Cairo ao tempo da Segunda Guerra, por André Araújo

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
[email protected]

Oficiais britânicos no terraço do legendário Shepheard Hotel.

Cairo ao tempo da Segunda Guerra

por André Araújo

Enquanto se desenrolava a luta no front da Libia contra tropas italianas do Marechal Graziani e alemãs do General Rommel, a vida social no Cairo era vibrante, cabarés de luxo a pleno vapor, festas nos 300 palácios da aristocracia rural  em Zamalek e Heliópolis, 15 hotéis luxuosos ocupados pela oficialidade, chás das cincos, romances, alta gastronomia no Groppi, restaurante suiço com o melhor cocktail de camarão do Canal. Apesar da guerra não faltava whisky, champagne francesa, cava espanhola, vinhos hungaros, cocotes francesas, caviar russo, anchovas portuguesas. Lutava-se no front, depois descanso no Cairo ou em Alexandria. Em 1942 começaram a chegar os americanos, vindos de avião pelo centro da Africa via Freetown, Fort Lamy e Cartoum, a partir de voos transatlanticos partindo da Flórida com escala em Recife.

Artemis Cooper, escreveu um clássico CAIRO IN TIMES OF WAR descrevendo esse período único na capital egípcia, a vida social intensa cujos epicentros eram a Embaixada Britânica e o Palácio Abdine onde reinava Farouk e sua numerosa corte, neutro na guerra que se desenrolava em seu território que não era sua.

Apesar de serem aliados da Alemanha mantinham Embaixadas no Cairo, quase até o fim da Guerra, a Hungria, a Romenia e a França de Vichy, todas centros de espionagem para desespero dos ingleses.  O Embaixador inglês Sir Miles Lampson era o maestro da vida social. A Inglaterra estava em guerra contra a Itália mas a Embaixatriz era italiana assim como os serviçais do Rei Fraouk no Palácio Abdine. Quando Lampson ordenou a Farouk que se livrasse dos italianos no Palácio porque havia risco de espionagem, o sarcástico Farouk replicou, “eu os mando embora depois que Sua Excelência se livrar de sua esposa italiana”.

Além do Rei Farouk, outros reis estavam no Cairo em refúgio, o Rei da Grécia, o Rei da Iugoslávia e grande número de nobres do leste europeu, milionários franceses e belgas, ladies inglesas, armadores noruegueses.

O Rio de Janeiro também foi um palco social intenso durante a Segunda Guerra, mereceria um livro. O Rio, com seus cassinos, recebeu muitos refugiados importantes, um oásis em um mundo conturbano. Propus a Artemis Cooper escrever em co-autoria esse livro, ficou de estudar quando dispor de tempo, dela também é PARIS EM TEMPO DE GUERRA sobre o mesmo período na Cidade-Luz. Guerra é tragédia mas nela brotam oásis.

Na Segunda Guerra foram cidades vibrantes Lisboa, Madrid, Estocolmo, Buenos Aires, Havana, Santiago, Lima, Cidade do México, Istambul, todas neutrais e centros de negócios típicos de guerra, mercado negro e contrabando, de espionagem e tráfego de dinheiro e de gente.

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

19 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Paraisos artificiais

    E como não lembrar do belo filme de Anthony Mingella O Paciente Inglês, que nos leva para o cenario e época descritos no texto de André Araujo. O Egito e todo o Mediterrâneo perderam o protagonismo d’então, mas vivem hoje outro protagonismo: o de lugar de passagem e por vezes cemitério de migrantes e refugiados entre o oriente e o ocidente.

    1. Qualquer semelhança….

      Esse é o destino de países dotados de extraordinárias riquezas, controlados por uma elite corrupta, completamente alheia aos interesses de seus povos. Qualquer semelhança não é mera coincidência.

      1. Sempre culpando uma “elite” abstrata

        A fórmula mágica para explicar o fracasso é culpar uma “elite”, como se a elite fosse pior que o resto da população. Na verdade essa elite, na imaginação dos comentaristas, é um totem, uma entidade etérea que ninguém sabe dizer exdatamente o que é, exceto que seus integrantes são sempre os outros.

  2. http://www.goodreads.com/book

    http://www.goodreads.com/book/show/11567065-lisbon

    Das cidades neutras na Segunda Guerra, LISBOA foi uma das mais ativas, Portugal beneficiou-se muito com

    a neutralidade,  um grande fluxo de refugiados ricos a espera de visto e passagem da Pan American para

    a America, podia ser EUA, Cuba ou Republica Domenicana, destinos mais frequentes.

