A reforma trabalhista e o apoio oficial ao trabalho escravo, por Jacques Távora Alfonsin

Sugestão de Fernando Claro Dias

no Sul21

A reforma trabalhista e o apoio oficial ao trabalho escravo

por Jacques Távora Alfonsin

O desdobramento das medidas oficiais planejadas pelo Estado de exceção imposto ao Brasil, desde o ano passado, executou mais dois golpes aos direitos humanos fundamentais sociais previstos na Constituição Federal, na Consolidação das leis do trabalho e em outras leis de defesa e proteção de direitos como os tratados internacionais acolhidos como válidos e vigentes no país.

O primeiro golpe através da lei a Lei nº 13.467/2017, já conhecida como reforma trabalhista, que vai entrar em vigor no dia 13 de novembro próximo, e o segundo através da Portaria nº1129/2017, baixada pelo Ministro do Trabalho Ronaldo Nogueira na semana passada.

As críticas generalizadas contra essas duas iniciativas do atual (des)governo – criadas pelo  conluio atualmente  a serviço praticamente exclusivo de interesses do capital nos poderes executivo e legislativo – estão reagindo de forma indignada, inclusive entre juristas e representantes do próprio Poder Judiciário.

Alguns marcos desta contrariedade à reforma trabalhista já levaram as suas denúncias de inconstitucionalidade à lei que a implantou. No Rio Grande do Sul, por exemplo, dias 16 e 17 deste outubro, um “Seminário sobre a reforma trabalhista: Aspectos constitucionais”, promovido pelo URBE, (Centro de Estudos da cidade) com a participação do Instituto Novos Paradigmas, ouviu juízas/es, advogadas/os, promotoras/es, líderes sindicais e estudantes sobre os efeitos dessa reforma, seja no quanto ela viola a Constituição, seja no quanto ela esvazia a CLT.

Conforme nota do Instituto Novos Paradigmas, disponível na internet, a doutora Beatriz Renck, presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região foi enfática:  “A constituição estabeleceu o pacto social e elevou os direitos trabalhistas à condição de direitos fundamentais sociais. Eles fazem parte da condição de dignidade do cidadão brasileiros e só podem ser suprimidos por uma nova Assembleia Constituinte”

Presente também neste encontro, o ex ministro da Justiça Tarso Genro advertiuEstas reformas anti-CLT, promovem “modernizações” desumanizadoras das relações de trabalho, logo, não para proteger o produtor-trabalhador, mas para dar livre curso a novas formas de exploração do trabalho dependente. E vão levar mais insegurança para as empresas, que ficarão tentadas a aplicar normas claramente inconstitucionais, que serão alvo de milhares de ações trabalhistas. Esta é a reforma – como toda a reforma sem concertação social – do caos e da desordem jurídica”.

Sobre a Portaria 13.467/2017 do Ministério do Trabalho, que pretendeu definir e tratar do trabalho escravo, as opiniões elevaram ainda mais o tom exaltado das opiniões contrárias. O Estadão de quarta-feira passada (18) noticia que a doutora Raquel Dodge, Procuradora  Geral da República, recebeu visita do Ministro do Trabalho, oficializando um pedido de revogação da referida normativa que, segundo a mesma, constitui um “retrocesso à garantia constitucional de proteção à dignidade da pessoa humana”.

Ela fez ver ao Ministro que essa garantia constitucional não se restringe à liberdade de ir e vir, mostrando que a Portaria “volta a um ponto que a legislação superou há vários anos” e, sobre a função da polícia federal relativa à essa prática criminosa de submeter-se alguém à condição de escravo, deve ser a de “na condição de polícia judiciária, instaurar inquéritos, avaliar prisões em flagrante, colher depoimentos que podem garantir a punição deste crime que envergonha a todos”.

O site Dom total de hoje (20), abre manchete oportuna sobre o mesmo crime: “Rede vai ao STF contra portaria que trata de trabalho escravo”. Salienta alguns pontos da ação judicial proposta, onde se lê a denúncia de a dita Portaria ter sido motivada por uma das ‘mais abjetas barganhas’ da história do país, por ter trocando “a impunidade na escravidão pela impunidade na corrupção”. Motivada pela  necessidade de o presidente (!?) Michel Temer manter coesa a bancada  ruralista presente no Congresso Nacional, a referida portaria visa contar com a dita bancada para  votar contra a segunda denúncia  lá tramitando contra ele.

Se as leis anteriores, partidas do golpe institucional do ano passado, já tinham pago à dita bancada a dívida do seu apoio incondicional, agora se vê que ela é ainda maior e se estende às/aos trabalhadoras/es que, como escravos, prestam à ela e outras representações do capital entreguista e predatório do Brasil o seu poder de exclusão e de aprofundamento da injustiça social que patrocinam.

Se a doutora Raquel e a Rede não forem ouvidos, isso não vai impedir a organização ético-política dos movimentos populares de resistirem a mais esse desmando típico de um Estado de exceção hipocritamente fazendo-se passar por democrata.

***

Jacques Távora Alfonsin é Procurador do Estado aposentado, Mestre em Direito pela Unisinos, advogado e assessor jurídico de movimentos populares.

 

Redação

Redação

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  • Senhores de escravos

    Causa espécie que a Câmara Federal seja composta por bancadas. Bancada da bala ? Bancada do Boi ? Bancada da biblia? Eh tão grotesco e ao mesmo tempo a maioria parece achar essas bancadas, que representam uma excrescência em meio de uma casa que representa a todos e a democracia, como algo normal. 

    O governo Temer, não sei como passara aos livros de Historia num primeiro momento, mas com o tempo, sera visto como um dos momentos mais indignos da Republica brasileira. Tudo que tem ligação com direitos sociais, Temer mostrou que so se interessa pelo dinheiro e poder. Nenhuma ambição pelo destino da Nação. 

    "Eh preciso que tudo mude, para que nada mude realmente". O Leopardo.

    • Il Gattopardo

      A frase, talvez, mais conhedida que se ouve no filme de Visconti na boca do principe Salina é "Se nos quisermos que tudo fique como antes, é preciso que tudo mude". 

  • Terra Brasilis

    É impressionante quanto as pessoas conseguem ser usadas como massa de manobra, estou falando com relação ao golpe de 2016 e os mesmos que gritavam nas ruas e  faziam os panelaços, hoje assistem ao fim da democracia e dos direitos sociais, calados simplismente mudos, sentados em seus divâs.

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