Categories: Crime

As causas das mortes de mais de 1 milhão nos últimos 30 anos

Os impressionantes dados mostrados ao Brasil, nesta quarta-feira 14/12/11, pelo Mapa da Violência 2012, precisam ser objeto de reflexão e análise pelos estudiosos do tema. No Brasil, nos últimos 30 anos, matou-se mais do que em muitos conflitos armados duradouros. Enquanto a disputa religiosa entre Israel e Palestina, entre 1947 e 2000, foi marcado pela morte de 125 mil pessoas e a guerra civil da Guatemala, durante 24 anos, deixou um rastro de 400 mil mortes, no Brasil, nos últimos 30 anos, 1.091.125 pessoas foram vítmas de homicídio, numa média de 4 brasileiros assassinados por hora, sem contar os milhares de desaperecidos sem que se saiba, referentemente aos que efetivamente morreram, qual a causa-mortis. A meu ver, numa análise estrutural e conjuntural do quadro da violência no Brasil são as seguintes as principais causas determinantes de tamanha tragédia:

1)      Os resquícios históricos, provenientes principalmente das regiões Norte e Nordeste, da antiga premissa da “lei do mais forte”, cultivada pelos chamados ‘Coronéis do Sertão’ e seus capangas, onde a presença da autoridade policial, do poder judiciário e do poder público em geral ainda são incipientes até hoje em muitas localidades longíquas;

 
2)     os resquícios de um período de exceção no país ( pós / 1964),  gerando a violência de Estado para combater a luta armada, perpetrada por militantes de esquerda, que alicerçados na cultura marxista-leninista, tinham como finalidade implantar o regime comunista no país pela tomada ilegal do poder;
 
3)      ênfase maior, nas décadas de 60, 70 e 80, no combate das forças de segurança ao crime político, mormente em ações contra-guerrilha;
 
4)      crescimento, sem que os órgãos de informações da época, tivessem observado, da violência do crime comum, com o surgimento da doutrina do narcoterrorismo, com a criação da primeira facção criminosa do gênero, instalada em morros e favelas do Rio, proveniente do encontro, no Presídio da Ilha Grande, de criminosos políticos e criminosos comuns, com a difusão dos assaltos a banco como forma de captação de recursos para montagem da estrutura dos arsenais do tráfico;
 
5)      início, na década de 80, do crescimento do contrabando de armas e do tráfico de drogas, através de nossas vulneráveis fronteiras, mormente provenientes do Paraguai e da Colômbia;
 
6)      a exclusão social empurrando jovens para a marginalidade, mormente nas décadas de 80 e 90;
 
7)      a arregimentação de menores (inimputáveis), em morros e favelas do Rio, na hierarquia do tráfico;
 
8)      a obsolescência da idade inicial de responsabilização penal pelo critério biológico ( idade de 18 anos), ultrapassado no mundo onde países mais evoluídos no tema adotam hoje o critério psicossocial, face o avanço tecnológico e de informações no mundo atuala à disposição dos jovens;
 
9)      a obsolescência do Código Penal Brasileiro ante a evolução das práticas criminosas, mormente nos crimes contra a vida com o emprego de armas de guerra, onde as penas são consideradas brandas face a brutalidade dos crimes;
 
10)   as brechas da legislação penal brasileira com a implantação das progressões de regime carcerário e redução de penas, sem o devido exame criminológico de grau de ressocialização do apenado;
 
11)   a carência de casas de custódia, presídios e penitenciárias no país, criando os abarrotados “depósitos sub humanos de presos”, onde a ressocialização é em grau mínimo ( numa média de 90 dias, 85% dos apenados, postos em liberdade, retornam ao cárcere pela prática de novo crime);
 
12)   não cumprimento de milhares de mandados de prisão por falta absoluta de estrutura, no sistema penitenciário brasileiro, para alocar mais e mais presos;
 
13)   morosidade nas decisões do Poder Judiciário pela falta de estrutura de pessoal para acelerar procedimentos jurídicos o que acaba gerando um sentimento de certa impunidade inclusive com prescrição de prazos processuais;
 
14)   o grau acentuado da letalidade nas intervenções policiais que ainda privilegia o uso da força excessiva em detrimento da seletividade da ação ( há que se entender que “quanto maior a seletividade da intervenção policial menor o emprego da força”);
 
15)   a difusão e aumento do consumo de drogas pelos jovens, inclusive no uso excessivo do álcool, droga considerada lícita, cuja massificação da propaganda midiática o apresenta como algo prazeroso;
 
16)   aumento assustador do consumo do ‘crack’, a chamada ‘droga da morte’, com a difusão das cracolândias em boa parte das cidades brasileiras;
 
17)   influência do cinema nos mais jovens na abordagem de temas envolvendo violência tipo as séries ‘Duro de Matar’ e ‘Jogos Mortais’;
 
18)   influência nos mais jovens pela difusão de jogos eletrônicos voltados para guerras e destruição humana, onde a cultura da violência, na tecnologia, também retrata a violência real do cotidiano;
 
19)   a falsa crença de que arma é um necessário instrumento de defesa pessoal em qualquer situação ( cultura armamentista); e finalmente,
 
20)   o envolvimento e contaminação do aparelho policial com o crime, com a corrupção, com atrocidades e abuso de poder.
 

                            Milton Corrêa da Costa é coronel da reserva da PM do Rio de Janeiro

 

 

 

 

 

Redação

Redação

Recent Posts

CPI: técnico responsável por minas de sal da Braskem fica em silêncio

Defesa de Paulo Cabral conseguiu habeas corpus do ministro Alexandre de Moraes; ao menos 40…

10 minutos ago

Lula estuda representante permanente do governo federal no Rio Grande do Sul

O presidente Lula quer enviar um representante do governo federal para atuar no gerenciamento da…

17 minutos ago

Pablo Marçal, um Barão de Munchausen perigoso, por Luís Nassif

Bolsonarista, quando pretendeu integrar a militância digital de Jair, foi escorraçado por Carlos Bolsonaro, o…

43 minutos ago

Dilma destina R$ 5,7 bilhões do Banco dos Brics para a reconstrução do Rio Grande do Sul

Valor será destinado para obras de infraestrutura, mas pode ser direcionado para resolver as urgências…

58 minutos ago

Niger, Rússia e África: Cooperação ou Alienação?

Após a Segunda Guerra, a África Ocidental viu mudanças sociais significativas devido aos investimentos coloniais

1 hora ago

O campeonato brasileiro deve parar?, por Ricardo Mezavila

Seria mais inteligente e útil, aproveitar o público dos estádios para arrecadar doações e também…

2 horas ago