    O livro LISBON : WAR IN THE SHADOWS 1939-1945 de Neil Lockery retrata essa epoca em Lisboa.

    1. Gulbenkian foi um dos que aportaram em Lisboa…

      A cidade vizinha a Cascais, Estoril, que também possui o seu, deu nome a casinos espalhados pelo mundo, Tem algo a ver com o período?  

  3. sem a mesma sorte e bem perto

    Não muito longe do Cairo eu tenho os relatos do meu tio Giulio, sem glamour.

    Enfiado em buracos nas areias do deserto, os avanços até Tobruk a quase rendição inglesa não fossem as forças e o poder bélico dos americanos, a batalha perdida a prisão, o retorno depois da guerra, uma vida sem a juventude. 

    1. O 1º cerco de Tobruk foi em abril de 1941

      O cerco durou 240 dias. E quem resistiu ao cerco Alemão foi as tropas da 9º divisão Australiana sob o comando do general Leslie Morshead, não os americanos que nem haviam entrado na guerra ainda! . O cerco foi rompido pelas tropas do 8º exercito britânico sob o comando general  Auchinleck em dezembro de 1941. Em 1942 Tobruk novamente foi cercada pelo Africa Korps de Rommel e desta vez ocupada. As tropas Australianas já tinham partido para enfrentar os japoneses no Pacífico. Somente depois da segunda batalha de El Alemein, as tropas britânicas agora sob o comando do general Bernard Montggomery liberaram Tobruk. Os americanos só atuaram no oeste do norte da Africa quando desembarcaram no Marrocos na operação Tocha e não participaram das grandes batalhas na Líbia entre 1940 e 1942.

  4. Parnamirim, o “Trampolim da Vitória”

    Prezado André Araújo,

    Sou seu fã e leio todas as suas postagens.

    Contudo, com  relação a esse “post”, permita-me efetuar um pequeno reparo: a escala dos americanos era em Parnamirim, cidade vizinha a Natal, e não em Recife. Para maiores detalhes, nesse sentido, reproduzo, a seguir,  trecho extraído da “Wikipedia”:

    Com o desenrolar da Segunda Guerra Mundial (19391945), o governo de Getúlio Vargas assinou, em julho de 1941, um acordo de defesa mútua que cedia áreas para a instalação de bases norte-americanas no Nordeste (em outubro de 1941), rompendo relações diplomáticas com a Alemanha, Itália e Japão, em janeiro de 1942 e, finalmente, em 22 de agosto do mesmo ano, declarar guerra aos países do eixo. A construção das bases naval e aérea, em Natal, seria fruto desses acordos.[14]

    Para manter as aparências da participação conjunta nos esforços de guerra e salvar a autoestima nacional, o governo brasileiro criou, por meio de um decreto, a Base Aérea de Natal, que daria o impulso decisivo para ao surgimento da cidade de Parnamirim. A pista de pouso das companhias comerciais dividia ao meio o campo de Parnamirim. Os brasileiros ficaram com o lado oeste, onde já estavam as instalações da Air France e da companhia de aviação italiana (LATI), desativadas desde o início da grande guerra na Europa. Eram instalações modestas demais para atender o esforço de guerra dos aliados e os americanos preferiram ocupar o lado leste. Lá, estava sendo construído um novo campo, na base leste: o Parnamirim Field, considerado o maior campo de aviação e base de operações militares que os Estados Unidos viriam a ter, durante a Segunda Guerra, fora do seu território.[14]

    Em termos estratégicos, Parnamirim Field foi a base de um triângulo que apontava para o teatro de operações (o norte da África e o sul da Europa), onde a sorte dos aliados contra os nazistas estava sendo lançada. Este triângulo era identificado nos mapas estratégicos norte-americanos como Trampoline of Victory (trampolim da vitória). Mas foi somente em outubro de 1946, dezessete meses após a rendição alemã, que a Base Leste foi entregue à Força Aérea Brasileira. No mesmo ano foi inaugurada a Estação de Passageiros da Base Aérea de Natal, elevada à condição de Aeroporto Internacional Augusto Severo, em 1951.[14]

    ____________

    Disponível em <https://pt.wikipedia.org/wiki/Parnamirim_(Rio_Grande_do_Norte)&gt;

    Acesso em 28 out 2016

     

    1. Agradeço o otimo comentario

      Agradeço o otimo comentario mas as ROTAS DO ATLANTICO SUL eram muitas, não se limitavam a Natal, a Pan American para os voos até a Africa usava muito Recife pela conveniencia geografica no cruzamento do Atlantico Sul, Paranamirim era mais usada pelos aviões militares americanos. Veja abaixo o longo relatorio das rotas pelo Atlantico Sul:

       

      https://en.wikipedia.org/wiki/South_Atlantic_air_ferry_route_in_World_War_II

      1. A “Rampa”

         Meus caros, quem inventou a ” Rampa “, ou a ” Fazendo dos Machados”, foi em 1927 com os franceses da Latecoere, depois CGA e por ultimo Aeropostale ( Saint Exuperie pousou e decolou bastante da Natal ), depois vieram os germanicos do Syndicato Condor, e por ultimo já em 1939/1940 as “squadras” italianas da LATI ( Lineas Aereas Transcontinentales Italianas ).

