A doença do curto prazo, por Rodrigo Medeiros

Em artigo publicado no “Valor Econômico”, a jornalista Maria Clara do Prado busca levantar algumas reflexões que nos ajudam a explicar as perplexidades do momento brasileiro (clique aqui para ler o artigo). Ela pontua questões políticas e econômicas, ressaltando a prevalência do imediatismo na barganha do presente. Vejamos então alguns pontos da discussão.

De acordo com a jornalista: “O Brasil segue firme na tradição de funcionar no compasso do curto prazo. Salvo momentos muito pontuais da sua história, o imediatismo tem dado o tom, a cara e o ritmo do errático processo de desenvolvimento do país. A primazia do curto prazo persiste mesmo depois do desaparecimento da hiperinflação”. O prognóstico do Fundo Monetário Internacional (FMI) para o Brasil diz que só em 2017 poderemos contar com uma taxa de crescimento ao redor de 2%. 

Maria Clara também aponta para as deficiências nos serviços públicos, como é o caso da qualidade da educação brasileira. Tal fato não estaria contribuindo efetivamente para os necessários avanços na produtividade da mão de obra, que, por sua vez, afeta a competitividade do país. Políticas e práticas educativas deficientes deixam muitos países em um permanente estado de recessão econômica (clique aqui). Citando ainda um estudo recente do FMI sobre a infraestrutura brasileira, a jornalista aponta que o investimento no setor caiu do equivalente a 5,2% do PIB no início dos anos 1980 para algo em torno de 2,25% do PIB nas últimas décadas: “uma infraestrutura deficiente e inadequada é capaz de afetar para menos entre 10% e 15% a evolução do PIB no Brasil”.

Algo que merece destaque no artigo de Maria Clara diz respeito ao empresariado. Segundo a autora, “há ainda um outro elemento chave que ajuda a propagar a doença brasileira do imediatismo. O empresariado não tem o hábito de investir. Isso vem de longe”.  De acordo com Maria Clara: “o excesso de liquidez a custo baixo que pairou no mundo a partir de 2009 com a agressiva política expansionista dos Estados Unidos, disseminando crédito abundante para os países emergentes, foi usado pelos empresários brasileiros em boa parte para fazer ‘cash’, através de diferentes modalidades de captação de recursos, ao invés de ter sido aplicado em investimentos produtivos”. Nesse sentido, a inovação não tem importância porque não se encaixa no imediatismo.

Para finalizar, outro artigo que li recentemente apontou para os problemas enfrentados pelo “ensaio desenvolvimentista” no primeiro governo Rousseff (clique aqui para ler o artigo). Segundo Kalecki, “a função social da doutrina do ‘equilíbrio fiscal’ é tornar o nível de emprego dependente do ‘estado de confiança'”. Seguindo essa lógica, os governos seriam forçados a ceder às pressões capitalistas e a referência recorrente ao “estado de confiança dos empresários” seria a forma de manifestação de uma chantagem, pela qual os capitalistas ameaçam realizar “greve de investimentos” em reação às políticas que os desagradam. Não posso afirmar se os fatos se desdobram exatamente assim, mas achei interessante essa abordagem.

Reformas e avanços institucionais são bem necessários em nosso país, como é o caso da busca por um sistema tributário progressivo e transparente, por exemplo. No entanto, creio que o debate precisa considerar questões que se colocam além de uma ótica estritamente economicista. Lideranças políticas esclarecidas também se fazem muito necessárias no presente. 

Rodrigo Medeiros é professor do Ifes (Instituto Federal do Espírito Santo)

Rodrigo Medeiros

1 Comentário

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  1. Lideranças…

    “Lideranças políticas esclarecidas também se fazem muito necessárias no presente.”

    Infelizmente, estamos muito longe disso. Tanto na direita quanto na esquerda, a mediocridade das lideranças atuais é assustadora. Aliás, esse fenômeno não é especificamente brasileiro : quais são os grandes líderes políticos mundiais da atualidade? 

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