Vender o Banrisul é desistir do futuro, por Tulio Zamin e Guilherme Cassel

Por razões que só o fundamentalismo neoliberal pode explicar, anseiam vender um banco público que ano após ano dá lucro (mais de 800 milhões de reais em 2020, ano da pandemia)

Vender o Banrisul é desistir do futuro

por Tulio Zamin e Guilherme Cassel

A Assembleia Legislativa do RS deverá votar ainda este mês a PEC 280 que autoriza a venda de empresas públicas sem a necessidade de um plebiscito. Mais uma vez entra em pauta o desejo dgmático dos governos conservadores de privatizar o Banrisul. Foi assim nos governos de Britto, Yeda, Sartori e agora, de Leite. Eles insistem em uma pauta equivocada, que deixará o Rio Grande mais pobre e sem um importante instrumento de política econômica.

Por razões que só o fundamentalismo neoliberal pode explicar, anseiam vender um banco público que ano após ano dá lucro (mais de 800 milhões de reais em 2020, ano da pandemia), que repassa dividendos para o caixa do Estado, atua direta ou indiretamente em quase todos os municípios gaúchos e tem sido ao longo de mais de noventa anos um importante instrumento de política econômica no Rio Grande do Sul.

Em condições normais, a volta da discussão sobre a venda do Banrisul poderia ser considerada apenas mais um episódio desta verdadeira saga dogmática pseudoneoliberal, mas neste 2021, com uma pandemia deteriorando e desorganizando as bases de toda a economia mundial, pensar em vender um banco com a vitalidade do Banrisul soa como uma afronta à inteligência e à racionalidade econômica. Mesmo instituições financeiras internacionais de tradicional corte neoliberal como o FMI e o Banco Mundial têm se rendido à realidade ­e reconhecendo a importância do papel do Estado e do financiamento de longo prazo para apoiar o investimento privado. Estão revendo suas recomendações privatistas.

O raciocínio é simples: mais cedo ou mais tarde a pandemia irá terminar e uma outra economia, com outro desenho, novos desafios e novas estruturas deverá surgir. Será uma economia diferente, com necessidades e possibilidades que ainda desconhecemos. Esta outra economia, no entanto, não surgirá como obra do Espírito Santo ou por simples geração espontânea; pelo contrário, sua vitalidade dependerá da capacidade que o Estado terá de incentivá-la com financiamento suficiente e adequado, além de políticas públicas de desenvolvimento consequentes. Teremos que criá-la e a sua sustentabilidade no tempo dependerá da nossa capacidade de utilizar de maneira correta e no momento certo os instrumentos de política econômica disponíveis. O Banrisul, então, será uma peça fundamental para ativarmos esta nova economia.

 O programa de recuperação econômica que Joe Biden já está aplicando nos EUA é um exemplo mais do que suficiente para pensarmos em como reativar economias regionais e nacionais. Lá, o Estado irá investir 1,9 trilhão de dólares na economia, no curto prazo, para gerar empregos, combater a pobreza e ampliar o acesso à escola pública. Além disso, em outro pacote, 2 trilhões de dólares, em oito anos, serão destinados a novas obras de infraestrutura. Mais ainda: irá aumentar a taxação das grandes fortunas para financiar empreendimentos de energia limpa.

Outro bom exemplo é o Programa de Recuperação Econômica da Europa, gerido pela União Europeia e seu banco. Serão 750 bilhões de euros destinados à recuperação da economia, sendo que destes, 390 bilhões de euros em forma de simples subsídios. Parte destes recursos também serão destinados a programas de pesquisa, desenvolvimento rural e a um programa de transição justa, voltado a cobrir os danos da pandemia nos países mais pobres.

Ou seja, o desenvolvimento da economia pós-pandemia irá depender em muito da capacidade dos Estados (nacional, regional ou municipal) de financiarem esta possível retomada, seja colocando recursos diretamente na mão dos mais pobres, seja viabilizando a recuperação e o surgimento de novos negócios, via financiamento de longo, médio e curto prazos. Neste cenário, inclusive, organismos internacionais e, fatalmente o BNDES, irão financiar investimentos de longo prazo em todo o país. É aí, então, que dispor de um banco estadual será uma inestimável vantagem comparativa em relação a outros estados.  Uma vantagem que o Rio Grande do Sul não pode abrir mão.

 O Banrisul poderá, por exemplo, ser um instrumento de política econômica ágil e eficaz, em cada município gaúcho, para acessar aos recursos federais, via BNDES, e destiná-los a um projeto de desenvolvimento voltado para a revitalização da nossa economia. Além disso, deverá ser um poderoso repassador de crédito rural para os milhares de Agricultores Familiares gaúchos e para toda a cadeia da agropecuária.

Os desafios pós-pandemia serão enormes, mas, por óbvio, dispor de um banco público com a excelência e a capilaridade do Banrisul poderá aumentar muito nossas chances de sucesso.

 Ter um banco público na atual conjuntura econômica significa ter em mãos um instrumento potentíssimo de atração de recursos financeiros capazes de irrigar a economia neste momento tão delicado. Vender o Banrisul agora significará desistir do futuro; um gesto de abandono e desistência que não podemos deixar acontecer.

Tulio Zamin – Ex-Presidente do Banrisul

Guilherme Cassel – Ex Vice-Presidente do Banrisul

Redação

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