O Desenvolvimento anda de trem IV
por José Manoel Ferreira Gonçalves
A história das ferrovias no Brasil está umbilicalmente ligada aos chefes de estado de ocasião. Na semana passada vimos que a solução apresentada pelo governo FHC à crise dos trilhos – que se arrastava desde 1929 -, foi terceirizar o “problema”. A solução de seu governo foi entregar o resultado do esforço de gerações de uma nação a dois oligopólios, um desastre completo, cujos reflexos, a mal de todos, se arrastam até hoje, tanto direta quanto indiretamente.
Com a assunção do governo Lula em 2003, seja pelo cenário internacional mais favorável às commodities, seja pelo sucesso do governo em aumentar o crédito e, com o crédito aumentar o consumo e, com o consumo aumentar a produção, e com a produção aumentar o emprego, que aumentava o consumo… e assim entrando em um ciclo virtuoso, vivemos um verdadeiro milagre econômico. E, ao contrário do famigerado milagre econômico do início dos anos 1970, agora tínhamos um processo estável, autossustentável, e não baseado em dinheiro emprestado, como o milagre dos militares e de Delfin Neto nos idos de 70.
Com o dinheiro na mão e uma ideia na cabeça Lula se lança a realizar o mais antigo e ambicioso projeto ferroviário do Brasil, a Norte-Sul.
O projeto rapidamente foi se tornando realidade e sendo concretizado nas imagens publicadas das obras, dormentes, trilhos… um verdadeiro colosso. Foram milhares de quilômetros de novos trilhos. O número de quilômetros feitos continua em disputa, porque depende de como são medidos, se só o que ficou concluído, se só o que entrou em funcionamento etc. O certo é que como quer que se conte foram mais de dez mil novos quilômetros de ferrovias. E mais, ao final do governo Lula, a coisa prometia, porque em 2010 o crescimento da economia, malgrado a crise da bolha financeira de 2008, cresceu 7,5%. Lula recebia avaliação bom e ótimo de 87 % dos brasileiros e, renunciando a concorrer a um fácil terceiro mandato, elegeu com facilidade sua sucessora. O trem do progresso e do desenvolvimento estava garantido.
Não estava. Como o modelo econômico implantado por Lula começava a mostrar esgarçamento e como os sinais da crise de 2008 fatalmente começaram a aparecer, o dinheiro disponível para investimento começou a ficar reduzido, e o governo Dilma apelou para o modelo de PPP – Parcerias público-privadas, que dependia de investidores. Para tanto foram publicados editais para obras em que o governo investiria mais de 90 bilhões de seu caixa. Mas, pressionado pelas forças progressistas do seu bojo, o governo Dilma acabou oferecendo condições pouco atrativas aos investidores, acima de tudo pouca segurança jurídica e, com isso, os interessados simplesmente não apareceram.
O milagre começava a dar água. Lamentavelmente. Falaremos dela na semana que vem.
José Manoel Ferreira Gonçalves é jornalista, cientista político, advogado e doutor em engenharia. Dedica-se ao estudo da ecologia e meio ambiente, bem como aos modais de transporte, notadamente o ferroviário, para cuja bandeira milita.
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Não há outro caminho para a integração nacional que não seja a ferrovia.
Quando descobrirmos o óbvio talvez não nos reste mais território a integrar.