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A gestão de Ben Bernanke no BC americano

Do The Wall Street Journal

Bernanke tornou o BC americano mais consensual

Por JON HILSENRATH

Em seus seis anos como presidente do Federal Reserve, o banco central americano, Ben Bernanke já fez coisas impensáveis, como levar os juros para perto de zero e manter a taxa nesse nível por anos, mais do que triplicar o tamanho de sua carteira de títulos de investimento, resgatar instituições financeiras das quais o Fed nem é o regulador.

Mas essas ações radicais acabaram ofuscando a maneira como ele mudou o próprio banco central. Sob sua liderança, o Fed se tornou mais aberto sobre seus planos para a economia e sobre seus debates internos, que às vezes são intensos. Bernanke também tornou a instituição mais voltada ao consenso. As decisões anunciadas pelo Fed semana passada foram típicas de Bernanke em todos esses aspectos e terão efeitos duradouros sobre como o banco opera.

O Fed tomou duas medidas. Primeiro, ele publicou projeções detalhadas para os juros feitas por cada um dos 17 diretores que participam de decisões de política monetária, sem identificar o diretor pelo nome. Segundo, publicou suas metas para inflação e desemprego mais explicitamente do que já fizera antes.

Xinhua / Zuma Press
Ben Bernanke, presidente do Fed

A primeira medida — publicar as diferentes visões dentro do Fed sobre como os diretores acreditam que os juros devem se comportar — tem o efeito prático de dar voz ao comitê no qual o presidente do Fed opera. É mais um exemplo de Bernanke tentando mostrar que lidera por consenso.

Bernanke acredita nas pesquisas de Alan Blinder, um professor de Princeton e ex-vice-presidente do Fed, que mostra que grupos costumam ser mais eficientes em tomada de decisões do que indivíduos. Os predecessores de Bernanke — Alan Greenspan, Paul Volcker e Arthur Burns — atuavam mais pela força individual. Bernanke assumiu o Fed em 2006 disposto a mudar isso.

A medida da semana passada foi um passo importante nessa direção. Bernanke salientou isso, e a possibilidade de que ele não continue no cargo quando seu primeiro mandato terminar em 2014, numa entrevista coletiva. “A gestão do presidente não é infinita”, disse ele. “A uma certa altura, haverá um novo presidente. Mas há muito mais continuidade no [Fed] coletivamente.”

Se um novo presidente do Fed assumir daqui a dois anos disposto a fazer mudanças radicais na política monetária, essa pessoa enfrentará o fato desconfortável de que as visões de seus colegas estão abertas para quem quiser ver.

Ainda assim, a transição não foi fácil. Consenso no Fed também implica uma cacofonia muitas vezes confusa entre os diretores sobre que medidas tomar. Uma análise mais detalhada da pesquisa de Blinder pode ajudar a mostrar por quê. Blinder e John Morgan, um professor da Universidade da Califórnia em Berkeley, tiraram suas conclusões depois de conduzirem experimentos em tomada de decisão por parte de grupos com estudantes da universidade na década passada. Eles nunca analisaram o desempenho de grupos maiores do que oito pessoas, diz Blinder. Eles queriam manter os grupos com tamanhos modestos em parte porque temiam que os estudantes pudessem partir para alguma outra atividade no campus no meio do experimento.

O Fed é um grupo muito maior. “Dezessete pessoas não podem dirigir nada em conjunto”, diz Blinder. Isso ajuda a explicar a cacofonia, e também por que Bernanke, apesar de sua devoção pelo consenso, muitas vezes achou melhor se impor para levar o grupo aonde ele quer que o grupo vá, e seu eventual sucessor poderá fazer o mesmo.

A dinâmica de grupo no Fed é mais complexa também porque nem todos esses 17 diretores votam em reuniões de política monetária. O banco central americano é dividido em 12 regionais, cada uma com seu próprio presidente, e só 5 desses presidentes votam nas reuniões que decidem a meta de juros, em rodízio, o que implica que sempre haverá 7 pessoas que podem falar mas não decidir.

Na reunião da semana passada, parecia haver uma certa tensão entre a visão coletiva do grupo de 17 diretores na reunião e o grupo de 10 que votaram. A previsão mediana do grupo de 17 punha os juros a 0,75% no fim de 2014. O comunicado da decisão aprovado pelos dez que votaram sugeria que o Fed esperava taxas perto de zero “pelo menos até fins de 2014”, que pende um pouco mais para juros menores do que as previsões sugeriam. Bernanke disse, numa entrevista coletiva mais tarde, que a visão dos diretores que votam sempre “triunfará” sobre o grupo maior. Os votos do Fed são obrigatórios por lei.

O segundo passo — publicar metas mais específicas para inflação e desemprego — é algo que Bernanke quer faz tempo. Michael Bordo, um historiador econômico da Universidade Rutgers, no Estado de New Jersey, diz esperar que essa medida ponha o Fed na direção de uma política mais sistemática, depois de vários anos do qu parece ter sido tomada de decisões ad hoc.

Para quem teme que o Fed vá permitir que a inflação suba muito, o banco central agora afirma com mais ênfase do que nunca que quer manter a inflação em torno de 2%. Ainda assim, Bernanke disfarçou um pouco esse ponto, observando que se a inflação ficar acima da meta e o desemprego também estiver alto, ele pode optar por tentar por um pouco mais tempo derrubar a inflação com uma política monetária restritiva.

Bordo diz que o Fed “perdeu muita credibilidade” com suas ações durante a crise financeira. Ele acha que a meta de inflação tem uma chance de pôr o banco central numa rota mais constante, “mas não sei se eles já estão nela”.

Luis Nassif

Luis Nassif

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