Golpe é resultado da degradação do jornalismo, diz ex-ombudsman da Folha

Jornal GGN – Em artigo publicado pela Folha de S. Paulo, Mario Vitor Santos, ex-ombudsman e secretário de redação do jornal, afirma que a “ruptura institucional em via de ser completada” é resultado da degradação do jornalismo, colocada em prática por quase todos os meios de comunicação do pais. “Cuidados éticos foram sacrificados a tal ponto que o jornalismo promove a derrubada de uma presidente até agora considerada honesta”, afirma.

Para ele, ao contrário de informar os fatos de pontos de vista diferentes, os veículos brasileiros, “quase todos em dificuldades financeiras”, uniram esforços na defesa de uma ideia única, apostando em “exageros, catastrofismo e idiossincrasias”. “Veículos de mídia cederam ao populismo que inflama os ódios de classe e leva o país a vivenciar mais um golpe contra as instituições. Fica para conferir se a mídia terá no governo Temer a mesma obsessão higienizadora e incriminatória que exibe contra a ordem petista”, diz. Leia mais abaixo:

Enviado por esquiber

Da Folha

Apocalipse do jornalismo

A ruptura institucional em via de ser completada no Brasil é resultado direto da degradação do jornalismo posto em prática por quase todos os meios de comunicação no país. Os cuidados éticos foram sacrificados a tal ponto que o jornalismo promove a derrubada de uma presidente até agora considerada honesta.

Jornalismo deve informar os fatos de pontos de vista diferentes e contrários, encarnar ideias em disputa, canalizar o entrechoque de versões, sublimar antagonismos.

Veículos brasileiros, ao contrário, quase todos em dificuldades financeiras e assediados pelos novos hábitos do público, uniram esforços na defesa de uma ideia única. Compactaram-se em exageros, catastrofismo e idiossincrasias. Agruparam-se de um lado só da balança, fortes para nocautear um governo, mas fracos para manter sua própria razão de existir, a autonomia.

Poderia ser diferente. As denúncias de corrupção da Operação Lava Jato deveriam mesmo merecer toda a atenção de uma imprensa aguerrida. Deveriam mobilizar controles e cuidados na mesma proporção. No entanto, se a justiça da Lava Jato tem alvo preferencial, o jornalismo não deveria ter. Quem defende o equilíbrio quando justiça seletiva e jornalismo discricionário se fundem?

Normas e técnicas jornalísticas não são meros enfeites para códigos ou lições esquecidas nos bancos da escola. São peças essenciais para a sobrevivência da democracia. Na Lava Jato, o que deveria motivar uma custosa operação de checagem independente e edição autônoma derivou numa repetição inglória dos piores momentos do jornalismo do passado. A audição generosa e justa do chamado outro lado das denúncias, tanto na apuração das informações como em sua edição, não existiu.

O abuso de reportagens baseadas exclusivamente em fontes mantidas em sigilo tornou-se a regra. Vazamentos com objetivo manipulatório foram a tônica. Quando informações em “off” dão as cartas e o outro lado é uma formalidade, o jornalismo não existe senão como contrafação.

O que foi feito do esforço de convivência de tantos profissionais de ponta com outras culturas jornalísticas mais avançadas, tolerantes e variadas? Onde estão as intenções de controle técnico, equidistância, sobriedade e isenção?

Os ombudsmans, os rigores autonomistas das técnicas de investigação independentes e as autocríticas não serviram para nada. Virou pó o empenho de ao menos uma geração de profissionais para que o jornalismo, depois do infame apoio majoritário ao golpe de 1964, viesse a seguir melhores padrões.

Não pode haver fracasso maior para quem ao longo dos anos aspirou a se legitimar como instituição pilar de uma jovem democracia. Veículos de mídia cederam ao populismo que inflama os ódios de classe e leva o país a vivenciar mais um golpe contra as instituições.

Fica para conferir se a mídia terá no governo Temer a mesma obsessão higienizadora e incriminatória que exibe contra a ordem petista.

