Manaus (AM) – O pesquisador Lucas Ferrante, doutorando do programa de Ecologia do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), formalizou uma denúncia por crime de lesa-pátria no Ministério Público Federal no Amazonas (MPF-AM) contra o presidente Jair Bolsonaro e os ministros da Economia, Paulo Guedes, e da Agricultura, Tereza Cristina. No pedido inédito, o cientista quer a revogação do decreto assinado pelas três autoridades no dia 6 de novembro e que liberou a expansão do cultivo da cana-de-açúcar nos biomas Amazônia e Pantanal.
Na denúncia, Lucas Ferrante apresentou artigos científicos que demonstram a inviabilidade econômica e ambiental da produção de cana-de-açúcar nos biomas. Segundo ele, o plantio pode aumentar os índices de desmatamento e comprometer serviços ambientais nos dois biomas.
“A medida do governo ameaça seriamente os dois biomas, pois vai afetar a biodiversidade e serviços ecossistêmicos, além de impactar outras áreas do Brasil”, diz o cientista, em trecho da denúncia protocolada no MPF do dia 11 de novembro.
Em outra parte do documento, Ferrante afirma que a decisão do governo Bolsonaro “é um crime de lesa-pátria que afeta não apenas a maior floresta tropical do mundo e sua biodiversidade, mas também serviços ambientais essenciais para a manutenção do abastecimento humano e agricultura das regiões Sul e Sudeste do Brasil. O impacto afetará a capacidade agrícola do país”.
Segundo a assessoria de imprensa do Ministério Público Federal no Amazonas, a denúncia do pesquisador Lucas Ferrante já foi registrada no sistema de tramitação de procedimentos do órgão e distribuída ao procurador competente, que irá analisar e decidir quais andamentos deverá dar à apuração.
Restrição ao cultivo Bolsonaro ao lado da ministra Tereza Cristina e do ministro Paulo Guedes (Foto: Alan Santos/PR) Ao liberar a expansão do plantio da cana-de-açúcar nos biomas Amazônia e Pantanal, o presidente Jair Bolsonaro e os ministros Paulo Guedes e Tereza Cristina extinguiram o zoneamento ambiental da planta que estava em vigor com o decreto nº 6.961, de 17 de setembro de 2009 . O decreto foi uma decisão estratégica do então governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que visava conquistar o mercado internacional com um etanol supostamente mais verde que o de outros países.
O próprio decreto apontava, entre outras coisas, como “principais indicadores considerados na elaboração do zoneamento agroecológico” a vulnerabilidade das terras, o risco climático e o potencial de produção agrícola sustentável. Além disso, proibia a cultura em áreas com cobertura vegetal nativa, os biomas Amazônia e Pantanal e a Bacia do Alto Paraguai, áreas de proteção ambiental, terras indígenas, remanescentes florestais, dunas e mangues entre outras áreas. Na época, o objetivo era tornar a produção de etanol e açúcar mais competitivos devido ao incentivo à expansão da produção sustentável no território brasileiro.
O texto também dizia que os resultados obtidos na época demonstravam que o Brasil tinha 63,48 milhões de hectares de áreas aptas à expansão do cultivo com cana-de-açúcar, sendo que destes 18,03 milhões de hectares eram considerados com alto potencial produtivo, 41,17 milhões de hectares como médio e 4,28 milhões de hectares como de baixo potencial para o cultivo.
As áreas aptas à expansão cultivadas com pastagens, em 2002, representavam cerca de 36,13 milhões de hectares. “Estas estimativas demonstram que o país não necessita incorporar áreas novas e com cobertura nativa ao processo produtivo, podendo expandir a área de cultivo com cana-de-açúcar sem afetar diretamente as terras utilizadas para a produção de alimentos”, dizia o texto do decreto de 2009.
O que é o crime de lesa-pátria? Colheita de cana em São Paulo. (Foto: Werner Rudhart /Greenpeace) De acordo com a legislação brasileira, o crime de lesa-pátria é aquele que atenta contra a integridade territorial e a soberania nacional .
Na opinião do pesquisador do Inpa, Lucas Ferrante, a revogação do decreto de 2009 afeta duramente os serviços ecossistêmicos prestados pela Amazônia.
“A medida afeta a biodiversidade e serviços ecossistêmicos de maneira irreversível, consequentemente a economia, a agricultura e o abastecimento humano em um nível sem retorno, ou seja, colapsa todos estes quesitos essenciais para o país”, disse Ferrante em entrevista à agência Amazônia Real .
