conquistado esse status, há desdobramentos relevantes, o principal dos quais a criação de um mercado internacional de etanol, com a produção mundial obedecendo às especificações.

Esse é o ganho líquido e certo. O restante são hipóteses. E aí entra a grande volatilidade que marca a diplomacia comercial americana, da qual o Brasil foi beneficiário e vítima dos anos 40 aos anos 70.

No início dos anos 40, Franklin Delano Roosevelt, estimulado por seus assessores Sumner Welles e Nelson Rockefeller, acertou um projeto de desenvolvimento para o Brasil. Compromisso firme e garantido… enquanto Roosevelt viveu. Foi relevante, permitindo a criação da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). Esse clima de boa vontade foi essencial para que grandes amigos do Brasil, como o embaixador Adolfo Berle Jr ajudassem a bloquear as ações da Standard Oil, visando impedir a implantação de refinarias no país.

***

Morto Roosevelt, substituído por Truman, os compromissos mudaram. Em vez de financiar o desenvolvimento, sucessivas missões foram incumbidas de “ensinar” o Brasil a buscar fontes internas de financiamento para seus projetos.

Foi assim com o Plano de Reaparelhamento Econômico, as Missões Cooke (42-43), Abbink (1948) e o Plano Salte (1946-1950) até desaguar no chamado Plano Lafer e na Comissão Mista Brasil-Estados Unidos, passando por dois encontros diplomáticos decisivos, a III Reunião de Consulta dos Ministros das Relações Exteriores das Repúblicas Americanas, e a IV Reunião, já nos anos 50.

Esse é o acervo de iniciativas que permitem deslindar o período, um tempo em que o Brasil aprendeu a identificar seus pontos críticos, a planejar seus projetos e a política econômica a ganhar foco. Mas, recurso que é bom, entrou muito pouco.

***

Nos anos 40, a prioridade no Brasil durou o período exato da Segunda Guerra. Terminado o conflito, a Europa tornou-se prioritária, sendo beneficiada pelo Plano Marshall.

No final da década, houve outra ação decisiva, em cima da Comissão Mista Brasil-Estados Unidos. Foram definidos projetos em que os EUA entrariam com recursos, atrelados à contrapartida de recursos brasileiros.

As intenções esbarram em dois problemas. Do lado brasileiro, a inclusão de muitos projetos acima da capacidade do país de entrar com contrapartidas. Do lado americano, a eclosão da Guerra da Coréia, que inverteu novamente as prioridades do Império.

Mais tarde, a ajuda foi retomada com John Kennedy, tendo o mesmo Berle Jr como inspirador. Morto Kennedy, morreu a prioridade.

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Depois disso, já no governo Geisel as relações entre ambos os países entraram na geladeira. Houve aproximação entre Fernando Henrique Cardoso e Clinton; e agora entre Bush e Lula. Mas o interesse de Bush parece muito mais o de contentar o eleitorado hispânico dos EUA do que tratar o Brasil como parceiro prioritário.

Para incluir na lista Coluna Econômica

Luis Nassif

Luis Nassif

View Comments

  • A lembrar a influência que a
    A lembrar a influência que a revolução castrista de 1959 teve na politica do Departamento de Estado em relação à AL. O temor do espraiamento do castrismo orientou boa parte da ação da Subsecretaria para Assunstos Latino Americanos de 60 a 80 e explica boa parte do apoio americano aos regimes militares dessa época.
    Tambem relevante a ação do Presidente JK ao agulhar o Governo Americano e através de uma ação diplomática concentrada, a Operação Panamericana, conseguir extrair a forceps o BID-Banco Interamericano de Desenvolvimento, uma idéia do Brasil, criado em 1960 por inspiração direta de JK. Na realidade a politica do Departamento de Estado com relação ao Brasil sempre foi especifica e não se confundiu com àquela dirigida aos paises de fala espanhola.
    O Brasil, pela sua dimensão e peso internacional, não deve agir diplomàticamente como Estado-cliente, que depende do que os EUA farão. Não precia dos EUA rigorosamente para nada e nem os EUA tem dado qualquer coisa ao Brasil, ao contrário, é um dos países que tem maiores problemas alfandegários com os EUA, no açucar, etanol, suco de laranja e aço, todos sobretaxados.
    Portanto o atual patamar das relações Brasil-EUA é bem diferente até dos tempos de JK. Hoje o Brasil não precisa e não espera nada dos EUA, cada qual que defenda seus interesses e faça seus acordos, é esse o degrau onde se encontram de uma forma ou de outra os grandes emergentes: Brasil, Russia, India e China. O México, apesar de seu PIB, é um caso separado, depende muito mais dos EUA e tem graves e especificos problemas com seu vizinho.

