O acordo institucional é a vitória possível?, por Ricardo Cappelli

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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O acordo institucional é a vitória possível?
 
por Ricardo Cappelli
 
Na guerra, quando a situação é de clara defensiva, acordos pontuais que preservem posições importantes devem ser considerados.  Não se trata de abdicar da batalha, muito menos de adesão ou capitulação, mas sim de garantir posições para prosseguir no enfrentamento.
 
Que questões importantes são essas? 
 
A correlação de forças foi sempre um fantasma a nos assombrar nos últimos tempos. Ela briga incansavelmente com a disposição, com a convicção ideológica da tropa para o embate. Não é simples preservar posições numa estratégia defensiva mantendo o moral do exército elevado. 

 
Qual o atual cenário da luta no Brasil? Bolsonaro, representando a extrema direita, acabou de ser aclamado pelo voto popular. Temos provavelmente o Congresso mais liberal e conservador de nossa história. 
 
Lula, o maior líder popular do país, está preso sem perspectiva de sair da cadeia. Seu capital político continua impressionante. Mesmo assim o povo não demonstrou nenhuma disposição de ocupar as ruas para defendê-lo de uma condenação sem provas, injusta e inaceitável.
 
Sérgio ‘Hoover” continua a todo vapor na montagem de sua estrutura policial-política-judicial. Não se enganem com o seu silêncio e discrição. A terceira delação de Palocci acaba de ser fechada com o Ministério Público. O ex-todo poderoso dos governos Lula e Dilma atira principalmente no peito de seus antigos companheiros e aliados.
 
Com o fim do recesso judiciário a Lava Jato e suas ramificações devem voltar a operar com força máxima. Alcançaram seus objetivos e vão refluir? Não creio. Uma nova leva de prisões “espetaculares” não seria surpresa.  Circulam boatos de que pode acontecer um “combo”, com outros ex-presidentes presos de uma só vez.
 
O TRF4 decidiu reescrever a Constituição à luz das convicções pessoais de seus desembargadores. Declarou inconstitucional o indulto natalino no sul do país. Leis em movimento reescritas permanentemente pelos “legítimados representantes do concurso público” são sinais inquestionáveis de que um estado de exceção opera na direção de uma “democracia tutelada”.  
 
As forças progressistas estão sitiadas no Nordeste. O cerco não será pequeno. Tentativas de questionar a legitimidade das eleições dos Governadores em alguns Estados não vão tardar. Reconhecer o resultado das urnas não faz parte do cardápio da elite brasileira. Por que farão isso agora que estão exibindo um “poder sem vergonha”?
 
O PCdoB não ultrapassou a cláusula de barreira. A ameaça de uma “inabilitação branca” do PT com o TSE aplicando multas impagáveis que inviabilizem na prática o funcionamento do partido não parece delírio. 
 
A derrota foi estratégica. A questão central não é o rumo ideológico que o Congresso irá tomar. Isso já foi decidido pelo povo nas urnas. Qualquer um que assuma o comando das duas Casas levará a cabo uma agenda liberal e conservadora. 
 
Se o ponto crucial é a preservação da democracia, de condições mínimas de funcionamento do parlamento, do respeito à prerrogativa dos partidos, parece razoável considerar uma saída institucional sem vencidos ou vencedores, mesmo que se dê em torno de liberais. 
 
Candidaturas únicas na Câmara e no Senado, preservando o tamanho dos partidos e a democracia interna das Casas, respeitando a proporcionalidade na ocupação dos espaços, na atual correlação de forças, seria uma derrota do campo progressista? A esquerda ficaria melhor ou pior posicionada para a batalha?
 
O argumento de que a base e os movimentos sociais não irão entender parece frágil. A eleição é fato de apenas um dia. É a expressão da nova correlação de forças na ocupação dos espaços. Não se trata de compromisso programático. Passados os minutos do ato formal, a oposição vai para o combate, lugar que o povo lhe designou. 
 
Lula disse recentemente que o objetivo do novo governo não é governar, mas sim destruir os avanços dos governos progressistas e, especialmente, destruir o PT.  Esta leitura terá alguma consequência? 
 
Uma guerra assimétrica travada num cenário de defensiva histórica testa nossos nervos. É preciso sangue frio para não errar. Marcar posição esperando acumular isolado para um possível amanhã é sempre tentador. Tem cheiro de bravura. Pode ser também o caminho do cerco e aniquilamento final. 
 
Qual o melhor caminho para que exista amanhã? O dia primeiro está chegando.
 
Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

3 Comentários

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  1. O autor fazia melhor quando

    O autor fazia melhor quando defendia a candidatura Ciro Gomes, hoje levando a sérias dúvidas se o experiente político não teria sido uma linha auxiliar do golpe de estado de 2016, já que se apresentou com a convicção de que, mesmo com os poucos votos que permitia sua trajetória política a nível nacional, teria condições de liderar a oposição e vencer o pleito de 2018. Na realidade, não havia um veto ao seu nome vindo dos golpistas. Era de certa forma aceito pelo comando do golpe, não era atacado. Resultado: mesmo com a prisão do Presidente Lula e todas as falcatruas feitas por Bolsonaro, que não era o candidato preferido do golpe, para vencer o pleito do Fernando Haddad, tudo com a conivência da Justiça (toda na realidade, mas mais explícita a vinda da Justiça Eleitoral), Ciro Gomes desviou 12% de votos que poderiam levar a oposição ao poder,  E pior: mesmo com esse cacife eleitoral, manteve-se como se estivesse ainda na disputa no segundo turno, que certamente levou seus apoiadores mais fiéis a, ou anular o voto ou não votar, favorecendo a candidatura Bolsonaro, certamente (não há dados) mas em maior número do que no primeiro turno. Não dá para admitir que um político calejado como Ciro Gomes não estivesse agindo para servir uma posição, que não era a da oposição. Deu no que deu, Bolsonaro eleito. Por isso, quando já foi eleito o segundo presidente do golpe, ainda mais tendo em vista muito do que alinhava de possíveis movimentos dos golpista, não considerando a atuação da oposição, dos trabalhadores e prejudicados pela condução da economia pelos golpistas, a luta não é pela Democracia, mas para sua volta. Desculpe, é possível que desconheça muito das possibilidades de reação da oposição, e não só, já que aumentará o número de prejudicados, que atingirá a população como um todo, inclusive os incautos que vivem de salários que votaram em Bolsonaro. Com seu pessimismo, quer que a oposição dê uma de calça arriada. Nada dusso: barco perdido, bem carregado.  Lula livre, abaixo a ditadura!

     

  2. Como enfrentar o Governo Militar ?

    Para a atual legislatura, o campo da centro-esquerda não passa de 30% na Câmara Federal.

    No Senado foram perdidas vozes combativas: Roberto Requião, Lindbergh Farias, Angela Graziottin…

    Até o New York Times, em editorial, afirmou: “Um ano fatídico começou para o Brasil”.

    Como enfrentar o Governo Militar sem uma Frente Ampla Democrática ?

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