Lucas Ferrante desenvolve pesquisas sobre a influência das ações humanas na estrutura, dinâmicas, clima e biodiversidade de paisagens como as florestas tropicais, entre outros. Ao lado do cientista Philip Fearnside, publicou na revista científica mais importante do mundo, a Science, em 2018, o artigo “Amazon sugarcane: A threat to the forest”, que contesta a viabilidade econômica da cultura da cana-de-açúcar nos dois biomas.
“Os tomadores de decisão, como políticos e as instituições nacionais e internacionais que financiam grandes empresas agrícolas não devem ser enganados pelo doce sabor de uma nova fronteira agrícola a ser explorada. Eles devem ser orientados pela necessidade de evitar a perda da biodiversidade da Amazônia, do patrimônio genético e dos valiosos serviços ecossistêmicos, incluindo a regulamentação climática para a área com a maior população e produção agrícola da América do Sul”, alerta Ferrante, referindo-se à região Sudeste do Brasil, em seu artigo.
“A floresta amazônica desempenha um papel importante no clima da América do Sul, com contribuições substanciais de precipitação para a agricultura no sudeste do Brasil. Em médio e longo prazo, a perda florestal ameaçaria a própria produção agrícola e de biocombustíveis do Brasil, sendo a área com maior produção agrícola localizada no sul e sudeste do país, que depende do vapor de água da região amazônica”, destaca Ferrante em entrevista.
O pesquisador também lançou uma petição que pede a revogação do decreto que liberou o cultivo da cana-de-açúcar na Amazônia .
Migração e efeito de borda Canavial da empresa Jayoro, no interior do Amazonas (Foto: Alberto César Araújo) Segundo o pesquisador Lucas Ferrante, o cultivo da cana-de-açúcar provoca danos ambientais a quilômetros de distância. “Essa cultura tem uma consequência chamada efeito de borda, que pode afetar a floresta a centenas de quilômetros da área de plantio”, diz ele à reportagem.
“Em floresta adjacentes, temos detectado mortalidade de árvores, perda da estrutura vegetacional, afetando serapilheira, cobertura de dossel e consequentemente, a perda de espécies e também alterações na fauna. Essa medida tem potencial para provocar um colapso na produção de cana de açúcar no Brasil inteira, pois diminuiria a quantidade de chuvas do sudeste e sul do Brasil, onde estão as principais plantações”, completa.
O pesquisador diz que não há vantagem ambiental e nem econômica na liberação do plantio na Amazônia. “A produção que gera pouco emprego e é mecanizada e, quando não é, gera problemas como queimadas. Enfim, só gera perdas, danos e destruição”, afirma.
O que diz o governo? Em vídeo divulgado no site do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) , o coordenador de agroenergia do órgão, Cid Caldas, diz que a medida não impedia crimes ambientais, mas que hoje o Código Florestal, o Zoneamento Ecológico e Econômico e o RenovaBio são garantias de produção limpa.
“Podemos afirmar categoricamente que os instrumentos atuais são muito mais eficazes em termos ambientais e de sustentabilidade”, diz Caldas no vídeo.
O texto que acompanha a postagem também fala que “a revogação do zoneamento da cana-de-açúcar tem o objetivo de permitir o retorno de investimentos no setor sucroenergético, suspensos desde 2009”.
Procurado para falar sobre essa questão, Lucas Ferrante destaca que a publicação da Science é posterior ao Renovabio, demonstrando a ineficiência do programa em mitigar impactos do cultivo.
Competitividade do etanol Colheita de cana-de-açúcar em São Paulo (Foto: Werner Rudhart /Greenpeace) De acordo com estimativas da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), produção de cana-de-açúcar, na safra 2019/20, será de 615.978,9 mil toneladas no país. A Região Centro-Sul tem a expectativa de produzir 566.732,3 mil toneladas de cana-de-açúcar, representando 92% da produção nacional. Desse total, 323.416,4 mil toneladas virão da produção em São Paulo. Já a Região Norte/Nordeste tem a estimativa de produzir 49.246,6 mil toneladas ou 8% da safra brasileira. A Conab não possui dados sobre a produção de cana-de-açúcar nos estados do Acre, Amapá e Roraima.