  • http://www1.folha.uol.com.br/
    http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi1303200713.htm

    Ou seja,

    empresários brasileiros (sejam descendentes de portugueses, judeus, libaneses ou italianos) tem a grande chance de se reunir num consórcio e captar dinheiro privado e público (do BNDES) para montar e/ou incrementar a rede de pesquisa biotecnológica, tendo como gancho o etanol celulósico (já há algumas plantas produzindo em escala quase comercial no exterior).

    Mas perdem tempo, marcam touca.

    Acho que eu vou mandar um outro e-mail para a Unicamp para ver se dessa vez o professor me atende...

  • PRecisam do produto, mas por
    PRecisam do produto, mas por enquanto querem que os fornecedores sejam exclusivamente de lá.

  • Luis,

    eu gostaria de
    Luis,

    eu gostaria de entender por que o nosso presidente não comanda o nosso país com a mesma garra que ele demonstra nos palanques,
    que em meu entender se porta como um leão e na hora de agir, principalmente na política externa se porta como um ratinho, vide caso da Bolívia e agora com os EUA.
    Sinseramente espero não estarmos num barco furado.

  • Para os USA o Brasil não
    Para os USA o Brasil não passa de um Pais pobre, sub-desenvolvido que tem um povo semi- nalfabeto e não faz porte do contesto mundial, os USA não levam a sério o Brasil.Por isso nossos governantes deveriam focar mais nossos problemas e dar prioridades ao nosso Pais pelo muito que se há de fazer por aqui.

  • É por aí sim. Mas o Geisel
    É por aí sim. Mas o Geisel promoveu um distanciamento dos EUA. O ajuste de Campos e Bulhões foi no governo Castello, e acho que o apoio estava muito mais ligado aos interesses financeiros do grande capital, em ter uma economia mais estabilizada.

  • Sanzio, tenho bons
    Sanzio, tenho bons depoimentos para meu livro, de pessoas da época que conviveram com o staff de Kennedy, de que a Aliança foi resultado da Operação Panamericana (deflagrada por JK) e da volta ao poder dos conselheiros de Roosevelt, que sempre buscaram aproximação com a América Latina.

  • BUSH é um paranóico,
    BUSH é um paranóico, psicótico impedioso.Não gosta de ninguém, e muito menos de LULA. Já, CLINTON, além das afinidades que tinha com F H C,é mais ''humano''.
    Quando vc diz ''parece'', leia-se: é( e mais nada).A visão de CLINTON, é completamente antagônica a de BUSH. Não se esqueçamos, de BUSH governador, e suas penas de mortes sádicas.DE certa forma , esse sadismo panóico, estendeu-se , numa escala tremendamente superior, ao se tornar presidente.E pra isso, deveu-se a ALL GORe, que mesmo ganhando, em nome do país, assumiu a derrota.Talvez seja, um dos únicos casos da história, que teve concomitantemente duas personalidades tão distintas: A magnitude de ALL GORE, e a pequenês de BUSH. ENtão, NASSIF, esperar o que de BUSH? Qualquer avaliação que fizer a respeito do presidente dos EUA, não pode ser considerada.
    ps: Quando te assistia na tv cultura, notei claramente a sua singeleza, simplicidade e até uma certa ingenuidade.Ingenuidade para o bem, por acreditar nas pessoas, por ser lúdico, admirador de músicas, compositores e instrumentos antigos( ou pelo menos ,não tão usuais).
    E faços essas considerações, porque sou abalizado pra faze-las.É óbvio, que são apenas consideraçôes, precisaria de um contacto, que não possuo com nenhum dos citados. Mas, não está muito distante não....
    Abraços!!!

