Como operava o informante do cartel do metrô

Sugerido por Braga – BH

Da Istoé

Quem é e como operava o informante

Mais do que uma testemunha, o ex-diretor da Siemens, Everton Rheinheimer, delator do propinoduto tucano, era um dos expoentes do esquema

Pedro Marcondes de Moura, Sérgio Pardellas e Alan Rodrigues

 

O homem que pode abalar o Palácio dos Bandeirantes. Assim integrantes da força-tarefa responsável pela apuração do propinoduto tucano descrevem Everton Rheinheimer. A definição atribuída ao ex-diretor da divisão de transportes da Siemens não está relacionada apenas às suas mais recentes revelações ao Ministério Público, que fizeram com que o escândalo chegasse à cúpula tucana. Além de ser uma testemunha que acompanhou de perto toda a tramoia, Rheinheimer, na condição de dirigente da empresa alemã, era um dos expoentes do esquema. Reunia-se com lobistas, transitava com desenvoltura entre autoridades da CPTM e do Metrô e, segundo relato dele a interlocutores, chegou até a distribuir propina a mando da Siemens e com o conhecimento e o aval de políticos do PSDB.

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O CARA
O ex-diretor da Siemens reunia-se com lobistas, transitava entre autoridades da CPTM e do Metrô e até distribuía propinas

Ao longo de mais de duas décadas na Siemens, Everton Rheinheimer fez carreira até chegar à direção da bilionária divisão de transportes da companhia em 2001. A pessoas próximas, o ex-executivo narra que, ao participar de reuniões com autoridades do setor de transporte sobre trilhos, autorizar pagamento de propina e assegurar a participação da multinacional no cartel, ele apenas deu continuidade a uma prática recorrente na gestão de seu antecessor. A prática usual, mas nada lícita, era o único caminho para a Siemens conseguir amealhar contratos com o poder público, costuma dizer o ex-executivo. Sob sua gestão e com a ajuda dos lobistas Arthur Teixeira e Sérgio Teixeira, a Siemens sagrou-se vencedora de uma série de licitações que lesaram os contribuintes do Estado de São Paulo e do Distrito Federal. Foi com base nessa atuação e no que presenciou durante os governos de Mário Covas, Geraldo Alckmin e José Serra (2001 a 2007) que Rheinheimer enviou, na manhã de 12 de junho de 2008, uma carta anônima, de cinco páginas, ao ombudsman mundial da Siemens. No documento, com 77 tópicos e seis anexos, o ex-executivo relatou as ilegalidades praticadas pela filial brasileira e suas concorrentes. Na carta e em depoimentos prestados ao Ministério Publico e à Polícia Federal, ele revela uma lista extensa de políticos e servidores corrompidos pela Siemens, entre eles os secretários estaduais Edson Aparecido (Casa Civil), José Aníbal (Energia) e o deputado Arnaldo Jardim (PPS-SP). O informante relata ainda o “estreito relacionamento” entre o principal lobista do cartel, Arthur Teixeira, e os também secretários Jurandir Fernandes (PSDB) e Rodrigo Garcia (DEM), além do senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB), o deputado federal Walter Feldman (PSB-SP) e o deputado estadual Campos Machado (PTB). Segundo o ex-executivo, o propinoduto abasteceu o “caixa 2 do PSDB e do DEM”. Todos os políticos negam envolvimento com as irregularidades.

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PARCERIA
O lobista Arthur Teixeira, o diretor da CPTM, José Luís Lavorente, e o secretário Jurandir Fernandes (da esq. para a dir.): segundo o informante, os três participaram do esquema

Para pessoas de seu circulo íntimo, Everton Rheinheimer alega que resolveu abrir o verbo porque teria se revoltado com a maneira como o esquema era operado. Seu estado de ânimo teria se transformado após ele, pela primeira vez, ter feito a entrega da propina pessoalmente. Em meados de 2006, sem poder contar com a ajuda dos portadores frequentes ou lobistas, o ex-executivo teve de levar uma mala de dinheiro a um político paulista. “Foi um constrangimento para mim”, disse ele a interlocutores. Daí em diante, resolveu registrar e colher provas das práticas ilegais do cartel dos transportes. A versão heroica do ex-executivo contrasta com relatos de diretores de empresas subcontratadas pela Siemens. Segundo um executivo de uma empresa que teria participado do esquema, Rheinheimer não se constrangia em cobrar as comissões. “O dinheiro é para a base aliada do governo do PSDB”, alertava sempre Rheinheimer, segundo testemunho da fonte ouvida por ISTOÉ. “Sem a grana, não tinha negócio, dizia ele”, acrescentou a fonte.

