Duzentos e dezoito bilhões de reais contra a recessão, por André Araújo

Por André Araújo

O que se poderia fazer no combate à recessão com R$ 218 bilhões? Esse é o valor do prejuízo do Banco Central no 1º Semestre deste ano, cuja conta o BC gentilmente manda ao Tesouro.

Esse prejuízo não foi sequer citado por NENHUM dos comentaristas econômicos da grande imprensa. Apenas uma pequena nota, quase invisível, no jornal O ESTADO DE SÃO PAULO de 15 de outubro passado (pág.B 13) dá conta desse prejuízo.

Os jornalistas econômicos não se deram ao trabalho de ao menos registrar, muito menos de analisar esse valor, mas o deficit do Orçamento, que é um número bem menor que esse, gerou a PEC 55 e mereceu quilômetros de comentários na grande imprensa, com lições moralistas sobre a necessidade de controle de gastos.

Sobre o controle de gastos do Banco Central, nenhuma palavra, mas é dinheiro tão bom quanto o dos gastos correntes.

O prejuízo do BC se deve basicamente aos custos para manter o dólar abaixo do que deveria ser e, com isso, garantir aos especuladores estrangeiros a porta de saída do capital que eles investem em títulos do Tesouro, é uma aposta contra o País e a favor dos especuladores.

Se o BC deixasse o dólar flutuar, esse custo não existiria. A anomalia existe porque APÓS o Plano Real, o Governo deu CARTA BRANCA ao Banco Central para fazer o que quisesse com a poÍitica cambial.

Não era essa a intenção dos fundadores do Banco Central do Brasil. Os pais do BC, Roberto Campos e Octavio Bulhões, este último tinha sido diretor da SUMOC, Superintendência da Moeda e do Crédito, predecessora do BC, nunca imaginaram dar ao Banco Central tal liberdade de infligir ao País qualquer prejuízo em nome de uma política cambial decidida intra-muros do próprio BC com objetivos que só o BC decidiu.

Valorizar ou desvalorizar a moeda do País é uma decisão de GOVERNO, não de Banco Central, este é apenas executor, não é formulador de política econômica.

Junto com o BC, Campos e Bulhões criaram o CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL, um órgão colegiado que tinha autoridade ACIMA do Banco Central e onde se decidiam as políticas monetária, cambial, de crédito, de sistema bancário.

Ao Banco Central cabia a execução do que o CMN decidisse. No CMN estavam representados a indústria, o comércio, os serviços, a agricultura.

Esse Conselho foi, na prática, extinto no Governo FHC por exigência dos “economistas do Real” para que eles pudessem operar o BC sem controle, livremente. Com isso, poderiam controlar as flutuações da moeda de dentro do BC.

Por uma incrível coincidência todos os “economistas do Real”, antes pobretões de roupa amassada, viraram banqueiros milionários. Com essa “liberdade”, dois presidentes do BC quase quebraram o Brasil e tiveram que ser demitidos quase “manu militare”, à força, tal o estrago que fizeram.

Com isso o BC pode infligir ao País prejuízos monumentais que podem quebrar o Tesouro pela decisão de uma única assinatura, a do Presidente, sem dar satisfação a ninguém. Com o prejuízo de R$ 218 bilhões, seria possível iniciar a reativação da economia no rumo da saída da recessão.

Como exemplo:

1. SEIS MIL, 6.000 obras municipais de pequeno porte até R$ 5 milhões cada uma, possível para construir creches, escolas, ambulatórios, estradas vicinais, pontes. Estou exagerando, em pequenos municípios R$5 milhões dá para fazer mais de uma obra. Total dessa verba R$30 bilhões.

2. MIL E QUINHENTAS , 1.500 obras municipais e estaduais de médio porte, R$20 milhões cada uma, dá para fazer conjuntos habitacionais, redes de saneamento e esgotos, parques esportivos, mercados municipais, hospitais, dá para fazer um conjunto dessas obras em cada cidade. Total dessa verba  R$30 bilhões

3.OITOCENTAS, 800 obras estaduais até R$50 milhões – Dá para fazer estradas de rodagem, pontes, viadutos, conjuntos hospitalares, escolas do ciclo médio, estações de captação de água, estações de saneamento, divididas pelos Estados mais pobres (20) dá 40 obras por Estado, um belo conjunto de obras de médio porte, inclusive conjuntos habitacionais. Total dessa verba R$ 40 bilhões

4. TREZENTAS, 300 grandes obras de saneamento de custo até R$150 milhões cada uma, para cidades médias, zonas litorâneas, consórcios de cidades menores, há enorme carência de obras de captação, canalização, tratamento de esgotos, usinas de lixo. Total dessa verba R$ 45 bilhões