          Uma história interessante da época, é que durante alguns meses o pessoal da LATI, compartilhou hangar com os da PanAmerican, pois o hangar da LATI era o maior, mas após Pearl Harbour ( 07/12/1941 ), o governo americano pressionou Vargas com o cancelamento do combustivel de aviação ( AVGAS ) para as aeronaves da LATI, que eram fornecidos pela Shell, mas mesmo assim, não se sabe como até hj., e as versões são varias, a LATI ainda conseguiu durante meses, a manter o correio aereo Brasil – Italia.

           E caro André, podemos até lembrar da estação de radio que o filho do embaixador italiano, a época no Rio de Janeiro, um ótimo “habitué” do Cassino da Urca, manteve no Leblon durante meses

  5. Seria interessante os relatos
    Seria interessante os relatos de acontecimentos históricos ou atuais no
    mundo sempre serem postados aqui no Ggn,como forma de exemplo para os
    brasileiros,pois não temos noção de cidadania,respeito e ética, o bom exemplo
    TEM Q VIR DE ALGUM LUGAR !!!! Arriba Brasilll !!!

  6. Caro André

    Este e mais inúmeros outras postagens semelhantes evidencia o que é sabido em todos os cantos da terra: Ser rico é bom, não impoprta onde nem quando.

  7. Ver o Egito hoje e o do

    Ver o Egito hoje e o do passado, na época dos faraós, faz a gente ver como a história é imprevisível. O primeiro grande império da humanidade hoje é um país que, graças à sua elite fdp, é um dos mais pobres do mundo. E, ironia das ironias, a grande fonte de renda do Egito hoje é o dinheiro do turista – que vai pra lá pra testemunhar basicamente as pirâmides, o maior símbolo do que já foi um império. 

     

  8. Imperialismo, bah…

    Enquanto os homens exercem seus podres poderes,
    índios e padres e bichas, negros e mulheres
    e adolescentes
    fazem o carnaval

    Queria querer cantar afinado com eles,
    silenciar em respeito ao seu transe, num êxtase,
    ser indecente
    mas tudo é muito mau

    Caetano se esqueceu de incluir, entre os adolescentes inconsequentes, os militares e certos políticos…

  9. No relato do meu xará me
    No relato do meu xará me senti transportado para dentro do filme Casablanca. Tem aquela certa elegância nostalgica só possível com uma bela fotografia em preto e branco de um filme da decada de 40. Ele escreve como quem gostaria de ter nascido uns 30 anos mais cedo. Só faltou a minha musa, La Bergman. Cadê a Ingrid meu xará?
    PS. A Rita Hayworth de Gilda também serve.

  10. Unter den Linden

        Meu caro AA, 

        Poderiamos tambem colocar um ainda mais luxuoso e glamouroso, na mesma época e condições de guerra, o Adlon Kempinski Berlin, o mais exclusivo abrigo anti-bombas da 2a Guerra Mundial, que mesmo naquela fase, jamais perdeu seu charme.

         Até pode-se analisar a pobreza cultural dos nazistas, ao compararmos o Adlon  um local de classe, com o outro hotel berlinense que eles, Goebbels principalmente gostava, o Kaiserhof, um local para “ascendentes”.

         E filho, o Hilton Bagdah durante a Guerra do Golfo, ou mesmo durante a Irã x Iraque, sempre foi uma festa, bebida a vontade, musica boa, serviço razoavel, mesmo quando Sadam colocou baterias antiaereas nas proximidades, ele não foi atingido, e deu até para aprender algo : Quando vc, escuta o estrondo sonico de um bombardeiro ( avião de ataque ou missil ar-terra ), não se preocupe, ele já passou – esta em recuperação para altitude – e aquela explosão que vc. escutou segundos antes do “sonico”, foi a gerada por esta aeronave, como um cara me contou : a bomba ou o tiro que irá te matar, vc. não escuta, vc. já era.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador