Novas eleições e a tentação do voluntarismo, por Juliano Medeiros

 
NOVAS ELEIÇÕES E A TENTAÇÃO DO VOLUNTARISMO
 
Por Juliano Medeiros* 
 
Nas últimas semanas ganharam força as propostas de novas eleições presidenciais e de eleições gerais antecipadas. Como essas propostas tem tido a adesão de atores sociais de peso à esquerda e à direita considero importante desenvolver uma breve reflexão sobre o tema. Mas antes, é necessário definir com precisão cada uma das propostas.
 
A proposta de antecipação das eleições presidenciais, defendida por Marina Silva, só poderia ser viabilizada pela cassação da chapa Dilma/Temer pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Há uma ação movida pelo PSDB com esse objetivo, alegando uma série de crimes cometidos no decorrer da eleição de 2014. Caso seus argumentos fossem aceitos pelo TSE, seriam convocadas eleições presidenciais em até noventa dias, período no qual o país seria governado por Eduardo Cunha. Mas se o TSE cassasse os mandatos de Dilma e Temer depois de transcorridos dois anos de mandato (a partir de janeiro de 2017) então a eleição seria feita de forma indireta pelo Congresso Nacional.
 
A proposta de eleições gerais é ainda mais complexa. Não há nenhum embasamento jurídico para a medida defendida por Renan Calheiros, Valdir Raupp, PSTU e um setor minoritário do PSOL. Até agora a única alternativa apresentada seria a aprovação de um Projeto de Emenda à Constituição (PEC) que instituísse a revogabilidade de todos os mandatos: presidente, governadores, senadores, deputados federais e deputados estaduais. Segundo a proposta esboçada pelo PMDB no Senado Federal, a aprovação da PEC viria acompanhada ainda de um plebiscito ou referendo. Não há maiores informações sobre a proposta que, ademais, poderia ser alvo de questionamento no Supremo Tribunal Federal sob o argumento de ferir princípio da não-retroatividade1.

 
Contra ambas as propostas se insurgiram Aécio Neves, Michel Temer e a própria Dilma Rousseff. Como se vê, o tema favorece alinhamentos dos mais improváveis. Por isso mesmo, é necessário ir um pouco além das palavras de ordem e perceber o que está por trás de cada uma dessas saídas.
 
Não precisa ser um gênio da política para saber que ambas as propostas podem se tornar bandeiras tanto da direita quanto da esquerda. Explico: se o processo de impeachment tiver um desfecho favorável a Dilma, é muito provável que a oposição demo-tucana empalme no dia seguinte a proposta de novas eleições, seja pela cassação da chapa Dilma/Temer, seja pela convocação de eleições gerais. Nesse caso, os defensores dessas propostas podem se tornar, do dia pra noite, caudatários de Aécio Neves, Michel Temer et caterva. Mas se a proposta de impeachment alcançar os 342 votos na Câmara dos Deputados e o afastamento de Dilma for confirmado pelo Senado Federal, que alternativa terá a esquerda senão reivindicar a realização de novas eleições diante do ilegal e ilegítimo governo Temer?2
 
Portanto, quem tiver um mínimo de juízo não pode hostilizar a priori a proposta de novas eleições. A prudência, porém, recomendaria não abraça-la de forma tão convicta. Diante das incertezas da conjuntura, considero totalmente precipitado aderir a uma saída dessa natureza. Não posso deixar de reconhecer que há gente séria defendendo essas propostas com base no princípio sagrado da soberania popular. O próprio PSOL defendeu, no bojo das discussões sobre a reforma política, a introdução de mecanismos de revogação dos mandatos, como os que existem na Bolívia e Venezuela. Mas essa não é a motivação de todos os que, agora, defendem a convocação de novas eleições. No caso de Marina Silva, por exemplo, é claro que ela advoga em benefício próprio: num cenário de novas eleições presidenciais ela seria um dos nomes mais competitivos. Para outros, a antecipação/convocação de novas eleições representará tão somente o segundo round na luta para derrubar o governo Dilma caso o impeachment seja derrotado na Câmara dos Deputados.
 
Há, por fim, um debate de fundo em torno da proposta de eleições gerais e antecipação das eleições presidenciais que poucos têm feito: mudar o governo, sem mudar o sistema político, resolve a crise atual? Ao defender a tese de que uma nova eleição seria necessária para pôr fim à crise, vários atores de esquerda reforçam involuntariamente a ideia de que deve-se mudar tudo para não mudar nada. De que adiantaria a realização de novas eleições sem uma profunda reforma política? Como esperar que o resultado seja melhor que o de 2014 com esses partidos, esse sistema eleitoral, essas regras de campanha? No ano passado Eduardo Cunha aprovou uma reforma eleitoral que buscou asfixiar os partidos de esquerda (como o PSOL) e eventuais alternativas mais ou menos fora do establishment (como a Rede Sustentabilidade). É nesse contexto que se imagina que um novo processo eleitoral pode ser benéfico para as forças progressistas e democráticas?
 