  • Olha que texto bonitinho...
    Olha que texto bonitinho...

    Um consórcio para o etanol celulósico

    A recente vinda do Presidente Bush ao Brasil intensificou o debate sobre a produção de etanol e biocombustíveis em geral no País. É certo que com a escassez cada vez maior do petróleo, um crescente esforço será dirigido para o desenvolvimento de fontes de energia alternativas, e o etanol, assim como o biodiesel, figura entre as opções contempladas.

    Ocorre que os meios empresariais, científicos e governamentais do País, no que concerne ao etanol, vêm perdendo muito tempo. Perdem muito tempo focando exclusivamente no álcool combustível hoje produzido por meio da fermentação da sucrose (ou sacarose), na produção da qual a cana-de-açucar é o organismo biológico mais eficiente.

    Isso porque a alternativa do etanol da celulose oferece um potencial econômico muito maior ao País no médio e longo prazos no concernente à produção do biocombustível, assim como, no curto prazo, é uma oportunidade única para o desenvolvimento do nosse setor de pesquisa biotecnológica.

    A celulose é uma substância onipresente nas plantas, o que vale dizer que são inúmeros os organismos vegetais aptos a produzi-la, inclusive os que hoje utilizamos em parte para diretamente ou indiretamente nos alimentar. A viabilização da produção do etanol da celulose, portanto, já aí começa a mostrar o seu diferencial - pois a quantidade de cultivares, de plantas aptas a serem melhoradas geneticamente, aumenta vertiginosamente, assim como a possibilidade de co-produção de vários alimentos com a matéria celulósica. A própria cana-de-açucar passa a ser muito mais produtiva em etanol.

    Sendo muito maior a quantidade de cultivares, de plantas aptas para a produção de etanol, muito maior passa a ser, além da possibilidade de melhoramento genético, a área cultivável para a produção do biocombustível, pois a maior diversidade de plantas disponíveis torna igualmente mais diversos os climas e solos aptos para a produção de matéria prima.

    A produção do etanol com base na sacarose da cana sem dúvida oferece ainda um grande potencial. Mas esse potencial é limitado, considerada uma escala realmente relevante de produção, pela competição com a produção de alimentos e problemas ambientais. É possível antever uma grande pressão contra o crescimento das lavouras de cana, inclusive por regulação do Poder Público, a partir desse argumento.

    Neste ponto, torna-se importante discutir quais são as presentes limitações para a produção do etanol celulósico e quais os diferenciais do Brasil para uma atuação de destaque nesse setor.

    Quanto às atuais limitações à produção comercial do etanol da celulose, residem elas no fato de que essa substância, para servir de matéria prima do etanol, precisa ser antes "quebrada" numa molécula de açucar, por meio de um processo denominado "hidrólise enzimática". O problema é que as enzimas hoje disponíveis para o processo são produzidas a um custo relativamente alto, e têm uma baixa produtividade.

    Daí a necessidade de pesquisa e desenvolvimento voltado para o barateamento e aumento de eficiência dessas enzimas e do aparato utilizado no processo, um esforço que hoje se mostra muita mais viável, graças ao grande progresso havido no setor biotecnológico.

    E onde entra o Brasil nisso ? Ora, o Brasil, se não é o primeiro, certamente é um dos países que oferece a maior extensão de terras com potencial agrícola no mundo. Isso sem derrubar nenhum quilômetro quadrado a mais de matas nativas. Parte dessa grande extensão de terras pode ser usada, de modo inteligente, para a captação de recursos voltados para a constituição de um consórcio voltado para a pesquisa e implementação da produção do etanol celulósico no País.

