Cai delação de executivo que ameaça mandato de Michel Temer

A delação de ex-presidente da Andrade Gutierrez era primordial na investigação. Mas quando Temer tentou isolar Dilma da responsabilidade, depoimento veio por água abaixo
Jornal GGN – Uma das peças-chave para a cassação do mandato de Michel Temer, no processo que mira a chapa com a ex-presidente Dilma Rousseff, o delator Otávio de Azevedo Marques mudou a sua versão sobre a propina repassada ao fundos partidários à Presidência de 2014.
O executivo é ex-presidente da Andrade Gutierrez. Depoimentos prestados a nível da Operação Lava Jato, na Vara Federal de Curitiba, motivou a sua intimação para oitivas junto ao Tribunal Superior Eleitoral, onde tramita as ações contra a chapa Dilma e Temer por irregularidades no financiamento de campanha.
A delação era primordial na investigação. No início de outubro, o ministro do TSE e relator do processo Herman Benjamin escutava atentamente as palavras do delator, que detalhava um repasse de R$ 20 milhões à chapa, ainda em 2010.
Contou Otávio de Azevedo que, em outubro daquele ano, “fui chamado pelo deputado, ex-ministro Antonio Palocci, para uma reunião. Na época ele não era ministro, né? Trabalhava na arrecadação de fundos da presidente Dilma, futura presidente, candidata”.
Seguindo: “Ele me disse que aquela escolha, feita pela ministra Erenice (Guerra, chefe da Casa Civil na época), precisaria ter um entendimento de que havia um projeto político para ser apoiado. E que nós deveríamos recolher 1% do valor dos nossos faturamentos naquele consórcio: 0,5% para o PT e 0,5% para o PMDB”.
Com as palavras, a Justiça concluiu que o dinheiro da Andrade Gutierrez, em um total de R$ 20 milhões, repassado por meio de doações eleitorais tinha como origem o esquema de corrupção. Se algumas empreiteiras usariam métodos convencionais de lavagem de dinheiro, a Andrade teria disfarçado os repasses por doações legais declaradas.
Em outro momento, em setembro, o mesmo executivo informou que foi pressionado pelo então tesoureiro de campanha de Dilma, Edinho Silva, a doar R$ 100 milhões à chapa, sendo que um dos repasses, de R$ 1 milhão, já havia sido feito ao fundo partidário do PT, com esse objetivo.
“Na verdade, nessa data, já tinha havido uma transferência de R$ 1 milhão feita no dia 14 de julho, parece, ou 10 de julho, do Diretório Nacional [do PT] para a campanha de Dilma. E na prestação de contas, está lá: o doador, o partido e a Andrade Gutierrez como originária”, narrou ao ministro.
Até aquele início de outubro, os depoimentos de Azevedo eram os que mais se aproximavam de uma conclusão e meio de provas contra a campanha da chapa Dilma e Temer, que teria sido irrigada pelo esquema corrupto.
A conclusão do relator Herman Benjamin foi de assombro. Após acompanhar pessoalmente cada uma das oitivas dos delatores do processo, chegou a manifestar que o esquema era “cruel” com os integrantes, no caso, as empreiteiras, uma vez que quem não aceitasse não era contratado e quem aceitasse, não poderia mais sair.
“São valores estratosféricos. Nós, seres humanos normais, não temos condição de avaliar o que se pode comprar com aquilo. Os operadores perderam o controle do dinheiro e faziam acerto de contas por amostragem. Era dinheiro demais”, havia dito o ministro já no início deste mês.
Assustou a ele a “normalidade da prática”. “Isso que me impressionou muito, não era exceção. E segundo praticamente todos, isso ocorre na administração pública brasileira de uma forma geral”, completava.
E foi diante deste trecho das falas de Azevedo que a defesa da ex-presidente Dilma Rousseff resolveu atuar. Levando documentos ao Tribunal Superior Eleitoral, comprovou que o dinheiro doado pela Andrade Gutierrez à chapa não teve o envolvimento do PT, como narrou o executivo, mas do PMDB.
Isso porque esse R$ 1 milhão repassado pela empreiteira entrou pelas contas de campanha de Michel Temer. Mais que palavras ou narrativas, essa era a prova material. O objetivo era contra-atacar a tentativa iniciada pelo peemedebista de isolar Dilma na responsabilidade da cassação da chapa.
Como o GGN reportou em diversas matérias, a estratégia tomada pela defesa de Michel Temer foi aderida por parte dos ministros do TSE, que iniciaram uma articulação para separar o julgamento ou a responsabilização de ambos no processo contra o financiamento da campanha presidencial.
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Com os documentos apresentados pelos advogados de Dilma à Corte, ficou comprovado que, se eles quisessem responsabilizar o montante como de origem corrupta, o culpado seria Temer, o receptor do repasse.
Apesar de insistir em acompanhar cada um dos depoimentos, de modo a se certificar qual grau e sentido traziam aquelas delações, Herman Bejamin deixou escapar no último mês um dos que talvez foi o seu principal erro na instrução deste processo: confiar nos delatores.
“Os depoimentos são muito relevantes. Quero levar para os meus seis colegas a minha percepção pessoal de como esses depoimentos ocorreram, o que foi dito. Só estando presente conseguimos relatar a confiabilidade de um determinado depoimento”, disse.
Além das próprias palavras de Otávio de Azevedo terem sido confrontadas pelos comprovantes de repasses ao PMDB, e não ao PT, agora, o ex-presidente da Andrade Gutierrez muda a sua versão da mesma história. Negou, nesta quinta-feira (17), que o dinheiro à campanha da chapa foi propina.
Em mãos dos documentos da remessa ao PMDB, declarados ao TSE, mas que supostamente seria uma forma de disfarçar a origem corrupta, Herman Benjamin questionou: como o dinheiro foi para o PT, como disse anteriormente, se aqui há provas de que foi destinado ao PMDB?
A nova resposta do delator: o montante de R$ 1 milhão, ao diretório do PMDB, foi uma contribuição voluntária, sem nenhuma origem irregular. “Otávio Azevedo fez uma retratação, ou seja, ele reconheceu claramente que não existiu nenhuma propina e nenhuma irregularidade na campanha presidencial de Dilma Rousseff e Michel Temer. Portanto, ele se retratou perante a Justiça Eleitoral”, disse o advogado de Dilma, Flávio Caetano.
Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

