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Zelaya manifesta solidariedade a Lugo

Três anos após deposição em Honduras, Zelaya se solidariza com Lugo, por Gulhermes Luis Barrucho, na BBC

Há exatamente três anos, na manhã do dia 28 de junho de 2009, o então presidente de Honduras, José Manuel Zelaya, foi preso em sua residência por policiais e militares hondurenhos. Em cumprimento a uma decisão da Justiça do país, Zelaya foi destituído do poder ainda de pijama e enviado em um avião à capital da Costa Rica, San José.

Em entrevista por telefone à BBC Brasil da capital hondurenha, Tegucigalpa, onde voltou a viver no ano passado após um exílio forçado na República Dominicana, Zelaya reiterou que foi tirado do poder “a bala” e se solidarizou com a situação do colega Fernando Lugo, que deixou a presidência do Paraguai após sofrer um polêmico processo de impeachment.

Para ele, ambos foram destituídos por meio de um “procedimento-padrão” com “muitas semelhanças”. “Quando um presidente é eleito para um mandato de quatro anos pelo povo, o povo – e somente ele – é o único que pode destituí-lo”, afirmou Zelaya.

Orlando Sierra/France Presse
O ex-presidene Manuel Zelaya cumprimenta simpatizantes em Tegucigalpa no dia 18 de junho

Ele acrescentou que não pretende concorrer novamente à presidência do país. Sua grande aposta, entretanto, é sua esposa, Xiomara Castro, que será candidata nas próximas eleições. “As pesquisas apontam que ela está na liderança”, disse.

Zelaya foi tirado do poder sob a alegação de que havia traído à pátria e convocado um referendo sem autorização do Judiciário e do Congresso para a instalação de uma Assembleia Nacional Constituinte, que poderia abrir caminho para sua reeleição.

Em setembro de 2009, ele retornou a Honduras, escondido, e refugiou-se na embaixada brasileira por quatro meses, até o término de seu mandato, em janeiro de 2010, quando, então, partiu para o exílio em Santo Domingo, na República Dominicana.

*

BBC Brasil – Há três anos, o senhor foi forçado a deixar a Presidência de Honduras. Recentemente, o presidente do Paraguai, Fernando Lugo, também teve de abandonar o cargo contra sua vontade. Como o senhor analisa o processo que culminou na destituição de ambos?

José Manuel Zelaya – Eu e (Fernando) Lugo fomos destituídos do poder em meio a um processo com características diferentes, mas que seguiu um mesmo procedimento-padrão, o de atacar um governo democraticamente eleito. Há, por isso, muitas semelhanças na forma como as destituições foram conduzidas. No meu caso, entretanto, talvez a única diferença tenha sido a de que os militares me tiraram do poder à bala.

Mas o senhor considera que o presidente Lugo sofreu “um golpe de Estado”?

(O diplomata e jornalista italiano) Curzio Malaparte (membro do partido fascista, posteriormente expulso por suas críticas contundentes a Hitler e a Mussolini) afirmava, à sua época, que um golpe de Estado consiste na interferência de um poder sobre outro poder.

Trata-se de um atentado que destrói a base jurídica do Estado. Normalmente, tal procedimento se dá através de métodos violentos e opressivos.

Quando um presidente é eleito para um mandato de quatro anos pelo povo, o povo – e somente ele – é o único que pode destituí-lo.

Neste sentido, quando o poder judicial ou o legislativo, como o Congresso, suplantam o soberano nas posições que lhe competem, estão interferindo em outro poder do Estado e, para Malaparte, trata-se de um golpe.

No caso de Lugo, entretanto, o golpe não chegou à fase final porque ele não tirado do poder da mesma forma que eu, pelos militares e a bala. Mas de resto, foi tudo igual: a criação da crise, a formação do processo gestado no Congresso Nacional; o objetivo era de um poder interferir sobre o outro.

Como o senhor avalia a participação de outros países latino-americanos na crise desencadeada no Paraguai?

Quando os presidentes defendem outro presidente estão defendendo a si próprios. Acredito que seja correta a posição dos países do Mercosul, que estão dando ao Paraguai um tratamento de repúdio à condenação pela destituição forçada do presidente Lugo.

O senhor acredita que os Estados Unidos terão um papel de mediação de crise no Paraguai igual ao verificado em Honduras?

Os Estados Unidos só têm um papel-chave nos países onde têm interesse. Não se pode generalizar, porque, neste caso, o presidente Obama fala pela parte diplomática do Estado, mas o império atua por outros ramos pouco conhecidos.

Depois de três anos de sua saída do poder, como está a situação de Honduras?

A situação em Honduras só piorou com o golpe de Estado. Os direitos humanos não são respeitados, a economia aponta para baixo, a pobreza aumentou e o país se tornou, segundo dados públicos, o mais violento do mundo, com uma taxa de homicídios recorde.

Por outro lado, aqui foi criada uma força popular contra o golpe chamada Resistência Popular, que tomou forma como o Partido Libertad y Refundación de Honduras (Libre).

Ele está em primeiro lugar nas pesquisas e nos próximos meses lutará pela conquista do poder, assim como a resistência contra Hosni Mubarak (ex-presidente do Egito que renunciou no ano passado em meio à pressão popular).

O senhor planeja voltar à política de Honduras e, quem sabe, candidatar-se novamente à presidência?

Zelaya: Atualmente, sou coordenador do Libre. Não sou candidato à Presidência. Mas há todas as possibilidades de que a candidata à Presidência Xiomara Castro (esposa de Zelaya) possa vir a ser a nova presidente de Honduras e o partido conquistar o poder.

O senhor já teve a oportunidade de encontrar pessoalmente Roberto Micheletti (presidente que sucedeu a Zelaya, após sua deposição)?

Não, tenho feito todo o possível para evitá-lo.

Quando o senhor teve a ideia de abrigar-se na embaixada brasileira há três anos? E por que o senhor escolheu o Brasil em detrimento de outros países?

Quando cheguei (escondido) a Tegucigalpa, tinha uma lista tríplice de representações diplomáticas às quais ia pedir refúgio político e proteção. O primeiro da lista era o Brasil, seguido por França e Espanha. Essa é a razão.

Mas antes disso o senhor fez algum contato com algum diplomata brasileiro?

Jamais. Nunca. Não podia fazer contato nenhum com ninguém. Caso contrário, exporia a minha vida, quando sei que muitas das comunicações são interceptadas pela CIA (Central de Inteligência Americana).

http://www.bbc.co.uk/portuguese/celular/noticias/2012/06/120628_zelaya_entrevista_lgb.shtml

Redação

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