5.DUZENTOS E CINQUENTA, 250 grandes conjuntos habitacionais nas regiões metropolitanas a custo de R$200 milhões cada um, o que daria para no total 1.250.000 moradias  Total dessa verba R$50 bilhões

6. MIL, 1.000 obras em parques e museus nacionais, ao custo de R$8 milhões cada obra, daria para recuperar grande número de museus, parques e monumentos nacionais, boa parte necessitando de conservação – Total dessa verba R$8 bilhões

Emprego: estimando que a participação de mão de obra nessas obras corresponda a 25% do custo, serão R$52 bilhões, a R$52 mil por ano por operário seriam criados UM MILHÃO DE EMPREGOS nesse conjunto de obras. Em vez disso essa verba garante o emprego do Sr. Ilan Goldfajn e nada mais.

 

Andre Motta Araujo

Advogado, foi dirigente do Sindicato Nacional da Indústria Elétrica, presidente da Emplasa-Empresa de Planejamento Urbano do Estado de S. Paulo

Andre Motta Araujo

Advogado, foi dirigente do Sindicato Nacional da Indústria Elétrica, presidente da Emplasa-Empresa de Planejamento Urbano do Estado de S. Paulo

View Comments

  • Muito bom

    O André, além de um excelente comentarista é corajoso e diz as coisas como elas são.

    Este post cita o fato e mostra os seus desdobramentos. Isso é mais do que matar a cobra e mostrar o pau..

    Parabéns André!!

  • É provável que todos aqueles

    É provável que todos aqueles que já notaram minha existência nesse mundo, via GGN, estejam de saco cheio, mas lá vou eu de novo:

    O Banco Central do Brasil, autarquia do governo federal, é, na prática, uma entidade privada.

    Não trabalha para buscar ou promover o bem público.

    Trabalha para promover os interesses da banca privada.

    Desculpem a encheção de saco.

    • O BCB, segundo informa o AA

      O BCB, segundo informa o AA neste excelente artigo, não foi concebido assim. Tinha um CMN a subordiná-lo, conselho composto por ministros de estado e representantes da sociedade. Até que os "goldens boys" do Plano Real, ora milionários, conveceram o então presidente FHC a deixar tudo sob o controle do BCB que sequer votava nas decisões do CMN (não era assim, André?), apenas secretariava as reuniões. Daí, tal qual já ocorria nos demais países,  o nosso BC tornou-se independente do governo, embora administrativamente subordinado ao Ministério da Fazenfa.

      • Você está certa.
        Mas o que o

        Você está certa.

        Mas o que o BC foi, até o período FHC, já não afeta em nada nossos vidas.

        O que o BC se tornou, pós-FHC, é o que nos submete a essa fraude.

        E o que ele se tornou, foi isso: uma instituição privada.

  • Caríssimo André Araújo,
    seu

    Caríssimo André Araújo,

    seu texto brilha pela clareza, coragem e força de convencimento! Parabéns!

  • Se a midia fosse realmente

    Se a midia fosse realmente isenta,

     

    muitos "analistas economicos" estariam, em praça publica, pendurados em postes; e não com sorrisos cheios de dentes nas telinhas da tv..... ao lado desses alguns "patriotas".........

  • André, parabéns pelo artigo,

    André, parabéns pelo artigo, irretocável. Estamos ferrados e mal pagos, para não usar termos chulos.

  • Jornalista econômico na

    Jornalista econômico na grande imprensa não existe... só tem golpistas ditadores da máfia fhc clinton disfarçados de jornalistas que só analisam, oportunamente, assuntos que alimentem algum tipo de golpe.

  • naturalizado

    Andre,

    Notícias como esta, corretamente analisada, somente são possíveis de ler na internet.

    Não poderia ser diferente, quando se coloca um banqueiro privado na condução do BC. Quem indicou, quem foi o responsável pela ida do brasileiro naturalizado Ilan Goldfajn para aquele trono supremo ?

    • O outro também

      O outro cotado para o lugar de Meireles também tem cidadania americana.

       

      http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc22029906.htm

      Fraga diz ter dupla nacionalidade

       

      "Um parente de Fraga informou que ele ganhou passaporte americano aos dois anos de idade.
      A secretária de Justiça do Ministério da Justiça, Sandra Valle, disse que Fraga não está impedido de assumir a presidência do BC por ter dupla nacionalidade.
      Segundo ela, uma emenda constitucional reconheceu em 1994 o princípio da dupla nacionalidade, suprimindo dispositivo do artigo 12 da Constituição que exigia a nacionalidade única."

       

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