Como bandeira de agitação a proposta de eleições gerais ou novas eleições presidenciais é vista com bons olhos pela população, que em sua ampla maioria apoia a saída de Dilma Rousseff. De uma forma ou outra, ela representa uma variante do “Fora Dilma”. O problema é que, sem força para viabilizar um processo de refundação da democracia brasileira, essas propostas não resolverão os limites do nosso trágico sistema político. E é essa a grande luta que se abrirá no dia seguinte à votação do impeachment. 
 
*Presidente da Fundação Lauro Campos
 
1 Princípio constitucional segundo o qual a lei prejudicará o direito adquirido e o ato jurídico perfeito. No caso, o direito de Dilma de concluir seu mandato de acordo com as regras que definiram o pleito de 2014 e o tempo de mandato.
2 O atual processo de impeachment é ilegal porque não há crime de responsabilidade comprovado que possa sustenta-lo. E é ilegítimo porque foi instalado como uma vendeta do corrupto presidente da Câmara dos deputados, Eduardo Cunha, em sua luta contra o Palácio do Planalto.  
Redação

8 Comentários

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  1. Um Golpe e dois caminhos

    Continua sendo golpe e, mais ainda, deixando em evidencia a influencia sobre o eleitor desinformado que possui a Rede Globo.

    Passado este fracassado impeachment há que correr para: dar um chega na Globo; Maior comunicação direta ao povo e Agenda Positiva.

  2. Meu voto vale até 31/12/2018.

    Meu voto vale até 31/12/2018. Qualquer coisa fora disso é golpe. Dilma venceu apesar de todo o jogo sujo da direita político-midiática-judiciária. Se a direita golpista, que é responsável pela crise política, conseguir qualquer tipo de concessão que não esteja prevista na constituição, vai repetir a conduta criminosa no futuro.

  3. Temos eleições neste ano,

    Temos eleições neste ano, quando o povo tem toda a liberdade para castigar o PT, como querem os golpistas. E 2018 está ai mas como essa direita entreguista é muito sorrateira, da mesma forma que deu o golpe em 64 para não ter que enfrentar JK em 65, quer dar o golpe agora para que não tenha que enfrentar Lula em 2018.

     

    Dizem meus botões que esse pedido de Janot ao STF para que Lula não assuma o ministério, tem como objetivo a prisão e impedimento da candidatura de Lula. Sem Lula na disputa de 2018, a calmaria pode voltar, assim pensa o Alto Comando do golpe liderado por Janot,  essa nefasta figura com cara de xerife americano que, volta e meia vai aos EUA lamber as botas do Tio Sam, levando a tiracolo informações para que o império atente contra os interesse nacionais do povo brasileoro e, na volta, traz informações coletadas de forma ilícita pelos EUA para que sejam efetuadas prisões como a do Comandante Othon e, assim, o Brasil vire uma republiqueta de bananas.

     

    1.  
      O diabo tá com eles Zé

       

      O diabo tá com eles Zé Carlos. Mas como sabemos, o capiroto cobra caríssimo pelos serviços prestados. Lembre o que o rabudo fez com o Doutor Fausto. No caso do Lula, eles quebram a fuça. Podem prender o homem ilegalmente para torná-lo inelegível, tá na cara que já decidiram. Mais ai, o Lula entrega a jararaca ao Ciro, ao Riquião, ou a qualquer outro parceiro de sangue na venta, e a população entrega a faixa em nome do Lulão e manda a jararaca fumar nas fuças deles.

      Esse bando de golpistas medíocres, imaginam que o apoio dos batedores de panela da tucanolândia são suficientes para arribá-los de volta ao Alvorada. Coitados, vão é se lascar com os sonegadores.

      Orlando

       

  4. Então… voluntarismo por

    Então… voluntarismo por voluntarismo, por que não uma mini-constituinte para promover uma reforma política profunda (partidário e eleitoral), desembocando numa “virada” do sistema de representação legislativa? Sim, que valeria APÓS 2018, em estrito respeito à Lei Maior, e isso é “inegociável”. Vi esses dias que o Paulo Paim saiu com uma tal proposto, e penso que não repercutiu como deveria.

    O que seria muito interessante inclusive para encaminhar uma repactuação genuinamente democrática: a esquerda e as forças não tão à esquerda mas progressista topariam facilmente, e os de bom senso (senso democrático) ao centro e até à direita seriam demovidos de seu “silêncio”, escapando da armadilha que os falsos democratas, agora em aliança íntima com os fascistas, preparou para também os imobilizar.

  5. a mediocridade me irrita!

    O post é bom e claro. Concordo com ele.

    O que me irrita são os mediocres no congresso, nos partidos e nos tribunais inventando moda a cada crise.

    Eles criaram a crise, por ganancia e incompetencia etc.

    Um pais como o BRASIL com uma unica lingua, sem diferentes nacionalidade no mesmo territorio, sem diferenças religiosas inconciliaveis, sem conflitos com vizinhos, sem movimentos separatistas serios, porque esta em crise!!!!.

     

    Eu respondo:  porque temos um elite politica da pior qualidade!

    Não vai ter golpe!

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