Como ponta de lança do esquema, Everton Rheinheimer não teria dificuldades em reunir provas que incriminassem autoridades e políticos. Uma parte dessas provas já se tornou pública em reportagens publicadas por ISTOÉ desde julho. Entre elas, os contratos de fachada entre o conglomerado alemão e as consultorias radicadas em paraísos fiscais Leraway S/A e Gantown S/A, dos lobistas Sérgio Teixeira – morto em 2011 – e Arthur Teixeira. Este, indiciado pela Polícia Federal pelos delitos de corrupção ativa por subornar agentes públicos da área de transporte, lavagem de dinheiro e crime financeiro e alvo de bloqueio de bens por decisão da Justiça Federal. Também foram entregues por Everton, como ISTOÉ publicou com exclusividade, planilhas de saques da firma MGE de valores destinados a pagamentos a autoridades e cópias de contratos de serviços nunca prestados, segundo ele, firmados entre a empresa e a Siemens para esconder a origem da propina.

 

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Se há controvérsias quanto aos reais motivos que o levaram a detonar o esquema, o fato é que Rheinheimer só resolveu contar o que sabia um ano depois de a Siemens ser apanhada num dos maiores escândalos corporativos do mundo e lançar uma campanha para acabar com a prática de corrupção a agentes públicos em suas filiais em 2007. A carta enviada ao ombudsman da Siemens, no entanto, não teve o efeito que ele esperava inicialmente. Contrariado com o fato de a Siemens não levar adiante suas denúncias, o ex-executivo procurou a bancada do PT na Assembleia Legislativa de São Paulo. Nos primeiros contatos, deixava documentos ou relatos das falcatruas em um local próximo à sede do Legislativo paulista e ligava de um orelhão, sem se identificar, para que assessores do partido buscassem a papelada. Os documentos serviram de base para uma série de representações da bancada petista endereçadas ao Ministério Público – a maior parte se refere a contratos das estatais paulistas hoje sob investigação. Meses depois, identificou-se e passou a municiar ainda mais os parlamentares do PT. Acompanhado do então deputado estadual Simão Pedro, chegou até a conversar com um promotor paulista, mas não quis prestar depoimento por temer represálias de pessoas ligadas ao cartel. Foi então que recorreu ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão ligado ao Ministério da Justiça responsável por punir crimes que afetam a livre concorrência de mercado, como o de cartel. A proximidade com autoridades o fez sonhar com voos mais altos. Segundo documento da PF, Rheinheimer teria sugerido trocar dados sobre o cartel por um emprego na mineradora Vale, o que não se concretizou. Mesmo sem o emprego, ele forneceu informações suficientes para que a instituição pressionasse a Siemens a fazer um acordo de leniência – em que, em troca de denunciar todo o esquema, garantia imunidade a si e a seus antigos e atuais executivos –, trazendo à tona, em julho, o escândalo do propinoduto tucano. Desde então, de acordo com pessoas próximas ao ex-executivo, a Siemens passou a pagar sua defesa e viagens à Alemanha para retirá-lo do assédio de jornalistas. A preocupação com cortejo é tanta que ele removeu fotos suas da internet e tem evitado ficar em casa.

Redação

11 Comentários

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  1. Enquadramento

    Espera-se para breve que o mpe – ministério público estadual – intimem os jornalistas que fizeram a reportagem para saber de suas ligações com PT. O governador deve exigir todos os documentos em poder da revista para iniciar as investigações devidas.

  2. isso nao vai dar exatamente

    isso nao vai dar exatamente nada.

