Pochmann critica curtoprazismo do ajuste fiscal do governo

 
Jornal GGN – O presidente da Fundação Perseu Abramo, ligada ao PT, Márcio Pochmann criticou o ajuste fiscal da equipe econômica de Dilma que, através de medidas de choque com impactos no curto prazo, “desorganizou a capacidade de o governo liderar os investimentos”. Para o economista as medidas de ajuste para reaquecer a economia deveriam ser aplicadas de forma gradual.
 
Pochmann assina, ao lado de outros intelectuais da esquerda, o documento “Por um Brasil Justo e Democrático”, lançado recentemente e baseado em outro documento, lançado nos anos 1980 por desenvolvimentistas chamado “Esperança e Mudança”, com medidas para barrar a recessão naquela época. O texto atual defende um projeto de reindustrialização no país. Segundo o economista, o prolongamento de uma recessão hoje irá alimentar mais protestos no Brasil, isso porque a população não será capaz de suportar o rebaixamento do padrão de vida. 
 
Folha de S.Paulo
 
Entrevista Marcio Pochmann
 
Futuro está bloqueado pela ditadura do curtoprazismo
 
PARA ECONOMISTA LIGADO AO PT, PAÍS NÃO AGUENTA RECESSÃO PROLONGADA E MEDIDAS DE AJUSTE DEVERIAM SER GRADUAIS
 
ELEONORA DE LUCENA
DE SÃO PAULO
 
“Por quanto tempo a população sustentará medidas que apontam para o rebaixamento de seu padrão de vida?”.
 
Quem faz o alerta é o economista Marcio Pochmann, 53, presidente da Fundação Perseu Abramo, ligada ao PT. Para ele, o ajuste do governo é um equívoco, reforça o baixo dinamismo da economia e ameaça direitos conquistados.
 
Ex-presidente do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), Pochmann diz que a agenda de futuro do país está sendo bloqueada pela “ditadura do curtoprazismo”, lógica do mercado financeiro.
 
Contra essa corrente, ele e dezenas de intelectuais lançaram, na semana passada, um documento com sugestões de mudanças políticas e econômicas: “Por um Brasil Justo e Democrático”.
 
Nesta entrevista, ele avalia que o governo pode dar uma virada à esquerda e encampar as ideias do texto.
 
Folha – Qual é o foco do documento “Por um Brasil Justo e Democrático”?
 
Marcio Pochmann – É olhar o futuro. O Brasil se enfraqueceu do ponto de vista produtivo. Nosso projeto é de reindustrialização nacional. No início dos anos 1980, desenvolvimentistas fizeram o documento “Esperança e Mudança”, com um projeto para o Brasil, que estava em recessão por três anos (1981-83). Foi nossa referência.
 
Por que o governo deu uma guinada e adotou ajuste que, diz o documento, segue a lógica do mercado financeiro?
 
A nova equipe econômica convenceu a presidente de que era mais importante adotar uma terapia de choque, que, diziam, teria efeitos negativos, mas de curto prazo. Fizeram choques fiscal, monetário, cambial e de preços. Tudo no mesmo momento. Isso alterou dramaticamente as expectativas e jogou a economia numa recessão. O impacto foi talvez surpreendente para a equipe econômica.
 
Surpresa? A recessão não foi deliberadamente fabricada?
 
As questões principais não estão resolvidas. Qual o projeto pós-ajuste? A lógica do ajuste é um fim em si mesmo. Não fixa pontes para o futuro. Está queimando pontes com o presente e passado. As sugestões que ganham força são de corte em despesas obrigatórias, estabelecidas como direitos e conquistas. A oposição, que não tem projeto para o futuro, diz que a Constituição não cabe no PIB.
 
Como o senhor rebate essa afirmação?
 
Temos uma despesa que não gera nenhum ganho e é improdutiva, que é a com os juros da dívida. Eles são campeões do mundo para uma dívida relativamente baixa em relação ao PIB. Defendemos finanças públicas saudáveis. As opções que estão sendo tomadas não levam a isso.
 
O ajuste não era necessário?
 
Medidas deveriam ter sido tomadas de forma gradual. O choque desorganizou a capacidade de o governo liderar os investimentos. Precisamos reindustrializar. A agenda que é a ponte para o futuro vai sendo bloqueada pela ditadura do curtoprazismo. Estamos na lógica do mercado financeiro, especulativo.
 
O empresariado está muito contrariado com o ajuste?
 
Não estão satisfeitos. É insustentável uma recessão prolongada. A se manter o quadro, os protestos contra a recessão vão crescer, como cresceram nos anos 1980, quando um grupo de trabalhadores derrubou as grades do Palácio dos Bandeirantes. Temos agravamento porque as pessoas percebem a piora, o rebaixamento do padrão de vida. Por quanto tempo o povo vai sustentar medidas que apontam para o rebaixamento de seu padrão de vida? É um caldo de cultura que favorece situações políticas que não sabemos muito bem.
 
O sr. considera a hipótese de o governo encampar as ideias do documento e dar uma virada à esquerda?
 
Sim. Estamos no início de um governo que tem quatro anos pela frente. A maioria hoje é muito frágil e a mudança ministerial vai no sentido de recompor uma maioria política para sustentar o governo para os próximos anos.
 
A mudança ministerial pode significar uma virada à esquerda? Não é o que parece.
 
A recomposição da maioria pode apontar para um caminho à esquerda. Juscelino Kubitschek foi eleito e não tinha maioria nas esferas institucionais –tinha só um terço dos votos no Congresso. E foi construir a maioria fora dessas esferas. Fez o programa de metas fora do governo e o executa fora da administração pública tradicional, cria grupos executivos. Esse movimento lhe permitiu reconstruir as bases no congresso.
 
O documento afirma que são os pobres que pagam a conta do social. Por quê?
 
Os pobres pagam mais impostos proporcionalmente do que os ricos. Para os pobres foi criado o Bolsa Família. Mas para a classe média e os ricos que podem declarar o Imposto de Renda há abatimento com gastos privados em instrução. Dá mais do que o Bolsa Família atual.
 
Há uma ‘Bolsa Rico’?
 
Se houvesse um esforço concentrado só na questão da sonegação, não precisaria do ajuste. Sonegação, subsídios, desonerações: o Estado brasileiro é muito corajoso para cobrar imposto de pobre e paternalista para cobrar imposto de rico. Quem mais paga imposto não reclama e quem menos paga, reclama.
Redação

2 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Como já disse um senador do

    Como já disse um senador do PT, com esse ministério, seria melhor ter perdido a eleição. Sem falar na manutenção do sinistro da justiça.

  2. Reindustrializar ?

    É um belo termo quando usado de maneira leviana.

    Explicar como se faz isso é que é o problema. 

    Só prá começar, como se faz isso se nossas lei trabalhistas são jurássicas e não nos permitem concorrer com outros países ?

    Foi só falar em flexibilização da terceirização de mão-de-obra industrial, estratégia adotada em todo o mundo hoje, inclusive nos países europeus, e já sairam sindicalistas ateando fogo as vestes como se tivessem decretado o extermínio dos trabalhadores brasileiros.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador