Setor de saúde à espera da grande reforma

A explosão do mercado de consumo brasileiro está promovendo mudanças estruturais em inúmeros setores, cada qual exigindo um reformador de peso, capaz de redefinir funções e papéis.

É o caso do mercado de saúde suplementar.

Nos últimos anos, ter um plano de saúde tornou-se o terceiro objeto de desejo da ascendente classe C – logo após a casa própria e a educação para os filhos. Tornou-se demanda central nos acordos coletivos e na própria atuação dos sindicatos.

Essa explosão de demanda criou uma nova realidade que atropelou o velho modelo. Há uma efervescência, um mercado em plena mutação mas amarrado aos paradigmas do velho mercado.

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No universo da saúde suplementar convivem os seguintes personagens:

1. As empresas que vendem planos de saúde.
2. Os prestadores de serviços: hospitais, clínicas, médicos, laboratórios etc.
3. A ANS (Agência Nacional de Saúde), órgão regulador.
4. O governo.
5. O público.
Os planos são a porta de entrada para a economia da saúde.

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É um sistema fundado no conceito de seguro. Ou seja, estimam-se os custos, sinistros e, a partir daí, calcula-se o valor da apólice. É uma aposta – como em todo seguro – com diversas variáveis em jogo.

1.  A inflação do setor, com a introdução de novas tecnologias e novas demandas.

2. Uma pirâmide etária em mutação, com o envelhecimento da população.

3. A falta de protocolos médicos que limitem os gastos hospitalares ou as tecnologias desnecessárias.
4. A falta de limites ao número de consultas/ano.

5. Todos esses fatores são colocados em um plano recém-lançado. Depois disso, terá que se ater aos reajustes anuais autorizados pela ANS
***

Pelo modelo atual, o único elo que assume o risco do seguro é a operadora.

Sendo assim, a única maneira de mitigar o risco é através de carteiras amplas. Por isso mesmo, as chamadas “majors” (as grandes seguradoras) marcharam para os planos empresariais e para os planos de adesão (ligados a associações profissionais e sindicatos). E os planos individuais ficaram restritos a pequenas seguradoras e ao sistema Unimed, caminhando para a extinção.

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No caso dos planos empresariais, o custo da apólice está amarrado aos sinistros. Se em determinado ano houver muitos sinistros, ocorrerá uma majoração da apólice. E, muito provavelmente, as empresas procurarão outros planos.

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O redesenho passa, entre outros, pelos seguintes pontos:

1.     Os hospitais precisam aderir maciçamente ao sistema de protocolos – que definem a quantidade de procedimentos para cada internação. O que superar o protocolo correrá por conta e risco do hospital. Com esse enquadramento, será possível aos planos, inclusive, adquirirem pacotes de internação em hospitais.

2.     Tem que haver uma integração de bancos de dados das operadoras de saúde, seja para evitar duplicação de exames e procedimentos, seja para orientar políticas de prevenção.

3.     Há a necessidade da criação de um sistema de resseguros que garanta excedentes de consultas médicas per capita, por exemplo.

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São desafios à procura de um gestor. Mas o que se tem até agora, nas federações, na ANS e no proprio governo, é um vazio de ideias.

Luis Nassif

Luis Nassif

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  • limites e negócios

    Os planos de saúde, tipicamente negócio, determinam protocolos, mas daqueles em que o hospital atira o doente pela janela no décimo primeiro dia de tratamento intensivo, pois a cobertura garante pagamento de despesas até o décimo dia. O sistema privado aposta na ineficiência do sistema público, e vende sua apólice de seguro tal qual seguro de um automóvel, com prêmio condicionado ao perfil e sinistro condicionado a investigações. Não há alternativa: cuidar da saúde é tarefa de um sistema público, gratuito e universal. 

  • Responsabilidades para todos

    Há um fator que deve ser considerado, de dificílima ponderação: como dito na análise, os planos convivem, além de com uma taxa variável de sinistralidade, mutante de agordo com seu público, com a constante criação de novas tecnologias, a "necessidade" que o paciante sente de usar tudo que há de novo, mais de uma vez, em mais de um lugar, com mais de um profissional, os médicos se dispõem a aplicar toda a tecnocolgia disponível, até para tratar uma unha encravada, especialmente se o paciente assim deseja - pois se não o fizer, será tachado de incompetente e trocado - e os sistemas de diagnósticos querem mais é vender seus serviços.

    A visão - completamente equivocada - que o usrário de planos de saúde tem de que "ele paga plano de saúde, portanto, precisa usar, AFINAL, suas consultas e exames são gratuítos, dentro do plano contratado", é um dos grandes vilões dos custos do sistema e portanto, do peso das mensalidades.

    Assim como em relação à coisa pública - onde as pessoas muitas vezes não se importam em danificar equipamentos públicos, pois "não é meu mesmo" - o usuário irresponsável dos planos de saúde é o grande causador do aumento de mensalidades, que depois ele mesmo - usuário - não consegue pagar.

    Mesmo quando um diagnóstico pode ser emitido com toda segurança a partir de um raio X, muitos médicos, movidos pelo olhar de desconfiança de seus pacientes, seguirão em seguida para uma tomografia, e, não satisfeitos, logo estarão numa ressonância, ou sabe-se mais o quê é a última novidade do mercado...

    No final, é lógico, a conta sai do bolso do usuário.. E, lógico também, ele vai achar ruim.

  • Estou mais preocupado com quem não tem acesso ao seguro

    Eu estou mais preocupado com quem não tem acesso ao seguro privado de saúde. São milhões de pessoas pobres e excluídas que não tem acesso a um sistema mínimos de saúde. Por mais caro que seja, se bem administradom o sistema de saúde público sai mais barato do que o privado porque não visa o lucro. Acho que as energias e recuros devem ser voltados para um sistema de saúde público bom e deixar o sistema privado cuidar do seu lucro.

  • Nos últimos anos, ter um

    Nos últimos anos, ter um plano de saúde tornou-se o terceiro objeto de desejo da ascendente classe C - logo após a casa própria e a educação para os filhos. Tornou-se demanda central nos acordos coletivos e na própria atuação dos sindicatos.


    ESTÁ TUDO ERRADO!!!


    Todos devemos lutar pela qualidade e pela universalização da Educação e Saúde Públicas, esta deve ser a grande bandeira nacional.


    A arrecadação não pode ser apenas para pagar juros da dívida, como querem os neoliberais.


    Todos os trabalhadores e sindicatos devem apoiar, os trabalhadores e sindicatos dos profissionais de Educação e Saúde públicas, pois estamos TODOS no mesmo barco.


    Apostar no "eu sozinho" ou no "cada um por si" é burrice.


    O que as pessoas gastam com mensalidades e despesas com Saúde e Educação é um absurdo.


    A próxima etapa é o que, a privatização da segurança pública e da Justiça


    Um país que despreza tudo o que é coletivo e público, basta ver a situação dos transporte coletivo em nossas cidades.


    O exemplo positivo do Mais Médicos não pode ser exceção, tem que ser a regra.

    • PLANOS DE SAÚDE

      Têm razão, está tudo errado! Mas o governo sabe disso e ganha muito com isso. Quando o governo não nos presta as garantias constitucionais (saúde, educação, segurança, etc..) o que fazemos? Recorremos a empresas que prestam os serviços (seguradoras, empresas de segurança, escolas, etc..). Essas empresas geram empregos e o governo recebe impostos dessas empresas e ainda diz que está gerando emprego. Quanto pior o retorno dos impostos pagos, mais serviços contratamos e mais se enriquece o governo.

  • Poxa, saúde suplementar para

    Poxa, saúde suplementar para a Classe C?

    A questão tem que ser outra: como melhorar o SUS para a Classe C não precisar da saúde suplementar.

    E, mesmo que já morreu Neves e realmente o SUS será enterrado e todos precisarão de saúde suplementar, precisamos pensar antes em como fazer para este contingente todo se especializar, qualificar-se para o mercado de trabalho, para conseguir promoções, melhores oportunidades, grandes saltos na renda familiar.

    Ora, se grande parte da Classe C, conforme visto, ganha até 1,5 Salário Mínimo por mês e trabalha no setor de serviços, como é que faremos ela arcar com mais um gasto, se primeiro já comprometeu parte de sua renda em financiamentos de longo prazo, a exemplo do Minha Casa Minha Vida?

    Se para a classe média dita "tradicional" já está complicado arcar com plano de saúde, educação privada para os filhos, e por aí vai, é realmente sustentável este modelo privatista? 

     

  • ... tem-se a nitida impressao

    ... tem-se a nitida impressao q o país estah indo aos trancos e barrancos.  cada vez eh um assunto q explode numa sequencia avassaladora.

    agora fala-se em melhorar a saude, mas nao se tem uma administraçao voltada numa unica direçao.  ve-se as esferas governamentais debatendo-se entre si mais para ganhar a midia do q de fato para resolver as questoes pertinentes.

    vejo na saude uma questao q esta passando desapercebida mas eh crucial:  a falta de hospitais.

    na minha cidade por exemplo, ha mais de trinta anos nao se constroe um unico hospital, nem mesmo a iniciativa privada.  dai a superlotaçao nos ja existentes.

    falta um plano de verdade !!!

  • Não entendi porque deveria

    Não entendi porque deveria haver um limite para consultas durante um ano ? Reorganizar o setor sim, é preciso, mas me parece que limitar consultas num determinado periodo de tempo é torna-lo mais desumano do que ja é para os pacientes, com mais lucros para as operadoras.  

    Essa frase, com os planos de saude tais quais têm-se hoje, poderia ser assim:

    "Os planos são a porta de entrada para o comércio da saúde"

     

    • A idéia não é limitar o

      A idéia não é limitar o número de consultas, mas utilizar sistema de resseguro para quando o número de consultas estourar a cota. Não muda a vida do segurado, apenas de quem paga a conta.

  • Sindicatos valorizaram Planos de Saúde; azar do SUS!

    Infelizmente, nos últimos anos os sindicatos valorizaram em muito os Planos de Saúde. Não tem um sindicato que tenha deixado reivindicado e conquistado Plano de Saúde - independente da qualidade do mesmo - para a sua categoria.

     

    Com isso, os sindicatos esqueceram de exigir melhorias do Sistema Único de Saúde/SUS.

     

    Muitos avanços foram e são observados nos serviços do SUS, mas poderiam ter sido muito maiores caso o movimento sindical atuasse ao lado daqueles/as usuários do Sistema. Pena!

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