    Se alguns forem punidos, serão os do baixo clero, talvez até os denunciantes.

    No Brasil, está provado: punição é para pobre, preto, nordestino e petista.

  3. Os escorpiões, os sapos e os jornalistas…

    O problema dos jornalistas, e suas versões menos civilizadas, os porcalistas, é que comungam, quase ao mesmo tempo, de uma noção que lhes é a própria razão de existirem:

    Uma vez impressa uma noção como fato, a versão passa a soterrar a realidade…

    Os cacoetes mais sutis são contrabandeados, e sem que (quase)ninguém perceba, estamos a repetir o conceito que se impôs para manipular o resultado daquilo que dizem querer “apurar”.

    Cartel?

    Ora, bolas, cartel é o cac*te!

    Repetir, à exaustão a palavra cartel para um dos maiores escândalos de corrupção passiva, ativa, associação criminosa, pecultado, prevaricação, lavagem de dinheiro que se tem notícia, com conexões internacionais e que perpassou 12 anos, expondo as vísceras do partido do MP (seção paulista) é não só amenizar politicamente os estragos, mas pretender restringir a percepção do público para que apenas percebam que:

    a) um grupo político que foi vítima da voracidade de empresários maus…

    b) que os empresários ou seus diretores maus podem se arrepender em tempo de contarem tudo o que fizeram…

    c) que se tratou apenas de combinar preços de concorrência…

    d) o problema foi só de um promotor que engavetou…ele fez isto por conta e risco, portanto, não é um problema institucional…(mas se fosse um funcionário público “qualquer”, ou um “delegadozinho”, p*ta que pariu, o pau cantaria no lombo das instituições, das corporações, do Estado, da ONU, enfim, o escarcéu…)

    Engraçada porque trágica, é a seletividade dos analistas, dos porcalistas e seus asseclas que rastejam pelos blogs, sim, porque na ação 470, não cansaram de destacar, reproduzir e comemorar a fala indignada da vestal carmen lúcia (aquela que “não” sabia que seus auxiliares da gabinete “afanaram” milhares de reais em “horas extras” em 2012):

    “Mas caixa dois é crime, e crime grave!!!!”

    Cartel? Nem tanto…

    Pois é, me entristece que o truque seja ampliado até por quem pretende dar uma cobertura mais isenta da questão, como parece ser o caso da “recém-convertida” Quanto É!

    Mas é a natureza do escorpião, já soube o sapo…assim como é a natureza dos jornalistas…

     

  4. Segundo o José Simão o Psdb e

    Segundo o José Simão o Psdb e o Dem não se envolvem em corrupção. Só com cartel. O assunto vai sumir das manchetes já, já. Foi tudo armação do delator,  do PT e do ministro da justiça..

    Será que não dá jeito do xerife Joaquim Barbosa enquadrar estes petistas com a lei do silêncio imposta ao Genoíno  também? E a demissão do ministro do justiça quando que le vai impor? 

    Sabe como é que é, o deus do judiciário aliado a Globo pode tudo.

  5. Com todo respeito, Nassif,

    Com todo respeito, Nassif, acho que é preciso parar de chamar a ROUBALHEIRA TUCANA NO METRÔ de cartel. 

    As tecnicalidades neste caso beneficiam muito os LADRÕES e aqueles que incidentalmente fazem parte da quadrilha protegendo-os discursivamente nos jornais, telejornais e revistas. 

    1. É por isso que os tucanos

      É por isso que os tucanos ladrões se criaram, todos são cheios de dedos para falar qualquer coisa contra eles. Eles ficam em um pedestal, olham de cima da sua arrogância para os denunciantes ou potenciais denunciantes e todo mundo treme, sentem como se a Casa Grande fosse desabar sobre a cabeça deles.

  6. Para entrar para a cúpula do

    Para entrar para a cúpula do PSDB há um requisito fundamental: a cara de pau tem que ser impecável. É impressionante a sem cerimônia como eles distorcem denúncias contra eles e ainda jogam a sujeira na cara do denunciante. Se Deus permitir, ainda vou ver esses tucanos serem encarcerados pelos seus crimes, com punhos de rendas, fraque , cartola,  arrogância e tudo.