O especialista em políticas ambientais e agropecuária na Amazônia, Raoni Rajão, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), já tinha dado o alerta ao Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa). A partir de uma pesquisa sobre zoneamento ambiental da universidade, uma comissão da União Europeia encomendou um estudo sobre a produção de etanol em diversos países. O interesse do bloco econômico é aderir ao etanol como medida de baixo carbono.
A União Europeia não quer repetir o erro cometido em 2003 com a Indonésia , onde o interesse pelo biocombustível intensificou o desmatamento e outros crimes sociambientais. “Comprar biocombustível que tem origem em locais desmatados não é uma medida ambientalmente saudável”, explicou Rajão, em entrevista à Amazônia Real .
O especialista disse que a revogação do zoneamento do cultivo da planta tira competitividade do etanol de cana-de-açúcar brasileiro, pois aumenta o risco de desmatamento no Mato Grosso e em Rondônia. Para Raoni Rajão, o Brasil se arrisca mundialmente, pois não há garantia que nem sequer de que a China, um dos mercados mais cobiçados do mundo, compre etanol do Brasil, pelas mesmas razões que a União Europeia.
“A produção de cana-de-açúcar na Amazônia corresponde a apenas 1,5% da nacional. Por causa desse pequeno percentual, a medida do Governo Federal cria um problema reputacional para outros 98,5% do Brasil”, diz Rajão.
“A União Europeia pode voltar atrás no acordo comercial que tem com o Mercosul e diminuir, ou mesmo suspender, a compra de etanol do Brasil com um argumento climático. Estão subestimando os riscos e superestimando dos benefícios”, acrescenta.
Raoni Rajão destacou ainda que o perigo são as outras alternativas, como o etanol de milho dos Estados Unidos, que não tem um balanço energético competitivo como o brasileiro, mas não está ligado ao desmatamento de florestas tropicais.
“Infelizmente, parece que o ódio às medidas tidas como ambientalistas é mais forte que a racionalidade econômica. Não se pode tomar uma atitude que venha a comprometer a capacidade de vender para o mercado internacional”, avalia o pesquisador.
O gosto do consumidor muda de gosto e os consumidores internacionais têm hoje, uma exigência cada vez maior, pelo consumo de produtos orgânicos. “Um mercado competitivo e dentro da lógica liberal, diz que o consumidor tem sempre razão e não o produtor”, conclui o especialista da UFMG.
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Esses Gojobas não estão nem aí para as Futuras Gerações nem para a Natureza. O lema desses Trogloditas é: "Après nous, le déluge", isto é, depois de nós, o dilúvio.
O Sal da Terra
(Beto Guedes)
Anda, quero te dizer nenhum segredo
Falo desse chão, da nossa casa, vem que tá na hora de arrumar
Tempo, quero viver mais duzentos anos
Quero não ferir meu semelhante, nem por isso quero me ferir
Vamos precisar de todo mundo pra banir do mundo a opressão
Para construir a vida nova vamos precisar de muito amor
A felicidade mora ao lado e quem não é tolo pode ver
A paz na Terra, amor, o pé na terra
A paz na Terra, amor, o sal da...
Terra, és o mais bonito dos planetas
Tão te maltratando por dinheiro, tu que és a nave nossa irmã
Canta, leva tua vida em harmonia
E nos alimenta com teus frutos, tu que és do homem a maçã
Vamos precisar de todo mundo, um mais um é sempre mais que dois
Pra melhor juntar as nossas forças é só repartir melhor o pão
Recriar o paraíso agora para merecer quem vem depois
Deixa nascer o amor
Deixa fluir o amor
Deixa crescer o amor
Deixa viver o amor
O sal da Terra
Terra...
Estado Ditatorial Absolutista Caudilhista Assassino Esquerdopata Fascista. Não será fácil para o Capitão, acabar com 9 décadas de doutrinação. Acabar com a 'Velha Política'. Quer dizer que além de entregar o território brasileiro aos interesses internacionais do NeoColonialismo Ecológico, agora querem impedir o Povo Brasileiro de produzir dentro do seu próprio país? De um lado o Povo Brasileiro. Do outro as Elites Ditatoriais dentro da máquina pública, como IBAMA's, CONAMA's, ICMBio's da vida. Por que não perguntam ao Cidadão Brasileiro, o que Ele acha mais razoável? NUNCA !!! Sabemos. 90 anos de um a farsante Democracia replicada em fraudulenta Redemocracia. O Brasil de muito fácil explicação.