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Geólogos dizem que problema da OGX não é técnico

Do Estadão

Problema na OGX, de Eike Batista, não é de tecnologia, dizem geólogos

Petrolífera teria de perfurar mais poços para produzir petróleo no campo de Tubarão Azul, o que pode ser antieconômico

Wellington Bahnemann

RIO – O anúncio desta segunda-feira, 1º, da OGX de suspensão do desenvolvimento dos campos Tubarão Tigre, Tubarão Gato e Tubarão Areia, além de revelar que a produção do campo Tubarão Azul pode acabar em 2014, colocam em xeque o discurso montando em torno da petrolífera que já ambicionou rivalizar com a Petrobrás. Especialistas da indústria de petróleo ouvidos pelo Broadcast, disseram que as medidas surpreendem, sobretudo se for considerado o experiente corpo técnico constituído por Eike Batista para tocar a empresa, muitos vindos da Petrobrás a peso de ouro. O anúncio deve agravar ainda mais a crise de confiança do Grupo X.

No comunicado, a companhia informou que, após análise detalhada de cada um dos três poços em produção do campo de Tubarão Azul, na Bacia de Campos, chegou-se à conclusão de que não há, hoje, “tecnologia capaz de viabilizar economicamente qualquer investimento adicional visando aumentar o seu perfil de produção”. A partir desse fato, a empresa reinterpretou os dados geológicos e geofísicos dos outros três campos, no qual “ficou evidente a intensa compartimentalização e descontinuidade desses reservatórios, o que compromete a produtividade dos mesmos”.

Na prática, o que a companhia revelou ao mercado é que as reservas de petróleo e gás estão espalhadas em pequenas estruturas não contínuas dentro dos reservatórios, o que demandaria um maior número de poços para a extração dos recursos. “Isso não é um problema de tecnologia. Isso é um fato da geologia. A OGX vai ter que perfurar mais poços para produzir petróleo, o que pode ser antieconômico”, avaliou o especialista em geologia da Universidade de Brasília (UnB), Carlos Jorge Abreu, acrescentando que o reconhecimento do problema neste momento demonstra uma deficiência dos estudos elaborados pela petrolífera.

Ainda no fato relevante, a OGX recomendou ao mercado que desconsidere suas projeções anteriormente divulgadas. Na época da sua oferta ações – realizada em 2008 -, a empresa estimou ter reservas potenciais de 2,562 bilhões de barris de óleo na Bacia de Campos e justificou o grande potencial dos seus blocos com base nos resultados exploratórios de outras petrolíferas em áreas adjacentes, como os campos de Polvo, operado pela Devon, e Papa-Terra, operado pela Petrobrás. Em março deste ano, ao declarar a comercialidade de Tubarão Tigre, Tubarão Areia e Tubarão Gato, a OGX estimou o volume “in situ” total entre 521 milhões de barris de óleo equivalente (boe) e 1,339 bilhão de boe.

Para o especialista em exploração Pedro Zalán, da ZAG Consultoria, o anúncio de hoje revela que a OGX realizou essas projeções sem conhecer em detalhes as características geológicas dos reservatórios. “Isso é o reconhecimento de que os reservatórios são muito difíceis. A questão é que a empresa chegou a essa conclusão agora. Isso deveria ter ocorrido há muito tempo”, comentou o profissional, reforçando o entendimento de que a exploração em reservatórios compartimentados não tem dificuldades tecnológicas.

Zalán acrescentou que a suspensão do desenvolvimento dos campos e de investimentos adicionais para a produção quando já há unidades produção (FPSOs) contratados é algo bastante inusitado na indústria de petróleo. “A Petrobrás chega a declarar comercialidade de alguns de campos e depois revê isso após estudos mais aprofundados. Mas isso não ocorre em um momento em que os FPSOs estão contratados”, argumentou. “Antes de deslocar o FPSO é preciso fazer muitos testes de longa duração (TLD)”, disse. Por força contratual, a OGX terá que pagar à OSX o aluguel de afretamento dos FPSOs OSX-1 e OSX-2, mas decidiu interromper a construção das FPSOs OSX-4 e OSX-5 e das plataformas fixas WHP-1, 3 e 4.

Broadcast apurou que a complexidade dos reservatórios do bloco BM-C-41, onde estão localizados os campos Tubarão Azul, Tubarão Tigre, Tubarão Areia e Tubarão Gato, já era conhecido pelo mercado. O otimismo da OGX, inclusive, sempre foi questionado pelo corpo técnico da Petrobrás, dada a experiência obtida com a exploração dos campos de Papa-Terra e Maromba, áreas adjacentes aos campos da OGX. “O pessoal da Petrobrás sempre estranhou essas grandes reservas anunciadas pela OGX”, disse uma fonte do mercado de petróleo que falou sob a condição de anonimato.

Prova da cautela da Petrobrás em relação a esses campos ficou evidente na 9ª Rodada da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), que ofertou o bloco BM-C-41. Na ocasião, o bônus oferecido pela estatal por essa área, em parceria com a Petrogal e a Ecopetrol, foi de R$ 112,450 milhões. O valor é praticamente metade do que foi pago pela OGX: R$ 237,241 milhões. “A diferença entre os bônus pagos revela as avaliações das duas empresas”, comentou a fonte.

Apesar dos decepcionantes resultados da OGX até o momento, tendo em vista a estimativa inicial para o campo de Tubarão Azul de 25 mil barris por dia (bpd), Zalán ponderou a empresa não pode ser vista como um fracasso completo, apesar de ter entregue 3,4 mil bpd no primeiro trimestre de 2013. O especialista lembrou que a OGX está produzindo gás natural surpreendentemente bem na Bacia de Parnaíba e que o modelo de construção de termelétricas na boca do poço se revelou uma estratégia vencedora, tanto que o governo federal e outras companhias pretendem reproduzi-lo.

“O sucesso na Bacia do Parnaíba tem sido completamente ofuscado por essas questões. O problema foi a promessa de produção que a OGX fez ao mercado”, disse Zalán. Nesse contexto, a futura produção no campo de Tubarão Martelo, também na Bacia de Campos e prevista para ter início no quarto trimestre de 2013, se torna decisiva para as perspectivas da companhia.

Luis Nassif

Luis Nassif

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