  7. É bom proteger a vida dele!

    Esse cara está sob proteção policial como testemunha?

    Por que se não estiver vai virar arquivo morto logo, logo.

    Quadrilha é quadrilha. Não tem quadrilha boazinha.

    Por muito menos, muita gente já partir desta para melhor…

    E e proteção tem que ser federal, não da polícia paulista, que não protege nem velhinha!

  8. A hora do ministro da Justiça

    Como podemos observar desde que se colocou como Ministro da Justiça, uma clara tendência a “ajudar” o PSDB em suas enrascadas.

    Não é de hoje que Cardozo vem numa frequência absurda de “ação entre amigos” com a turma do PSDB.

    Já foi longe demais sua ingerência contra o governo. Dilma Roussef deveria expurgar tal indivíduo que age de maneira a complicar todas as acões. Esta última envolvendo o chamado “cartel” foi a gota d’água. Cardozo nunca inspriou confiança em suas atitudes. Vive dando gol contra. Nas lambanças envolvendo a Sathiagraha ele já mostrou a que veio.

    Cardozo é o petista mais alinhado com os tucanos, mais até que o Palloci e Roberto Messias.

  9. A CASA CAIU

    A paixão política deixa as pessoas imbecilizadas. Fui ler o artigo no blogue da IstoÉ e fiquei assustado com os comentários postados. A maioria dos comentaristas têm a cara-de-pau (ou insensatez) de afirmar que a reportagem é mais um dossier dos PETRALHAS contra os TUCANOS, que é matéria paga e por aí afora. 

    Quando vejo pessoas indignadas com o tal mensalão, só posso acreditar que trata-se de indignação seletiva, pois elas não veem, ou não querem ver, as falcatruas dos tucanos. 

    Agora, assustador mesmo é o silêncio de Veja, de Época, das Organizações Globo (ou é Bando Globo?). Fico imaginando onde essa turma quer chegar com esse silêncio ensurdecedor. 

    Cara-de-pau e cínico é o José Aníbal: vai processar (será que vai?) o Ministro da Justiça por ele ter cumprido seu dever de mandar a PF investigar as falcatruas dos tucanos relatadas pelo ex-diretor da Siemens. Isto é S U R R E A L.

  10. Estava lendo um jornal – há

    Estava lendo um jornal – há muito tempo – num terminal de ônibus urbano quando senta-se ao meu lado
    um bêbado – nem tanto – e quando vê nas páginas uma famosa atriz da tv brasileira, logo se emociona alegando ser uma velha amiga de sua cidade e as diversas vezes que dividiu sua cama, façanhas, fatos sórdidos. Enfim.
    Não vem ao caso no momento.Tratei de partir para outra jornada antes que alguém da Veja ou da Folha envolvesse meu nome num escândalo – possibilidade insólita, visto que a referida atriz não era do PT.

    Mas tudo isso é passado. Hoje, vivemos numa legalidade. Seja quem for, vier testemunhar que ouviu conversas
    de corredor que começavam com dinheiro e terminavam com prefeito ou prefeitura em SP – seu depoimento
    imediatamente ganha destaque a la 11 de setembro. Isso que é democracia!

    No entanto, o estado de direito precisa ser conservado e se algum Edward Snowden aparecer querendo entupir HDs das redações com inegáveis atos da direita – atos esses visando a perpetuação no poder – citados tão veementemente no julgamento do mensalão como sendo o motivo central do expurgo e peso condenatório – também observamos equanimidade.

    Será que não percebem (as redações) que o cérebro humano funciona com sub rotinas desconhecidas.Por exemplo, o que deu errado nas manifestações de Junho?

    Levam-se meses – com todo cuidado – consultando envolvidos e pedindo sinceras desculpas por  serem obrigados a se manifestar – Acreditam de fato que com o volume de informações
    disponíveis sobre os acontecimentos, não existam elaborações complexas acontecendo nos recôndidos mais
    improváveis da sociedade?

    Na sequência iniciam-se as infindáveis táticas de resignificação de tudo que soe comprometedor.

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