Categories: Política

Serra escreve sobre crimes e criminosos

Do joseserra.com.br

Segurança e falatório

Por José Serra

Apesar de todo o falatório do Governo Federal sobre o tema, o índice nacional de violência homicida é extremamente alto e resiste a cair: o número de homicídios por 100 mil habitantes – acima de 26 por ano – manteve-se praticamente igual nos último decênio. Comentei isso ontem neste site, com números do Mapa da Violência – 2012.

De fato, o Brasil é o país com o maior número de assassinatos em todo o mundo, tendo atingido a marca de 43 mil mortes dessa natureza em 2009, de acordo com o relatório do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime. Nos últimos oito anos, foram mais de 400 mil homicídios.

Onde houve queda acentuada, como em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Pernambuco, ela se deveu aos esforços dos governos estaduais. Nos estados onde seria mais necessário do que nunca o apoio federal, como é o caso da Bahia ou do Maranhão, onde os homicídios aumentaram vertiginosamente, nada foi feito. Brasília contempla de camarote essa realidade mórbida. Programas com nomes pomposos e metas fantasiosas são lançados na mídia, para depois caírem no esquecimento ou serem estrangulados por inépcia administrativa e/ou sucessivos cortes de recursos.

Tome-se como exemplo a ação mais badalada do Governo Lula na área da segurança, o Pronasci. Quando lançado, em 2007, foi fixada meta de redução da taxa de homicídios do conjunto do país superior a 50% – de 26 para 12 mortes por 100 mil habitantes! Obviamente, nada disso aconteceu – pelo contrário, o índice nacional permaneceu o mesmo, com um detalhe: em algumas regiões, como Norte e Nordeste, a violência aumentou brutalmente, como mencionei no texto de ontem (O mapa do crime).

Na trilha do seu antecessor e do talento publicitário petista, o atual governo lançou o Plano Estratégico de Fronteiras (tratei deste tema nos textos As fronteiras abertas da América LatinaArmas de destruição em massaA prática desmente o discurso)  que previa ações de impacto, como o aumento do efetivo da Polícia Federal nas fronteiras e a concessão de gratificações especiais aos policiais designados para essas áreas; criação de três dezenas de novos postos de policiamento de fronteira; entrada em operação de 14 veículos aéreos não tripulados para melhorar a vigilância da região (lembram-se daquele disco voador anunciado na campanha eleitoral do ano passado?), entre outras medidas.

Como é rotina na esfera federal, seis meses depois do seu lançamento praticamente nada do que se previa nesse Plano Estratégico foi feito. O efetivo não aumentou, as gratificações não saíram do papel, nenhum novo posto de vigilância foi entregue, e dos 14 veículos não tripulados previstos para fotografar as fronteiras, apenas um levantou vôo, em fase de testes. Provavelmente, o mesmo aparelho que já foi dado como voando e operando em meados do ano passado, em um dos debates dos candidatos a presidente. Quando também foi dito que as fronteiras brasileiras eram as mais seguras e defendidas do mundo.

Não foi por menos, aliás, que os policiais federais que atuam nas fronteiras, indignados com o escárnio, fizeram recentemente um protesto nacional. Suas queixas já são antigas: falta de equipamentos básicos, como coletes à prova de balas; armamentos defasados; meios de comunicação e transporte precários; efetivo altamente insuficiente, deixando os policiais em desvantagem nos enfrentamentos com bandidos fortemente armados.

No caso dos presídios, a situação é calamitosa. Nos oito anos do governo Lula, pouco mais de 800 vagas foram criadas em presídios federais em todo o Brasil. Só para comparar, no mesmo período, o Governo de São Paulo criou 26 mil novas vagas. O resultado é a transferência de encargos aos governos estaduais, e, naturalmente, mais superlotação de presídios.

A Força Nacional continua sendo um apanhado de policiais recrutados junto às PMs estaduais e em determinadas ocasiões. É, de fato, uma polícia heterogênea, pequena e tardia, pois sua mobilização demora semanas. Volto a insistir: o Brasil precisa de uma Guarda Nacional, ou uma Polícia Federal fardada, de caráter permanente, com sólida qualificação e capacidade de pronta atuação, na rotina e em situações críticas.

O Pronasci, além de nascer defeituoso e inepto, passou ao largo de questões difíceis de resolver sem o apoio federal. Não há programas efetivos de apoio ao treinamento e seleção para polícias de todo o país, com exceção de sugestões para os currículos das academias. Por exemplo, a formação dos soldados da PM durante um ano, com padrão de qualidade, tal como é feita em São Paulo, deveria ser estendida a todo o país. Já os investimentos federais para aumentar a capacidade de perícia e investigação das polícias estaduais, hoje razoavelmente elevada em São Paulo com recursos próprios, são insignificantes. E vejam bem: tudo o que se refere à formação de recursos humanos e tecnologia acaba sendo muito barato se confrontarmos seus custos com os resultados obtidos. Como diriam os economistas, uma elevadíssima relação produto-capital.

Por fim, um exemplo que surpreenderá o leitor: inexiste hoje um banco de dados nacional integrado, com informações sobre os principais delitos cometidos e cadastro dos criminosos. Nem números fidedignos sobre a população carcerária do país existem! Como na Saúde, na Segurança são necessários bons diagnósticos para saber-se como agir. Sem essas informações básicas, a realidade do crime no país fica envolta numa espessa nuvem de poeira. Como prever bons resultados se não consegue enxergar nem mesmo aquilo que se pretende enfrentar?

Luis Nassif

Luis Nassif

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