Opinião

Nem Putin, nem OTAN, por Homero Fonseca

Nem Putin, nem OTAN, por Homero Fonseca

A Ucrânia é apenas o território onde duas potências capitalistas se enfrentam. A guerra é entre EUA e Rússia. O que está em jogo é o protagonismo na geopolítica mundial. Não se trata de um FLA X FLU, onde escolhemos um lado para torcer.

Desde o fim da União Soviética, no começo dos anos 1990, os EUA se tornaram a potência hegemônica, firmando-se via economia, diplomacia ou pelas armas como o  poder dominante num mundo unipolar. Essa política é sustentada no essencial pelos presidentes americanos, sejam republicanos ou democratas.

Ao ser extinto o Pacto de Varsóvia, o mesmo deveria ter acontecido com a OTAN (eram o braço armado institucional dos dois lados da Guerra Fria). Mas, oportunisticamente, os americanos aproveitaram o vácuo para fortalecê-la sob seu comando. E foi cercando a antiga URSS de bases militares nas antigas repúblicas comunistas. Faltava a Ucrânia. Desde 2014, essa hipótese estava sendo construída e o atual governo ucraniano acelerou o passo nessa direção. Foi a gota d’água para o czar Putin partir para a agressão militar, numa jogada de alto risco. Sua meta é restaurar a bipolaridade do poder mundial, em que o império russo volte ao protagonismo.

A imprensa brasileira, alinhada ideologicamente a Washington, fornece-nos uma cobertura despudoradamente parcial, na realidade uma versão propagandística dos fatos: apresenta o imperialismo russo como o Dragão da Maldade em contraposição aos Super-heróis do Bem (EUA, OTAN, governo da Ucrânia). Quando os americanos invadiram o Iraque, por exemplo, não se enfatizaram as atrocidades dos invasores, a mortandade de civis, o heroísmo da resistência iraquiana.

Como analisa a ucraniana Yuliya Yurchenko, professora de Economia Política na Universidade de Greenwich e autora do livro Ukraine and the Empire of Capital: from Marketisation to the Armed Conflict (2018): “A transição voraz do país para uma economia de mercado dirigida pelo bloco cleptocrático dominante, tornou a Ucrânia numa vítima do implacável crescimento do império do capital, vulnerável à colisão entre os imperialismos capitalistas russo e ocidental”[1].

Não tem super-herói nem mocinho nessa história. Não à toa, a extrema direita mundial está dividida entre Putin e as milícias ucranianas (vide Bolsonaro X seus seguidores que pregavam a ucranização do Brasil).

Penso que uma posição consequente dos progressistas deve ser:

Pela paz, com a cessação das hostilidades e retirada das tropas russas, em paralelo a uma solução diplomática que impeça a presença da OTAN em território ucraniano.

REFERÊNCIA


[1] “A Ucrânia e o Império do Capital”: https://www.esquerda.net/dossier/ucrania-e-o-imperio-do-capital/79568

Homero Fonseca é pernambucano, escritor e jornalista, formado pela Universidade Católica de Pernambuco. Foi editor da revista Continente Multicultural, diretor de redação da Folha de Pernambuco, editor chefe do Diario de Pernambuco e repórter do Jornal do Commercio. Foi também professor de Teoria da Comunicação e recebeu menção honrosa no Prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo. Atualmente, dedica-se à literatura e mantém um blog em que aborda assuntos culturais.

O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN

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