Poder econômico se apossou do Estado e barrou avanços civilizatórios, por Marcio Pochmann

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Durante a transição na década de 80, PMDB resgatou o espírito reformista, agora, é mais funcional para o mercado. Foto: Arquivo Senado

Da Rede Brasil Atual

Poder econômico se apossou do Estado e barrou avanços civilizatórios

Os escândalos são fruto da natureza viciada da relação do Estado com o mercado. É necessária uma reforma política que democratize o voto e coíba o poder do dinheiro sobre Legislativo, Executivo e Judiciário
 
por Marcio Pochmann

Durante o período da ditadura civil-militar (1964-1985), os principais inimigos da democracia podiam ser simplificados pelos grandes capitalistas e pelo estamento dirigente estatal, ambos tementes das reformas civilizatórias prometidas no ciclo político do segundo pós-guerra (1945-1964). Por conta disso, as reformas de base apresentadas pelo governo Jango para conter o tipo de capitalismo selvagem estabelecido no Brasil foram brutalmente rompidas pelo golpe de Estado em 1964.

Ainda durante a transição para a retomada democrática, na primeira metade da década de 1980, o lançamento do programa Esperança e Mudança do PMDB resgatou o espírito reformista enquanto componente necessário para a transformação da relação transparente do Estado com o mercado e da atuação ética do estamento dirigente estatal. Mais de três décadas depois, a experiência democrática brasileira, a mais longeva de todas, se manteve distante da perspectiva de civilizar o capitalismo selvagem aqui instalado, e tampouco de estancar o patrimonialismo inserido no interior do Estado.

Sem reformas, o regime democrático se tornou funcional aos capitalistas, capazes de converter o sistema eleitoral numa espécie de negócio rentável. Enquanto os grandes capitalistas financiam privadamente o processo eleitoral, recebem em contrapartida um conjunto de benesses operado arbitrariamente pelo estamento dirigente estatal.

Dessa forma, o mercantilismo capitalista invadiu o certame eleitoral da escolha democrática da representação popular, acompanhado, em geral, de lucros extraordinários obtidos a partir do financiamento do sistema político. Do conjunto das delações recentemente tornadas públicas, percebe-se o quanto o poder do dinheiro não parece ter limites para os verdadeiros donos do Brasil.

Tudo parece estar à venda. Da compra de leis no Legislativo a pareceres e decisões no Judiciário, as aferições de fiscais e outras funções de interesse do Executivo. Mesmo as informações econômicas confidenciais são privilegiadas a poucos, o que faz o capitalismo de Estado funcionar ao reverso. Não seria mais o Estado a comandar o conjunto dos capitalistas, mas simplesmente o contrário.  

Nessa mesma perspectiva, o velho estamento dirigente nas mais distintas esferas do aparelho de Estado terminaria o utilizando para o seu fim próprio. Parcela do estamento segue recebendo remunerações acima do limite constitucional, o que torna atual a velha máxima: “para os amigos tudo, os inimigos a lei”.

Para resolver o descrédito que se generaliza, é necessária a realização da reforma política que democratize o voto, coíba o poder do dinheiro e facilite a formação de convergência para maioria partidária. Na sequência, o desencadeamento das eleições gerais.

Conforme experiências passadas, o Brasil cresce justamente no interior das dificuldades. São elas que forçam a adoção de soluções até então inimagináveis.  

Talvez por isso os escândalos que na atualidade proliferam possam revelar não apenas a natureza viciada da relação do Estado com o mercado como também os laços do patrimonialismo ainda presente no estamento estatal dirigente. Em plena crise, a mais amarga de sua história republicana, a recuperação do elo perdido das verdadeiras reformas prometidas no ciclo democrático do segundo pós-guerra (1945 – 1964) permite conectar o momento atual com uma perspectiva de futuro diferente da democracia mercantil e do patrimonialismo do estamento estatal.  

Marcio Pochmann é professor do Instituto de Economia e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho, ambos da Universidade Estadual de Campinas.

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8 Comentários

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  1. Claro, pois a é economia que determina a política

    “O governo moderno não é senão um comitê para gerir os negócios comuns de toda a burguesia”. – Marx e Engelsd, Manifesto Comunista

     

    “Capital privado tende a se concentrar em poucas mãos, em parte devido à competição entre os capitalistas, em parte porque o desenvolvimento tecnológico e o crescimento da divisão do trabalho estimulam a formação de unidades de produção maiores, em prejuízo das menores. O resultado desses desenvolvimentos é uma oligarquia do capital privado, cujo enorme poder não pode ser efetivamente controlado sequer por uma sociedade política democraticamente organizada.

    Isso é assim porque os membros dos corpos legislativos são selecionados por partidos políticos, que são amplamente financiados, ou influenciados de algum outro modo, por capitalistas privados que, para todos os propósitos práticos, separam o eleitorado da legislatura. A consequência é que os representantes do povo não protegem de fato e de modo suficiente os interesses dos setores menos privilegiados da população. Além disso, nas condições atuais os capitalistas privados inevitavelmente controlam, direta ou indiretamente, as principais fontes de informação (imprensa, rádio, educação). Torna-se assim extremamente difícil para o cidadão individual, e de fato impossível na maioria dos casos, chegar a conclusões objetivas e fazer uso inteligente dos seus direitos políticos.” – Einstein, Porque o Socialismo?

    https://www.marxists.org/portugues/einstein/1949/05/socialismo.htm

  2. Sendo eu mesmo um capitalista

    Sendo eu mesmo um capitalista eu faço uma ressalva. Eu poderia dizer que na verdade o que vocês conhecem por “capitalismo brasileiro” sempre foi um grupo difuso de escravocratas lutando para puxar mais recursos para os cofres deles enquanto mantém a população sob controle por meio do uso da violência e da lavagem cerebral. Eu estou faz algum tempo no país e até agora não vi uma única situação em que não tivesse algum “sujeito de família importante” tentando colocar empecilhos nos meus negócios para vender depois “facilidades”, e também não vi até agora algum segmento de mercado aonde não tenha pelo menos um player desonesto ou criminoso envolvido.