Já se diz que a queda do governo Dilma marca o ocaso do arranjo democrático da Constituição de 1988. Corporifica também o fim do breve ensaio de jornalismo surgido no bojo do movimento que levou à Nova República.

Parodiando o poema trágico de Murilo Mendes, essa mídia nativa, em busca da sobrevivência, nasceu para a catástrofe.

Redação

12 Comentários

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  1. realmente

    tenho muitas saudades do MARAVILHOSO pluralismo de idéias que havia no Jornalismo ao final da Ditadura/início da Nova República.

     

    Como lamento a perda daqueles ares de esperança, reflexões…

     

    NOJO desta ditadura midiatico-juridica-policialesca-cachoeira.

     

    Triste fim da Nossa Democracia Porcina. Triste.

  2. Samba de uma nota só

    Fico imaginando o que leva um jornalista  se submeter a esse papel depreciativo de não ter opinião própria, em troca de manter o emprego se não concordar com a opinião do patrão. Radialistas e apresentadores de telejornais de quase todos os meios de comunicação, repetindo diariamente as mesmas noticias e as mesmas palavras a elas relacionadas, como se fossem tiradas de uma cartilha pré concebida de manipulação tendenciosa. Escola nazista da pior qualidade usadas em tempo de guerra e de triste lembrança para a humanidade. É o jornalismo estafeta, que deve ser entregue lacrado e que não pode ser modificado. Triste papel destes “jornalistas” repassadores de versões patronais.

  3. .

    Penso que é preciso entender que , apesar de muitos enxergarem retrocesso , o que ocorre na verdade é um embate entre as novas forças políticas e as velhas. Há um retrocesso , provocado pelas forças políticas decadentes e que são majoritarias nas instituições do poder. Entretanto ,  a força do novo não foi e não vai ser eliminada . Ela está pulsante. A estrutura ultrapassada – na qual se inclui a mídia , o velho empresariado e a corja política de sempre – está toda carcomida. A GLOBO sabe que daqui a dez anos ela não existirá mais – ao menos não como é hoje. O mesmo vale para a revista VEJA. Os governadores e os velhos políticos sabem que o sistema tributário , o pacto federativo e o sistema eleitoral de representatividade são todos inviáveis. O empresariado da FIESP sabe que a distribuição de renda , a sonegação e seu parasitismo nos negócios com o governo tem dias contados. 

    Vejam a enorme dificuldade que estão tendo para tocar adiante o golpe. Não foi aquela maravilha do day after de 1964 .  

    Como toda estrutura carcomida , quando despencar , despenca de uma vez. Porque vão se agarrando ao poder até não mais se sustentarem. Basta o momento e os agentes políticos certos . E esses aparecem de repente. Lembrem-se dos 70 anos do mundo comunista. Aquele império ruiu em pouas semanas. 

    Penso que figuras como o prefeito paulistano Fernando Haddad e outras que a crise fará despontar nos próximos anos terão a chance de fazer mudanças profundas e melhores. Se Deus também nos ajudar um pouco. 

     

  4. Humberto Eco, no livro,

    Humberto Eco, no livro, Cemitério de Praga, cita jornais que são controlados pelos Marçons, Judeus e outras pragas que faziam a mesma sacanagem de hoje. Incrível, nada mudou?

  5. Detonou os recentes ombudasman da Folha?

    “O que foi feito do esforço de convivência de tantos profissionais de ponta com outras culturas jornalísticas mais avançadas, tolerantes e variadas? Onde estão as intenções de controle técnico, equidistância, sobriedade e isenção?

    Os ombudsmans, os rigores autonomistas das técnicas de investigação independentes e as autocríticas não serviram para nada. Virou pó o empenho de ao menos uma geração de profissionais para que o jornalismo, depois do infame apoio majoritário ao golpe de 1964, viesse a seguir melhores padrões.”

    Acho que ele detonou o(a)s mais recentes ombudsman da Folha. Acho, sim. Se acho.

    E se detonou, conforme acho, acho que foi muito bem feito. Merecido.

     

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