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  • E para onde foi a convicção do juiz?

    Uma justiça que é pautada só por convicção quando confrontada com provas materiais fica com a credibilidade muito abalada. Ou será que nem assim ?

  • Pau não bate em Xica se não tiver como não bater em Francisco

    Pau que bate em Dilma não bate em Temer e se pau que bate em Xica não tiver como não bater em Francisco, não se bate em Xica.

    A galera da senzala não vai para o pelourinho se os sangues-azuis da Casa Grande forem seus cúmplices.

  • Como diria o Ricardo Sergio.

    Naquela conversa célebre entre o Ricardo Sérgio, o famoso Mr. Big, com o não menos famoso Luiz Carlos Mendonça de Barros, eles diziam que andavam no limite das próprias irresponsabilidades.

    http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,o-limite-da-irresponsabilidade-imp-,58571

    Bons tempos aqueles porque se não se praticava, pelo menos, falava-se em limites de responsabilidade. Agora os tempos são outros. A alta malandragem instalada na Alta Burocracia improdutiva do Estado está levando os setores produtivos de riqueza e conhecimento desse país em direção a um profundo abismo e não há limites para a irresponsabilidade de ninguém. Cada um faz o que quer e se não tem tú vai tu mesmo. E vamo que vamo!!!

     

     

     

     

     

  • O Nível do Empresariado aqui

    O Nível do Empresariado aqui no Brasil, é o desse "Cagarolas" ?????....Esamos Fodidos.....

  • Discordo.
    A prova material da

    Discordo.

    A prova material da propina depositada na conta de Michel Temer existe.

    O que quer que o delator diga neste caso não tem qualquer valor.

    A prova material (o cheque) é suficiente para que Michel Temer seja processado e eventualmente condenado. 

    • triste....

      Aí fica difícil, quase impossível acreditar que a Operação Lava Jato não tem o objetivo de perseguir o PT. Cada vez que chega perto de figuras do PSDB, as provas, as investigações, as delações são menosprezadas e as prisões deixadas de lado. O espetáculo da PF é esfriado até um novo momento próprio, onde só alcance figuras próximas à Lula ou Dilma. As empreiteiras da Lava Jato são as mesmas da Privataria Tucana, que se tornaram donas da nossa vida, nosso aeroportos, portos, rodovias, pedágios extorsivos, Metrô de SP, que mata 7 pessoas soterradas e que a outra Justiça, a paulista, brilhantemente conclui que não há culpados, fora os mortos e "Deus" ("Deus agora faz Metrô? E não as empreiteiras e o governo PSDB de Geraldo Alckmin?). O Juiz Sérgio Moro, com delações premiadas do sr. Yussef, não produziu tamanho espetáculo, nem retumbantes prisões no caso do BANESTADO. Será que naquela época a Justiça Brasileira mais "engavetava" que concluia? Ou será que agora os objetivos são outros? O Brasil inteiro, inclusive as pedras, sabe que responsabilidades devem ser exigidas, mas que a corrupção no país não começou no governo do Lula. Queremos que a Justiça alcance a todos os "honestos" deste país, mas que conserve um país e justiça a todos os inocentes.   

  • Estamos à mercê das

    Estamos à mercê das Instituições falidas. Em um pais com um mínimo de justiça, o delator sairia algemado por mentir em juízo, mas em se tratando do Brasil, sai rindo em seu carrão.

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