Rescisão de contratos do governo interino Temer com blogs de oposição é inconstitucional

É ilegal e inconstitucional a rescisão de contratos do governo interino Temer com blogs de oposição

por Percival Maricato

As notícias têm origem no governo e não foram desmentidas: o governo Temer rescindiu contratos com blogs da oposição a seu governo por motivação política. Quando muito, elas dizem que a rescisão foi com blogs simpatizantes do PT ou contrários ao impeachment.

Do ponto de vista Constitucional, trata-se de uma violência não vista desde a época da ditadura militar.  Está claro na Carta Magna o direito de expressão, a liberdade de imprensa, a vedação a censura e outras normas correlatas.

Muito ao contrário, é obrigação do governo defender e até estimular a pluralidade de opiniões dentro de um regime democrático. É sabido que esses blogs tem muito menos poder econômico se comparado as demais mídias, são os únicos meios de comunicação que se posicionam conforme opinião de 30% da população brasileira, a esquerda, acreditando-se em pesquisas do Datafolha, Ibope etc (eleitores de Lula, Ciro Gomes, Luciana Genro etc).

Logo em seu artigo 1º a Constituição se preocupa em colocar entre fundamentos da República, alinhando no item V, o PLURALISMO POLÍTICO.  No artigo 5º Caput, consta que todos são iguais perante a lei. Em seu item IV está insculpido que “é livre a manifestação de pensamento”; o item VIII prescreve que “ninguém será privado de direitos por…convicção política.”

O governo é Poder Público e não poder da tendência política que o controla. Não pode dirigir verbas públicas apenas para seus simpatizantes. Lula e Dilma entenderam isso ao permitir a publicidade inclusive na Globo, revista Veja e assemelhadas, apesar de criticarem seus governos, incessantemente, como se fossem 100%  corruptos, mal intencionados e incompetentes.

É inconstitucional também por ferir os princípios obrigatórios na conduta do Poder Público, especialmente os da impessoalidade e da igualdade. Até o leigo pode concluir que ferem também os da moralidade, da transparência, da isonomia, da legalidade, da equidade etc. Princípios são mais que leis, são normas estruturantes, fundamentais no Estado Democrático de Direito. Desobedecê-los intencionalmente, pior ainda se por discriminação contra a pluralidade política, é o mais grave dos crimes, bem mais grave que pedaladas.

Por ser inconstitucional, obviamente a decisão foi também ilegal, mas nem precisaria tanto. Foi ilegal mesmo à luz das normas infraconstitucionais. A rescisão de contratos públicos exige motivações previstas em lei, não podem jamais ser fundamentadas no fato dos contratados terem determinada posição política ou governantes não gostarem do contratado. Se assim fosse, Dilma, voltando, ou futuros presidentes, ou governadores atuais, poderiam fazer o mesmo. Os que estão gostando da decisão de Temer (entre eles os que sempre defendem a “liberdade de imprensa”, quando se fala em democratização de mídias e neste caso, silenciam) pensaram nisso? Ou vai ser como reeleição, nomeação de ministro ao STF etc, vale para uns e não para outros.

Se algo deve ser feito pelo governo, que tal fazer valer o parágrafo 5ª do artigo 220 da Carta Magna, onde consta que “os meios de comunicação não podem direta ou indiretamente ser objeto de monopólio ou oligopólio”. Uma mídia de pensamento único afronta ainda  outros itens do referido artigo 220:

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação,  sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§ 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.

§ 2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.

No caso, não houve sequer a preocupação de tentar explicar as rescisões de contratos do ponto de vista econômico, talvez porque os valores  pagos aos blogs referidos representam menos de 1% da verba gasta pelo governo com mídias. E como já transparece em uma ou outra declaração eles serão redistribuídos por órgãos de comunicação que apoiam o governo.

Trata-se de um ilícito que pode ser discutido política, mas também juridicamente, Se redistribuída a referida  verba por órgãos que apoiam o governo, cabe ação popular para que os responsáveis por esse ato arbitrário sejam condenados a devolver o valor aos cofres públicos. Os blogs que tiverem prejuízos significativos em virtude da rescisão imotivada (sem fundamentos legais), podem pedir indenização e entendemos, os responsáveis pela violência também deve indenizar a União se a ação for procedente. Afinal, repita-se, a liberdade de imprensa não é tão só liberdade de imprensa de quem apoia este ou aquele governo.

Percival Maricato

Ilustração de Angeli em montagem do GGN

Redação

10 Comentários

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  1. Caro Nassif
    O governo em si é

    Caro Nassif

    O governo em si é ilegal.

    Ele está sendo reconstruido com o que há de mais puro do sangue da casa grande, portanto, oposição é proibido, informar é proibido, povo é proibido, entre outras coisas.

    Não há mais leis, apenas as que eles estão fazendo.

    Saudações

     

  2. Não acho que seja censura.

    Não acho que seja censura. Blogs são iniciativas privadas de pessoas físicas e algumas até possuem personalidade jurídica.

    Que o dono vá atras de entes privados e publicos e demonstre por a + b, que vale a pena anunciar em seu espaço, que é lido por n pessoas, que isso e mais aquilo.

    Agora, colocar dinheiro público direto do governo federal ou de estatais em blogs que não possuem quantidade de leitores que permitam atrair atenção de entes privados e públicos e exigir que o governo federal financie esses blogs cujo objetivo básico é opor-se ao seu principal pagante, convenha-se…

    Este espaço mesmo, vejo propaganda do Bradesco, da vivo, etc. Que esses blogs façam o mesmo.

     

    1. “Esses Blogs”

      Estes blogs, a que se refere o MarcoA., têm mais leitores do que muitos órgãos de imprensa financiados pelo governo. E é evidente que o Estado Democrático, não o governo (qualquer governo), deve ter interesse na diversidade de notícias e opiniões. Caso seja utilizado um critério técnico para a distriuição de verba, “esses” blogs teriam uma fatia bastante razoável.

      1. O governo não deveria gastar

        O governo não deveria gastar 1 centavo em propaganda. Tem os portais de transparência e a mídia privada. Nenhuma estatal deveria fazer propaganda, nem caixa, nem BB, nem petrobras, nenhuma. Pronto, problema resolvido, nem para chico, nem para francisco.

    2. Publicidade pública pra mim é

      Publicidade pública pra mim é jogar dinheiro fora. Porém, pela sua opinião, jogar umas migalhas fora num blog de esquerda é muita mais grave do que jogar bilhões fora na horta da rede goebbels, né? 

  3. a direita sempre manipulou

    a direita sempre manipulou assim chantagistamente a propaganda,

    assim como sempre a grande mídia golpista chantageou,historicamente….

  4. O que se espera é a não conformidade…

    Parabéns ao articulista por nos brindar com um argumento perfeito sobre o tema.

    O que se espera agora é que não haja conformação dos blogs independentes com o desejo dos interinos de silenciá-los.

    Portanto, há que se promover uma grande mobilização e entrar com medida judicial à altura para impedir a consumação dessa violência inominável.

     

  5. Blogs fazedores de opinião
    Esses blogs são todos propaganda política, deveriam ser todos cancelados mesmo. Se bobear muitos são formas de tirar mais dinheiro público, tática petista !

  6. A atitude do (des)governo

    A atitude do (des)governo Temer vai contra também as recomendações da Unesco sobre comportamento do poder púbico em relação ao fomento à pluralidade da mídia.

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