Paulo Henrique Amorim, um jornalista de coragem, por Luis Nassif

Conheci Paulo Henrique Amorim em minha ida para a Editoria de Economia da Veja, em 1974, em uma oportunidade aberta por Paulo Totti, que era chefe de reportagem.

Ao lado de Elio Gaspari e Marcos Sá Correa, Paulo Henrique formava o trio dos jovens jornalistas cariocas, importados para a Veja e com curso superior. Se não me engano, ele era formado em Ciências Sociais.

Assumiu o cargo de Editor de Economia ao lado do inesquecível Emilio Matsumoto. Sua estreia em São Paulo havia sido pouco antes, convidado por Luiz Fernando Mercadante para trabalhar na revista Realidade. Ali, já deixara sua marca mais conhecida, um feroz espírito de competição que o impulsionava atrás de notícias.
Jovem ainda, tornou-se influente junto à área econômica do governo.

Sua carreira prosseguiu fora da Veja. Primeiro, foi escalado para dirigir a revista Exame, que fazia parte de um pacote de revistas técnicas que a Abril adquirira.

Depois, mudou-se para o Jornal do Brasil. Ali experimentou sua fase mais brilhante de jornalista, como titular da coluna Informe Econômico.

Na nova função, passou a revelar uma de suas características mais marcantes, de cunhar expressões que se tornariam motes, a exemplo de Elio Gaspari, e provavelmente inspirado no jornalismo de guerra da velha Rio de Janeiro de Gondim da Fonseca e outros. A expressão “raposa felpuda” tornou-se sua marca, além da incomparável capacidade de valorizar, pela manchete ou pelo lide, as informações mais prosaicas.

De lá foi para a TV Globo, onde também se consagrou pelos furos e pelos motes, como editor de Economia e comentarista. Não me lembro perfeitamente da maneira como anunciava informações exclusivas de Brasília. Mas fazia o telespectador participar do clima de cumplicidade, como se ele estivesse junto com Paulo Henrique em um local misterioso, arrancando informações da fonte. Competitivo, mantinha uma disputa surda com o comentarista oficial Joelmir Betting.

Era cioso de sua idade. Quando recebi um convite da Globo para ser comentarista, e foi marcado um almoço no Rio, Paulo me ligou e, na conversa, sugeriu delicadamente que eu não dissesse que havia sido seu foca na Veja. Acabei desistindo do convite e do almoço.

De lá saiu para dirigir o escritório da Globo em Nova York. Não sei as razões de sua saída. Logo foi contratado pela TV Bandeirantes para a vaga de âncora do Jornal da Band. Pouco antes, o velho João Saad me havia convidado para assumir a função. Enrolado com minha empresa, e percebendo a resistência de Johnny Saad, recusei.

Saindo da Globo, de imediato foi contratado pela UOL para apresentar um programa que ficava exposto permanentemente na home do portal. Ali, mais uma vez se revelou o pauteiro primoroso, identificando os melhores temas pela manha, conseguindo entrevistas por telefone e apresentando no programa que, se não me engano, ir ao ar ao meio dia.

De lá saiu se não me engano para o iG. Foi lá que voltamos a nos cruzar, nas guerras com Daniel Dantas.

Voltamos a nos cruzar em 2010, na campanha eleitoral, em uma frente informal contra o risco José Serra. Tinha restrições ao seu estilo, e ele devia ter ao meu. Mas foi uma guerra inclemente, em que era atacado por todos os lados.

Do lado de Serra, a pecha de chapa branca. Do lado do PT, Tereza Cruvinel me afastando da TV Brasil, suspendendo o pagamento até que aceitasse a mudança no contrato, entregando todos os programas até julho, para então encerrar o contrato. Que só foi refeito depois que Serra perdeu.

Éramos meia dúzia de blogs, cuja única afinidade era a resistência contra o perigo Serra. Acordava toda manhã sentindo o peso do mundo, e o que nos animava reciprocamente era a resistência para a luta, particularmente de Paulo Henrique.

E essa garra e coragem ele não perdeu, mesmo nos momentos mais críticos. Aliás, quanto mais crítico o momento, maior a sua coragem.

Nos últimos anos, seu estilo jornalístico encontrou o ambiente mais propício, os vídeos do Youtube. Tornou-se um campeão do Youtube, graças à sua enorme capacidade de identificar um tema, mirar no detalhe ridículo que ninguém percebia, e fuzilar com a pontaria dos grandes polemistas.

Deixa um legado de coragem.

Luis Nassif

Luis Nassif

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  • Lamentável a morte de PHA, como ele era chamado. Jornalista de primeira linha. Competente, ousado, inteligente e especial. Vai fazer muita falta, nesses tempos sombrios por que passamos. Descanse em paz PHA.

  • Evidente que sua perda é irreparável pra sociedade, que perde MAIS UM CANAL progressista de larga penetração.

    Claro que estou ciente de tocar agora num tema INOPORTUNO, mas se não agora, quando ?

    Penso que tem muitos bons jornalistas espalhados por aí ..de diversas tendências, mas éticos, transparentes, convictos de suas crenças e ciências ..e é por estes, E MUITO MAIS PELO BRASIL, que penso que essa turma deveria pensar seriamente em se associar pra fundarem um canal de MAIOR penetração do que estes que conseguem estando fracionados e segmentados, e"meio que esmolando" por socorro e ajuda, nesta imensa teia digital global.

    nt - claro que falo só pelos canais progressistas com quem tenho mais familiaridade de acompanhar ..mas penso que gente como Azenha, BOB FERNANDEZ, Joaquim e a turma do DCM e 247, outros menos expostos mas com coteúdo (tipo E.Guimarães e T.Dozani) poderiam compor este time de verdadeiros campeões, pra defender a democracia e as Instituições do país.

  • Grande jornalista, deixaria saudades em qualquer momento de sua partida, hoje, fará enorme falta.

  • Grande jornalista, deixaria saudades em qualquer momento de sua partida, hoje, fará enorme falta pelo seu senso crítico e argúcia incomum.

  • O que dizer depois das palavras edificantes,carinhosas e particularmente verdadeiras de Nassif.PHA,como gostava de se identificar,era um jornalista especialmente corajoso.Seu tamanho não se harmonizava com sua coragem.Jamais capitulou,ou dobrou os joelhos para o conglomerado Mafimidiático,e enfrentou de maneira indescritível a Globo e seus tentáculos,tal qual Nassif com a Veja.Não há muito o que dizer,apenas registrar que o Brasil fica cada dia mais pobre,quando morre um homem como PHA,e seu lugar em algum cemitério da vida,será muito longe dos fariseus.

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