Submundo da internet já se tornou formador de opinião, diz Sakamoto

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Sakamoto: Há estruturas armadas para isso (propagar mentiras), e também tem muita gente que é paga

Leonardo Sakamoto

da Rede Brasil Atual

Submundo da internet já se tornou formador de opinião, diz Leonardo Sakamoto

Produção de notícias falsas: de quem é a responsabilidade? “Pra muita gente, confiável é quem fala aquilo que ela quer ouvir”

por Vitor Nuzzi, da RBA

São Paulo – A enxurrada de notícias falsas na internet, que é motivo de preocupação de observadores e agentes da comunicação, mistura descuido, interesses e más intenções. Em debate realizado na manhã de hoje (5), o jornalista e cientista político Leonardo Sakamoto, diretor da ONG Repórter Brasil, disse que os divulgadores das chamadas fake news, que ele chamou de “submundo”, já se tornaram fontes de informação. “A parte invisível da internet, os sites anônimos, que não têm expediente, que não tem quem assina, já formam opinião tanto quanto a parte visível”, afirmou.

O evento foi promovido pela Faculdade de Comunicação da Fundação Armando Alvares Penteado (Facom/Faap). Foi a primeira edição de uma parceria com o jornal espanhol El País – outras duas já estão programadas para este ano. “A gente está vivendo um momento tão complicado no Brasil que qualquer motivo é motivo para virar fake news“, comentou a editora-executiva do El País Brasil, Carla Jimenez, citando caso ocorrido ainda ontem, sobre uma informação a respeito de emenda para prorrogar o mandato do atual governo.

“Antes do desmentido, já tinha ido pros blogs de esquerda e essa notícia pegou fogo. Essa ansiedade, a insatisfação e o estado emocional do país favorecem também essa disseminação de informações.” Carla contou ter se assustado quando um jornalista catalão disse a ela estar espantado com o grau de polarização no Brasil. “A Catalunha (região da Espanha) vive esse dilema da separação há muitas décadas, e ouvir isso dele me chocou.”

Autor de livro com título autoexplicativo (O que aprendi sendo xingado na internet), Sakamoto citou três casos em que foi envolvido em divulgação de falsas notícias. Contou que foi xingado e agredido na rua, além de alvo de uma cuspida (que não o acertou). “Na internet, o ônus da prova é do acusado. Você tem de provar que você não fez alguma coisa que alguém acabou colocando.”

Há também aqueles que ajudam a espalhar essas notícias por identificação. “Pouco importa pra muita gente se aquilo é verdade ou mentira, o que importa é que aquilo pode ser usado como munição na guerra virtual. Você começa a usar aquilo à exaustão. Mesmo portais verdadeiros acabam caindo também nesse processo”, diz Sakamoto, para quem a preocupação principal deve ser “qualificar o debate público”.

Como se faz isso? Por exemplo, não dando likes (a imagem em que o polegar aparece levantado, sinal de que gostou da publicação) para coisas absurdas que se espalham na redes. “A partir daí, você tem a construção de uma verdade”, afirma o jornalista, para quem a trollagem “é uma ciência”.

O caso da figurinista Su Tonani, que recentemente denunciou o ator José Mayer por assédio, também levou a uma notícia falsa, de que eles teriam sido amantes. Isso a motivou a novamente se pronunciar, em um texto publicado hoje no blog #AgoraÉQueSãoElas, no portal UOL. 

Checagem

Segundo a coordenadora do curso de Jornalismo da Faap, a jornalista e cientista social Mônica Rugai Bastos, uma preocupação básica do profissional deve ser buscar as fontes, de preferência as que originaram a informação. Ela destaca a responsabilidade da mídia, mas também chama a atenção do leitor, do receptor da notícia. “Os veículos de comunicação também têm responsabilidade. (Devem) checar a informação, para uma produção de qualidade. Se a sociedade quiser, terá notícia de qualidade”, afirmou. Mas muitas vezes, observou, à preocupação é de “repercutir o próprio ódio”.  

Uma falsa notícia sobre o fim do programa Bolsa Família chegou a ter mais de 400 mil compartilhamentos. Sobre a “prisão” do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nove em 10 notícias compartillhadas eram fakes. Às vezes, uma simples consulta ao Google pode resolver o problema, diz o jornalista e cientista político André Rossi, sócio-fundador da Veto, empresa de inteligência de redes.

Ele também sugere desconfiar de sites com nomes que tentam “imitar” veículos conhecidos, citando a Folha Política. Rossi lembra que Google e Facebook começam a adotar medidas para tentar barrar a multiplicação de falsas informações. Também começa a aumentar o número de organizações que fazem checagem – segundo Carla Jimenez, chegam a 115, um número que o fundador da Veto ainda acha pequeno.

O debate lembrou a influência das notícias falsas nas recentes eleições norte-americanas. Em entrevista ao El País em novembro do ano passado, o diretor da Escola da Jornalismo da Universidade de Columbia, Steve Coll, via um ambiente contaminado por esse tipo de notícia e citou o exemplo da informação inverídica de que o Papa Francisco apoiava Donald Trump – 1 milhão de compartilhamentos.

Para Sakamoto, as notícias falsas já influenciaram a eleição brasileira em 2014. Ele citou a informação espalhada nas redes de que o doleiro Alberto Youssef tinha sido envenenado e estava à beira da morte em Curitiba. Não adiantaram nem sequer os desmentidos da própria Polícia Federal. “Acho que isso só tende a piorar. (Há) desde estruturas estruturas armadas para isso, mas também tem muita gente que é paga”, afirmou, destacando a criação de perfis falsos, mas aparentemente convincentes. “Pra muita gente, confiável é quem fala aquilo que ela quer ouvir.”

A uma pergunta sobre o caso Escola Base, sempre lembrado em escolas de Jornalismo, a coordenadora do curso da Faap observou que o repórter sempre deve questionar, entre outras coisas, por que algumas autoridades falam sobre determinados assuntos quando a investigação ainda está em curso. “Muitas vezes elas querem aparecer, e a mídia é uma das melhores formas pra isso.” Mas ela ressalva que, naquele caso, a notícia original saiu de um delegado. “Tinha fonte.”

O diretor da Repórter Brasil avalia que um dos problemas é a “falta de pluralidade” no espectro ideológico, em relação aos meios de comunicação. “Há espaço para todo mundo. O ideal seria que a gente tivesse veículos contemplando todo o espectro político, para que a população pudesse escolher.” Em um momento em que todos podem ser “produtores” de notícias, ele disse esperar que “a gente esteja vivendo apenas uma adolescência da internet”, à espera da maturidade. 

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

8 Comentários

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  1. Espalhar notícia falsa se
    Espalhar notícia falsa se tornou um grande negócio e parte integral das estrategias politicas dos partidos.

  2. Tudo começou com o ódio que
    Tudo começou com o ódio que direita ficou ao perder 4 vezes seguidas as eleições presidenciais. Agora é caçar quem os financia e os mantém e botar na cadeia.

  3. Quando a gente analisa o

    Quando a gente analisa o perfil sócio-econômico e até a fornação educacional e profissional de certas pessoas que levam a sério tanta mentira que é colocada na internet, se surpreende. Esta frase é muito acertada: “Pra muita gente, confiável é quem fala aquilo que ela quer ouvir”

  4. É PRECISO COLAR O “FAKE NEWS” NA TESTA DA DIREITA!!!

    É comum as pessoas falarem “existem excessos dos dois lados” mas isso não é verdade… eu ouso dizer que praticamente todo o “fake news” é financiado pelos partidos da direita brasileira e surgiram todos ao mesmo  tempo (julho de 2013 ou eleições) e com o mesmo perfil (falsas notícias baseadas em algum fato real que dê credibilidade e possa ser usado na manchete sem gerar um processo). Todos são anti-PT e anti-esquerda sem nenhuma excessão. Também abraçam políticos e partidos sem nenhum constrangimento.

    É NECESSÁRIO COLAR ISSO NA TESTA DA DIREITA BRASILEIRA!!! O FAKE NEWS É DE DIREITA!!!

    E eles tem todo o amparo da imprensa brasileira… na realidade fazem o trabalho sujo da imprensa. Trabalham em conjunto e se citam mutuamente. Uma notícia falsa é plantada em um site… o MBL replica como verdade… Reinaldo Azevedo cita o MBL… e assim vai indo…

    Do outro lado temos os blogs de esquerda… são os mesmos de 10 anos atrás.. raramente vejo notícias falsas, geralmente são desmentidas… 

    Prova maior que o “fake news” é de direita: Aécio e Dória processaram pesoas comuns por falarem mal deles… não blogs ou sites… usuários comuns… eles não estavam repassando alguma matéria falsa… estavam emitindo opinião… 

    MAS EU POSSO ESTAR ERRADO… SE ALGUÉM SOUBER… FAVOR LISTAR OS SITES DE ESQUERDA QUE SÃO MENTIROSOS… ESSE BLOG PODERIA ATÉ TENTAR CATALOGA-LOS… DUVIDO QUE APAREÇA ALGUM RELEVANTE… NA DIREITA EU CITO AQUI FACILEMTE UNS 10… 

  5. íntimo querer, os likes para mentiras…

    além do uso político atual, fácil , rápido e duradouro, sempre foi um excelente negócio,

    a busca pela aprovação do outro para fazer da mentira um grande verdade

    Nenhuma novidade

    pois toda esta merda em rede veio diretamente dos políticos que temos

    horário gratuito para propaganda política enganosa, turbinada e sem fim

    Assim como não mereceu o pluripartidarismo, o Brasil, e a sociedade em geral, ainda vai levar um bom tempo para merecer uma internet realmente livre dos idiotizados

  6. O fim do diploma deu nisso

    Isso que deu o STF abolir o diploma para trabalhar como jornalista. Desde, então, todo mundo se acha apto para exercer a profissão, sem ter uma noção mínima dos fundamentos do jornalismo, tais como, SEMPRE checar a informação antes de publicá-la, SEMPRE ouvir todas as partes envolvidas, ser imparcial, buscar a pluralidade de opiniões etc.

  7. Tudo muito difícil, mas possível .

    Para acabar com tudo isso precisaríamos :

    a) Um milhão de manifestantes cercando o congresso e supreminhos do judiciário

    b) 100 mil cercando a vara do juizeco paranaense

    c) 100 mil cercando a sede da GRoubo no RJ

    d) Dezenas de milhares de manifestantes cercando todas as sedes das afiliadas da GRoubo em todos os estados da federação

    Quando e como conseguiremos toda essa mobilização ?

    a) Quando for implantado milhares de rádios em comunidades proletárias disseminando uma guerrilha radiofônica

    b) Quando as tropas norte-americanas começarem a policiar os centros urbanos e houver estupros em massa das adolescentes .

    c) Quando o governo fantoche, por ordem do império, acabar com o carnaval e substituir o futebol pelo soccer .

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