‘Estamos perplexos’, por Janio de Freitas

Os aspectos obscuros –e, enquanto o forem, também suspeitos — em torno das alegadas acusações do doleiro Alberto Youssef a Lula e a Dilma Rousseff, publicadas por “Veja”, aumentaram em número, em gravidade e no emaranhado.
O advogado de Youssef, Antonio Figueiredo Basto, negou a notícia de “O Globo”, comentada em artigo aqui, segundo a qual as acusações foram feitas como “retificação” a depoimento anterior, respectivamente, nos dias 22 e 21 últimos. O jornal atribuíra o pedido de “retificação” a “um dos advogados” de Youssef, o que Antonio Basto também nega.
Ao fazer a retificação da “retificação”, “O Globo” continuou sem identificar o tal advogado e sem informar a procedência da notícia contestada. O que não é incomum nem lhe acrescenta qualquer responsabilidade. Mas obscurece um pouco mais o caso. Porque na origem da informação incomprovada havia o óbvio propósito de complicar mais o episódio, dificultar sua elucidação.
Não foi a primeira intervenção negadora de Antonio Basto, nem a mais importante. E não muda em nada os aspectos que a Polícia Federal considera necessários investigar em inquérito. Por suspeitar de indução para que Youssef, preso e dependente de benefícios prometidos, mas ainda não formalizados, fizesse as acusações para influírem no eleitorado. Possível crime não incluído na atual delação premiada.
“O Globo” foi também o primeiro jornal a noticiar as acusações publicadas por “Veja” a 48 horas da eleição presidencial. No seu texto, dia 24, à pag. 5: “O advogado de Youssef, Antonio Figueiredo Basto (…) disse não ter conhecimento da informação citada pela revista”. E dá a palavra ao advogado: “Eu nunca ouvi falar nada que confirmasse isso (que Lula e Dilma sabiam do esquema de corrupção na Petrobras). Não conheço esse depoimento, não conheço o teor dele. Estou surpreso — afirmou Basto”. Os parênteses nesse trecho são do jornal.
Mais: “Ele disse que Youssef prestou muitos depoimentos no mesmo dia [21] e que o doleiro estava acompanhado de advogados de sua equipe”. Palavras de Antonio Basto: “Conversei com todos da minha equipe e nenhum fala isso [a acusação]. Estamos perplexos e desconhecemos o que está acontecendo. É preciso ter cuidado porque está havendo muita especulação”.
Antonio Basto “nunca ouviu falar” nas acusações atribuídas a seu cliente. Entre “todos na sua equipe”, “nenhum fala isso” (ter havido acusação). E, no entanto, como o advogado quis esclarecer ao negar a notícia posterior de “retificação” acusatória, “participam dos depoimentos a Procuradoria-Geral da República, delegados da Polícia Federal e agentes, além de um advogado de defesa”.
O que essa explicação transmite é a confirmação da presença, sempre, do próprio Basto ou de advogado de sua equipe, portanto não se explicando que houvesse a acusação e nenhum deles soubesse dela. Tanto mais sendo acusação tão grave, em momento tão sensível. E, Basto esclarece ainda, cada advogado da sua equipe, nas audiências e depoimentos, “confere os documentos produzidos [o que implica leitura das declarações] e as assinaturas”.
A retificação do dia 22, para incluir as acusações a Lula e a Dilma, não houve. E essas mesmas acusações no depoimento do dia 21, das quais a defesa “não ouviu nada” e “nunca ouviu falar” antes de servidas ao país pela imprensa?
A resposta profissional de Antonio Figueiredo Basto, como apareceu também na Folha da véspera da eleição, é que “não desmente nem confirma”. Explica-se: mesmo o advogado, se disser mais do que “não ouviu falar”, e fórmulas assim, estará violando o sigilo exigido para a delação premiada do cliente e anulando-a, não importa se confirma ou se nega o que quer que seja.
O noticiário político da Folha foi cobrado, internamente, para informar sobre a retificação do depoimento –a tal que não houve. Na verdade, procurou fazê-lo, mas, como respondido à cobrança, a retificação foi negada por dois agentes e por um dos advogados do caso. E é verdade que fui avisado disso, mas já perto das 8 da noite. Não houve como localizar em tempo o advogado, nem desejei sustar o comentário sobre a notícia de “O Globo” por entender que todo este assunto das acusações, e das circunstâncias em que apareceram, precisaria ser mexido até se conhecer o seu avesso.
*Janio de Freitas é jornalista e hoje colunista da Folha de S. Paulo. Trabalhou na revista Manchete, no Jornal do Brasil, Correio da Manhã e Jornal dos Sports. Em 2002 recebeu a Medalha Chico Mendes de Resistência, prêmio entregue pela ONG brasileira Grupo Tortura Nunca Mais a todos aqueles que se destacam na luta pelos direitos humanos e por uma sociedade mais justa.
Redação

Redação

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  • Só podem estar de sacanagem

    Na falta de assunto, produz-se um. Intensifica isso claramente com a "reportagem" desse domingo em O Globo. Porra, "entrevistar" Moreira Franco e "obter" dele ilações sobre política do governo é. no minimo, vilependiar a inteligência alheia. Moreira Franco opiniando sobre rumos políticos de alguma coisa ? Só podem estar de sacanagem.

     

    É grave levar para a disputa política a divisão do país’, diz Moreira Franco

    Ministro da Aviação Civil defende que o governo precisa propor um projeto que simplifique a vida das pessoas

    POR SIMONE IGLESIAS02/11/2014 7:00 / ATUALIZADO 02/11/2014 9:17Para Moreira, número excessivo de partidos políticos estimula balcão de negócios - Givaldo Barbosa/ O Globo

    Read more: http://oglobo.globo.com/brasil/e-grave-levar-para-disputa-politica-divisao-do-pais-diz-moreira-franco-14439790#ixzz3HusML3o3

  • MENTIROSOS PROFISSIONAIS

    A mentira, escondida como argumentação jurídica, como maquiagem da verdade, como direito de um acusado, como ações que a “literatura jurídica permite”, e etc., é a principal razão pela qual os tribunais estão abarrotados de causas pendentes.

    É um exagero dizer que se as pessoas fossem obrigadas a dizerem a verdade nem precisaríamos de advogados, mas, a rigor, dentro da comunidade brasileira, os advogados não são proibidos de mentir em favor dos seus Clientes, e isso está errado. O Advogado que mentir, e se essa mentira for provada, deveria ser censurado, expulso da Ordem, e acionado judicialmente da mesma forma que um cidadão comum. Veríamos assim uma agilidade nunca vista na Justiça brasileira.

    • Olha, Alexis, na verdade a

      Olha, Alexis, na verdade a mentira é proibida no processo, sob pena de configuração de litigância de má-fé. Só que, como você pontuou, é fácil esconder uma mentira travestida de filigrana jurídica e, ademais, a penalidade é branda, normalmente 1% do valor da causa. Outro fato desalentador: quem possui a técnica jurídica e sabe o que pode ou não fazer é o advogado, mas se houver condenação por litigância de má-fé, quem paga é o cliente. O máximo que um juiz pode fazer é enviar ofício à OAB e requerer a avaliação corporativa. Complicado.

  • apelido

    O PIG já ultrapassou qualquer circunstância onde mereceria os cuidados de praxe: as resalvas, os condicionais, as hipóteses, a condescendência.

    Eles perderam o senso de decência, o republicanismo, a vergonha.

    Agora o assunto deve ser tratado com os nomes corretos:  Fraude, Manipulação, Formação de Quadrilha, Falsa informação, Banditismo, etc.

    Eles merecem isso porque ficou comprovada a sua falta de decência e partidarismo golpista.

     

  • Eu não estou perplexo

    Eu não estou perplexo com a Veja, nem com a Globo ou com a Folha de São Paulo, Jânio. Há mais de 20 anos que estudo o comportamento da imprensa e o que tenho visto é a sua gradual e inexorável degradação ética até ultrapassar a fronteira com o crime. Houve um tempo, não muito recente, que discutíamos nas redações a questão moral e ética de se misturar o comercial com o editorial, quando jornalistas eram "estimulados" pelo patrão a vender matérias. Hoje essa prática é, inclusive, ensinadas nas escolas de jornalismo. Então, não fico perplexo, porque em igual proporção à capa da Veja, todos os dias a imprensa trai seus leitores e comete um ato de má fé, o que, na teoria é crime. 

    Nem o fato de que isso é praticamente ignorado no universo jurídico me deixa perplexo, porque lá dentro, entre seus maiores astros, em toda a parte, graça a corrupção e nem é necessário fazer uma equação complicada para se chegar a um resultado tão óbvio. Efeitos colaterais de um capitalismo que corrói tudo o que toca. Inclusive nas lentes com que analisamos as coisas. 

    • Olha, Erly Ricci, a agonia

      Olha, Erly Ricci, a agonia que sinto é mais em decorrência de um sentimento profundo de impotência do que, propriamente, em relação ao que é publicado. Se houvesse um amparo legal mais sólido do direito de resposta, isso naturalmente depuraria o teor e a fidedignidade das publicações. Falo de um direito de resposta rápido e desproporcional à publicação, com maior destaque e frequência (por exemplo, manchete de maior apelo chamativo e com o dobro do tempo de publicação). A vedação de propriedade cruzada também seria capaz de qualificar as discussões públicas, com controle recíproco dos conteúdos. Infelizmente, essa bandeira, assim como a reforma política, terá que ser empunhada pela população. Por iniciativa do Congresso creio que não sai nada.

      • é um paliativo

        Seria, apenas uma medida mitigadora, que já é alguma coisa, uma vez que tanto a cultura da informação - levada a cabo pelas grandes corporações de imprensa e seguida pelas demais -  quanto a política de representação que não representa o eleitorado, mas seus financiadores, precisam ser modificadas. No campo jurídico, não falo somente do poder judiciário mas de toda a estrutura judicial, é necessário uma ampla reforma. Do jeito que está e, levando-se em conta um certo progresso na responsabilização da mídia, os nossos grandes e reais problemas jamais serão pautados.

      • Reguulacao meramente

        Reguulacao meramente economica e tolice.Eles dispersam tudo entre "assessores"  e laranjas que serao eternamente "afiliadas". Apenas multas indenizatorias elevadas e rigoroso "direito de resposta"  nos trara um imprensa menos criminosa.

  • manifestação na paulista

    Nassif: ontem, vi que nas manifestações da paulista encontravam-se o governador de São Paulo Geraldo Alkimin e outos políticos do psdb. Gostaria que alguém me confirmasse se é verdade tal fato. Se se confirmar, me parece muito grave tal atitude de geraldinho. Agradeço a donfirmação.

  • esse assunto tem ser

    esse assunto tem ser conhecido por todos e

    a pf deve esclarecer  logo os interesses em jogo:

    o golpe eleitoral.

    o estelionato eleitoral praticado em concluio 

    com parte evidente do mpf (juiz moro?)

    , pf (que agentes?),

    tucanos.

    na parte dos tucanos, se houvessse investigação usando

    o domínio do fato, haveria comprovação evidente pela verossimlhança.

    youssef denunciara álvaro dias no caso banestado

    e seria amigo íntimo do senador tucano.

    o suplente do senador reeleito álvaro dias é o empresário joel maluceeli,

    dono da rádio cbncuritiba , aquela que repercutiu regional

    e nacionaomente o  dia inteiro da votação a tal da acusação contra dilma-lula. .

     

  • Não entendi

    O que o Janio quis dizer?

    Que o depoimento não ocorreu?

    Que a Veja inventou um depoimento e uma declaração?

    Foi isso que ele quis dizer?

    • Foi isso meso. Exatamente

      Foi isso meso. Exatamente isso.

      Janio de Freitas disse, de uma forma indireta porque a Veja é dos seus patrões, que a Veja inventou a coisa toda.

      Como aliás, a PF já desconfia.

  • A sorte da VEJA é atuar no

    A sorte da VEJA é atuar no Brasil. Em outro país já estaria fechada tal o peso das cominações por sentenças judiciais de cunho indenizatório  e seus donos processados;  talvez mesmo presos. 

    A vilania desse Grupo ultrapassou todas os limites não só da ética, mas da própria civilidade. 

     

     

  • Chama de volta o Paulo Lacerda

    Uma vez, Paulo Lacerda, que estava aposentado, revoltado com o caso Collor, foi chamado para chefiar a policia federal pelo pres. Lula.

    Deu no que deu: a moralização da policia federal, a prisão de individuos "acima de qualquer suspeita", um inicio alvissareiro de que as coisas estavam mudando no Brasil.

    Ai entrou em cena o Gilmar Dantas e seu assecla Demostenes Torres, montaram a farsa do audio sem provas, e encurralaram Lula, que ja andava desgastado e sem apoio suficiente para peitar tais sumidades.

    Conclusão : Paulo Lacerda foi pra Portugal, e perdeu o lugar.

    DILMA, CHAME O PAULO. Quem sabe ele ainda aceite o convite e retome o trabalho interrompido? 

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