    Que uma boa empresa, um bom empresário faz questão de dizer com orgulho “eu fiz isso” ao levantar o produto dele da mesa e também diz com orgulho “eu emprego milhares de funcionários”. O Brasil não têm nada disso, têm um punhado de “empresários” que não evoluíram quase nada desde os primeiros colonizadores portugueses que vinham para enriquecer o mais depressa possível na colônia para depois voltar para Portugal, deixando uma terra arrasada para trás. Isso não é capitalismo.

    1. Capitalismo bacana mesmo é

      Capitalismo bacana mesmo é nos EUA onde não se admite monopólios porque detonam com a concorrência, onde o estado jamais proteje uma empresa em detrimento de outras por lobby, onde os capitalistas não infiltram-se no estado para, maniplando-o, criar guerra e terror, matar milhões de civis estrangeiros e assim fomentar a si mesmos. Tremenda aquisição civilizatória, o capitalismo daquele país. A propósito empresários banqueiros de que país deflagram o ataque às economias nacionais em 2008, que resultaram numa convulsão social que mata milhões desde então e até hoje? E os capitalistas perfeitos dos EUA não se beneficiam de trabalho precarizado nem em seus próprio território nem em outros países, é isso?

  3. Marx estava certo. Quanto

    Marx estava certo. Quanto mais se aperfeiçoa o capitalismo, mais se caminha para sua superação. O capital, por isso, gosta de manter escravaturas, ditaduras, transgressões a leis, violências e toda sorte de incivilidades mas cuida de nos vender a ideia de que já somos civilizados, seguimos a moda… Como é aquela história de que a História acabou? O tempo parou, é isso? Qual a natureza da coisa para a qual os tempo parou e a História acabou senão a natureza Morta?

    1. esperança….

      A Gstapo Ideológica continuará com este Anti Capitalismo Tupiniquim? Pobre Poder Político se deixa corromper pelo dinheiro?! Estou quase chorando por ver figuras de uma honestidade virginal se deixarem levar pela cobiça. E o Brasil poderia tanto com os Neves, a começar pelo avô, que derrubou o malvado do Paulo Maluf !!! E tucanos e petistas. Anti Capitalistas desde a genética. Frei Chico e suas Consultorias para a Odebrecht. Afinal não é fácil ir para Cuba toda semana e não fazer umas compras em Miami, não é mesmo? HONESTIDADE ANTI CAPITALISTA. E eu não sabia disto? Como é didática esta nossa Imprensa?! O interessante é que entre milhares de horas gravadas e encontros, não existe Um ÚNICO, pedido partindo dos empresários para os politicos. E sempre a exigência extorsiva do politico para o achacamento do empresário. Sabe com quem tá falando? A extorsão velada. E os pobres inocentes são aqueles que indicam os Ministros do STF, toda cupula do Poder Judiciário, empossam Delegados e Procuradores, fazem leis, informam as obras, controlam o Orçamento, liberam ou retém o dinheiro… E estes “Inocentes” (não é mesmo Temer e Aécio) são corrompidos pelo vil metal? Somente no Brasil ainda ainda ouvimos esta ladainha. Inacreditável !!!! 

      1. Ria prá não chorar, Zé $érgio, pois você tá sendo gravado

        É Rir prá não Chorar

        (Jota Quest)

         

        Tô pensando muito sério
        Em mudar meu raciocínio
        Tô querendo ficar zen
        Mas não tenho patrocínio
        Falta o líquido e o certo
        Falta até água da chuva
        Pra lavar essa sujeira
        Pra levar essa minha busca

        Eu sei que tenho que ir assim
        Não vou ficar parado aqui
        Sem fazer nada
        Eu te aconselho à vir também
        Porque já não dá mais pra deixar prá lá
        Tem gente que tá puro lixo
        E quem tá com a mão mais suja:
        O empresário ou o político?
        O acusado ou quem acusa?

        Eu peço a atenção ao povo
        Quando for eleger de novo
        Se lembrem de tudo
        Que pensem no futuro

        Ah Ah Ah Ah
        É rir pra não chorar

        É que agora veio à tona
        O que já tava acontecendo
        Acabou não tem mistério
        O que estavam escondendo
        Não se sabe de onde vem
        Só que é muita grana suja
        Dividiram entre eles
        O que era de outros, meu
        Eu sei que eu devo ir assim
        Não vou ficar parado aqui
        Sem fazer nada
        E eu te aconselho a vir também
        Por que já não dá mais pra deixar pra lá
        Não é possível que essa troup
        Depois dessa saia impune
        Que senão Deus nos ajude
        Que eu tenha força e atitude
        Eu peço a atenção ao povo
        Quando for eleger de novo
        Se lembrem de tudo
        E pensem no futuro

         

         

        Mas saibam não adianta dedetizar as moscas e não remover a merda capitalista, pois ela fatalmente atrairá outras moscas.

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