    Mais especificamente, o financiamento para as atividades desse consórcio viria de duas formas - por meio da iniciativa governamental, consubstanciada numa garantia de retorno mínimo ao empreendimento, a médio prazo, pelo BNDES (sem necessariamente o aporte de recursos imediato), combinada com uma captação de recursos junto à iniciativa privada.

    O valor da garantia seria diretamente proporcional ao ingresso de recursos privados no empreendimento, cujos ganhos seriam lastreados nas patentes eventualmente registradas pelo consórcio, bem como pela utilização direta ou indireta de direitos de arrendamento de áreas agrícolas para a produção do etanol, em caráter exclusivo ou em combinação com a produção de alimentos ou outras commodities agrícolas.

    E quem pode dar efetivo valor a esse "lastro" é o próprio governo brasileiro, principalmente por meio de uma legislação apropriada, que condicione a emissão e utilização desses direitos, ou a incentive, exigindo como contrapartida o aporte de recursos em iniciativas que ao mesmo tempo sejam voltadas para o esforço de pesquisa acima referido e tragam o aperfeiçoamento da infraestruta de pesquisa e produção biotecnológica do País.

    Portanto, os meios empresariais, científicos e o Poder Público brasileiros têm uma oportunidade única nas mãos, com um potencial imenso de atração de recursos internos e externos no aprimoramento do "agribusiness" e da infraestrutura de ciência e tecnologia nacionais.

    Mas é bom correr, pois no exterior não se faz "corpo mole", e várias empresas tem capitalizado sobre a idéia do etanol celulósico, bastando dizer que já há unidades de produção em escala quase comercial nos Estados Unidos e no Canada, com bilhões de dólares em investimento público e privado envolvidos.

    É bom aproveitar enquanto o diferencial brasileiro ainda persiste.

  • De maneira geral os
    De maneira geral os Democratas tem um relacionamento mais denso com a América Latina, com uma pauta maior que inclue áreas economicas, culturais e de direitos humanos. Já os Republicanos, tb de maneira geral, só tem interesse em temas estratégicos.
    Sintomática é a armadura usada na burocracia do State Dept. para lidar com a AL. O Subscretário do Hemisfério Ocidental, que trata
    da AL, Tom Shannon, veio do Conselho Nacional de Segurança da Casa Branca, que só lida com estratégia, do mesmo lugar de onde veio sua chefa, Condy Rice.
    Como consequência, eles só tem interesses estratégicos, nada para economia e cultura e é nessa moldura que se insere a visita de Bush. O interesse estratégico é ter no banco de reserva da matriz energética o etanol disponível, para se livrar em parte da dependência de fornecedores instáveis de petroleo. Nada mais.
    O etanol nem precisa vir agora, basta preparar o terreno para uma futura suplementação ao petroleo. Pode demorar 20 anos, tempo do planejamento estratégico do Departamento de Energia. Importa é a direção e Bush veio aqui plantar a estratégia, jogar a isca.
    Quanto ao voto hispânico, existem duas vertentes : a classe média já absorvida, como os cubanos da Florida vota em geral nos Republicanos. Mas a maioria é de outro grupo, o dos imigantes mais recentes, que não votam mas influenciam o voto dos que podem votar. Esses estão sendo perseguidos e espezinhados pelo bushismo e seguramente votarão nos Democratas. Os pitbulls do Serviço de Imigração estão fazendo coisas antes nunca feitas com os imigrantes sem green-card, como prender e algemar no local de trabalho, de onde o infeliz é deportado sem poder falar com afamilia. Fizeram isso agora no frigorifico Swift em Illinois com 220 imigantes. Muitos hispânicos, mesmo já assimilados, estão indignados com essa humilhação, simbolizada pelo inacreditável muro na fronteira mexicana, e os Republicanos estão perdendo votos na vasta comunidade hispânica. O tema da imigração vai ser central na definição do voto hispânico nas próximas eleições. Todo imigante, documentado ou não, tem preocupação com o assunto, tem parentes que querem vir ou retornar ou tem amigos em situação de perigo. É mais um estrago que Bush fez e vai custar bem caro consertar.

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